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Saramago não incomoda nada.

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Saramago não incomoda nada. Empty Saramago não incomoda nada.

Mensagem por Joao Ruiz Dom Out 25, 2009 10:17 am

Saramago não incomoda nada.

por Alberto Gonçalves
Hoje

Saramago não incomoda nada. Alberto_goncalves

A história das 'escutas' mostrou que Cavaco não é imune ao ridículo, mas o 'não' aos Gato mostrou que o ridículo tem limites.

Terça-feira, 20 de Outubro

E o Prémio Sousa Lara de 2009 vai para o eurodeputado do PSD Mário David, que tem vergonha de José Saramago e por isso lhe pediu que renuncie à cidadania portuguesa. É preciso um apurado patriotismo para decidir que em Portugal só se encaixam cidadãos impolutos e exemplares. Desgraçadamente, não sou patriota. Por umas e por outras, convenci-me de que, mais ou menos à semelhança dos restantes países, aqui coexistem pessoas dignas e bandalhos, sumidades e palermas, além de imensas criaturas assim-assim. É verdade que o sr. Saramago não ocupa o topo das minhas preferências, mas se ler os seus livrinhos e aturar os seus desabafos não forem actividades compulsivas, não me aflige partilhar a nacionalidade e a geografia com o homem.

Já me espanta um bocadinho que se atribua ao homem o relevo que não merece. Na rua da minha infância, surgia às vezes um indivíduo que, auxiliado por uma corneta e um bombo, gritava blasfémias tão profundas e esclarecidas quanto as do sr. Saramago. Em lugar de lhe conceder o Nobel, a Casa dos Bicos e manchetes na imprensa, a vizinhança ria-se do infeliz. Ao infeliz faltou o que não falta ao sr. Saramago: disciplina de escrita e gente que lhe desse troco.

Além do tal Mário David, também figuras respeitáveis da Igreja e da comunidade judaica ajudaram o sr. Saramago na prática do seu desporto favorito: imaginar-se "incómodo". O sr. Saramago é o equivalente literário daqueles treinadores de futebol que passam a vida a proclamar que o seu Paços de Ferreira ou o seu Vitória de Setúbal "estão a incomodar muita gente". A boutade visa atribuir a quem a profere uma capacidade singular, um carácter indomável que eleva o autor acima da ralé "incomodada".

Escusado dizer que há aqui bastante presunção e algum delírio. Desde que não volte a dispor do poder de que dispôs durante o assomo estalinista de 1975, o sr. Saramago não me incomoda nada. Pelo contrário: na medida em que os seus anseios publicitários produzem regularmente o exacto tipo de burlesco que alimenta a crónica jornalística, o sr. Saramago até me é útil. Os seus alívios anticlericais, típicos de quem não leu ou não percebeu o Antigo Testamento, e as suas derivações ficcionais, típicas de quem leu e percebeu García Márquez e coisas piores, apenas incomodam os que o levam a sério, toleima em que, insisto, não caio. No fundo, tenho mais o que fazer. Notoriamente, Mário David, e não só Mário David, não tem.

Quarta-feira, 21 de Outubro

Bombas sexuais

Nem a mais refinada sátira consegue competir com as excrescências da ONU dedicadas aos "direitos humanos". Essas prestimosas instâncias, que essencialmente combatem Israel por via de "resoluções" e "relatórios", atingiram agora o apogeu de um já notável currículo de demência. A demência mais recente, e juro que não exagero nem um pedacinho, condena as subtilmente medidas antiterroristas levadas a cabo pelo governo israelita a pretexto de perturbarem, ou até humilharem, indivíduos de sexualidade "alternativa" ou "transgénica" (lamento, mas "transgénero" não passa no corrector ortográfico do Word, sem dúvida uma geringonça reaccionária).

Não perceberam? Também não é bem para ser percebido. Ainda assim, tentarei explicar. Parece que alguns dos senhores que em Telavive ou Jerusalém se rebentam no meio de civis têm por hábito disfarçar o intento vestindo-se de mulheres. Parece que, avisadas do disfarce, as autoridades locais inspeccionam os aparentes travestis árabes com particular atenção. Parece que a ONU acha intoleráveis - as inspecções, não os atentados.

Perante isto, o que dizer? No máximo, uma réstia de lucidez lembra-nos que, no Médio Oriente, um muçulmano travestido é sempre um potencial suicida: se não se mata entre israelitas, será provavelmente morto a título de heresia pela família ou pelo seu governo, se este não for o de Israel. Mas quem usa a lucidez para comentar o absurdo arma-se em excêntrico num mundo que, pelo menos se visto das Nações Unidas, enlouqueceu de vez.

Sexta-feira, 23 de Outubro

Big Brother dos famosos

A título de declaração de interesses, como parece estar em voga, informo que conheço o Ricardo Araújo Pereira (e, menos, o Zé Diogo Quintela) de dois ou três jantares e o ocasional e-mail ou telefonema. Acrescento que achei os Gato Fedorento dos primórdios um milagre que aconteceu à comédia nacional, depois achei o Magazine e o Zé Carlos um nadinha institucionais e acho o Esmiúça os Sufrágios, que agora acaba, uma alternativa decentíssima ao Daily Show, sem os respectivos meios técnicos e sem um apresentador que, como Jon Stewart desde há um par de anos, exibe desagradavelmente a influência entretanto acumulada.

