Vagueando na Notícia


Participe do fórum, é rápido e fácil

Vagueando na Notícia
Vagueando na Notícia
Gostaria de reagir a esta mensagem? Crie uma conta em poucos cliques ou inicie sessão para continuar.

Que batom combina com as montanhas?

Ir para baixo

Que batom combina com as montanhas? Empty Que batom combina com as montanhas?

Mensagem por Vitor mango Qui Abr 18, 2013 12:30 am

Que batom combina com as montanhas?

É no aconchego mútuo que as pessoas vivem.

Provérbio Irlandês
“Há apenas três coisas que me preocupam,” disse a minha mãe ao telefone.

Conseguia
imaginá-la de pé, em frente à janela da cozinha, com o telefone preso
entre a cara e o pescoço, enquanto cortava orégãos frescos para o
jantar. “Ser atacada por ursos, precisar de ir à casa de banho… e ficar
feia nas fotografias.”


Esforcei-me
por fazer ouvir a minha voz mais confiante, suave e
tranquilizadora...e disse-lhe: “Se tiver de ser, vou espantar os ursos
para bem longe com um pau, mas provavelmente não veremos nenhum. Ter
que fazer chichi de cócoras no meio do monte não é nada de especial; e
prometo que não vamos publicar fotografias feias na revista. Se o
fizermos, podemos sempre pôr uma daquelas tiras pretas por cima dos teus
olhos….”


Estava combinado.

Iria
levar a minha mãe de cinquenta e um anos, Priscilla, e a sua irmã
gémea, Linda, numa viagem de três dias de mochila às costas — um
trabalho para a revista Backpacker. Estava entusiasmada, mas
também nervosa. A minha mãe e a tia Linda não são exatamente
montanhistas... Para elas, passar um dia inteiro ao ar livre equivale a
dezoito buracos de golfe e a um bife no churrasco. Mas cada uma delas
tem três filhos que adoram o ar livre. E estavam ansiosas por ver o que
aquilo era…


“Posso
ao menos levar um batom?” suplicou a minha mãe já no trilho principal,
enquanto eu verificava o conteúdo do seu saco. O tempo prometia, a
rota que tínhamos escolhido era um desafio, mas não era difícil, e com a
minha amiga Tracey para ajudar a transportar a carga, a minha mãe e a
tia Linda só teriam que carregar as roupas, os sacos de dormir e
algumas coisas essenciais. E era este o busílis da questão!


Eu
já tinha confiscado o rímel, uma escova de cabelo de cerca de vinte
centímetros e dois soutiens de seda que a minha mãe considerava serem
vitais para a sua segurança e bem-estar. O meu saco cheio de comida e
equipamento para o grupo pesava quase vinte e cinco quilos, e eu até
tinha sacrificado as minhas roupas interiores e uma T-shirt de reserva
para conseguir levar uma almofada fofa só para ela. Mas deixei que
levasse o batom. Para ela era um bálsamo ter os lábios com um pouco de
cor….


Amarrei
bem o seu saco, tomei-lhe o peso e fiquei a observar a minha mãe, à
espera por detrás da minha tia para dar um retoque final, observando-se
no espelho lateral do carro. Estavam ambas nervosas, dando pequenas
gargalhas, como duas miúdas da escola a prepararem-se para a festa de
finalistas! E as duas partiram com uma passada razoável, em silêncio,
com os bastões de escalar e o cabelo enrolado e seco com o secador.


Fomos
subindo gradualmente. As vistas do Lago Tahoe eram inspiradoras e,
quando parámos para almoçar num campo de seixos cheio de sol, a minha
mãe deixou cair o saco e disse com orgulho “Isto não foi nada comparado
com a minha musculação diária!”


Mesmo
que ainda estivéssemos há poucas horas a andar, fiquei aliviada ao ver
as duas a sorrir — e não apenas com os sorrisos habituais de “Olá,
lindo dia, não está?” Eram sorrisos de orelha a orelha, com os olhos
bem abertos: “Nós somos fortes e saudáveis, uau, vejam aquela
paisagem!” E eu sentia-me como qualquer chefe de escutas: nervosa
porque, a qualquer momento, poderia surgir algum problema, mas feliz
por ver as “minhas miúdas” a divertirem-se.


“Faltam
cerca de cinco quilómetros para o acampamento,” disse-lhes. “Porque é
que não vestem os vossos casacos de lã cardada para não ficarem geladas
enquanto descansamos?” Ocorreu-me então que os papéis parentais se
tinham invertido e que eu parecia mesmo a minha mãe! Esta, sentada numa
rocha ao lado da irmã, disse suavemente “Está bem.” Nunca eu na minha
vida tinha sido tão obediente!


