O Iberismo.
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O Iberismo.
O Iberismo.
Variadíssimas vozes, ao longo dos tempos, defenderam uma integração política entre Portugal e Espanha. O iberismo não é uma corrente recente, conquanto, sobretudo em Portugal, tenha desde sempre envolvido mais os intelectuais do que os cidadãos comuns. As tentativas de unificar os dois países são seculares. Pela História, Espanha e Portugal digladiaram-se com objectivos antagónicos: o primeiro procurando anexar e o segundo tentando manter a sua frágil independência perante um vizinho forte, geograficamente maior e poderoso. Temos, portanto, um longo rol de batalhas ao longo das Idades Média e Moderna. Como esquecer Aljubarrota e a longeva Guerra da Restauração?, entre muitas outras.
A partir do século XIX, depois das Guerras Peninsulares, os novos ideais foram esbatendo as velhas rivalidades, com o enguiço de Olivença presente. Portugal resistiu a Napoleão e negou o desejo francês e espanhol de repartir o território nacional entre si, regateando. Franco e Salazar, já no século passado, não eram tão amigos quanto se pode imaginar. Salazar, como bom estratega, soube manter o status quo de Portugal, estimulando relações tão cordiais quanto possíveis com o Generalíssimo. Pacto entre Pacto, afastaram a que parecia inevitável participação na II Guerra Mundial, legitimando os seus regimes despóticos até meados dos anos setenta.
Portugal, apesar de mais pobre, é país uno, homogéneo, desde finais do século XIII. Espanha, não, unificada tardiamente. O fim da União Ibérica (1580 - 1640) isso demonstrou. Tendo de acudir a uma sublevação perigosa na Catalunha, Filipe III (IV de Espanha) não conseguiu suster o descontentamento em Portugal, ou seja, Espanha nunca foi tão forte internamente como quis parecer. Fosse-o e, hoje, a península seria una. A velha aliança Luso-Inglesa, actualmente em vigor, que remonta ao século XIV e ao reinado de D. João I, também explica o sucesso português diante das investidas espanholas.
A discussão em torno de uma União Ibérica paira, nos dias que correm, como um reduto de teor académico. Ninguém levará muito a sério, nem por cá, nem por lá. A maioria dos portugueses desconfia dos espanhóis e a maioria dos espanhóis pouco se interessa por Portugal, o que se reflecte na parca abordagem dos media espanhóis sobre o país vizinho. Há ressentimentos históricos. Esses, nenhuma União Europeia apaga. Não mais Portugal e Espanha seguem de costas voltadas. Desde há trinta anos, quase, que trilham um caminho comum. Entretanto, Espanha sente-se inferior à vizinha França, de quem sempre invejou o sucesso, odiando a Inglaterra que outrora lhe roubou o brilho e o protagonismo. Portugal mantém o eterno complexo de inferioridade, subalternizando a sua língua em diálogos com espanhóis, os seus costumes. Tão iguais no percurso histórico, tão diferentes no chauvinismo, exacerbado além da raia, nulo ou perto disso deste lado.
Interessado que sou, participo em alguns fóruns temáticos sobre o Iberismo - sendo veementemente contra. Poucos, que o discurso aceso levar-me-ia ao banimento em todos - o que nunca aconteceu. Pontos de vista opostos não são bem aceites pelos iberistas espanhóis. Porém, há uns dias, conversando com um, educadamente me disse, em castelhano, para eu despir-me de preconceitos e procurar ver o seu lado. Procurar, no fundo, sentir Portugal quando não o era, quando Afonso Henriques ainda não tivera a ideia de se tornar rei. Antes mesmo de nascer. Desvendou-se toda uma perspectiva diferente. Para os nacionalistas portugueses, Portugal começará com o nosso primeiro rei (e não terá sido assim?). Foi, evidentemente, mas o que seria Portugal antes da aventura do primeiro dos seis Afonsos que aqui reinaram? Era um condado e, recuando um pouquinho mais, não muito, uma parcela dos Reinos de Galiza e de Leão, pertencentes a Afonso VI de Leão e Castela. Não fosse a entrega do Condado Portucalense a D. Henrique e a D. Teresa, pais de Afonso Henriques, e o provável teria sido a unificação de todos os reinos peninsulares na Espanha, herdeira do termo Hispania, nome que os romanos davam à península, por contraposição com Iberia, denominação dos gregos.
