Parque Nacional do Gerês

"Lobos no Gerês? Só no zoológico e cá não temos nenhum"

por PAULO JULIÃO, Viana do Castelo
Hoje



O Plano de Ordenamento do Parque Nacional do Gerês está a gerar contestação das populações de cinco concelhos. As novas regras impedem a livre circulação de residentes e restringem o recurso a energias eólicas

O tempo parece que parou na Peneda-Gerês. Animais caminham lado a lado com os automóveis mas os ritmos de outrora permanecem inalterados. A agricultura e a pastorícia são, mais do que um emprego, uma questão de hábito e sobrevivência. Trabalho há, mas emprego é raro. Uma realidade bem diferente daquela que é "pintada" na televisão, começou por explicar ao DN Manuel Costa, presidente da Junta do Soajo.

"As telenovelas portuguesas vieram para cá, o que foi muito bom para o nosso turismo, mas essa não é nossa realidade. Nós não podemos viver dos espigueiros que a televisão mostra e que ficam cá para os senhores de Lisboa verem", apontou o autarca de uma das mais emblemáticas freguesias do parque, pertencente a Arcos de Valdevez.

Em causa, o novo Plano de Ordenamento que está a ser alvo de duras críticas. "O nosso voto favorável não vai ter. Isso vai acontecer com todas as freguesias porque não é possível continuarem a cortar direitos a quem mora no parque. Para isso vamos embora e o parque fica sem pessoas", acrescentou, lembrando que a actual proposta de plano é praticamente a mesma anteriormente apresentada. "As propostas que apresentamos não foram tidas nem achadas. É o caso da energia eólica, que nos vai continuar a ser vedada. Então que nos compensem de outra forma", apelou.

Certo é que os residentes no Parque Nacional da Peneda-Gerês prometem fazer guerra ao Plano de Ordenamento da estrutura se não forem retiradas normas que impedem a sua livre circulação no território. Os autarcas acusam o Parque Nacional de querer impedir a livre deslocação dos moradores, limitando-a aos casos em que existem colmeias ou outras actividades agrícolas, como o pastoreio.

A discussão pública do Plano de Ordenamento do Parque Nacional da Peneda-Gerês, que começou dia 20 e se prolonga até 2 de Dezembro, inclui sessões públicas de apresentação do documento às populações. Parque Nacional, o único existente em Portugal, engloba territórios dos municípios de Terras de Bouro, Montalegre, Ponte da Barca, Arcos de Valdevez e Melgaço. Alegam ser "inadmissível" que os moradores sejam obrigados a pagar taxas a "preços altíssimos", defendendo que deveria ser feito um estatuto do residente, contemplando a dispensa de pagamento de taxas.

Ponto de ordem parece ser a manutenção da proibição de exploração de equipamentos eólicos. "Seria uma fonte de riqueza importantíssima para as Juntas poderem realizar investimento e para os proprietários dos terrenos, mas até isso nos está vedado. E a barragem do Alto Lindoso? Não veio alterar as condições do parque e do seu clima? Sobre isso ninguém diz nada", afirma o autarca de Soajo, para quem é um direito ver a população, cerca de mil pessoas, indemnizada "por tanto impedimento".

"São postos de trabalho que se perdem, sem qualquer compensação", aponta ainda, aludindo aos "chumbos" dos pareceres de impacto ambiental de todos os projectos apresentados. "Por ano morrem 40 pessoas no Soajo e nascem quatro ou cinco. Está fácil de ver para onde isto vai", desabafou. O turismo tem servido para ajudar ao desenvolvimento, mas Manuel Costa não resiste a sublinhar o episódio cada vez mais típico.

"Chegam-me de todos os pontos do País a perguntar onde podem ver os lobos, como se fosse uma coisa que se encontra em cada esquina. Eu só lhes respondo que é no zoológico e nós cá não temos nenhum."

DN