Vagueando na Notícia


Participe do fórum, é rápido e fácil

Vagueando na Notícia
Vagueando na Notícia
Gostaria de reagir a esta mensagem? Crie uma conta em poucos cliques ou inicie sessão para continuar.

O gosto dos outros

Ir para baixo

O gosto dos outros Empty O gosto dos outros

Mensagem por Vitor mango Sex Ago 12, 2011 12:32 am

O gosto dos outros

By brunocarmelo – 11/08/2011Posted in: Destaques






Buzz

O gosto dos outros Fireworks-Wednesday-300x199"Fireworks Wednesday", 2006, dir. Asghar Farhadi


Os filmes sobre os conflitos no Oriente Médio se multiplicam na França: conscientização do público ou espetáculo da alteridade?





Por Bruno Carmelo, editor do blog Discurso-Imagem.

Os cinemas franceses estão repletos de filmes iranianos. São quatro títulos simultâneos, além de Au Revoir,
que estreia dentro de duas semanas. O Irã está melhor representado do
que a Itália, Alemanha ou a Espanha, por exemplo – para citar alguns
países vizinhos de mais longa tradição cinematográfica. A Separation superou
todas as expectativas ao atingir mais de 750 mil espectadores, uma
bilheteria muito melhor que diversas comédias francesas. Os jornalistas
tentaram explicar este sucesso pelas críticas positivas, mas muitos
outros filmes receberam críticas ainda mais entusiasmadas e nem por isso
tiveram uma bilheteria tão expressiva.

Pode-se dizer, sem dúvida, que o Irã tem produzido filmes de excelente qualidade. Fireworks Wednesday,
outro sucesso iraniano, consegue quebrar a imagem dos filmes iranianos
puramente estéticos e formais ao introduzir uma dimensão social, muito
mais do que política. Este não é um filme de denúncia, e sim uma obra
familiar, sobre os costumes e os conflitos morais que ultrapassam
facilmente as fronteiras deste país. Mais uma vez, este fator
universalizante pode ajudar a compreender a boa reação do público, mas
não justifica em si todo o sucesso obtido.
O gosto dos outros 18-Jours-213x300Pôster francês, com a menção "O primeiro filme da primavera árabe".


O trailer de Au Revoir, por exemplo,apresenta
os tradicionais fragmentos do filme, e se termina com uma frase de
efeito, informando que o diretor está preso no Irã por causa de seus
filmes. O título aparece em seguida. Paralelamente, o egípcio 18 jours
estreia dentro de algumas semanas, com o grande slogan “o primeiro
filme da primavera árabe”- não “sobre” o movimento, mas “do” movimento,
como se tivesse sido feito por ele. Neste momento, é impossível ignorar a
dimensão comercial e publicitária que o fator político adquire na venda
do cinema vindo destes países. Da mesma maneira, o festival de Cannes
tinha sido criticado por “não prestar atenção ao mundo ao redor”, quando
divulgou sua lista de filmes em competição em 2011, dentre os quais
praticamente não constavam obras do Oriente Médio.

O festival, muito preocupado com sua
imagem moral (vide o caso Lars Von Trier), se corrigiu rapidamente e
obteve duas obras de diretores iranianos presos, uma delas num pen drive. A clandestinidade do pen drive
em oposição ao tapete vermelho de Cannes imprimiram à seleção uma certa
preocupação de esquerda, politicamente correta, com o cinema de países
em conflitos civis. Entenda-se: tornou-se necessário
representar o Irã, muito embora as preocupações da seleção oficial eram
muito mais dirigidas aos diretores “de grife” (Almodóvar, Malick, irmãos
Dardenne) do que aos diretores em exílio ou em países privados de
democracia.

Embora aparentemente os dois filmes
selecionados sejam muito bons, eles foram escolhidos principalmente por
sua nacionalidade. Malick e outros integraram a seleção pelo sistema de
cota reservado aos autores, enquanto Rasoulof e Panahi estavam presentes
enquanto vítimas e/ou mártires do cinema. Passados os festivais, estes
filmes se venderam muito bem, algo que é com certeza de mérito dos
realizadores, mas não apenas. O cinema iraniano tem se tornado cool, um certo alívio burguês ao espectador que, ao se deparar com Fireworks Wednesday,
acha que: 1) Agora ele conhece a situação lá fora, o que vai alimentar
seus temas de discussão com os amigos, como diria Bourdieu, 2) É
bom/importante/louvável assistir a esses filmes, para ajudar a economia
iraniana e/ou a visibilidade desta temática, 3) Estes filmes são ainda melhores porque foram feitos em condições precárias, de modo que a qualidade é condicionada à dificuldade e à coragem dos diretores.

O nome de cada diretor e a maneira como cada tema é abordada tornam-se fatores secundários. O fato de o filme ser iraniano e mostrar
o Irã faz dele uma atração em si. Talvez por isto os franceses tenham
feito pôsteres e trabalhos promocionais praticamente idênticos para
todas estas obras (vide imagens abaixo), que não estão sendo vendidas
por sua singularidade, e sim pelo conjunto. Logicamente, o problema não é
o fato destes excelentes filmes serem vistos, mas a maneira como são vistos.
A onda comercial iraniana corresponde a este desejo de boa consciência
de um espectador cujas ideias pessoais não necessariamente se traduzem
em uma abertura de espírito às culturas e políticas mediterrâneas.

O gosto dos outros Affiches-Iran1-1024x353

Chega a ser irônico que este fenômeno de
público ocorra no momento de todas as crises econômicas, políticas e da
guinada de praticamente todos os países europeus à direita repressiva e
xenofóbica. A situação iraniana é um espetáculo que se admira de longe,
justamente pela distância segura que garante que os conflitos não
chegarão ao solo europeu. Entre o fetichismo da alteridade e o caráter
circense de admirar as culturas distantes, A Separation, Fireworks Wednesday, About Elly, The Circle e
outros criam um nicho efêmero no cinema, um efeito de moda. Como dizem
alguns países africanos a respeito da ajuda europeia para o combate à
fome: “Não nos ajudem, deem-nos as ferramentas para que nós mesmos nos
ajudemos.”

O mesmo se passa com os produtos
culturais iranianos em países ricos, de direita. Não admirem este
conflito pela distância cultural que ele representa à sua cultura, e sim
pelo interesse enquanto filme, e pela possibilidade futura de se
sensibilizar a esta causa. Com Fireworks Wednesday, não consuma
o Irã, não consuma a informação, e sim um filme, uma discussão moral,
ética, estética. Pode ser improvável, mas espero que o Irã continue bem
representado nas telas francesas. Acima de tudo, que estes filmes sejam
apreciados por sua singularidade, sem menções publicitárias ao calvário
dos diretores, sem vitimação nem miserabilismo. Que se ultrapasse o selo
de qualidade “filme iraniano” para se discutir o que estes filmes
iranianos têm a dizer e mostrar.



Fireworks Wednesday (2006)
Filme iraniano dirigido por Asghar Farhadi.
Com Hedieh Tehrani, Taraneh Alidousti, Hamid Farokhnezhad, Pantea Bahram.

_________________
Só discuto o que nao sei ...O ke sei ensino ...POIZ
O gosto dos outros Batmoon_e0
Vitor mango
Vitor mango

Pontos : 117472

Ir para o topo Ir para baixo

Ir para o topo


 
Permissões neste sub-fórum
Não podes responder a tópicos