“O
almoço está servido,” disse eu pouco depois, deixando cair aos pés
delas o saco comum a todas com barritas energéticas e entregando a cada
uma um pãozinho de trigo integral recheado com queijo, salame e
mostarda. Comemos em silêncio até que a minha tia Linda deixou escapar
“Isto tem um sabor incrível!”


“É completamente gourmet!”
disse arrebatadamente a minha mãe, que é famosa pelas suas capacidades
culinárias e em particular pelas sanduíches requintadas que faz.


“E esta barra energética,” disse a tia Linda, que é igualmente talentosa na cozinha, “foste tu que fizeste?”

Fiquei verdadeiramente comovida.

A
quase 2.500 metros de altura, depois de uma tarde de tagarelice
cordial, a minha tia parou e disse quase sem fôlego “Priscilla, olha
para isto!” À nossa frente, espreguiçando-‑se, estava o Lago Upper
Thelma, a brilhar – qual safira gigante – ao sol da tarde. E não se via
ninguém em volta.


Encontrámos
um sítio para acampar com uma vista espetacular. A minha mãe e a irmã
mergulharam os pés saídos da pedicura nas águas frias do lago, enquanto
Tracey e eu montávamos o acampamento. Quando a nossa tenda ficou
pronta, a minha mãe rastejou para o interior e deixou-se cair. Enfiei a
cabeça lá dentro e descobri que tinha arranjado muito bem as nossas
camas. Tracey e eu ficaríamos com as das pontas — para protegê-la dos
ursos, dizia. Estava feliz, deitada de costas, a sorrir para o teto de
lona.


Em
breve apreciávamos um bom vinho à volta do fogareiro. A minha mãe
estava reclinada na sua cadeira de campismo, a ver-me picar alho e
cebola para juntar às lentilhas que ferviam em lume brando. Apanhei um
bocado de cebola que tinha caído no chão, soprei-lhe a terra, e depois
deitei-o por cima das lentilhas. Os olhos dela esbugalharam-se. “Não te
preocupes, mãe, um pouco de terra não te vai matar!” disse eu. Quando
as lentilhas e o arroz foram finalmente servidos, só se ouviam ohs e ahs a saudarem os meus talentos culinários. E foi tudo devorado em segundos!



com o anoitecer a envolver-nos, a conversa girou em torno da
perspetiva de sermos apanhadas por ursos. Durante o jantar, e mesmo
depois, nas pequenas tarefas antes de deitar, a minha mãe e a minha tia
sentiam-se algo inseguras dentro do círculo amarelo das luzes das
lanternas… assustando-se com qualquer ruído na escuridão. Mas uma vez
no interior da tenda, sentiram-se em segurança e rapidamente começaram a
baralhar as cartas à luz da vela.


Na
manhã seguinte estava um dia magnífico, quente e com sol, com nuvens
de algodão doce a flutuarem num céu azul profundo. O nosso plano era
passar algum tempo a escalar sem bagagem até um lago próximo, parar
para almoçar, e depois regressar à base. Ainda não tinham passado vinte
minutos e a minha mãe e a irmã tinham já referido os nomes de cinco
tipos de flores silvestres. Nunca antes puseram o pé num prado no cimo
de uma montanha, mas anos a cuidar de lindos jardins tinham-nas
transformado em botânicas amadoras. No final do dia já me tinham
ajudado a identificar dez novas flores silvestres!


Depois
do almoço, retomámos devagar o caminho de volta ao acampamento,
caminho esse que serpenteava entre prados cobertos de flores, e era
acompanhado por um belo riacho gorgolejante. A minha mãe estava a
demorar-se um pouco e, quando eu me voltei para ver o que se passava,
estava ela completamente dobrada, puxando a língua da bota. “Acho que
posso estar a fazer uma bolha,” disse a medo. Descalcei-lhe a bota, vi
que não tinha qualquer bolha, e depois alarguei um pouco os cordões
para aliviar a pressão. Ajoelhada na terra, enquanto lhe dava um nó
duplo, pus-me a pensar nas centenas de laços que teria atado por mim ao
longo de todos os anos… Levantou-se e deu alguns passos.


“Muito melhor,” disse ela. “Obrigada, querida.”

“De nada. Eu é que tenho muito que agradecer!”

