Depois da guerra, Faixa de Gaza vira 'ilha à deriva'
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Depois da guerra, Faixa de Gaza vira 'ilha à deriva'
Depois da guerra, Faixa de Gaza vira 'ilha à deriva'
Quatro meses após ataque de Israel, território palestino segue pressionado.
Mas região deve voltar a ser o foco do processo de paz no Oriente Médio.
Ethan Bronner
Do New York Times, na Cidade de Gaza
Tamanho da letra
Dezenas de famílias ainda vivem em tendas no meio dos edifícios
destruídos e da tubulação enferrujada. Com a proibição do
comércio de materiais de construção, alguns estão construindo
casas de tijolo de barro. Tudo tem de ser contrabandeado através
dos túneis dos desertos do Egito. Entre os itens mais
procurados, um analgésico capaz de causar dependência, usado
para combater a depressão.
Quatro meses depois que Israel iniciou uma guerra
para impedir o lançamento de mísseis do Hamas, e dois anos
depois que o Hamas tomou absoluto controle sobre a faixa
litorânea, Gaza é como uma ilha à deriva. Pressionada por fora,
por um boicote de Israel e do Egito, e por dentro, por seus
líderes islâmicos, 1,5 milhão de pessoas aqui foram privadas de
qualquer produtividade ou esperança.
Contrabandista palestino cava túnel em Rafah, na
fronteira entre a Faixa de Gaza e o Egito, em maio de
2009. (Foto: Ashraf Amra/The New York Times)
"Logo depois da guerra, todo mundo veio – jornalistas,
governos e ajudas estrangeiras, prometendo ajudar", disse
Hashem Dardona, 47 anos, desempregada. "Agora, ninguém
vem."
No entanto, com a administração Obama pressionando
Israel para permitir a entrada de materiais de reconstrução, e
com a atenção crescente focada nas divisões palestinas internas,
Gaza logo voltará ao centro das negociações de paz do Oriente
Médio.
Para muitos israelenses, Gaza é um símbolo de tudo
que há de errado com a soberania palestina, que eles enxergam,
cada dia mais, como uma oportunidade para forças
anti-israelenses, notavelmente o Irã, chegarem à área de alcance
dos mísseis. A não ser que seja descoberta uma forma de atar
Gaza à Cisjordânia, politicamente e geograficamente, ao mesmo
tempo em que se mitigam os temores de Israel, um estado
palestino parece mais distante do que nunca.
Isso deixa Gaza suspensa, em uma situação de
miséria que desafia qualquer categorização. É claro, o lugar é
povoado e pobre, mas está melhor que quase todas as regiões da
África e parte da Ásia. Não existe subnutrição aguda, as taxas
de mortalidade infantil se comparam às de países como o Egito e
a Jordânia, segundo Mahmoud Daher, da OMS (Organização Mundial
da Saúde).
Isso se deve ao fato de que, apesar de Israel e
Egito fecharem suas fronteiras durante os últimos três anos, em
um esforço para pressionar o Hamas, Israel distribui ajuda
diariamente, permitindo a entrada de cerca de cem caminhões com
alimentos e remédios. Oficiais militares de Tel Aviv contam as
calorias, para evitar um desastre. A agência da ONU para
refugiados palestinos administra escolas e clínicas médicas, que
são limpas e eficientes.
Porém, existem muitos níveis de privação além da
catástrofe, e Gaza habita na maioria deles. O lugar não possui
nada parecido com uma economia operante, com exceção do comércio
e da agricultura básica. A educação piorou terrivelmente; o
serviço médico tem caído em qualidade.
Frustração
Existem dezenas de milhares de pessoas instruídas e ambiciosas
aqui, professores, engenheiros, tradutores, administradores, que
não têm nada a fazer, a não ser ficarem cada vez mais
frustrados. Eles não podem praticar suas profissões, nem sair do
país. Eles recebem ajuda externa e fumam em cafés. Uma pesquisa
da ONU mostra um aumento repentino da violência doméstica.
Muitas pessoas afirmam terem começado a tomar uma
pequena cápsula conhecida como Tramal, o nome comercial para um
analgésico similar a um opiato, que aumenta o desejo sexual e a
sensação de controle. O Hamas recentemente lançou um alerta de
prisão àqueles que traficam ou consomem a droga.
