Vagueando na Notícia


Participe do fórum, é rápido e fácil

Vagueando na Notícia
Vagueando na Notícia
Gostaria de reagir a esta mensagem? Crie uma conta em poucos cliques ou inicie sessão para continuar.

Nem só de pão....

Ir para baixo

Nem só de pão.... Empty Nem só de pão....

Mensagem por Vitor mango Qui Nov 06, 2014 1:41 am

Nem só de pão....

 
 
 
 
— Mas onde é que ele está? — pergunta o pai. — A escola já acabou há muito tempo!
A mãe vai, mais uma vez, ver o horário e meneia a cabeça. Percebe-se uma pontinha de medo na sua voz quando diz:
— Geralmente, já cá costuma estar…
— Não — o pai abana a cabeça. — Não é bem assim. Lembras-te de que ele ainda no outro dia voltou a…
— Tirou a joaninha do passeio e foi pô-la na relva…
— Exatamente — diz o pai. — E não foi há tanto tempo assim que ele…
— Eu sei — diz a mãe. — Que ele queria tirar a minhoca do bico do melro…
— Então, e não tirou a borboleta da poça de água?
— Salvou o abelhão de morrer na teia de aranha, queres tu dizer…
— Não interessa — diz o pai. — De qualquer forma, ele ainda não chegou.
“Está a demorar tanto…” pensa a mãe. “Tanto…”
Já tinha ido à janela espreitar, primeiro para a rua, na direção de onde ele costumava vir, depois para o outro lado e ainda para o parque em frente. Mas agora não podia deixar o que estava a fazer na cozinha.
— Pronto, então vou eu — consola-a o pai. — Encontro-o já!
“Se não tiver acontecido nada…” pensa a mãe.
 
Nesse momento, tocam com força à campainha. Os pais acorrem. Matias precipita-se para dentro. O pai e a mãe olham para o filho, e depois entreolham-se.
O que irá ele dizer? Solta-se uma torrente de palavras:
— Sabem? Sabem? — exclama, ainda ofegante.
— Não — diz o pai afavelmente. — Não sabemos. Infelizmente, nós os dois não sabemos de nada.
— Ali em baixo está uma pomba que só tem uma pata!
Matias lança a novidade com os olhos arregalados de espanto e visivelmente excitado.
— Só tem uma pata, aquela pomba — continua. — A pata direita, e de cada vez que quer chegar à comida, bem… uma mulher estava a dar-lhe comida e vinham sempre as outras todas e eram muito mais rápidas. Eu dizia — xô, xô, — mas só assustava a que tinha uma pata e ela fugia… Voar, voava bem, mas no chão… e as outras… as outras…
As palavras perdem-se. Fica apenas um filho consternado que olha, desesperado, ora para a mãe, ora para o pai, durante muito tempo.
— E foi por isso que vieste tão tarde da escola? — pergunta o pai amavelmente — Outra vez?
Matias diz que sim com a cabeça.
— As pombas com duas patas roubam o pão à que só tem uma. Ela não é suficientemente rápida… é lenta, muito… demasiado lenta…
Os olhos assustados abrem-se ainda mais.
— Vai morrer à fome? — pergunta.
— Não, não vai — diz o pai com voz determinada. — A mãe já vai buscar alguma coisa à 
cozinha e … — deita-lhe um olhar.
A mãe defende-se:
— Agora vamos comer, se não, as panquecas…
Mas o pai nem sequer ouviu.
— …já traz pão da cozinha.
— Mas aquecidas não são tão boas!
— …pão da cozinha, e depois vamos lá ver o que podemos fazer com a pomba, não é?
O pai parece muito divertido ao falar. A mãe traz pão da cozinha. Matias meneia a cabeça algumas vezes. Ainda está perturbado com o que acabara de ver.
— …e depois vêm sempre as pombas com duas patas — continua — e a que só tem uma encolhe-‑se. Salta para o lado, cheia de medo e…
— Onde é que ela está? — pergunta o pai.
 
Matias conduz os pais até ao banco verde perto dos arbustos. As pombas já estão à espera, sacodem as asas e esvoaçam, debicam o pão que as pessoas lhes deitam, gostam de ir comê-lo à mão.
— Agora vamos ver se juntos conseguimos — diz o pai com energia.
Ah! A pomba que só tem uma pata também aparece. Aproxima-se aos saltinhos, com dificuldade. Matias aponta para ela, saltita de um pé para o outro, aos gritos:
— Ali! Está ali! Estás a vê-la? Aquela ali! Aquela!
Não é mesmo nada fácil ajudá-la. Sozinho, Matias nunca teria conseguido dar-lhe de 
comer. — Xô, xô! — faz ele. Muitas vão embora, enquanto a pomba doente fica junto do pai. As outras também recebem alguma coisa, mas ela recebe um verdadeiro banquete.
 
Matias está feliz. Ao sentar-se à mesa para almoçar, diz-lhe o pai:
— Se tivesses vindo logo… quero dizer, se nos tivesses chamado logo depois da escola, não é… não teria sido bem melhor?
Matias pensa e responde:
— Talvez. És capaz de ter razão, mas agora, ela também já tem a barriga cheia.
Lutz Besch
 
 
Jutta Modler (org.) 

Brücken Bauen

Wien, Herder, 1987
(Tradução e adaptação) 

_________________
Só discuto o que nao sei ...O ke sei ensino ...POIZ
Nem só de pão.... Batmoon_e0
Vitor mango
Vitor mango

Pontos : 117360

Ir para o topo Ir para baixo

Ir para o topo


 
Permissões neste sub-fórum
Não podes responder a tópicos