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Antigo soldado israelita. "De repente, querer matar um palestiniano passa a ser uma coisa banal"

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Antigo soldado israelita. "De repente, querer matar um palestiniano passa a ser uma coisa banal" Empty Antigo soldado israelita. "De repente, querer matar um palestiniano passa a ser uma coisa banal"

Mensagem por Vitor mango Seg Mar 23, 2015 6:05 am

Antigo soldado israelita. "De repente, querer matar um palestiniano passa a ser uma coisa banal"
Avihai Stollar é uma voz dissonante na aparente unanimidade da sociedade israelita quando o tema é a ocupação dos territórios palestinianos. Foi combatente durante a segunda intifada, serviu na Cisjordânia, e chegou a 1.º Sargento. Em 2004, depois de três anos nas Forças de Defesa, não quis que a violência continuasse a fazer parte da sua rotina. E quatro anos depois juntou-se à organização Breaking the Silence, onde lidera o projeto de recolha de testemunhos de soldados.
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Susana André, jornalista da SIC Notícias |
12:47 Quinta, 19 de Março de 2015
Avihai nasceu em Haifa, a terceira maior cidade israelita. Em 2008 juntou-se à organização "Breaking the Silence", onde lidera o projecto de recolha de testemunhos
Avihai nasceu em Haifa, a terceira maior cidade israelita. Em 2008 juntou-se à organização "Breaking the Silence", onde lidera o projecto de recolha de testemunhos / Violeta Moura

O que é a Breaking the Silence?
É uma organização de antigos militares das Forças de Defesa Israelitas, que tem como principal objectivo acabar com a ocupação dos territórios palestinianos. Recolhemos testemunhos de soldados que serviram em Gaza e na Cisjordânia e que nos contam as suas experiências, histórias de abusos e de violência. Também organizamos debates e visitas aos territórios ocupados.
Aquilo que estamos a tentar fazer é aproveitar a nossa experiência no serviço militar, o que fizemos e testemunhámos, e trazê-la a público. Há um lapso muito grande de conhecimento entre aquilo que as nossas famílias e amigos pensam saber sobre a nossa experiência militar e aquilo que nós realmente vivemos. A ideia é trazer essas histórias a público para criar um debate na sociedade israelita sobre o preço moral da ocupação militar.

O vosso trabalho tem conseguido alterar a forma como a sociedade israelita olha para a ocupação?
Quando trabalhamos na consciencialização pública, é difícil ver frutos. Acreditamos fazer parte de algo grande, de uma mudança social e política, mas não sabemos quando é que ela vai acontecer. O que sabemos é que há um grande nível de ignorância na nossa sociedade sobre o tema da ocupação, mesmo entre as pessoas que nos são mais próximas. Nada mudou nos últimos dez anos, desde o tempo em que eu era soldado.
Quando se enviam milhares de soldados para combate, sem regras de intervenção, dizendo-lhes para disparar sobre tudo o que considerem suspeito, tudo vai ser atingido. Sobretudo quando se tem a força aérea que Israel tem. E artilharia e tanques e milhares de soldados de infantaria.

Durante o tempo em que esteve ligado às Forças de Defesa Israelitas, já se questionava?
Eu servi durante a segunda intifada, na Cisjordânia, numa das unidades de infantaria, e tinha sentimentos mistos. Nasci numa família moderada, com valores éticos e morais. Por isso, quando cheguei ao serviço militar e comecei a ver amigos meus a baterem em palestinianos nos postos de controle, ou a tirarem-lhes as carteiras, não sabia como encarar isso.
Durante oito meses somos treinados para enfrentar outro exército e, de repente, com 18 anos de idade, vemo-nos na Cisjordânia com uma imensa responsabilidade e poder. Ao mesmo tempo temos medo de ser apunhalados pelas costas ou de deixar passar uma bomba numa mochila que não revistámos devidamente. Eu esforçava-me por ser educado, dizia sempre "obrigado" e "por favor". Mas, no fim do dia, é impossível sentir que fizemos sempre a coisa certa.

Como é a relação dos jovens israelitas com a vida militar?
O meu pai, o meu avô e o meu irmão mais velho combateram. Quando tinha 16 anos sentava-me a ouvir as histórias deles e sonhava fazer parte disso, queria ser um bom israelita. Isso era parte da minha identidade. Acho que a maior parte dos jovens sente isto.
Apesar de tudo, a minha família é liberal. Os meus pais são pessoas cultas e informadas, e votam nos social-democratas. Não somos militantes nem extremistas. Mas em Israel o serviço militar é quase uma religião. Não se contesta e é obrigatório para rapazes e raparigas. Somos educados assim, doutrinados para nos defendermos contra os inimigos. Os problemas começam quando a missão militar em que participamos é má e nós queremos criticá-la, mas temos receio de que as pessoas digam que não gostamos do nosso país.

