Um Oriente Médio utópico: escritores israelenses e palestinos imaginam retorno de refugiados
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Um Oriente Médio utópico: escritores israelenses e palestinos imaginam retorno de refugiados
Um Oriente Médio utópico: escritores israelenses e palestinos imaginam retorno de refugiados
O livro Awda, lançado em Israel, traz 12 contos escritos por autores palestinos e israelenses e foi publicado pela ONG Zochrot
Atualizada às 14h20
O livro Awda (“retorno”, em árabe), lançado em Israel, traz 12 contos escritos por seis autores israelenses e seis palestinos, que desenham, em detalhes, uma realidade imaginária de como seria o país após o retorno dos refugiados palestinos.
O subtítulo da obra, "Testemunhos imaginários de futuros possíveis", evidencia o exercício feito pelos autores, de imaginar levando em conta a realidade atual e o cenário geográfico e cultural da região.
Arquivo/Zochrot
Imagem mostra palestinos em Gaza, no momento da criação do Estado de Israel, em 1948, chamado de "Nakba" pelos palestinos
Em um dos contos, o escritor israelense Tomer Gardi, que mora em Tel Aviv, descreve a cidade após o retorno dos refugiados. Na história, muitos dos que retornam resolvem ir para Yafo, hoje um bairro no sul de Tel Aviv e que, até a fundação de Israel, em 1948, era uma das cidades palestinas mais importantes – chamada Yafa (com 'a').
Entre Yafa e Tel Aviv havia um bairro chamado Manchia, que não existe mais. O único sinal que restou é a mesquita Hassan Bek, hoje cercada por hotéis cinco estrelas em frente à praia. Gardi desenha uma Tel Aviv na qual Manchia é reconstruido, mas como a região já está densamente habitada, a solução é construir o bairro em uma ilha artificial no mar Mediterrâneo, em frente a Yafo, cujo nome, após o retorno, volta a ser Yafa.
Para se deslocar da ilha, que se chamaria Manchia Jdeide (Novo Manchia, em árabe), haveria uma ponte para pedestres. Na ilha viveriam juntos judeus-israelenses e árabes-palestinos.
Lembrando o passado
O livro foi publicado pela ONG israelense Zochrot (“lembrando”, em hebraico), que se dedica a pesquisar e divulgar a memória e as informações sobre a Nakba – termo que em árabe significa “tragédia” e se refere à expulsão de centenas de milhares de palestinos durante a guerra de 1948.
Divulgação
Para Eitan Bronstein Aparicio, diretor da Zochrot, "a literatura tem o poder de criar outro mundo, outra linguagem, outros conceitos, inexistentes hoje em dia".
[Capa de Awda traz o título nas duas línguas]
"Especialmente em situações como a nossa, que parecem sem saída, e nas quais é difícil ver um horizonte, a literatura e a arte em geral podem ajudar as pessoas a pensar em outras possibilidades", disse Bronstein a Opera Mundi.
De acordo com ele, o futuro imaginado pelos autores "não é um mar de rosas, mas também não é uma catástrofe". "Se quisermos realmente viver em paz nesta região, precisamos reparar a injustiça que foi cometida contra os palestinos, e isso significa reconhecer o direito ao retorno dos refugiados", afirmou Bronstein.
“Eu, como indivíduo, como israelense e como pai, gostaria muito que pudéssemos realmente nos integrar na região e não continuar vivendo em uma fortaleza isolada, com medo".
Viagem ao futuro
As diversas versões de possíveis futuros apresentadas nos contos são instigantes e quebram os conceitos que vigoram hoje em dia em Israel. Para quem acompanha diariamente os detalhes de um presente pouco alentador, é refrescante poder viajar para um futuro imaginário de paz.
O autor palestino Ala Hlehel se concentra em imaginar um reencontro de palestinos. Um homem e uma mulher que eram namorados antes da guerra de 1948 se reencontram dezenas de anos depois, quando ambos já têm uma idade avançada. A esposa atual do homem era a melhor amiga da mulher que retorna.
Então, o casal recebe a mulher em sua casa e a ajuda a se orientar na nova realidade. No conto, as relações entre os três idosos são permeadas pelas complexidades do passado.
Fronteiras abertas
Na introdução ao livro, o escritor palestino Umar al-Ghubari descreve uma viagem de todos os escritores que participaram do projeto, anos depois, para um congresso em Beirute.
Na realidade imaginária de al-Ghubari, após o acordo de paz entre israelenses e palestinos, que inclui o reconhecimento ao direito de retorno dos refugiados, todas as fronteiras com os outros países do Oriente Médio se abrem e os cidadãos podem facilmente tomar um trem da cidade de Haifa e chegar à capital libanesa em duas horas, coisa que hoje é inimaginável para os israelenses.
