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Banqueiros á nora

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Mensagem por Viriato Sex Jan 22, 2010 11:34 am

Banqueiros à nora

por Paul Krugman, Publicado em 22 de Janeiro de 2010



Por tudo o que se tem passado, cheguei à conclusão que o melhor é não dar ouvidos aos conselhos e às teorias dos financeiros quando o que está em causa é a reforma financeira

A comissão oficial de inquérito à crise financeira (Financial Crisis Inquiry Commission), grupo que pretende organizar uma versão moderna das audiências Pecora dos anos 30 e cujas investigações abriram caminho às regulamentações bancárias do New Deal - começou a ouvir depoimentos na quarta-feira. Na primeira ronda de audiências, a comissão macerou quatro grandes personalidades do mundo da finança. Que ficámos a saber?

Bom, para quem estivesse à espera de um momento ao estilo Perry Mason, numa cena em que a testemunha disparasse: "Sim! Confesso! Fui eu! E não me arrependo!", a audiência foi uma desilusão. O que ouvimos, em vez disso, foram as testemunhas a atirar: "Sim! Confesso! Não faço a mais pequena ideia!"

Bem, não terá sido exactamente por essas palavras... Mas, mesmo agora, os depoimentos dos banqueiros revelaram uma total incapacidade de avaliação da natureza e da extensão da actual crise. E isso é importante: diz-nos que o Congresso e a administração, quando procurarem reformar o sistema financeiro, devem ignorar os conselhos daqueles que são, supostamente, os grandes sábios de Wall Street, que revelaram não ter sabedoria nenhuma que nos seja útil.

Veja-se o que aconteceu até agora: a economia dos Estados Unidos ainda está a braços com as consequências da pior crise financeira desde a Grande Depressão; perderam-se biliões de dólares de receitas potenciais; as vidas de milhões de pessoas foram prejudicadas, em alguns casos irreparavelmente, pelo desemprego em massa; outros tantos milhões viram as suas poupanças aniquiladas; centenas de milhares, senão mesmo milhões, vão perder o direito a cuidados de saúde básicos devido a uma combinação de perda de emprego e de cortes draconianos nos depauperados orçamentos estaduais.

E esta catástrofe foi inteiramente auto-induzida. E não é, em nada, parecida com a situação de inflação e recessão simultâneas da década de 70, que em muito se deveu à subida astronómica dos preços do petróleo que por seu turno resultou da instabilidade política no Médio Oriente. Desta vez estamos em apuros exclusivamente por culpa da natureza disfuncional do nosso próprio sistema financeiro. Toda a gente percebe isso - isto é, salvo os próprios financeiros.

Houve dois momentos na audiência de quarta-feira que se destacaram. Um deles foi aquele em que Jamie Dimon, do JPMorgan Chase, declarou que uma crise financeira é uma coisa que "acontece a cada cinco ou sete anos. Não devia ser causa de surpresa; ele há coisas que acontecem, fazem parte da vida e pronto.

Mas a verdade é que os Estados Unidos conseguiram evitar crises financeiras de grande escala durante meio século, depois de se terem realizado as audiências Pecora e de o Congresso ter aprovado grandes reformas no sector bancário. Só quando essas lições caíram no esquecimento e desmantelámos essa eficaz regulamentação o nosso sistema financeiro regressou a um estado de perigosa instabilidade.

Foi também espantoso ouvir Dimon reconhecer que o seu banco nunca tinha sequer posto a hipótese de ocorrer uma descida substancial dos preços das casas, apesar dos avisos generalizados de que se estava a viver uma monstruosa bolha imobiliária.

Posto isto, o desnorte de Dimon não se compara com a enormidade do de Lloyd Blankfein, do Goldman Sachs, que comparou a crise financeira com um furacão que ninguém podia ter previsto. Phil Angelides, o presidente da comissão, não achou graça: a crise financeira, declarou, não foi uma catástrofe natural; resultou de "actos de homens e mulheres".

Será que Blankfein estava apenas com dificuldade em exprimir-se? Não me parece. Ele usou a mesma metáfora no depoimento que tinha preparado, em que apelava a que o Congresso não fosse demasiado insistente numa reforma financeira: "Devíamos resistir a aplicar medidas [...] que se destinariam apenas a proteger-nos contra uma tempestade que ocorre uma vez por século." Assim, esta gigantesca crise financeira teria sido apenas um raro acidente, um deslize da natureza, e devíamos cuidar de não lhe reagir exageradamente.

Só que a crise não teve nada de acidental. A partir dos anos 70, o sistema financeiro dos EUA, deixado à solta pela desregulamentação e por um clima político em que a ganância era vista com bons olhos, entrou numa vertigem cada vez mais descontrolada. Davam-se recompensas cada vez maiores - prémios muito além dos sonhos mais desbragados - a banqueiros capazes de produzir enormes lucros a curto prazo. E a melhor maneira de aumentar esses lucros era acumular dívida, impingindo empréstimos ao público e ganhando cada vez mais espaço de manobra no sector financeiro.

Mais cedo ou mais tarde, um sistema com estas características tinha de rebentar. E, se não fizermos mudanças fundamentais, a história vai repetir-se. Será que os banqueiros não percebem mesmo o que aconteceu, ou estarão apenas a proteger os seus próprios interesses? Como eu disse, o importante é que tenhamos presente que não devemos dar ouvidos aos financeiros quando está em causa a reforma financeira.

Economista Nobel 2008

Exclusivo i/The New York Times
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