Que tipo de relatos partilham os soldados que entrevistam?
As histórias que ouvimos agora são as mesmas que se ouvia há cinco ou dez anos, nada mudou. São os mesmos dilemas, é a mesma moral degradada. Num dia és um adolescente que se diverte no liceu, no dia seguinte a violência passa a ser algo normal na tua vida. De repente, querer matar um palestiniano passa a ser uma coisa banal. É chocante. Por mais que o governo diga que faz tudo para controlar a violência e que os postos de controlo estão preparados para lidar de forma humana com os milhares de palestinianos que os atravessam diariamente, isso é totalmente falso. Nos testemunhos dos soldados mantêm-se os relatos de violência arbitrária e de abusos. Israel continua a gerir a vida dos palestinianos pela força das armas.

Quase 50 anos depois, como é que Israel continua a sustentar a ocupação?
Com o discurso do medo e da insegurança. Mas se queremos ser uma democracia não podemos manter esta situação. Controlamos milhares de pessoas, em Gaza e na Cisjordânia, pela via militar. A vida nos territórios ocupados é terrível, os palestinianos não têm os mesmos direitos que eu tenho como israelita. Apesar de viverem sob controlo do mesmo governo, de terem obrigações e pagarem impostos, não têm os mesmos direitos. Nem sequer podem votar nas eleições nacionais. Vivem sob regime militar. Não entendo como pode Israel esperar paz quando se negam direitos fundamentais aos palestinianos. O que eu peço, e sei que é muito, mas é básico, é que a sociedade israelita entenda o que é a ocupação.

Os israelitas não têm consciência da realidade dos territórios ocupados ou preferem assobiar para o lado?
A tragédia é que Israel não faz mesmo ideia. Os israelitas preferem falar sobre qualidade de vida enquanto se sentam num café a beber um latte. Gostam de imaginar que estão na Europa, mas no fim da rua é a ocupação. Querem ter uma vida normal mas não fazem ideia do que isso seja. Acham que a ocupação é uma questão de autodefesa, uma questão de sobrevivência.
É isso que nos dizem na televisão e nos jornais, é isso que nos ensinam na escola. Desde crianças, convencem-nos de que somos vítimas. Mas a verdade é que nós só estamos nos territórios ocupados porque queremos. Temos quase meio milhão de israelitas a viverem em 200 colonatos na Cisjordânia. Isso diz muito. Mas de acordo com as sondagens, mais de 70% dos israelitas estão dispostos a abdicar da Cisjordânia pela paz. A verdade é que não querem saber, nunca lá estiveram nem tencionam ir, mas o governo diz-lhes que não é possível abrir mão dos territórios ocupados porque é uma questão de segurança. É falso, para ter paz bastaria acabar com a ocupação.

Mas o discurso do governo israelita, sobre insegurança e ameaça externa, continua a convencer?
Continua. Mas nos últimos seis anos houve três ofensivas militares em Gaza e isso não trouxe mais segurança aos israelitas. O resultado foi a morte de milhares de civis palestinianos. Quando os soldados vão para Gaza, por exemplo, é-lhes dito que não devem encontrar civis, por isso eles disparam contra tudo. Tudo são ameaças, tudo são zonas de combate.
Nos últimos 50 anos só nos relacionámos com os palestinianos por meios militares. Fazemos cercos e bloqueios, controlámos a liberdade de circulação das pessoas e a economia dos territórios ocupados. E quando isso falhou, avançámos para ofensivas militares.
Durante o meu serviço militar, em resposta a um ataque ou sem qualquer motivo, entrávamos numa cidade palestiniana, lançávamos granadas a meio da noite; as pessoas acordavam, as crianças atiravam-nos pedras e nós disparávamos balas de borracha contra elas. A ideia era mostrar a nossa presença, mostrar quem era o xerife. Não íamos fazer nada, nem prender suspeitos, nem recolher informações. Íamos só mostrar quem é que manda. Foi assim que passei boa parte do meu serviço militar.

Veja ou reveja a Grande Reportagem "Gaza, Prisão a Céu Aberto" , sobre as condições de vida do povo palestiniano em Gaza. Avihai Stollar é um dos personagens da deste trabalho.

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Só discuto o que nao sei ...O ke sei ensino ...POIZ
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Vitor mango
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