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Impasse: à esquerda, na caminha é que se está bem (IV)

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Mensagem por Vitor mango Sáb Abr 13, 2013 1:03 am

Impasse: à esquerda, na caminha é que se está bem (IV)







Daniel Oliveira
8:00 Sexta, 12 de Abril de 2013





















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Não é só por António José Seguro não
mobilizar que não surge como alternativa à tragédia que nos governa. O
problema é que qualquer líder do PS, nestas circunstâncias, teria de
mobilizar muitíssimo. O suficiente para conquistar uma maioria
absoluta. Caso contrário, o País estaria condenado a um governo de bloco
central, que se limitaria a gerir a crise sem um rumo, ou a um governo
minoritário, condenado a sobreviver uns meses
. O problema é que, ao contrário do que acontece à direita, governos pluripartidários à esquerda estão interditos.

O bloqueio à esquerda tem, em Portugal, razões históricas profundas:
o PCP ter sido, durante a ditadura, hegemónico na oposição; a
democracia ter nascido de um combate feroz entre as várias forças de
esquerda; o PS ter-se implantado no País contra o PCP e em aliança com a
direita; o adormecimento, por meio século, do nosso movimento sindical,
muito dependente das lógicas partidárias; um movimento social-democrata
(aqui representado pelo PS) que, ao contrário da maioria dos países
europeus, não tem raízes no movimento operário e nos sindicatos; a
debilidade da nossa sociedade civil. Tudo contribui para criar
fronteiras estanques à esquerda. Na realidade, as grandes clivagens ideológicas foram, nos últimos 40 anos, feitas no interior da esquerda e não entre a esquerda e a direita (abstenho-me aqui de ter um "esquerdómetro", limitando-me a usar as categorias de filiação histórica dos partidos).

Só que nos últimos 40 anos muita coisa mudou. E a
verdade é que a direita, que tinha uma posição ideológica envergonhada,
se tornou agressiva e ultraliberal. Ou seja, as condições exigem que a esquerda consiga trabalhar para os entendimentos que nunca considerou necessários.

Não escondo que não é apenas o passado que torna este entendimento difícil. Juntar a autosuficiência do PCP, a cultura de contrapoder do BE e a cultura de cedência do PS nunca seria fácil. Há, ainda assim, três denominadores comuns que neste momento poderiam garantir um governo de esquerda: o diagnóstico da crise (a que Sócrates chamou de "narrativa"), a convicção de que apenas uma política pública para o crescimento económico nos pode tirar deste sufoco e a certeza de que o equilíbrio das contas públicas não passa pela redução das funções sociais do Estado.
Se estiverem de acordo nestas matérias, a grande fronteira política
pode finalmente fazer-se, em Portugal, entre a esquerda e a direita.

Um governo de esquerda, fosse ele qual fosse, seria hoje um governo de emergência nacional. Com dois objectivos: libertar-nos da intervenção externa e retirar-nos da crise aguda sem pôr em causa a democracia e as funções sociais do Estado.

O programa deste governo passa, antes de mais, por uma negociação firme com os nossos credores e com a troika.
Para alterar as condições de pagamento, as maturidades, os juros e,
provavelmente, os montantes. Por uma simples razão: nas atuais
circunstâncias a dívida não é pagável. Para modificar radicalmente o
memorando (ou denunciá-lo), alterando toda a sua lógica para uma
política de crescimento que favoreça as condições para que o Estado e as
empresas criem emprego e receitas que possam garantir o equilíbrio das
contas e o pagamento das dívidas. Deixando claro que não estamos
disponíveis para a destruição do nosso Estado Social, que teria pesados
efeitos sociais e económicos. Fácil dizer, muito difícil fazer.

Uma negociação deste género exige três condições políticas prévias: um governo com amplo e forte apoio popular; um compromisso para procurar na Europa, entre os países em dificuldades, aliados; e uma enorme coragem para lidar com as possíveis consequências de uma atitude mais musculada na relação com a troika.
Entre as consequências indesejadas mas possíveis, está uma ruptura com
os credores e o fim do financiamento europeu, que põe em causa a
permanência no euro (tema que tenho prometido para uma crónica e que os
acontecimentos têm adiado).

Uma solução governativa desta natureza exige cedências de todas as partes. O PS terá de assumir, de uma vez por todas, que o problema não é apenas a "austeridade custe o que custar".
Uma austeridade mais branda pode tornar a "espiral recessiva" mais
lenta. Serve para quem acredita, com base em não se sabe bem o quê, que
haverá, muito brevemente, uma radical alteração no quadro europeu. Quem
duvide disso e mesmo assim defenda uma versão mitigada da austeridade
está a enganar os portugueses. A morte será mais lenta, mas a espiral
recessiva regressará e, daqui a um ano ou dois, estaremos de novo em
crise profunda e a aplicar as mesmas medidas que agora rejeitamos.

O Bloco de Esquerda e o PCP (os dois ou um deles) terão de aceitar negociar com os credores.
Não se pode defender a renegociação da dívida sem querer falar com
aqueles a quem devemos. E hoje os nossos maiores credores internacionais
são institucionais. Ou seja: a troika. Dizer que se quer renegociar a dívida e que não se quer falar com a troika é uma falácia. Mesmo assumindo, como eu assumo, que a troika
é hoje a maior e mais poderosa inimiga dos interesses nacionais, é com
os inimigos que se negoceia. Com os amigos conversa-se.