Mesmo assim, as pílulas chegam, junto com as
roupas, móveis e cigarros, através das centenas de túneis
cavados no deserto, ao sul da cidade de fronteira de Rafah,
através de empreendedores que pagam um imposto às autoridades do
Hamas pelas mercadorias.
Túneis similares também servem como canal para
armas. Israel periodicamente os bombardeia, na esperança de
enfraquecer o Hamas, que afirma que nunca irá reconhecer Israel
e se reserva o direito de usar violência contra o inimigo, até
que ele saia da terra conquistada na guerra de 1967. Depois
disso, haveria um cessar-fogo de dez anos de duração, enquanto
os próximos passos seriam contemplados, apesar de que o Hamas
defende a destruição de Israel em qualquer fronteira.
Estado de sítio
Israel começou o estado de sítio logo depois que o Hamas obteve
uma vitória surpreendente nas eleições legislativas palestinas,
em 2006. Ele foi mais severo depois que o Hamas expulsou
inteiramente a Autoridade Palestina de Gaza, em junho de 2007,
com mais quatro dias de batalhas nas ruas. O apoio iraniano ao
Hamas se somou à convicção israelense de que o estado de sítio é
o caminho certo.
O objetivo é manter Gaza na subsistência e
oferecer um contraste com a Cisjordânia, que, em teoria, se
beneficia com a ajuda externa e o desenvolvimento econômico e
político. Defensores do Hamas, então, se dariam conta de seu
erro. O plano não tem dado certo. Em parte porque a Cisjordânia
sob a ocupação de Gaza não é a ideia de paraíso de ninguém, e em
parte porque o Hamas aparente ter mais controle a cada ano, com
ruas mais limpas e menos criminalidade, apesar de sua
popularidade ser difícil de ser medida.
"O Hamas está aprendendo com seus próprios
erros e se fortalecendo cada vez mais", disse Sharhabeed
al-Zaeem, importante advogado daqui. Ele e outros têm solicitado
urgentemente a oficiais estrangeiros que permitam a entrada de
materiais de construção e outros bem em Gaza, através de
entradas fechadas.
Eles sustentam que o sistema atual só serve ao
Hamas, já que ele taxa os bens ilícitos e as trocas limitadas em
espécie, e não é culpado pelas pessoas pelo estado de sítio. Se
vidro e cimento fossem permitidos através das fronteiras com
Israel, dizem eles, o Hamas não teria o crédito e a Autoridade
Palestina poderia coletar os impostos.
"As pessoas em Gaza estão deprimidas, e
pessoas deprimidas recorrem ao mito e à fantasia, quer dizer,
religião e drogas", disse Jawdat Khoudary, da área de
construção. "Esse tipo de prisão alimenta o extremismo.
Deixa as pessoas olharem para fora, que vejam uma versão
diferente da realidade."
Oficiais israelenses permanecem céticos em relação
à abertura das fronteiras. Muitos acreditam que a guerra serviu
como ameaça e observam a drástica redução nos mísseis como
evidência. Eles temem que o aço ou o cimento sejam transformados
em armas pelo Hamas. No entanto, eles sentem a pressão dos
americanos e das Nações Unidas, e discutem um projeto-piloto.
Estado do Hamas
Enquanto isso, Gaza se parece cada vez mais como um estado do
Hamas e menos ligada à Cisjordânia. Mais homens têm barba, mais
mulheres estão se cobrindo. O Hamas é o principal empregador. As
escolas e os tribunais, antes administrados pela Autoridade
Palestina, dominada pelo Fatah, são todos do Hamas desde que o
governo da Cisjordânia ordenou que seus empregados ficassem em
casa. O governo está coletando informações sobre empresas e
organizações não-governamentais e buscando controlar suas
atividades.
Muitas pessoas aqui se preocupam especialmente com
os jovens e suas perspectivas. Em um programa criado para ajudar
aos traumatizados pela guerra de janeiro, adolescentes recebem
canetas coloridas para desenhar o que quiserem, diz Farah Abu
Qasem, 20 anos, estudante de tradução de inglês e voluntária do
programa.
"Eles parecem só escolher a cor preta e
desenham coisas como tanques", disse ela. "Quando
pedimos para desenhar algo que represente o futuro, eles deixam
o papel em branco".
Quatro meses após ataque de Israel, território palestino segue pressionado.
Mas região deve voltar a ser o foco do processo de paz no Oriente Médio.
