Vagueando na Notícia


Participe do fórum, é rápido e fácil

Vagueando na Notícia
Vagueando na Notícia
Gostaria de reagir a esta mensagem? Crie uma conta em poucos cliques ou inicie sessão para continuar.

Saltos Altos

Ir para baixo

Saltos Altos Empty Saltos Altos

Mensagem por Vitor mango Qui Jul 24, 2008 7:24 am

Saltos Altos
19 July 08 09:00 AM

A sociedadede consumo banalizou-se a tal ponto que perdemos em relação a ela o sentido crítico, aceitamo-la passivamente, deixámos de nos questionar sobre os expedientes que constantemente se inventam para nos obrigar a consumir mais e mais – mesmo em períodos de crise, como o que atravessamos.



Parece existir uma espécie de ‘central’ que emite ordens e cria diariamente novas fórmulas, novos modelos, para incentivar o consumo. Há técnicas antigas, que são mais ou menos conhecidas – como a disposição dos produtos nas grandes superfícies para levar os clientes a comprar bens supérfluos. Todos temos experiência disso: é muito raro irmos a um supermercado e não sairmos de lá com o dobro ou o triplo das compras que tínhamos planeado fazer.



Mas isto é a pré-história da arte de vender. As novas técnicas assentam, basicamente, em dois princípios.

Primeiro: levar as pessoas, através da moda, a consumirem em grandes quantidades produtos que antes consumiam em quantidades diminutas.



Segundo: alargar enormemente a base de consumidores.



Há 30 anos, a maioria das pessoas tinha um relógio. Os nossos avós tinham um relógio a vida inteira – um Omega, um Tissot, um Longines, marcas que ficaram míticas exactamente por serem ‘eternas’. Quando se comprava um relógio era para sempre – não se trocava de relógio por dá cá aquela palha, tal como não se trocava de mulher ou de marido.



A entrada no mercado dos relógios japoneses de contrabando – como os famosos Cauny Prima –, mas sobretudo a criação da Swatch, vieram revolucionar os hábitos. As pessoas deixaram de ter ‘um relógio’ – começaram a ter vários, de vários modelos, de acordo com a moda. Porquê? Porque o tipo de relógio e a cor da pulseira passaram a ter de condizer com a indumentária. Ao longo da vida, uma pessoa ‘que se preze’ não poderá, nos tempos que correm, ter menos de 20 ou 30 relógios.



E o que acontece com os relógios sucede com os sapatos. Há 30 anos as senhoras tinham meia dúzia de pares de sapatos: sapatos de Verão e de Inverno, sapatos mais claros e mais escuros, um par de cerimónia.

Mas também isso mudou. Primeiro, no que toca às cores: hoje as senhoras têm de ter sapatos de todas as cores, de acordo com a cor da roupa que vestem: sapatos azuis, verdes, amarelos, vermelhos, cor-de-rosa, brancos, de duas cores, etc. Depois, no que respeita aos modelos: tão depressa se usam sapatos com longas biqueiras (que ficam vazias, porque os dedos não chegam à frente, o que provoca a rápida deformação do calçado) como sapatos completamente arredondados (fazendo lembrar os das chinesas a quem punham ligaduras para não deixar crescer os pés).



Hà outras aberrações. Em certa altura usaram-se sapatos sem salto nenhum, completamente rasos, vendo-se mulheres baixíssimas (quase anãs) usarem alegremente esses modelos para não deixarem de andar à moda. Noutra época usaram-se solas grossíssimas, com as quais as raparigas pareciam caminhar sobre andas, sendo particularmente perigosas no atravessamento das ruas.



E já não falo das botas (de vários modelos) que as senhoras também não podem deixar de ter, nem das sandálias, nem das socas, nem das chinelas, nem das Crocs, nem das havaianas, ou seja, das ‘novidades’ que todos os anos são lançadas para obrigar a novos consumos.