Só que esta negociação pode correr mal. Se
ela correr mal, poderemos ficar num impasse. Ou metemos a viola no saco,
e então não se pode falar de uma verdadeira negociação, ou usamos as duas únicas armas que temos: sermos devedores e fazermos parte do euro. No fim, se tudo correr ainda pior, podemos ficar sem financiamento e, no limite, sermos obrigados a sair do euro para nos conseguirmos autofinanciar
(às consequências disto irei, repito a promessa, noutro texto). E é
aqui que a porca torce o rabo. Chegados a este ponto, as divisões à
esquerda deixam de ser as tradicionais. Esta é uma questão que divide
transversalmente toda a esquerda. Encontramos dentro do PS, do PCP e
do BE quem considere a permanência no euro um tema tabu (a maioria) e
quem já o comece a discutir como uma possibilidade a não descartar
.
Ou seja, poderemos, num futuro próximo, chegar a um ponto onde as
divisões da esquerda já não são as que eram e ultrapassam em muito as
fronteiras partidárias atuais.

Um governo que nos queira realmente tirar desta crise é
um governo que terá de saber lidar com uma enorme incerteza. Certo,
nesta crise, é que o caminho atual nos matará. Todas as alternativas não
estão isentas de enormes perigos. E, se os piores cenários se
confirmassem, poderiam resultar numa pesada fatura política para quem as
queira aplicar. Mas, nos tempos que correm, os partidos e os políticos que não queiram correr este risco serão inúteis.

Seria bom que o estado do debate sobre os
entendimentos à esquerda fosse o que aqui vou explanando. Mas não é. A
incapacidade da esquerda conversar nada tem a ver com a crise, com a
troika e com euro. Ela tem, por um lado, a ver com um indisfarçável oportunismo, em que cada um anda a ver o que pode ganhar com o descontentamento das pessoas. E, por outro, com um sectarismo histórico que vê qualquer conversa com o vizinho do lado como sinal de traição.

Um pequeno episódio recente ilustra bem o que aqui digo. No concelho de Caminha, no Minho, PS, PCP e BE locais sentaram-se à volta de uma mesa para uma coligação que derrotasse o PSD. O PCP concelhio acabou, por ordem da direção nacional, que interditou qualquer coligação em todo o País, por desistir.
O PS e o Bloco, depois de voltarem a tentar que o PCP se juntasse ao
processo negocial, chegaram a um acordo, com base em princípios
programáticos. Estava tudo pronto, até que os órgãos nacionais do BE
entraram em campo. A Mesa Nacional do Bloco de Esquerda vetou o acordo já firmado.
Por razões que nada tiveram a ver com a situação em Caminha ou com
divergências de programa. Apenas com o argumento de que o PCP, que fora
envolvido nas negociações de que saiu por decisão própria, não estava na
coligação. Ou seja, entregando ao PCP a estratégia nacional de alianças
do próprio BE (com excepção para o Funchal). O resultado será que o
Bloco provavelmente nem concorrerá naquele concelho. Conclusão: mais
vale não ir a votos do que correr o risco de fazer qualquer entendimento
à esquerda. Não vá o País pensar que os partidos oposição falam a sério
quando falam de um governo de esquerda.


Se um entendimento à esquerda é impossível, por razões de estratégia nacional,
numas eleições locais, onde as divergências programáticas e ideológicas
são muito menores, para derrotar o PSD, há três mandatos consecutivos
de poder incompetente num concelho em crise, quando tem ali existido uma
razoável convergência entre os partidos da oposição (sendo que a
proposta de coligação nasceu do BE local), imaginem no País. Junte-se a isto as
vozes de dirigentes do PS que repetidamente defendem, no caso provável
do próximo governo ser minoritário, um governo de bloco central
(ou a sua indisponibilidade para debater soluções fora dos limites do memorando da troika) e temos um clima bem mais claro de indisponibilidades mútuas, sempre disfarçadas com outros argumentos.

E esta é, devo dizer, a maior razão do meu desalento: perceber que todos os partidos querem ter razão, mas que são poucos os que estão disponíveis para arriscar a pele pela razão que têm. Enquanto os partidos da oposição não perceberem que vivemos mesmo num momento de emergência nacional,
em que são chamados a cumprir um papel histórico que, como sempre
acontece nestas alturas, lhes pode correr mal, estaremos condenados a
esta agonia. Não aprendemos nada com a tragédia alemã dos anos 30,
quando social-democratas e comunistas se guerreavam, enquanto os nazis
de apoderavam do poder. Com as devidas distâncias, é esta a situação em
que os partidos de esquerda se encontram: ou assumem as suas
responsabilidades históricas ou estarão condenados a ser espetadores
revoltados desta crise. E os portugueses, suas
vítimas submissas.

_________________
Só discuto o que nao sei ...O ke sei ensino ...POIZ
Impasse: à esquerda, na caminha é que se está bem (IV)  Batmoon_e0
Vitor mango
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