Leia mais
O autor menciona que "não há mais necessidade de tradutores", pois na nova realidade binacional, anos após o retorno, a grande maioria dos cidadãos já fala fluentemente as duas línguas – árabe e hebraico.
A forma do livro é coerente com o imaginário binacional. Versões dos contos em árabe e hebraico se intercalam. O título do livro, na capa, aparece nas duas línguas, assim como o índice e os detalhes dos autores.
Guila Flint/Opera Mundi
Para Eitan Bronstein Aparicio, diretor da ONG israelense Zochrot, "a literatura tem o poder de criar outro mundo, outra linguagem"
A capa é ilustrada com a imagem de ponteiros de relógio, em referência à viagem no tempo, para um futuro imaginário, que os escritores proporcionam aos leitores.
De volta ao presente
A questão dos refugiados palestinos é a mais espinhosa entre as várias questões que deverão ser resolvidas para que haja um acordo de paz. O governo de Israel se opõe veementemente ao retorno de um refugiado sequer para dentro das fronteiras do país.
Para a liderança palestina o reconhecimento ao direito de retorno é fundamental, embora o presidente Mahmoud Abbas tenha dito que não tem a intenção de "inundar" Israel com milhões de refugiados e alterar seu caráter demográfico.
Nas negociações de Taba, em 2001, representantes israelenses e palestinos discutiram a questão dos refugiados e elaboraram uma proposta com quatro opções, onde os refugiados poderiam: retornar para o Estado palestino que seria criado nas fronteiras de 1967; permanecer nos países onde se encontram e obter cidadania e igualdade de direitos; ser acolhidos por outros países; um número de refugiados, acordado com Israel, poderia voltar para o que hoje é o território israelense.
Todas as opções incluiriam indenização pelos danos que os refugiados sofreram.
Não se sabe se a proposta de Taba será retomada nas negociações atuais, mediadas pelo secretário de Estado norte-americano John Kerry. No entanto, aquelas negociações, há 13 anos, são consideradas o momento em que representantes oficiais dos dois lados chegaram mais perto de uma solução para a questão dos refugiados.
(*) Guila Flint cobre o Oriente Medio para a imprensa brasileira há 20 anos e é autora do livro 'Miragem de Paz', da editora Civilização Brasileira.
O livro Awda, lançado em Israel, traz 12 contos escritos por autores palestinos e israelenses e foi publicado pela ONG Zochrot
Atualizada às 14h20
O livro Awda (“retorno”, em árabe), lançado em Israel, traz 12 contos escritos por seis autores israelenses e seis palestinos, que desenham, em detalhes, uma realidade imaginária de como seria o país após o retorno dos refugiados palestinos.
O subtítulo da obra, "Testemunhos imaginários de futuros possíveis", evidencia o exercício feito pelos autores, de imaginar levando em conta a realidade atual e o cenário geográfico e cultural da região.
Arquivo/Zochrot
Imagem mostra palestinos em Gaza, no momento da criação do Estado de Israel, em 1948, chamado de "Nakba" pelos palestinos
Em um dos contos, o escritor israelense Tomer Gardi, que mora em Tel Aviv, descreve a cidade após o retorno dos refugiados. Na história, muitos dos que retornam resolvem ir para Yafo, hoje um bairro no sul de Tel Aviv e que, até a fundação de Israel, em 1948, era uma das cidades palestinas mais importantes – chamada Yafa (com 'a').
Entre Yafa e Tel Aviv havia um bairro chamado Manchia, que não existe mais. O único sinal que restou é a mesquita Hassan Bek, hoje cercada por hotéis cinco estrelas em frente à praia. Gardi desenha uma Tel Aviv na qual Manchia é reconstruido, mas como a região já está densamente habitada, a solução é construir o bairro em uma ilha artificial no mar Mediterrâneo, em frente a Yafo, cujo nome, após o retorno, volta a ser Yafa.
Para se deslocar da ilha, que se chamaria Manchia Jdeide (Novo Manchia, em árabe), haveria uma ponte para pedestres. Na ilha viveriam juntos judeus-israelenses e árabes-palestinos.
Lembrando o passado
O livro foi publicado pela ONG israelense Zochrot (“lembrando”, em hebraico), que se dedica a pesquisar e divulgar a memória e as informações sobre a Nakba – termo que em árabe significa “tragédia” e se refere à expulsão de centenas de milhares de palestinos durante a guerra de 1948.
