O caso Deolinda
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O caso Deolinda
O caso Deolinda
João Pinto e Castro
Os doutores que não distinguem entre um post e uma tese de mestrado entenderam que tentei refutar a canção dos Deolinda, apesar de o título que lhe dei ("Um gráfico para os Deolinda") indiciar uma mera proposta para reflexão.
Não se refuta um sentimento de frustração que, sei-o bem, é hoje partilhado por muitos jovens. Quando muito, procura-se colocá-lo em perspectiva, condição indispensável para tornar produtiva a revolta.
Mesmo assim, dizer-se que "para ser escravo é preciso estudar" é de facto muito estúpido, na linha, aliás, de uma desvalorização da importância da educação que tem uma longa história. Antigamente, dizia-se que a educação promovia o ateísmo e o reviralho; hoje, acompanhando o sentimento dos tempos, questiona-se a sua racionalidade económica.
Ora acontece que, em matéria de desenvolvimento económico, os economistas tendem a ser mais supply-siders do que quando o horizonte de análise é curto - e provavelmente ainda mais quando está em causa o investimento em competências. Para contestar isto só mesmo o Pulido Valente, que não suporta a existência de opiniões mais estúpidas do que a sua.
O que interessa na canção dos Deolinda não é, aliás, a canção ela mesma, mas o chorrilho de disparates a que deu azo, designadamente no que respeita ao drama do suposto êxodo de jovens licenciados portugueses.
Neste ponto permito-me uma nota pessoal. Antes de a presente crise começar, ou seja, até 2008, todos os jovens da minha família (menos um) estavam a trabalhar no estrangeiro. Posso-vos garantir que exercer uma actividade profissional qualificada em Los Angeles, Londres, Colónia ou Madrid não é propriamente a pior coisa do mundo, decerto nada comparável ao drama dos pobres camponeses analfabetos que há meio século íam a salto para países cujas línguas não entendiam e onde não tinham quaisquer direitos.
Acontece, porém, que a recessão lançou a maioria deles no desemprego (a única que tem ocupação segura trabalha para o Estado alemão) forçando-os a regressarem à pátria onde, pior ou melhor, todos acabaram por arranjar trabalho. Bem sei que a amostra não é representativa, mas nem esses nem outros casos que conheço confirmam a fábula segundo a qual os jovens licenciados portugueses só arranjam trabalho no estrangeiro.
Voltando ao fulcro da questão, o desemprego é um problema sério e vai ficar connosco por muito tempo. (Já agora, o que será pior: estar desempregado aos 25 anos ou ser despedido aos 50?) Mas nada se ganha em abordá-los de forma superficial, falsa e demagógica, que aparece mais apostada em lançar novos contra velhos ou portugueses contra imigrantes do que em procurar verdadeiras soluções.
João Pinto e Castro
Os doutores que não distinguem entre um post e uma tese de mestrado entenderam que tentei refutar a canção dos Deolinda, apesar de o título que lhe dei ("Um gráfico para os Deolinda") indiciar uma mera proposta para reflexão.
Não se refuta um sentimento de frustração que, sei-o bem, é hoje partilhado por muitos jovens. Quando muito, procura-se colocá-lo em perspectiva, condição indispensável para tornar produtiva a revolta.
Mesmo assim, dizer-se que "para ser escravo é preciso estudar" é de facto muito estúpido, na linha, aliás, de uma desvalorização da importância da educação que tem uma longa história. Antigamente, dizia-se que a educação promovia o ateísmo e o reviralho; hoje, acompanhando o sentimento dos tempos, questiona-se a sua racionalidade económica.
Ora acontece que, em matéria de desenvolvimento económico, os economistas tendem a ser mais supply-siders do que quando o horizonte de análise é curto - e provavelmente ainda mais quando está em causa o investimento em competências. Para contestar isto só mesmo o Pulido Valente, que não suporta a existência de opiniões mais estúpidas do que a sua.
O que interessa na canção dos Deolinda não é, aliás, a canção ela mesma, mas o chorrilho de disparates a que deu azo, designadamente no que respeita ao drama do suposto êxodo de jovens licenciados portugueses.
Neste ponto permito-me uma nota pessoal. Antes de a presente crise começar, ou seja, até 2008, todos os jovens da minha família (menos um) estavam a trabalhar no estrangeiro. Posso-vos garantir que exercer uma actividade profissional qualificada em Los Angeles, Londres, Colónia ou Madrid não é propriamente a pior coisa do mundo, decerto nada comparável ao drama dos pobres camponeses analfabetos que há meio século íam a salto para países cujas línguas não entendiam e onde não tinham quaisquer direitos.
Acontece, porém, que a recessão lançou a maioria deles no desemprego (a única que tem ocupação segura trabalha para o Estado alemão) forçando-os a regressarem à pátria onde, pior ou melhor, todos acabaram por arranjar trabalho. Bem sei que a amostra não é representativa, mas nem esses nem outros casos que conheço confirmam a fábula segundo a qual os jovens licenciados portugueses só arranjam trabalho no estrangeiro.
Voltando ao fulcro da questão, o desemprego é um problema sério e vai ficar connosco por muito tempo. (Já agora, o que será pior: estar desempregado aos 25 anos ou ser despedido aos 50?) Mas nada se ganha em abordá-los de forma superficial, falsa e demagógica, que aparece mais apostada em lançar novos contra velhos ou portugueses contra imigrantes do que em procurar verdadeiras soluções.
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