Uma
das minhas memórias mais antigas é a da minha mãe a cuidar de mim
quando estava doente. Devo ter estado quatro ou cinco vezes de cama.
Acordava a meio da noite a respirar com dificuldade e a tossir muito,
como se os meus pulmões estivessem cheios de serrim. A minha mãe abria
então o duche de onde saía uma água bem quente, sentava-me ao lado da
banheira e friccionava-me as costas. Falava comigo com meiguice, até os
meus pulmões ficarem descongestionados…


No
nosso último dia nas montanhas, foi a minha vez de cuidar da minha mãe
que tem um problema auditivo crónico que a pode fazer sentir-se “como
se alguém estivesse a espetar-me um ferro na cabeça”, como ela própria
descreveu um dia. A tal dor tinha começado a incomodá-la nessa mesma
tarde e, enquanto jantávamos, eu via que estava a piorar. De vez em
quando estremecia e inclinava a cabeça para o lado. Assim que o jantar
acabou, tomou quatro analgésicos e foi para a tenda deitar-se.


Tentei
manter-me calma. Sabia que não corria perigo, mas vê-la sofrer
punha-me doente. A minha tia lembrou-se então do remédio caseiro da
minha avó, que eu improvisei, embebendo um pouco de algodão em azeite.
Com suavidade, tapei-lhe o ouvido com algodão e coloquei-lhe bem ao
lado da cabeça uma botija de água quente. Uns minutos depois a minha
mãe estava a dormir. Fiquei acordada a maior parte da noite, a ouvir o
vento a uivar e os cristais de neve a roçarem na tenda. Às 3:00 da manhã
fui dar com a minha mãe acordada, com dores. Apalpei a botija de água
quente. Estava morna.


“Vou
levantar-me e aquecer mais água,” sussurrei. “Não, não sejas tonta,”
murmurou em resposta. “Lá fora há uma tempestade. Fica no teu saco de
dormir. Eu estou bem.”


Quinze
minutos depois, com uma botija de água quente de novo encostada à
cabeça, ela dormia em paz. Deitada ali ao lado, ouvindo-a a respirar,
pensei Isto deve ser como quando um filho fica doente ou se magoa


No
dia seguinte levantámo-nos com nuvens cinzentas-escuras, ventos fortes
e dois centímetros e meio de neve. O tempo podia estar desolador, mas o
ouvido da minha mãe estava bem melhor. Ao descermos a montanha, a neve
atingia-nos vinda de todo o lado, o vento fustigava-nos as faces, e o
trilho tornava-se cada vez mais escorregadio. As gémeas pareciam ter
uma certa dificuldade. No entanto, a minha mãe tirou o nariz para fora
do capuz e olhou para um pinheiro a baloiçar-se como se fosse uma
simples agulha.


“Se
calhar deveríamos sentir-nos infelicíssimas aqui fora, nesta
tempestade,” disse ela, e a irmã terminou o seu pensamento, “mas, no
entanto, estamos muito bem!”


Pareciam duas profissionais com os seus bastões de escalada.

Foi
com imensa satisfação que as vi deslizar pela escorregadia vertente da
montanha com a mesma graça das esquiadoras nórdicas veteranas! Mas o
que mais me surpreendeu foi que não pareciam ter grande pressa em
voltar à civilização. Há uma semana atrás, aquele tempo agreste
tê-las-ia impedido de irem a pé até casa, mas agora lá andavam elas a
passear por ali, todas felizes, parando de boca aberta a olhar para os
toros da cabana fustigados pelo vento! Compreendi então que esta nossa
aventura tinha sido uma das mais gratificantes de sempre: a minha mãe,
que tinha dormido debaixo de um teto durante toda a sua vida, era, ainda
que temporariamente, uma verdadeira mulher da natureza!


Naquela
noite encontrámo-nos com os meus pai, tio, irmão e primo num
restaurante elegante. A minha mãe e a tia Linda — depois de um duche
retemperador, com o cabelo arranjado e as faces bem rosadas — pareciam
mais saudáveis e jovens do que nunca! Tagarelavam, excitadas, repetindo
os detalhes da viagem perante uma bem ansiosa audiência. Quando
serviram o café, a minha mãe voltou-se para o meu pai e disse “Danny,
havias de ter visto a Kristin. Tomou tão bem conta de nós! Fiquei tão
orgulhosa!”


“Engraçado dizeres isso, mãe,” disse eu. “Estava a pensar exatamente o mesmo de ti.”

Kristin Hostetter
Jack Canfield; Mark Victor Hansen, Steve Zikman
Chicken soup for the nature lover’s soul
Florida, HCI, 2004

(Tradução e adaptação)

_________________
Só discuto o que nao sei ...O ke sei ensino ...POIZ
Que batom combina com as montanhas? Batmoon_e0
Vitor mango
Vitor mango

Pontos : 117533

Ir para o topo Ir para baixo

Ir para o topo

- Tópicos semelhantes

 
Permissões neste sub-fórum
Não podes responder a tópicos