O problema de Esmiúça os Sufrágios esteve nas entrevistas. A primeira parte, em que tínhamos Gato Fedorento a sério, era muito boa. A segunda parte, em que tínhamos políticos a brincar, nem por isso. A culpa não coube ao Ricardo, coube aos políticos que tentaram competir com ele em graça e, não possuindo nenhuma, obrigaram-no, por pudor, a conter a própria. A excepção aos políticos desengraçados foi Marcelo Rebelo de Sousa, cujo brilho intelectual o distingue no meio. A excepção aos políticos todos foi Cavaco Silva, que pura e simplesmente declinou o convite.

Nas caixas de comentários da Internet, a recusa de Cavaco nem sempre mereceu aplausos. Inúmeros cidadãos julgaram a atitude sobranceira, sob o argumento, presumo, de que um chefe de Estado não está acima de um espectáculo de humor. Sucede que, embora eu me incline a preferir o segundo ao primeiro, simbólica e tecnicamente está. E o exemplo de Barack Obama, citado com frequência, não me convence do contrário. Em Março passado, Obama fez o que, que eu saiba, apenas um presidente americano em funções (Gerald Ford, numa aparição assaz discreta no Saturday Night Live) fizera: participar num programa de entretenimento, no caso o Tonight Show, então de Jay Leno.

Obama é, pois, a mera consagração de uma tendência, a do estadista enquanto vedeta de variedades, capaz dos maiores malabarismos a fim de agradar ao paladar das massas e passar pelo sujeito "descontraído" e "irreverente" que a época pede. Se, mesmo assim, parte das massas desconfia, Obama troca a descontracção pela velha tesoura e tenta silenciar dissidências (ver, por favor, a ofensiva em curso da Casa Branca contra a Fox News). Por vezes, a distância entre a informalidade e a impaciência é curta. O facto de, em abono de uma dúbia "popularidade", os políticos contemporâneos se submeterem a tristes figuras não os torna melhores políticos nem, com certeza, pessoas mais tolerantes.

De resto, não é necessário recorrer à América para ver governantes passear "jovialidade" nuns canais e censurar outros. E não é preciso recorrer a Esmiúça os Sufrágios para ver a classe política em geral em prestações embaraçosas. Ainda recentemente, a história das "escutas" mostrou que Cavaco não é imune ao ridículo, mas o "não" aos Gato Fedorento mostrou que o ridículo dele tem limites. A haver um único político que os tenha, é bom que seja o Presidente da República. Já basta o que basta.

Sábado, 24 de Outubro

Uma aventura eleitoralista

Há demasiado tempo, talvez em 1984, a professora de História do 9.º ano prometeu um livro, não identificado, ao aluno com o melhor teste. No dia da grande decisão, a professora disse o meu nome e eu levantei-me, embaraçado pela distinção, satisfeito pelo prémio. Num ápice, fiquei-me pelo embaraço: o prémio era um livrinho da colecção "Uma Aventura", cópia indígena e pelintra dos "Famous Five" de Enid Blyton, os quais, aliás, lera aos seis anos. Aos catorze, andava, provavelmente sem compreender, pelos Camus e Kafka da praxe. Dei o livrinho a uma prima bebé e no 9.º ano não repeti os bons resultados a História. Embora a duras penas, aprendi nesse momento a incapacidade da docência em "motivar" as crianças. E aprendi o nome de Isabel Alçada, co-autora da mencionada colecção e hoje, talvez ironicamente, ministra da Educação. Pelo meio, ouvi que a senhora passou pelo Plano Nacional de Leitura, onde continuou a tentar infantilizar a população estudantil, tarefa nada difícil.

Dos novos ministros, o meu conhecimento esgota-se aqui. O meu e, ao que parece, o de toda a gente. Quando se diz que os estreantes constituem uma aposta do eng. Sócrates na "componente técnica", pretende-se dizer que ninguém tem ideia de quem sejam. Juntos na obediência dócil ao eng. Sócrates, estreantes e repetentes apontam dois caminhos. O primeiro é o desejo de sossegar polémicas (Educação, Saúde) ou em não as criar (Justiça, Administração Interna): oficialmente, o "reformismo" terminou antes de deixar marcas. O segundo caminho prende-se inteirinho com o dinheiro e, mediante abraço à esquerda e desprezo à despesa pública, descreve-se em três palavras: gastar, gastar, gastar. As Obras Públicas foram para um entusiasta das mesmas. A Economia foi para o dr. Vieira da Silva do Trabalho. O trabalho foi para uma sindicalista. E as Finanças permanecem no dr. Teixeira dos Santos, cujos méritos, esses sim técnicos, não moderam os propósitos do chefe.

Aparentemente, o chefe procedeu a um levantamento dos maiores problemas nacionais e inventou um Governo empenhado em mantê-los ou agravá-los. Com sorte, enquanto a médio prazo o país se afunda, no curto a popularidade do primeiro-ministro sobe, o que virá a jeito para dissuadir ou vencer eleições antecipadas. As almas seduzidas pelo eng. Sócrates falam em "Governo de combate". As almas cépticas suspeitam de que o combate é com o seu bolso, e partem já derrotadas.

DN

Saramago não incomoda nada. Notsure

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