Rússia nada tem a ver com situação na Ucrânia
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Publicada por José Milhazes à(s) 16:42 Sem comentários:
Pelo menos esta não foi de farda verde
Por vezes, fico com a impressão de que regressei à era soviética e estou a ler os jornais Pravda e Izvestia e lembro-me da velha anedota soviética de que “Pravda (Verdade) não há no Izvestia (Notícias), nem Izvestia no Pravda”.
Digo isto a propósito das declarações que hoje foram feitas por Dmitri Peskov num programa de televisão “Domingo à Noite com Vladimir Soloviov” que é um expoente máximo da propaganda soviética, misturada com as novas tecnologias e técnicas de markting.
Neste talk-show, Peskov, porta-voz de Vladimir Putin, afirma que a Rússia nada tem a ver com os acontecimentos das últimas semanas na Ucrânia e que estes têm origem em “processos ucranianos internos”.
“O que se passa no Leste (da Ucrânia) e na Crimeia nada tem a ver com a Federação da Rússia”, disse ele, acrescentando: “não se trata de processos artificiais e muito menos processos provocados por acções da Rússia. Bem pelo contrário, a Rússia é um país a quem pedem ajuda”, acrescentou.
Bem, esta história da Rússia vir em ajuda de quem a pede faz-me lembrar a história que nós oficialmente aprendíamos na Universidade de Moscovo na era comunista. Segundo ela, todos os povos que faziam parte da URSS tinham aderido voluntariamente ao Império Russo ou à URSS: fosse no Cáucaso, na Crimeia, na Ásia Central, etc.
Porém, os professores tinham dificuldade em compatibilizar essa tese com outra tese de Vladimir Lénine, fundador da Rússia comunista, de que “O Império Russo é a prisão dos povos”. Cada um que tirasse as conclusões, mas que não tivesse a infeliz ideia de ir dizer para o exame que os ditos povos foram para a prisão voluntariamente.
O próprio Peskov cai no mesmo erro da propaganda soviética, pois o que ele disse entra contradição com que o seu chefe diz em público e que o porta-voz cita: “E como correctamente diz Putin (outra fórmula muito familiar aos que conheceram a URSS), a Rússia é um país que em caso algum deixa esses processos sem atenção. Mas a génese desses processos está no interior da Ucrânia”.
Afinal em que ficamos, será que o papel da Rússia em relação à Ucrânia é o mesmo que o da Jugoslávia em relação ao COMECOM (mercado comum comunista), que, tal como os testículos, participava, mas não entrava. (Peço desculpa por esta tirada pouco convencional, mas é difícil encontrar paralelos normais).
Mas, verdade seja dita, não posso deixar de estar de acordo com Dmitri Peskov quando afirma que Ocidente segue uma política de “duplos padrões”, “cínica”, etc. Mas o Kremlin, pelos vistos, é um exemplo de virtudes. Peskov, por exemplo, indigna-se com o facto de o Ocidente ter “absolutamente recusado a parte do povo ucraniano o direito à autodeterminação, a decisões legítimas, o direito a empreender acções com vista a defender a própria dignidade e segurança”.
As centenas de milhares de homens, mulheres e crianças tchetchenas chacinadas nos anos 90 foram privadas pelo Kremlin não só desse direito, mas da vida. Os que justificam carnifarias destas afirmam que isso foi feito para “defender a integridade territorial da Rússia” e “travar o avanço do radicalismo islâmico”, ou seja, uns povos têm direito à “autodeterminação” e outros não. Quanto ao radicalismo islâmico, é de recordar que o movimento autonomista tchetcheno era, inicialmente, laico e se Moscovo tivesse dialogado com os seus primeiros dirigentes, talvez o conflito não tivesse chegado onde chegou. Mas, em história, não há “ses”.
Pode é repetir-se e, dentro de algum tempo, os tártaros do Volga ou outros povos da Rússia podem começar a pedir mais autonomia e independência. Os terroristas do Cáucaso do Norte também não deverão querer depor as armas e resignar-se a viver na Rússia. Ou, quem sabe, os milhões de chineses que vivem na Sibéria e Extremo Oriente russo sentirem-se “ofendidos” e “humilhados” e pedirem ajuda ao governo de Pequim.
Podem dizer-me que é impossível? Eu não seria tão peremptório, porque, do lado do Ocidente, prometeram-nos o “fim da história” (a propósito saudado euforicamente por muitos intelectuais e jornalistas da nossa praça) nos finais dos 1980 e rapidamente vimos que a história era outra, ou mais precisamente, era a continuação da mesma história: o mais forte pode e manda. Do lado da Rússia, os dirigentes do Kremlin teimam em repetir erros do passado: querem meter-se em todas e depois não aguentam a pedalada.
Por isso, vou guardar religiosamente este texto no meu arquivo, pode servir-me mais vezes.
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Só discuto o que nao sei ...O ke sei ensino ...POIZ
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