Divulgação
Para Eitan Bronstein Aparicio, diretor da Zochrot, "a literatura tem o poder de criar outro mundo, outra linguagem, outros conceitos, inexistentes hoje em dia".
[Capa de Awda traz o título nas duas línguas]
"Especialmente em situações como a nossa, que parecem sem saída, e nas quais é difícil ver um horizonte, a literatura e a arte em geral podem ajudar as pessoas a pensar em outras possibilidades", disse Bronstein a Opera Mundi.
De acordo com ele, o futuro imaginado pelos autores "não é um mar de rosas, mas também não é uma catástrofe". "Se quisermos realmente viver em paz nesta região, precisamos reparar a injustiça que foi cometida contra os palestinos, e isso significa reconhecer o direito ao retorno dos refugiados", afirmou Bronstein.
“Eu, como indivíduo, como israelense e como pai, gostaria muito que pudéssemos realmente nos integrar na região e não continuar vivendo em uma fortaleza isolada, com medo".
Viagem ao futuro
As diversas versões de possíveis futuros apresentadas nos contos são instigantes e quebram os conceitos que vigoram hoje em dia em Israel. Para quem acompanha diariamente os detalhes de um presente pouco alentador, é refrescante poder viajar para um futuro imaginário de paz.
O autor palestino Ala Hlehel se concentra em imaginar um reencontro de palestinos. Um homem e uma mulher que eram namorados antes da guerra de 1948 se reencontram dezenas de anos depois, quando ambos já têm uma idade avançada. A esposa atual do homem era a melhor amiga da mulher que retorna.
Então, o casal recebe a mulher em sua casa e a ajuda a se orientar na nova realidade. No conto, as relações entre os três idosos são permeadas pelas complexidades do passado.
Fronteiras abertas
Na introdução ao livro, o escritor palestino Umar al-Ghubari descreve uma viagem de todos os escritores que participaram do projeto, anos depois, para um congresso em Beirute.
Na realidade imaginária de al-Ghubari, após o acordo de paz entre israelenses e palestinos, que inclui o reconhecimento ao direito de retorno dos refugiados, todas as fronteiras com os outros países do Oriente Médio se abrem e os cidadãos podem facilmente tomar um trem da cidade de Haifa e chegar à capital libanesa em duas horas, coisa que hoje é inimaginável para os israelenses.
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O autor menciona que "não há mais necessidade de tradutores", pois na nova realidade binacional, anos após o retorno, a grande maioria dos cidadãos já fala fluentemente as duas línguas – árabe e hebraico.
A forma do livro é coerente com o imaginário binacional. Versões dos contos em árabe e hebraico se intercalam. O título do livro, na capa, aparece nas duas línguas, assim como o índice e os detalhes dos autores.
Guila Flint/Opera Mundi
Para Eitan Bronstein Aparicio, diretor da ONG israelense Zochrot, "a literatura tem o poder de criar outro mundo, outra linguagem"
A capa é ilustrada com a imagem de ponteiros de relógio, em referência à viagem no tempo, para um futuro imaginário, que os escritores proporcionam aos leitores.
De volta ao presente
A questão dos refugiados palestinos é a mais espinhosa entre as várias questões que deverão ser resolvidas para que haja um acordo de paz. O governo de Israel se opõe veementemente ao retorno de um refugiado sequer para dentro das fronteiras do país.
Para a liderança palestina o reconhecimento ao direito de retorno é fundamental, embora o presidente Mahmoud Abbas tenha dito que não tem a intenção de "inundar" Israel com milhões de refugiados e alterar seu caráter demográfico.
Nas negociações de Taba, em 2001, representantes israelenses e palestinos discutiram a questão dos refugiados e elaboraram uma proposta com quatro opções, onde os refugiados poderiam: retornar para o Estado palestino que seria criado nas fronteiras de 1967; permanecer nos países onde se encontram e obter cidadania e igualdade de direitos; ser acolhidos por outros países; um número de refugiados, acordado com Israel, poderia voltar para o que hoje é o território israelense.
Todas as opções incluiriam indenização pelos danos que os refugiados sofreram.
Não se sabe se a proposta de Taba será retomada nas negociações atuais, mediadas pelo secretário de Estado norte-americano John Kerry. No entanto, aquelas negociações, há 13 anos, são consideradas o momento em que representantes oficiais dos dois lados chegaram mais perto de uma solução para a questão dos refugiados.
(*) Guila Flint cobre o Oriente Medio para a imprensa brasileira há 20 anos e é autora do livro 'Miragem de Paz', da editora Civilização Brasileira.
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Só discuto o que nao sei ...O ke sei ensino ...POIZ
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