O que os iberistas do país vizinho defendem, e o povo espanhol, implicitamente (não deverão pensar todos os dias no assunto...), é que Afonso Henriques foi um traidor, que por capricho quis ser rei (e não foi?), quebrando com a unidade peninsular que viria a ocorrer, separando estas terras que hoje são Portugal da sua origem. E até têm uma certa razão. Portugal, se formos sinceros, deveria estar unido a Espanha (eu sei, eu sei, isto parece uma anedota vindo de mim!). Eu não disse que defendo isto. Eu disse, e digo, que faz sentido e é legítimo que se pense assim. A península ibérica, ou a Hispânia, província romana, era uma só entidade. Temos particularidades que nos distinguem. Para lá dos Pirenéus está outro povo. Agora, suponhamos que aparecia um Afonso Henriques - século XXI - pretendendo separar, humm, o Algarve de Portugal? Foi isso que o Afonso Henriques do século XII fez, uma secessão. É um herói em Portugal. Não o é tanto assim aos meus olhos.
A comunicação social, em manobras de diversão, por vezes, nomeadamente em Espanha, gosta de publicar sondagens que dão conta de uma predisposição dos portugueses em aceitar integrar-se em Espanha. Pouco credíveis. Com segurança, creio poder afirmar-se de que nove em dez portugueses seriam contra. Alude-se, os iberistas espanhóis, a que a união seria proveitosa para os portugueses, sendo Espanha um país melhor. Não tanto assim, direi eu, que Espanha não é nenhum Luxemburgo, nunca foi um grande país, embora seja um país grande, e só não a deixaram cair, como Portugal, a Grécia e a Irlanda caíram, porque isso significaria o colapso da União Europeia. E não há vantagens económicas que se sobreponham a uma independência. Integrando-se Portugal em Espanha, seria mais por fazer justiça à história que Afonso Henriques não deixou que se escrevesse.
Portugal existe há quase nove séculos. Falar-se de integração seria, de modo reprovável, claro, anular estes oitocentos e tal anos. Hoje em dia, uma união entre Portugal e Espanha não poderia passar por uma Hispânia ou Portugal deixando-se absorver por Espanha. O hipotético Estado, super Estado, chamar-se-ia Ibéria (ninguém em Portugal aceitaria uma integração em Espanha, tornando Portugal uma comunidade autónoma ou o que o valha). Teria de ser uma união entre dois Estados em pé de igualdade. Duas línguas oficiais de Estado, com as respectivas co-oficiais que já existem em Espanha (o português não poderia ser tratado como língua secundária e as crianças portuguesas só aprenderiam castelhano na mesma medida em que as crianças espanholas aprendessem português). O regime político teria de mudar. Nenhum português aceitaria ser súbdito de um monarca espanhol. A capital seria dividida entre Lisboa e Madrid... Irrealista, não?
Bastante. Nem a Constituição portuguesa permite atentados à independência nacional. Os catalães tampouco aceitariam cedências a Portugal em detrimento dos seus interesses. E, a longo prazo, a nossa língua portuguesa e cultura estariam ameaçadas, como a língua e cultura galegas que sofrem influências castelhanas ostensivas. O galego continua a ser descaracterizado, mesmo numa sociedade democrática que reconhece e diz proteger as singularidades (línguas, costumes, tradições) de cada povo que compõe Espanha.
O que se passa agora, que não se passava antes, é que passei a entender o lado dos iberistas, principalmente dos espanhóis, que há iberistas portugueses (que provavelmente farão o mesmo raciocínio que fiz ao longo deste artigo). Teria sido melhor seguirmos todos juntos. A península é uma só, Portugal está todo encostadinho a Espanha, o povo é igual, as línguas são quase iguais, as tradições... No fundo, as fragilidades despontam, volta e meia. Só a força deste povo torna Portugal um país viável. Vendo tudo com clarividência, é um pedaço que não faz muito sentido ser país. Nem os romanos assim o quiseram. Acharam, e logicamente, que a península era una, logo, teria um só nome, seria uma província (com subdivisões, mas todas elas passavam pela Hispânia). Também os povos pré-romanos, que eram vários, não estavam circunscritos ao que hoje compreende Portugal e Espanha. Alguns atravessavam pedaços de ambos. E depois da queda de Roma, tanto suevos como visigodos tinham os seus reinos por Portugal e Espanha. A ocupação muçulmana tudo juntou, mais uma vez, até chegarmos aos reinos cristãos - onde iniciei a saga.
Afinal, um homem, D. Afonso Henriques - o ideal de um homem - pôs tudo em causa! Com que direito?
Autor: Mark às 15:40 Separador: [url=http://asaventurasdemark.blogspot.pt/search/label/Artigo de Opini%C3%A3o]Artigo de Opinião[/url], Cultura, Dissertação
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