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Análises II

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Mensagem por Joao Ruiz Dom maio 16, 2010 10:08 am

Relembrando a primeira mensagem :

Vale do Ave revisited

por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje

Análises II - Página 2 Pedro-marques-lopes

1. Lembro-me dum "empresário" do Vale do Ave que no fim dos anos oitenta me dizia: "Não sei o que hei-de fazer a todo o dinheiro que me emprestam".

Para não decepcionar a gente que lhe queria, aparentemente a todo o custo, disponibilizar o dinheiro, ele lá o ia investindo. Uns Mercedes aqui, umas viagens às Caraíbas ali, uns apartamentos acolá, uns dinheiros para o clube de futebol da terra.

Entretanto, a sua fábrica laborava da mesma forma que há vinte ou trinta anos. As mesmas máquinas, os mesmos processos produtivos, o mesmo edifício, os mesmos mercados, a mesma publicidade, a mesma inexistente formação aos trabalhadores, a mesma estrutura de custos.

Passados uns anos, as encomendas começaram a escassear e, apesar de durante algum tempo os bancos ainda emprestarem algum dinheiro e de o Estado providenciar umas ajudas especiais , o nosso "empresário" viu-se em péssimos lençóis.

Claro está, a culpa era dos malditos bancos que o estavam a apertar e que ou lhe impunham certas medidas para sanear a empresa ou, pura e simplesmente, lhe fechavam a torneira.

É escusado referir que jamais lhe passou pela cabeça que a responsabilidade pela sua situação era dele e da sua gestão ruinosa. Além dos bancos, a culpa era dos mercados, dos chineses, dos impostos, do Estado que não o ajudava suficientemente, dos preguiçosos dos trabalhadores e até dum qualquer mau olhado.

Tenho-me lembrado deste senhor nos últimos tempos. Recordei-me dele na quinta-feira quando foram anunciadas as novas medidas contra a crise.

A empresa dele, como está bom de ver, faliu sem apelo nem agravo. Portugal não corre esse risco. Nem este é o pior momento da nossa história, nem a comparação entre uma qualquer empresa ou economia familiar se pode pôr ao mesmo nível dum país. Nós, como comunidade, temos, com mais ou menos sacrifícios, com mais avanços ou recuos, a possibilidade de começar tudo de novo. A nossa empresa comum não acaba.

2. A grande questão deste novo pacote contra a crise não é se era imprescindível subir os impostos ou se os cortes na despesa são ou não suficientes - temos de dar de barato, eu dou, que face à conjuntura não existiria outra solução. Como Silva Lopes - das pouquíssimas vozes lúcidas - referia na edição de sexta-feira deste jornal, se, neste momento, não tomássemos estas medidas, não seríamos capazes de obter financiamento externo e aí, sim, a catástrofe era garantida.

Mais uma vez, a pergunta fundamental é se, de uma vez por todas, conseguiremos aprender com os erros; se este enésimo sacrifício pedido mudará o que quer que seja; se passado este aperto tudo voltará a ser como dantes.

As medidas apresentadas de pouco ou nada servirão se não existir uma vontade convicta e expressa de mudar o paradigma em que vivemos, se as fulcrais e mil vezes repetidas reformas estruturais - justiça, competitividade, produtividade, educação, saúde, peso do Estado na economia, fiscalidade, reforma do Estado - não estiverem no cerne da estratégia política e do pacote de austeridade proposto.

No entanto, o actual estado das coisas tem responsáveis nacionais e não há crise internacional, ataque especulativo, egoísmo alemão ou colapso do sistema bancário que os ilibe.

Estamos a pagar, mais uma vez, décadas e décadas de políticas erradas, de opções estratégicas ruinosas, de discursos que, na essência, queriam dizer "depois logo se vê". Mas não podemos esquecer algo de básico: a maior responsabilidade é a próxima. Estando o diagnóstico há muitos anos feito, temos de perceber que quem conviveu com a situação, sabendo que estava a proceder de forma errada ou julgando que era a maneira acertada de agir, é o maior culpado.

O PS não pode fingir que não está no poder há quase quinze anos; que insistiu nos erros de sempre e os potenciou.

A pergunta já não é se os socialistas têm vontade ou se querem fazer as reformas fundamentais. O PS já mostrou que não conseguiu ou não quis transformar o País. A questão é se o PSD, cooperando nas medidas anticrise, tem como grande objectivo refundar todo o edifício económico, social e político. A paz social, a capacidade de a população suportar os sacrifícios depende, em grande parte, da esperança de que os sociais-democratas possam efectivamente mudar o País.

Do PS e deste primeiro-ministro já não esperam mais nada.

