A guerra colonial segundo Lobo Antunes
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A guerra colonial segundo Lobo Antunes
A guerra colonial segundo Lobo Antunes
Anda por aí um grande debate em torno de declarações produzidas por Lobo Antunes a propósito da guerra em Angola. O escritor escreveu "No meu batalhão [em Angola] éramos 600 militares e tivemos 150 baixas. Era uma violência indescritível (...) Eu estava numa zona onde havia muitos combates e para poder mudar para uma região mais calma tinha de acumular pontos. (...) E para podermos mudar, fazíamos de tudo, matar crianças, mulheres, homens. Tudo contava, e como quando estavam mortos valiam mais pontos, então não fazíamos prisioneiros.". Os militares não gostaram do que leram e exigem que o escritor se explique.
Trinta anos depois os portugueses ainda não conhecem a sua própria história continuando a ouvir-se a alguns que aquilo foi um acampamento de escuteiros onde os mortos resultavam de acidentes de viação e outros a descrever um Vietname às portas de Luanda.
A verdade é que houve uma guerra por onde passou a maioria dos jovens portugueses, alguns morreram, os restos mortais de uma parte destes ainda está ao abandono espalhados por África, muitos regressaram deficientes ou marcados por traumas psicológicos que os perseguirão por toda a vida. Os mesmos que tentam apresentar a guerra como quase benigna são os que depois denunciam a falta de apoio aos traumatizados por essa guerra e exigem a trasladação dos restos mortais que por lá ficaram abandonados.
Não vale a pena apresentar uma guerra de guerrilha onde cabia à PIDE a recolha de informação como um acampamento de escuteiros, como é um exagero imaginar essa mesma guerra sob a perspectiva do “Apocalypse Now” de Francis Ford Coppola. Quem teve familiares nessa guerra sabe o que sucedeu e não vale a pena iludir a realidade, houve atrocidades, desprezaram-se todas as convenções, valeu de tudo um pouco.
Mas é tempo de os portugueses deixarem-se de visões românticas ou de complexos de culpa ideológicos e olharem para a sua história, assumindo a responsabilidade. Não é verdade que seja necessário esperar pelo desaparecimento dos intervenientes para abordar o tema com rigor, esse argumento apenas serve para adiar o inevitável e perder a oportunidade de contar com o testemunho daqueles que fizeram ou sofreram com essa guerra.
É uma cobardia tentarmos enterrar a memória e a própria história enquanto nos esquecemos de enterrar muitos dos seus mortos ainda hoje chorados por pais, filhos e esposas que não fizeram o luto. Lobo Antunes terá exagerado? Talvez, mas teve o mérito de nos obrigar a desenterrar a nossa própria história, exagerou certamente no número de baixas, mas é uma hipocrisia acusá-lo de exagero na descrição da realidade da guerra ou mostrar essa guerra como uma guerra boa para descanso dos nossos generais aposentados.
Publicada por Jumento
Anda por aí um grande debate em torno de declarações produzidas por Lobo Antunes a propósito da guerra em Angola. O escritor escreveu "No meu batalhão [em Angola] éramos 600 militares e tivemos 150 baixas. Era uma violência indescritível (...) Eu estava numa zona onde havia muitos combates e para poder mudar para uma região mais calma tinha de acumular pontos. (...) E para podermos mudar, fazíamos de tudo, matar crianças, mulheres, homens. Tudo contava, e como quando estavam mortos valiam mais pontos, então não fazíamos prisioneiros.". Os militares não gostaram do que leram e exigem que o escritor se explique.
Trinta anos depois os portugueses ainda não conhecem a sua própria história continuando a ouvir-se a alguns que aquilo foi um acampamento de escuteiros onde os mortos resultavam de acidentes de viação e outros a descrever um Vietname às portas de Luanda.
A verdade é que houve uma guerra por onde passou a maioria dos jovens portugueses, alguns morreram, os restos mortais de uma parte destes ainda está ao abandono espalhados por África, muitos regressaram deficientes ou marcados por traumas psicológicos que os perseguirão por toda a vida. Os mesmos que tentam apresentar a guerra como quase benigna são os que depois denunciam a falta de apoio aos traumatizados por essa guerra e exigem a trasladação dos restos mortais que por lá ficaram abandonados.
Não vale a pena apresentar uma guerra de guerrilha onde cabia à PIDE a recolha de informação como um acampamento de escuteiros, como é um exagero imaginar essa mesma guerra sob a perspectiva do “Apocalypse Now” de Francis Ford Coppola. Quem teve familiares nessa guerra sabe o que sucedeu e não vale a pena iludir a realidade, houve atrocidades, desprezaram-se todas as convenções, valeu de tudo um pouco.
Mas é tempo de os portugueses deixarem-se de visões românticas ou de complexos de culpa ideológicos e olharem para a sua história, assumindo a responsabilidade. Não é verdade que seja necessário esperar pelo desaparecimento dos intervenientes para abordar o tema com rigor, esse argumento apenas serve para adiar o inevitável e perder a oportunidade de contar com o testemunho daqueles que fizeram ou sofreram com essa guerra.
É uma cobardia tentarmos enterrar a memória e a própria história enquanto nos esquecemos de enterrar muitos dos seus mortos ainda hoje chorados por pais, filhos e esposas que não fizeram o luto. Lobo Antunes terá exagerado? Talvez, mas teve o mérito de nos obrigar a desenterrar a nossa própria história, exagerou certamente no número de baixas, mas é uma hipocrisia acusá-lo de exagero na descrição da realidade da guerra ou mostrar essa guerra como uma guerra boa para descanso dos nossos generais aposentados.
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