Ponto contra Ponto, ou Ponto Contraponto?

Ponto contra Ponto, ou Ponto Contraponto?

Tenho consideração intelectual pelo trabalho académico de Pacheco Pereira, independentemente do seu trabalho político. Mas já aí, nomeadamente numa polémica que me ficou na memória sobre a história do Cunhal, JPP exibiu, por vezes, o péssimo hábito - algo cultivado, diga-se, entre as elites portuguesas - de atacar sem nomear o outro (o conhecido síndrome do tempo de antena). Concretamente escreveu um texto no Público em que inclusive, se bem me lembro, parafraseava o título de um artigo do Rui Ramos no Independente, criticava este último, mas nunca o nomeava. Parece-me uma prática lamentável (entre intelectuais de direita ou de esquerda ou assim-assim).

Parece-me igualmente lamentável JPP lançar sobre blogues em que escrevem dezenas de pessoas - como o Câmara Corporativa, o Jugular, ou o Aspirina B - uma acusação genérica de praticarem calúnias e outras vilezas, sem fazer o que há de mais elementar num blogue - lincar. Não lincou (sequer) para os ditos blogues, nem o fez (mais propriamente) para exemplos do que acusava, de forma a podermos avaliar da pertinência da dita cuja (acusação). Fica, portanto, a dúvida metódica de que é porque falta substância à acusação.

Decide ainda JPP lançar a acusação de aí (nos desditos blogues) haver apoiantes do governo PS! Algo tão suspeito que aparentemente se explica por serem pretensos intelectuais – esse remoque tão pouco original, tão pouco digno de José Agostinho de Macedo que o próprio JPP designa como modelo – e, ó suprema culpa, assessores do governo!

Não percebo muito bem como é que um político profissional, como o JPP tem sido (nada contra) – e antes professor, tanto quanto sei, pago pelo erário público (idem) – se arvora legitimidade para questionar a relação entre pagamento, argumentos e crenças políticas.

Quem tem memória suficiente para se recordar, ainda que vagamente, do papel de JPP como intelectual orgânico do governo de Cavaco Silva não pode deixar de se espantar com esta (pouco credível) inversão de papéis e discursos.

Eu sou dos que acham que argumentos se combatem com argumentos. E calúnias são sempre calúnias venham de assessores, de parlamentares, ou de cidadãos com a boa fortuna de terem fortuna própria (ou será que só estes podem falar, ou nem eles, pois afinal têm uma fortuna a defender?).

Prefiro, em todo o caso, assessores que comentem abertamente política nos blogues, àqueles que plantam pela calada calúnias e falsidades de enorme gravidade em jornais de referência.

Estranho ainda que JPP só tenha acordado para as calúnias agora, depois de uma campanha eleitoral das mais caluniosas da história portuguesa, e com políticos da oposição a traficarem (mais ou menos subtilmente) calúnias na tentativa de se alçarem ao poder.

Estranho que a SIC Notícias tenha uma programa como Ponto Contra Ponto com tal nome. Considero importantes e interessantes programas de debate crítico sobre a imprensa, como os que existem por esse mundo fora. Creio que JPP teria lugar num programa como esse, mas com alguém a fazer (precisamente de) contraponto, seja do outro lado da barricada política, seja sobretudo se a esse Ponto contra Ponto se acrescentasse um outro ponto de vista, de analista(s) especialista nestas questões.

No final ficou-me a dúvida, será que toda esta irritação de JPP revela sobretudo uma certa surpresa da direita habituada durante longo tempo a dominar a blogosfera (com a extrema-esquerda a acompanhá-la de perto) com a aparição de blogues onde há defensores sem papas na língua do reformismo progressista do PS? Ou será que JPP acha que todos os grandes blogues da direita (e da extrema-esquerda) são pacatos, serenos, nada dados a calúnias, e ninguém que aí escreve trabalha para partidos ou recebe do erário público?

A mim não me interessa (no debate político) quem recebe de onde, mas sim como argumentam, e francamente mal argumentado foi este poste de JPP.

PS - Este poste algo atrasado estava "feito" antes dos postes anteriores neste blogue sobre o tema. E vai tal qual.

publicado por Bruno Reis