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UMA INTERVENÇÃO INOPORTUNA Mário Soares

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UMA INTERVENÇÃO INOPORTUNA   Mário Soares Empty UMA INTERVENÇÃO INOPORTUNA Mário Soares

Mensagem por Vitor mango Ter Ago 05, 2008 1:12 pm

UMA INTERVENÇÃO INOPORTUNA


Mário Soares
1Não parece ter sido muito feliz a intervenção, feita com pompa e circunstância, através das televisões, pelo sr. Presidente da República, no último dia de Julho passado, quando a maioria dos portugueses se preparava para ir de férias, procurando esquecer, por um mês, os problemas graves e complexos que os esperam no regresso. Não porque o tema que levantou não tenha pertinência e não seja uma preocupação legítima que lhe respeita. Mas pelas expectativas criadas e pelo momento e a forma que escolheu para o transmitir aos portugueses. Quando tudo vai depender da maneira como os deputados o irão debater - e tentar resolver - quando a Assembleia da República voltar a reunir-se, depois de férias. A questão que o Presidente levantou é de natureza político-constitucional e, na fase em que se encontra, cabe ao Parlamento agora pronunciar-se e não aos portugueses em geral. É por isso que vivemos em democracia representativa e num Estado de direito. E ao Presidente da República cabe a última palavra, quando tiver de homologar ou não o Estatuto. Por isso terá sido inoportuna - no tempo e na forma como a fez - a comunicação do Presidente da República.

Quando os portugueses comuns estão preocupados - talvez mesmo angustiados - com outras questões, bem mais importantes, para eles, sejam continentais ou insulares: o custo de vida, a subir de forma exponencial; a crise energética e os seus efeitos nas bolsas de todos nós e nas empresas; a crise financeira, que afecta directamente todos os que têm acções na bolsa e, indirectamente, os que as não têm; o desemprego, que está a crescer não só em Portugal como na nossa vizinha Espanha, o que também nos afecta, a prazo; o escândalo da corrupção, que alastra por todo o espaço europeu e, entre nós, quando se corre o risco de suspender e arquivar os processos que resultaram da chamada "Operação Furacão", do "Apito Dourado" e outros (o que seria um escândalo e contribuiria para o descrédito definitivo da justiça portuguesa); a paralisia e crise em que está mergulhada a União Europeia - e nós com ela -, que tanto nos toca, quer queiramos quer não; a "bolha" do imobiliário, que de Espanha se repercutiu em Portugal; e tantos outros problemas que os portugueses sentem na carne.

Ora, sobre tudo isto, o sr. Presidente tem-se referido sempre de fugida, muito discretamente, em breves respostas a perguntas circunstanciais que lhe fazem. Mas nunca fez um discurso de fundo. Não para pôr em causa a famosa cooperação estratégica com o Governo - que os portugueses têm, na sua maioria, apreciado -, mas para dar a conhecer o seu pensamento, aos portugueses, e indicar um rumo de esperança, quanto ao futuro.

Era isso, julgo, que todos esperavam quando foi anunciada uma "importante" comunicação do Presidente aos portugueses. Daí a frustração que se seguiu à comunicação do Presidente, que a maioria não terá sequer compreendido. Uma frustração que não deve repetir-se...

2George W. Bush, no final do seu mandato, está a ser obrigado, pela força das coisas, a renegar as suas convicções neoliberais. Foi o que aconteceu, discretamente, sem publicidade, em 30 de Julho passado, quando promulgou um ambicioso plano de ajuda para tentar salvar o sector imobiliário da dramática crise em que se encontra. Cerca de 400 mil proprietários de habitação, cujos juros e dívidas à banca não podem pagar, vão ter a possibilidade de recorrer a um fundo criado especialmente pela Administração Federal, no valor de 300 mil milhões de dólares, para se refinanciarem.

Quer dizer: o jogo livre do mercado é invertido pela intervenção do Estado para financiar os proprie- tários endividados. John Maynard Keynes tinha razão - e não os neoliberais - ao preconizar que a economia depende da política e não o contrário, motivo pelo qual o Estado deve ser forte e interventor, porque, em momentos de crise económica ou de grandes catástrofes naturais, os privados fogem e todos se voltam para o Estado, a pedir protecção.

Bush agiu assim forçado pelas circunstâncias, quando já está de saída, e deixará, segundo as melhores estimativas, um deficit de 480 mil milhões de dólares. Ao contrário de Clinton, que deixou um considerável superavit. Note-se que Bush foi apoiado nesta medida mais pelos representantes e senadores democratas do que pelos republicanos (três quartos dos republicanos na Câmara dos Representantes votaram contra). Muitos dos seus correligionários mais fiéis criticaram - e criticam - a medida tomada por Bush.

Curiosamente, quase ao mesmo tempo, o Fundo Monetário Internacional (FMI) publicou o seu estudo anual sobre o estado da economia americana. E lembrou - o que foi igualmente significativo - que a reforma da regulamentação financeira e imobiliária é necessária e urgente.

Realmente, a Reserva Federal Americana (FED), o Banco Central Europeu (BCE) e o Banco Nacional Suíço anunciaram, em finais de Julho, um reforço concertado de refinanciamento dos bancos comerciais e de investimento. Porquê? Para tentar travar a crise de crédito, aumentando a liquidez dos mercados monetário e interbancário. Trata-se de evitar que alastre a crise financeira, considerada já pior do que a de 1929. Mas há a recessão, o desemprego, a crise energética e alimentar, o pânico nas empresas e nas bolsas... O que será preciso mais para que se compreenda que o sistema neoliberal, que nos tem dominado, se transformou num desastre total que é preciso eliminar de vez?|
Vitor mango
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UMA INTERVENÇÃO INOPORTUNA   Mário Soares Empty Re: UMA INTERVENÇÃO INOPORTUNA Mário Soares

Mensagem por Vitor mango Ter Ago 05, 2008 1:15 pm

2George W. Bush, no final do seu mandato, está a ser obrigado, pela força das coisas, a renegar as suas convicções neoliberais. Foi o que aconteceu, discretamente, sem publicidade, em 30 de Julho passado, quando promulgou um ambicioso plano de ajuda para tentar salvar o sector imobiliário da dramática crise em que se encontra. Cerca de 400 mil proprietários de habitação, cujos juros e dívidas à banca não podem pagar, vão ter a possibilidade de recorrer a um fundo criado especialmente pela Administração Federal, no valor de 300 mil milhões de dólares, para se refinanciarem.

Quer dizer: o jogo livre do mercado é invertido pela intervenção do Estado para financiar os proprie- tários endividados. John Maynard Keynes tinha razão - e não os neoliberais - ao preconizar que a economia depende da política e não o contrário, motivo pelo qual o Estado deve ser forte e interventor, porque, em momentos de crise económica ou de grandes catástrofes naturais, os privados fogem e todos se voltam para o Estado, a pedir protecção

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