E o que se diz para os relógios e para os sapatos poderia dizer-se para outras peças – sem falar do vestuário, porque só isso daria um livro. Já agora: como perceber que as mulheres portuguesas, que em geral têm a perna curta, tenham aderido tão entusiasticamente à moda da cintura descaída, que as faz parecer ainda mais atarracadas?



Vejamos agora outra questão: o alargamento da base de consumidores.



Isso é particularmente evidente pela análise da publicidade. Há 30 anos, a publicidade dirigia-se quase exclusivamente aos adultos: como os adultos é que tinham dinheiro para consumir, eram eles os principais alvos.



Hoje grande parte da publicidade é orientada para os jovens.



Aqui a Coca-Cola foi pioneira. Percebeu que os jovens iriam ser os grandes consumidores do futuro – e acertou. Por duas razões: porque os jovens passaram a ter dinheiro para gastar e porque são mais vulneráveis à mudança e à novidade.



Os anúncios de telemóveis, telecomunicações, vestuário, concertos e festivais, refrigerantes, bebidas alcoólicas, certas marcas de carros, gelados e doces, jornais e revistas, vídeos, computadores, internet, etc., são na esmagadora maioria concebidos hoje para os jovens.



E, além disso, vêem-se campanhas orientadas para nichos de mercado: campanhas dirigidas claramente aos africanos, aos emigrantes de Leste, etc.



Mas o alargamento da base de consumidores não se ficou pelo género humano – estendeu-se aos animais.



Com o aumento da solidão urbana, há cada vez mais pessoas a viver com animais – sobretudo cães e gatos, mas também pássaros, peixes, tartarugas, hamsters. E também aqui se criam novas necessidades de consumo.



Há dois anos, quando tive de comprar um champô para o Paco (o meu cão), profetizei: dentro de um ano ou dois, à semelhança do que acontece com os champôs para as pessoas, haverá champôs de todos os tipos para cães. Só me enganei no prazo: meia dúzia de meses passados as prateleiras dos supermercados enchiam-se de champôs para cães de todos os tipos: de pêlo curto e pêlo comprido, anti-alérgicos, com ph assim e assado, com vários aromas.



Falta falar das novas necessidades que se inventaram, onde as novas tecnologias têm um lugar de honra. Hoje, há objectos ‘imprescindíveis’ à vida das pessoas de que antes ninguém sentia a falta.

Mas aqui entramos num mundo onde a realidade ultrapassou há muito a ficção – e em que tudo aquilo que formos capazes de profetizar estará rapidamente desactualizado.



Até há pouco tempo ter um telemóvel era um luxo. Hoje não há quem não tenha dois ou três. E muda-se de telemóvel como quem muda de camisa: toda a gente quer ter o último modelo. E que dizer dos i-Pod, dos auriculares, das pens, das agendas virtuais, da internet sem fios…? Para não falar dos computadores – que começaram por ser objectos caseiros e se tornaram portáteis, transformando-se num produto de primeiríssima necessidade, sem o qual ninguém consegue agir… se não mesmo de existir.



Quem ‘inventa’ isto? Como são lançadas as ‘ordens’ que depois todos seguem? Às vezes, como disse, parece haver uma ‘central de comando’ a emitir orientações – que as grandes empresas, as multinacionais, os estilistas se encarregam de pôr em prática.



Parece existir uma espécie de ‘Deus do consumo’ que constantemente inventa novas formas de o expandir, de criar necessidades fictícias e modas absurdas que chegam a ridicularizar quem as adopta.

Sendo certo que não podemos fugir completamente ao apelo do consumo, tenhamos ao menos o espírito crítico necessário para não fazermos a figura ridícula da senhora de 1,40m de altura que andava de sapatos completamente rasos para brilhar com o último grito da moda.
Vitor mango
Vitor mango

Pontos : 117533

Ir para o topo Ir para baixo

Ir para o topo

- Tópicos semelhantes

 
Permissões neste sub-fórum
Não podes responder a tópicos