Ethan Bronner
Do New York Times, na Cidade de Gaza
Tamanho da letra
- .
Dezenas de famílias ainda vivem em tendas no meio dos edifícios
destruídos e da tubulação enferrujada. Com a proibição do
comércio de materiais de construção, alguns estão construindo
casas de tijolo de barro. Tudo tem de ser contrabandeado através
dos túneis dos desertos do Egito. Entre os itens mais
procurados, um analgésico capaz de causar dependência, usado
para combater a depressão.
Quatro meses depois que Israel iniciou uma guerra
para impedir o lançamento de mísseis do Hamas, e dois anos
depois que o Hamas tomou absoluto controle sobre a faixa
litorânea, Gaza é como uma ilha à deriva. Pressionada por fora,
por um boicote de Israel e do Egito, e por dentro, por seus
líderes islâmicos, 1,5 milhão de pessoas aqui foram privadas de
qualquer produtividade ou esperança.
Contrabandista palestino cava túnel em Rafah, na
fronteira entre a Faixa de Gaza e o Egito, em maio de
2009. (Foto: Ashraf Amra/The New York Times)
"Logo depois da guerra, todo mundo veio – jornalistas,
governos e ajudas estrangeiras, prometendo ajudar", disse
Hashem Dardona, 47 anos, desempregada. "Agora, ninguém
vem."
No entanto, com a administração Obama pressionando
Israel para permitir a entrada de materiais de reconstrução, e
com a atenção crescente focada nas divisões palestinas internas,
Gaza logo voltará ao centro das negociações de paz do Oriente
Médio.
Para muitos israelenses, Gaza é um símbolo de tudo
que há de errado com a soberania palestina, que eles enxergam,
cada dia mais, como uma oportunidade para forças
anti-israelenses, notavelmente o Irã, chegarem à área de alcance
dos mísseis. A não ser que seja descoberta uma forma de atar
Gaza à Cisjordânia, politicamente e geograficamente, ao mesmo
tempo em que se mitigam os temores de Israel, um estado
palestino parece mais distante do que nunca.
Isso deixa Gaza suspensa, em uma situação de
miséria que desafia qualquer categorização. É claro, o lugar é
povoado e pobre, mas está melhor que quase todas as regiões da
África e parte da Ásia. Não existe subnutrição aguda, as taxas
de mortalidade infantil se comparam às de países como o Egito e
a Jordânia, segundo Mahmoud Daher, da OMS (Organização Mundial
da Saúde).
Isso se deve ao fato de que, apesar de Israel e
Egito fecharem suas fronteiras durante os últimos três anos, em
um esforço para pressionar o Hamas, Israel distribui ajuda
diariamente, permitindo a entrada de cerca de cem caminhões com
alimentos e remédios. Oficiais militares de Tel Aviv contam as
calorias, para evitar um desastre. A agência da ONU para
refugiados palestinos administra escolas e clínicas médicas, que
são limpas e eficientes.
Porém, existem muitos níveis de privação além da
catástrofe, e Gaza habita na maioria deles. O lugar não possui
nada parecido com uma economia operante, com exceção do comércio
e da agricultura básica. A educação piorou terrivelmente; o
serviço médico tem caído em qualidade.
Frustração
Existem dezenas de milhares de pessoas instruídas e ambiciosas
aqui, professores, engenheiros, tradutores, administradores, que
não têm nada a fazer, a não ser ficarem cada vez mais
frustrados. Eles não podem praticar suas profissões, nem sair do
país. Eles recebem ajuda externa e fumam em cafés. Uma pesquisa
da ONU mostra um aumento repentino da violência doméstica.
Muitas pessoas afirmam terem começado a tomar uma
pequena cápsula conhecida como Tramal, o nome comercial para um
analgésico similar a um opiato, que aumenta o desejo sexual e a
sensação de controle. O Hamas recentemente lançou um alerta de
prisão àqueles que traficam ou consomem a droga.
Mesmo assim, as pílulas chegam, junto com as
roupas, móveis e cigarros, através das centenas de túneis
cavados no deserto, ao sul da cidade de fronteira de Rafah,
através de empreendedores que pagam um imposto às autoridades do
Hamas pelas mercadorias.
