Vagueando na Notícia


Participe do fórum, é rápido e fácil

Vagueando na Notícia
Vagueando na Notícia
Gostaria de reagir a esta mensagem? Crie uma conta em poucos cliques ou inicie sessão para continuar.

Daniel Oliveira: Antes pelo contrário

Ir para baixo

Daniel Oliveira: Antes pelo contrário 	 Empty Daniel Oliveira: Antes pelo contrário

Mensagem por Vitor mango Ter Fev 08, 2011 5:39 am

Daniel Oliveira: Antes pelo contrário O passe de Coelho « Daniel Oliveira: Antes pelo contrário « Blogues « Página Inicial |

O passe de Coelho

Passos Coelho quer um passe social só para pobres. Como os que nos têm governado, não fez as contas certas. Ao subsidiar o transporte coletivo o Estado poupa dinheiro. À sociedade, à economia e a si próprio.
Daniel Oliveira (www.expresso.pt)
8:00 Terça feira, 8 de Fevereiro de 2011

Última atualização há 27 minutos

Pedro Passos Coelho explicou, este fim de semana, numa proposta aparentemente setorial, o que entende ser papel do Estado na sociedade. Acha estranho que as pessoas possam aceder ao passe social sem apresentarem uma declaração de rendimentos. Ou seja, defende que o passe deve apenas estar disponível como um subsídio à mobilidade dos mais pobres. Repete assim a ideia de que o papel do Estado deve ser meramente assistencialista.

Não é difícil perceber qual o resultado desta política: como as pessoas também agem seguindo alguma racionalidade económica, os preços de mercado resultariam num abandono dos transportes públicos, que ficariam, na realidade, quase exclusivamente reservados às classes baixas. Além da perda de qualidade estar assim mais do que garantida - já aqui expliquei várias vezes os efeitos na qualidade dos serviços públicos quando as classes médias deixam de os utilizar -, isto teria efeitos em toda a qualidade de vida urbana.

Na verdade, Passos Coelho limita-se a querer continuar o que outros começaram.

O passe social nasceu, com o nome errado, no final dos anos 70 e seguindo a boa experiência europeia. Aproveitando o facto de quase todos os transportes coletivos serem de propriedade Estatal, criou um bilhete mensal único para todos os transportes urbanos, dividido por coroas. Falhou ao deixar de fora os títulos de transporte para uma só viagem. Mas a lógica estava lá: a rede de transportes deve ser vista como um todo e não como uma mera soma das partes. Não se tratava de um apoio aos mais pobres, mas da promoção do uso do transporte coletivo. Não por qualquer fetiche ideológico. Apenas porque a sociedade, o ambiente e a economia ficam a ganhar com esta opção.

Quando começou, nos anos 90, o processo de privatizações dos transportes o passe único perdeu importância. Os privados não foram obrigados, como são em grande parte das grandes cidades europeias - sejam elas geridas por pessoas de esquerda ou de direita -, a aderir a este sistema. Criaram-se então os passes combinados. Um erro histórico: quase metade das deslocações dos lisboetas, por exemplo, são fora do circuito casa-trabalho. Ou seja, estes passes chegam para as deslocações habituais, mas são inúteis em todas as restantes movimentações, em que os utentes passam a usar os seus próprios carros. Se a isto juntarmos o crescimento económico dos primeiros anos da entrada na CEE e o desinvestimento nos transportes coletivos com uma canalização geral de fundos para a promoção do transporte individual, o resultado foi o que se esperava: cada vez mais carros nas cidades, trânsito infernal, estacionamento impossível, perdas de produtividade e mais poluição. Esta opção foi paga por todos nós. Sentiu-se nos nossos bolsos e na nossa qualidade de vida.

Durante as últimas décadas os transportes coletivos passaram a cobrar preços impensáveis para os rendimentos médios dos portugueses. E, para compensar o número cada vez maior de carros nas cidades, também o estacionamento passou, e bem, a ser cobrado. Ou seja, fosse qual fosse a opção passámos todos a pagar mais para nos deslocarmos.

O que um governante tem de propor ao país é exatamente o oposto do que propõe Pedro Passos Coelho: um pacto pela mobilidade. Os passes e restantes títulos de transporte (únicos e incluindo os operadores privados, como acontece na maioria das cidades europeias) devem ser subsidiados pelo Estado não por qualquer razão social, mas por uma questão de racionalidade económica. Em troca, o uso das redes públicas por transportes individuais deve ser visto, sempre que há alternativas, como um luxo que se paga. E paga-se para subsidiar o transporte público.

Promover o transporte público tem efeitos diretos na economia. Transportes públicos mais baratos e melhores permitem menor dependência energética do País (com efeitos na dívida externa); menos pressão no mercado imobiliário dos centros das cidades (a centralidade perde importância); maior competitividade das regiões mais isoladas ou deprimidas; menos tempo perdido nas deslocações para o trabalho (com efeitos imediatos na produtividade); melhor saúde dos cidadãos (menos custos no Serviço Nacional de Saúde); mais rendimento disponível (menos despesa em transporte, incluindo no transporte individual); e menor despesa na construção e manutenção de infraestruturas rodoviárias (é insustentável manter uma rede pública que garanta mobilidade para todos nos seus próprios carros).

O problema do debate sobre a despesa pública em Portugal é que as contas são sempre as de merceeiro e não as das grandes opções políticas. Passos Coelho pensou na despesa que o Estado tem com os operadores públicos e com o passe social. Esquece-se de fazer as contas para os efeitos económicos e orçamentais do desinvestimento no transporte coletivo. Se o fizesse, estaria a propor mas investimento - e melhor gestão - em tudo o que promova o uso dos transportes públicos. Porque saberia que nesta matéria, como em tantas outras, o barato sai muitas vezes caro.

O problema do debate sobre o papel do Estado na vida coletiva é que se toma por preconceito ideológico a defesa da intervenção pública e por meramente racional a posição oposta. Quando, mostra a experiência, aqueles que acreditam nos automatismos quase milagrosos da concorrência e do mercado nunca conseguiram provar, com números e factos, a sua tese. E a política de transportes é talvez o melhor exemplo disso mesmo. Quando cada um trata de si o Estado se demite de intervir ficamos todos a perder. Incluindo os que vivem melhor.

_________________
Só discuto o que nao sei ...O ke sei ensino ...POIZ
Daniel Oliveira: Antes pelo contrário 	 Batmoon_e0
Vitor mango
Vitor mango

Pontos : 117530

Ir para o topo Ir para baixo

Ir para o topo


 
Permissões neste sub-fórum
Não podes responder a tópicos