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Carlos Fino sobre a russia

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Mensagem por Vitor mango Sáb Out 01, 2022 3:18 am

RÚSSIA VAI ABSORVER REGIÕES PRÓ-RUSSAS DA UCRÂNIA

Trata-se, grosso modo, da chamada Nova Rússia, incluindo o Donbass. Um território integrado ao Império russo em meados do século XVIII, por Catarina, a Grande, no contexto mais alargado da disputa com o Império turco, para lá tendo ir viver milhares de colonos russos.

Durante a URSS, por razões administrativas e políticas, esse território foi integrado na República Socialista Federada da Ucrânia e foi nessa configuração que passou para a República da Ucrânia, quando do colapso da União Soviética.

Nele vivem atualmente entre 6 a 7 milhões de pessoas (eram 8, antes da guerra), na sua maioria de origem russa e de língua russa.
As repúblicas do Donbass (Lugansk e Donetsk) não aceitaram o governo de Kíev saído da chamada "revolução Maidan", de 2014, que consideraram um golpe inspirado pelos EUA, contra um governo legítimo, eleito em escrutínio validado pela OSCE - a organização de segurança e cooperação na Europa.

Como forma de conciliação, os acordos de Minsk - patrocinados pela Alemanha, França e Rússia, previam a concessão de autonomia a essas regiões, o que Kíev, entretanto nunca implementou.

Pelo contrário - as forças ultranacionalistas ucranianas que dominam o governo de Kíev tentaram (à revelia das promessas eleitorais de Zelensky) uma "solução de força" - proibição dos partidos e políticos favoráveis a um entendimento com Moscovo, proibição do uso da língua russa na administração pública, incluindo no ensino, fecho dos canais de televisão em língua russa e continuados ataques militares, na tentativa de derrotar as milícias pro-russas locais, que passaram, por seu turno, a ter apoio cada vez maior da própria Rússia.

Uma situação que se prolongou por oito anos, com milhares de vítimas militares e civis de ambos os lados, até que em fevereiro do corrente ano a Rússia deu início à chamada "operação militar especial", transformando uma guerra civil larvar numa guerra aberta Rússia - Ucrânia.

Para além dos aspectos históricos, políticos e emocionais, está em causa a posse de um território riquíssimo em termos de produção agricola (terras negras muito férteis), matérias-primas e capacidade industrial instalada, que representa boa parte do PIB do país.

Por outro lado, o radicalismo identitário dominante em Kiev - na Ucrânia ocidental há, em muitos setores, verdadeiro ódio aos russos, designados depreciativamente por "mascali" - criou o receio entre as populações do leste, que o objetivo de Kiev seria não só submetê-los, ucranianizá-los à força, mas até eventualmente expulsá-los dali para fora, seja para a Rússia, seja para outro lado qualquer. A Rússia, pelo menos, na sua propaganda, fomenta essa ideia para ganhar apoio local.

Agora, com os "referendos" dos últimos dias, as forças pró-russas criaram o ambiente propício para a (re)anexação russa que terá o seu acto culminante hoje, no Kremlin.

O que irá seguir-se é uma incógnita - à excepção de alguns - poucos - países, a generalidade da comunidade internacional certamente não reconhecerá a anexação e haverá condenação moral e política do Kremlin em termos de opinião pública.

O Kremlin não parece, no entanto, estar muito preocupado com isso, já que tudo ou quase tudo o que os ocidentais e o resto do mundo poderiam fazer já foi feito, em termos de sanções e fornecimento de milhões de milhões em armamento ao governo de Kíev.

O objetivo declarado desse apoio é "enfraquecer a Rússia", como disse o secretário americano da defesa.

Alguns já afirmaram querer mesmo mais, como foi referido abertamente em reunião recente realizada em Praga: dividir a Rússia, fragmentá-la em vários Estados, como foi feito com a URSS, primeiro, e com a Jugoslávia, em seguida.