Túneis similares também servem como canal para
armas. Israel periodicamente os bombardeia, na esperança de
enfraquecer o Hamas, que afirma que nunca irá reconhecer Israel
e se reserva o direito de usar violência contra o inimigo, até
que ele saia da terra conquistada na guerra de 1967. Depois
disso, haveria um cessar-fogo de dez anos de duração, enquanto
os próximos passos seriam contemplados, apesar de que o Hamas
defende a destruição de Israel em qualquer fronteira.
Estado de sítio
Israel começou o estado de sítio logo depois que o Hamas obteve
uma vitória surpreendente nas eleições legislativas palestinas,
em 2006. Ele foi mais severo depois que o Hamas expulsou
inteiramente a Autoridade Palestina de Gaza, em junho de 2007,
com mais quatro dias de batalhas nas ruas. O apoio iraniano ao
Hamas se somou à convicção israelense de que o estado de sítio é
o caminho certo.
O objetivo é manter Gaza na subsistência e
oferecer um contraste com a Cisjordânia, que, em teoria, se
beneficia com a ajuda externa e o desenvolvimento econômico e
político. Defensores do Hamas, então, se dariam conta de seu
erro. O plano não tem dado certo. Em parte porque a Cisjordânia
sob a ocupação de Gaza não é a ideia de paraíso de ninguém, e em
parte porque o Hamas aparente ter mais controle a cada ano, com
ruas mais limpas e menos criminalidade, apesar de sua
popularidade ser difícil de ser medida.
"O Hamas está aprendendo com seus próprios
erros e se fortalecendo cada vez mais", disse Sharhabeed
al-Zaeem, importante advogado daqui. Ele e outros têm solicitado
urgentemente a oficiais estrangeiros que permitam a entrada de
materiais de construção e outros bem em Gaza, através de
entradas fechadas.
Eles sustentam que o sistema atual só serve ao
Hamas, já que ele taxa os bens ilícitos e as trocas limitadas em
espécie, e não é culpado pelas pessoas pelo estado de sítio. Se
vidro e cimento fossem permitidos através das fronteiras com
Israel, dizem eles, o Hamas não teria o crédito e a Autoridade
Palestina poderia coletar os impostos.
"As pessoas em Gaza estão deprimidas, e
pessoas deprimidas recorrem ao mito e à fantasia, quer dizer,
religião e drogas", disse Jawdat Khoudary, da área de
construção. "Esse tipo de prisão alimenta o extremismo.
Deixa as pessoas olharem para fora, que vejam uma versão
diferente da realidade."
Oficiais israelenses permanecem céticos em relação
à abertura das fronteiras. Muitos acreditam que a guerra serviu
como ameaça e observam a drástica redução nos mísseis como
evidência. Eles temem que o aço ou o cimento sejam transformados
em armas pelo Hamas. No entanto, eles sentem a pressão dos
americanos e das Nações Unidas, e discutem um projeto-piloto.
Estado do Hamas
Enquanto isso, Gaza se parece cada vez mais como um estado do
Hamas e menos ligada à Cisjordânia. Mais homens têm barba, mais
mulheres estão se cobrindo. O Hamas é o principal empregador. As
escolas e os tribunais, antes administrados pela Autoridade
Palestina, dominada pelo Fatah, são todos do Hamas desde que o
governo da Cisjordânia ordenou que seus empregados ficassem em
casa. O governo está coletando informações sobre empresas e
organizações não-governamentais e buscando controlar suas
atividades.
Muitas pessoas aqui se preocupam especialmente com
os jovens e suas perspectivas. Em um programa criado para ajudar
aos traumatizados pela guerra de janeiro, adolescentes recebem
canetas coloridas para desenhar o que quiserem, diz Farah Abu
Qasem, 20 anos, estudante de tradução de inglês e voluntária do
programa.
"Eles parecem só escolher a cor preta e
desenham coisas como tanques", disse ela. "Quando
pedimos para desenhar algo que represente o futuro, eles deixam
o papel em branco".
Vitor mango- Pontos : 118184
Re: Depois da guerra, Faixa de Gaza vira 'ilha à deriva'
Oficiais israelenses permanecem céticos em relação
à abertura das fronteiras. Muitos acreditam que a guerra serviu
como ameaça e observam a drástica redução nos mísseis como
evidência. Eles temem que o aço ou o cimento sejam transformados
em armas pelo Hamas. No entanto, eles sentem a pressão dos
americanos e das Nações Unidas, e discutem um projeto-piloto.
Vitor mango- Pontos : 118184
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