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Adeus, até ao meu regresso

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Mensagem por O dedo na ferida Qua Dez 24, 2008 8:28 am

Adeus, até ao meu regresso

Adeus, até ao meu regresso Alcantara

Umas das recordações da quadra natalícia que me ficaram da infância foram as horas intermináveis da RTP transmitindo as mensagens de Natal ds soldados portugueses que combatiam em África. Era curtas, cada soldado dizia o nome e o posto, desejava um bom Natal aos familiares e terminava invariavelmente com um “adeus e até ao meu regresso”.

Não sei o que me prendia ao televisor mas a inexistência de alternativas `RTP, a não ser a TVE, levou a que pelos meus olhos tivessem passado muitoss milhares de soldados portugueses, o “adeus, até ao meu regresso” ficou-me gravado para sempre na memória.

Recordo este facto para lembrar que muitos deles não regressaram, foram mandados para uma guerra pelo Estado português, morreram e por lá ficaram abandonados, alguns em cemitérios, muito nem isso, esquecidos por todos menos pelos seus familiares, muitos dos quais os terão visto pela última vez nestes programas da RTP.

Os portugueses foram-se esquecendo, uns porque o tema deixou de render, outros porque sentem vergonha deste lado da história, uns e outros esqueceram-nos, abandonado-os definitivamente. Os seus restos mortais ficaram por lá, esquecidos e abandonados. A maioria são soldados, gente pobre que não merece grande atenção dos poderes, morreram na guerra errada.

A ideia de um soldado morto não regressar à sua terra não é um exclusivo da guerra colonial, a Europa está pejada de cemitérios de soldados que morreram nas duas guerras mundiais. Mas depois da Segunda Grande Guerra o abandono dos militares mortos deixou de ser regra e é uma vergonha para Portugal que os seus soldados tenham sido esquecidos. Uma vergonha para Portugal e uma injustiça para as suas famílias, a quem tiraram os filhos sem nunca os terem devolvido.

Ser contra a guerra colonial não implica ter vergonha da nossa história e, muito menos, esquecer as maiores vítimas dessa guerra, é uma vergonha para o país tê-las esquecido. Recordo-os neste dia, que muitos dizem celebrar a família, porque são muitos os portugueses que também os recordam em silêncio, como se tivessem que ter vergonha por os seus filhos terem morrido em nome de um país com medo da sua história.

É tempo de Portugal honrar os seus soldados e trazer os seus soldados de volta a casa.

PS: Felizmente na minha família ninguém morreu em África, a minha geração escapou à guerra, da anterior tive um tio fuzileiro na Guiné e um outro numa companhia de caçadores nos primeiros tempos da guerra em Angola. Recuando mais um pouco, tive um avô na guerra civil de Espanha e um bisavô na guerra que a Espanha travou com os EUA em Cuba, todos regressaram vivos.



O Jumento

Alguns dos meus camaradas que ficarm em Nambuangongo... e creio que ainda lá estão. Hoje, não sei porquê, lembro-me deles de uma forma muito especial


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Nambuangongo Meu Amor

Em Nambuangongo tu não viste nada
não viste nada nesse dia longo longo
a cabeça cortada
e a flor bombardeada
não tu não viste nada em Nambuangongo

Falavas de Hiroxima tu que nunca viste
em cada homem um morto que não morre.
Sim nós sabemos Hiroxima é triste
mas ouve em Nambuangongo existe
em cada homem um rio que não corre.

Em Nambuangongo o tempo cabe num minuto
em Nambuangongo a gente lembra a gente esquece
em Nambuangongo olhei a morte e fiquei nu. Tu
não sabes mas eu digo-te: dói muito.
Em Nambuangongo há gente que apodrece.

Em Nambuangongo a gente pensa que não volta
cada carta é um adeus em cada carta se morre
cada carta é um silêncio e uma revolta.
Em Lisboa na mesma isto é a vida corre.
E em Nambuangongo a gente pensa que não volta.

É justo que me fales de Hiroxima.
Porém tu nada sabes deste tempo longo longo
tempo exactamente em cima
do nosso tempo. Ai tempo onde a palavra vida rima
com a palavra morte em Nambuangongo.


Manuel Alegre
O dedo na ferida
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