O pior de tudo é que, ao integrar estas regiões, a Rússia passará a considerar qualquer ataque ucraniano como violação do seu próprio território, o que significa, mais ainda do que até agora, guerra aberta com a Ucrânia e também - potencialmente -com a própria NATO, o que se traduzirá muito provavelmente numa escalada da guerra.

A (re)anexação é também uma resposta de Moscovo ao alargamento - a partir dos anos 90 - da NATO para leste.

Os ocidentais prometeram a Gorbachev que isso nunca iria acontecer, mas os "neocons" de Washington ( para cujo perigo alertou na altura Mário Soares, em artigo celebre na Visão) avançaram com esse alargamento, insistindo em que também a Ucrânia devia integrar a aliança atlântica. Uma política "perigosa e desnecessária", como advertiram na altura vários membros da elite político-militar dos EUA, considerando a insistência no alargamento da NATO para leste, em desafio à Rússia, "um erro histórico".

Entre outras razões, porque isso iria provavelmente reavivar os históricos receios russos em relação ao Ocidente (Carlos XII da Suécia, Napoleão, Hitler...), reforçar o nacionalismo russo sempre latente e adiar para as calendas gregas a democratização do país.

Ao alargamento da NATO para leste responde agora Pútin com o alargamento da Rússia para Ocidente.

A partir deste momento é que iremos ver para qual dos lados em confronto a questão da Ucrânia é verdadeiramente uma questão vital, ou seja, quem está de facto disposto a morrer por ela, enviando homens seus para o terreno.

Desde que decretou, primeiro, a "operação militar especial" e agora também a "mobilização parcial", a Rússia já está a fazê-lo em número e grau apreciável, apesar da resistência de parte da intelectualidade, de muitos jovens que não querem ir para a guerra e em geral dos setores pró-ocidentais do país.

E a NATO? também vai colocar soldados seus na Ucrânia, para além dos conselheiros que já lá tem?

O confronto continuará a ser apenas entre primos eslavos desavindos com um dos lados fortemente apoiado pelo Ocidente, ou vai transformar-se num choque militar direto entre a Rússia e a NATO, com tudo o que isso pode implicar, incluindo uma guerra nuclear devastadora?

Em qualquer caso, o conflito parece estar longe do fim.

O exército ucraniano, treinado pela NATO desde 2004, deu já provas de grande determinação e resiliência. Encorajado e fortalecido pelos fornecimentos de armas do Ocidente, já mostrou no campo de batalha - apesar de enormes perdas materiais e humanas sob ataques em massa da artilharia russa - que a vontade de independência e soberania da Ucrânia (pelo menos da sua parte ocidental) é muito forte, obrigando Moscovo a engolir a condescendência e sentido de superioridade com que costuma olhar para o seu vizinho.

As tragédias anunciadas - a já em curso e a que ainda está pela frente - poderiam entretanto ter sido facilmente evitadas - bastaria os europeus (França e Alemanha) e a Rússia terem aceite e implementado em conjunto a neutralidade da Ucrânia e o poder em Kíev ter aceite a realidade de um país diverso, promovendo um Estado federal, em que todos estariam incluídos, convivendo em tolerância com as suas diferenças, como acontece na Bélgica, na Suíça, na Áustria...

Mas houve claramente quem não estivesse interessado nisso ("Fuck Europe!" - disse a senhora Nuland), preferindo um conflito que deixará marcas indeléveis no continente, impossibilitando por muito tempo qualquer cooperação entre a Europa e a Rússia, forçando o velho continente a depender quase exclusivamente dos EUA e eliminando assim qualquer veleidade de real autonomia.

Sim, teria sido fácil evitar as tragédias. Infelizmente, como tantas vezes acontece quando interesses mais poderosos se alevantam por detrás e por cima dos intervenientes no terreno, o óbvio só chega depois do sangue. (CF)

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