Por que defendo Ferreira Leite? 06 December 08 12:00 AM

Por que defendo Ferreira Leite?
06 December 08 12:00 AM

O nosso mundo político é muito pequeno – e as pessoas sensatas, capazes e com visão que nele circulam são muito poucas.
Manuela Ferreira Leite começou por ser para muita gente a santinha que vinha salvar o PSD da desgraça.
Hoje, passados apenas seis meses, é a mulher que pode levar o PSD à desgraça.
Primeiro, era atacada porque não falava.
Agora é atacada por cometer demasiadas gafes quando abre a boca.



Tudo isto também acontece porque o PSD está em ponto de rebuçado.
O partido não sabe para que lado se há-de voltar.
Um dia olha com expectativa para Rui Rio, no dia seguinte tenta perceber as intenções de Passos Coelho, dois dias depois fica extasiado com Marcelo Rebelo de Sousa.
E pelo caminho vai ouvindo os dislates de Luís Filipe Menezes.
É uma loucura!
O pânico do PSD tem que ver com as próximas eleições: as autárquicas, as europeias e sobretudo as legislativas.
O partido vive no pânico da repetição da maioria absoluta de José Sócrates.
E ainda não percebeu que isso não passa tanto por ele como pela insatisfação dos professores ou o agravamento da crise financeira – que pode criar na sociedade um desejo de mudança.

O PSD começou por pensar que Ferreira Leite era a pessoa certa para devolver a credibilidade ao partido e combater Sócrates – e hoje tem dúvidas.
Os dirigentes e militantes do PSD são muito sensíveis ao universo mediático – e quando vêem muitos comentadores criticar Ferreira Leite, zurzir Ferreira Leite por não falar, atacá-la pelas gafes ‘tremendas’ que comete, começam a pensar que se calhar enganaram-se ao escolhê-la, que provavelmente não é ela a pessoa certa para galvanizar o eleitorado e roubar a Sócrates, se não o poder, pelo menos a maioria absoluta.
Os militantes do PSD ouvem os analistas e comentadores – e pensam se não seria melhor um líder mais ‘normal’, que falasse quando era suposto falar, que fosse politicamente correcto, que não cometesse deslizes.

Ora a grande vantagem de Manuela Ferreira Leite é exactamente não corresponder a esses critérios de ‘normalidade’.
É ser diferente do padrão comum.
É não ser simpática e não dizer o que as pessoas gostam de ouvir – antes ser capaz de ser incómoda e até ‘inconveniente’.
Quando disse que subir o ordenado mínimo era um erro, caiu-lhe em cima o Carmo e a Trindade; ora ela limitou-se a dizer uma evidência: que a subida dos salários provoca sempre um aumento do desemprego, não sendo aconselhável quando o desemprego está a subir.
E quando disse que para resolver os problemas da Justiça era preciso suspender por seis meses a democracia, toda a gente percebeu o que queria dizer: que o mau funcionamento da Justiça não se resolve com duas cantigas.
Ou alguém pensou, seriamente, que Ferreira Leite queria mesmo suspender a democracia?

Manuela Ferreira Leite está a ser vítima de uma coisa: de uma aliança objectiva entre a máquina de contra-propaganda do Partido Socialista, que lhe amplia os defeitos e potencia as gafes, e os seus detractores internos no Partido Social Democrata.
Uns e outros estão hoje de mãos dadas para a denegrir.
E, claro, no festim participam muitos militantes que funcionam como idiotas úteis.

É exactamente por isto que defendo Ferreira Leite.
Por um lado, percebo que é vítima de uma conspiração.
Por outro lado, é uma pessoa diferente, que não faz o que parece bem, não fala porque a mandam, não diz o que é preciso para agradar ao povo, tem a coragem de ser ela própria.
E o ser diferente, num mundo de cidadãos padronizados, de robôs que dizem o que lhes mandam e só fazem o que é previsível, é uma insubstituível qualidade.
Aliás, não é disso exactamente que se faz o carisma?
O carisma dos políticos não se faz a partir do que é invulgar, do que não vem nos compêndios, do que surpreende ou até choca?