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O MEU 25 DE ABRIL NA URSS Por Carlos Fino

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Mensagem por Vitor mango Seg Abr 27, 2015 12:47 am

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O MEU 25 DE ABRIL NA URSS
Por Carlos Fino

Fui surpreendido pelo 25 de Abril de 1974 em Moscovo. Tinha chegado poucos meses antes – em Novembro de 1973 - vindo da Bélgica, onde vivera dois anos exilado como refugiado das Nações Unidas.
Saíra de Portugal clandestinamente, “a salto”, em 1971, na sequência de uma onda de greves estudantis em cuja organização estive profundamente implicado enquanto militante clandestino do PCP e dirigente associativo na Faculdade de Direito de Lisboa.
Ficar significava correr o risco de ser preso e condenado a pelo menos quatro anos de cadeia, seguidos de mobilização para a guerra colonial – na Guiné, Angola ou Moçambique - como de facto já acontecera e viria ainda a acontecer com outros colegas meus.
Em Bruxelas, trabalhei durante um ano como condutor de eléctricos (bondes) e no ano seguinte cursei Direito (3ºano) na ULB, a Universidade Livre de Bruxelas.
Desadaptado em relação à nova situação e envolvido na militância partidária – incluindo a criação da futura APEB – Associação dos Emigrantes Portugueses na Bélgica – iria certamente perder o ano e com ele a bolsa de estudo a que tivera direito.
Foi então que, depois de alguns testes de voz, surgiu uma proposta que na altura me pareceu irrecusável – ir para a URSS ser locutor na secção portuguesa da Rádio Moscovo.
Após a incapacitação de Salazar, em 1968, tinha havido alguma esperança na liberalização do regime insinuada pelo seu sucessor, Marcelo Caetano. Agora, porém, cinco anos volvidos, era evidente que as anunciadas mudanças não passavam de fachada e parecia a todos, na Oposição ao regime, que este estava, infelizmente, para lavar e durar.
Foi nesse contexto que o convite para Moscovo me pareceu mais do que sedutor – não só iria conhecer a “pátria do socialismo”, como ter oportunidade de trabalhar numa rádio que já ouvia antes, às escondidas, em Portugal. Além do mais, havia a promessa de poder continuar os estudos.
Acima de tudo, ponderei, era uma saída para um compasso de espera que se adivinhava longo até à queda da ditadura.
DE REPENTE, NÃO MAIS DO QUE DE REPENTE...
Eis se não quando, escassos 5 meses depois da minha chegada, aconteceu o que ninguém previra – a queda do regime em Portugal, num golpe organizado pelos militares: o 25 de Abril de 1974!
Nesses dias, em que ainda não havia internet e as próprias comunicações telefónicas eram escassas e vigiadas, vivi literalmente de ouvido colado ao rádio, em particular um rádio militar de ondas curtas que descobri na secção africana em língua portuguesa da Rádio Moscovo.
Tinha sido escassa a minha contribuição para o fim do regime. Mas a verdade é que eu me inserira numa luta que vinha de outras gerações e havia por isso uma parte de mim naqueles acontecimentos, que queria naturalmente vivenciar.
Quis voltar de imediato a Portugal. Moscovo fora uma desilusão. Na ignorância dos meus verdes anos, imaginara uma Brasília vermelha, virada ao futuro, e deparara com uma cidade pesada, querendo imitar, com os seus néons rudimentares, o brilho das grandes metrópoles capitalistas.
Depois dos traumas do estalinismo e da guerra, a burocracia era uma realidade omnipresente e a estagnação económica avassaladora.
A insistência na utopia de vencer o mercado conduzira à falta de iniciativa e estímulo, que juntamente com a corrida armamentista, só produziam escassez. Havia falta de tudo – da alimentação aos bens de consumo mais rudimentares.
As filas para abastecimento tornavam a vida ainda mais pesada, para além do clima de sufoco causado pela falta de liberdade e pela propaganda omnipresente.

Aquela não era a minha terra, nem aquele tinha sido o meu sonho juvenil de uma sociedade mais justa. Agora, com a democracia a chegar a Portugal, nada mais me retinha ali e queria, portanto, voltar.
Mas o homem põe, e o partido dispõe. Comprometido com os soviéticos na deslocação daquele quadro (eu), o PCP achou por bem sacrificar o meu ímpeto juvenil, de quem sonha ainda com revoluções, e não autorizou a minha saída.
Como o meu passaporte estava nas mãos da organização e não havia ainda embaixada, não tive outro remédio se não continuar ali, contra minha vontade, até que finalmente viesse a autorização.

A memória que guardo de todo esse período é portanto um misto de grande alegria pelo que se passava em Portugal e de muita tristeza pela situação de confinamento obrigatório a que estava sujeito e me impediu de vivenciar os grandes momentos de libertação do país que foram o 25 de Abril e o 1º de Maio de 1974.
A autorização para voltar só chegaria em Novembro desse ano. Nesses seis meses, a minha vida mudou – não só perdi as ilusões em relação ao comunismo, como conheci aquela que viria a ser a minha primeira mulher russa, uma paixão que acabaria por mudar o rumo da minha vida noutra direção. Mas essa já é outra história, que terá de ficar para depois.
Brasília, 25 de Abril de 2015
Nas fotos - O 25 de Abril seguido à distância: alegria e tristeza

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[*]Augusto Fernando ...dava um livro.
6 h · Gosto
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Mensagem por Vagueante Qua maio 13, 2015 11:16 am

Sempre me intrigou o afastamento de Carlos Fino não só da Comunicação Social como de Portugal.
Talvez noutra oportunidade o excelente jornalista que ele era, nos possa dizer alguma coisa sobre o caso.

Vagueante

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O MEU 25 DE ABRIL NA URSS Por Carlos Fino Empty Re: O MEU 25 DE ABRIL NA URSS Por Carlos Fino

Mensagem por Vitor mango Sáb maio 23, 2015 1:22 pm

Vagueante escreveu:Sempre me intrigou o afastamento de Carlos Fino não só da Comunicação Social como de Portugal.
Talvez noutra oportunidade o excelente jornalista que ele era, nos possa dizer alguma coisa sobre o caso.
comungo na analise

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