In DN

Análises II - Página 2 0002041D


Última edição por Joao Ruiz em Sáb maio 19, 2012 3:51 pm, editado 1 vez(es)

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Análises II - Página 2 Empty Um ano depois

Mensagem por Joao Ruiz Sáb Jun 09, 2012 8:58 am

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Um ano depois

por JOÃO MARCELINO
Hoje

Análises II - Página 2 Joao_marcelino

1. Um ano depois das últimas eleições legislativas há os factos: algumas das promessas do Governo não foram cumpridas (como vai sendo hábito); os impostos subiram todos; o desemprego aumentou imenso; a recessão está para ficar; os portugueses compreendem já que esta crise vai muito para além dos erros de um só governante.

A sondagem da Universidade Católica para o Diário de Notícias deixa claro o desgaste do Executivo de Pedro Passos Coelho, a retoma do PS em termos de intenção de votos e o crescimento da esquerda, na qual Francisco Louçã deita um olhar guloso ao fenómeno grego chamado Syriza.

2. Com honestidade intelectual, a verdade é que nem antes, nem agora, se pode ver o caso português fora do enquadramento da crise europeia.

A Espanha apresta-se agora para, nas próximas horas, pedir a ajuda capaz de salvar o seu sistema bancário do descalabro. E isso pode ser apenas o princípio do agravar da crise, para a qual até Bill Clinton pede uma solução aos decisores europeus que Christine Lagarde, diretora-geral do FMI, gostaria de poder fechar numa sala até saírem de lá com um compromisso...

Antes nem tudo foi culpa "do Sócrates".

Agora, nem tudo o que são factos maus pode ser imputado diretamente à governação de Passos Coelho.

Há uma componente externa que potencia todos os erros cometidos em Portugal e que castiga violentamente os países do Sul da Europa: a sua tendência para o recurso ao crédito, para os défices excessivos e para uma menor produtividade quando comparada com os homólogos do Norte.

3. Um ano depois, há coisas positivas na ação do Governo. A primeira delas, e a mais importante, é a convicção com que Passos Coelho e Vítor Gaspar estão a conduzir a aplicação do memorando de ajuda internacional. Cumprir com os credores, e com os contratos, não é uma questão de pormenor nem deve ser colocado como alternativa ao crescimento. Sem isso, o País não receberia as prestações acordadas e pararia em colapso simples. É em cima desse esforço que podem ser catalisadas as medidas de estímulo económico feitas com dinheiros da União, onde o Governo deve começar a ser menos alinhado. Chegará, com certeza, o momento em que precisaremos de mais dinheiro e mais tempo para chegarmos às metas estabelecidas.

O outro ponto francamente positivo tem a ver com a ação do ministro Paulo Macedo na saúde.

4. Um ano depois, há coisas negativas. A execução orçamental não está a correr bem; o Governo acumula já as suas polémicas laterais, com as do ministro Miguel Relvas à cabeça; confirma-se que a estrutura do Governo foi demasiado reduzida e conduziu a ministros extras, como António Borges; falta dinamismo na condução da atividade económica; há muita coisa a funcionar por impulsos, como a prevenção militar originada por mais uma crise na Guiné-Bissau.

5. Enfim, o País sobrevive. São tempos difíceis, no princípio de uma legislatura crítica, em que ainda não temos por certo que não venha a ser necessário um governo de legitimidade alargada. Não depende de nós, como aliás muita coisa. E até por isso o Governo não pode fraquejar no que lhe cabe, sem dúvida, fazer: equilibrar as contas públicas.

É esse o legado deste primeiro ano.

O Tribunal de Contas de Guilherme D'Oliveira Martins tem produzido nas últimas semanas um trabalho muito importante em matéria de fiscalização da atividade governativa (do anterior Executivo). Há ali matéria para investigar pessoas e responsabilizar política e, talvez, criminalmente. É avançar.

In DN

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Análises II - Página 2 Empty Às tantas

Mensagem por Joao Ruiz Dom Jul 15, 2012 11:16 am

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Às tantas

por Pedro Marques Lopes
Hoje

Análises II - Página 2 Pedro-marques-lopes2

No discurso sobre o estado da nação, o primeiro-ministro propôs ao PS que ajudasse o Governo a elaborar o Orçamento do Estado para 2013 e que os socialistas participassem nas reuniões, em que se fará a quinta revisão do memorando de entendimento, com a troika. Houve quem visse nestes convites uma proposta pública de entendimento com vista à formação de uma coligação.

À primeira vista poderia parecer que quem assim o entendeu estaria a cometer um exagero interpretativo. Para que diabo um Governo com maioria absoluta, que passa a vida a dizer que será inflexível no rumo escolhido, que tem tido no Partido Socialista uma espécie de silencioso parceiro de coligação, havia de convidar os socialistas para elaborar o mais importante instrumento político, a peça onde se reflectem as opções políticas, ideológicas e o caminho que se defende para o País? São, de facto, perguntas sem uma resposta evidente. O que leva a que a interpretação de que houve mesmo um convite não seja assim tão exagerada.

Há vários elementos que ajudam a dar razão a quem pensa que, às tantas, Passos Coelho está mesmo interessado em fazer uma coligação com os socialistas.

Em busca da legitimação perdida, seria o mote dessa coligação. É que não restem dúvidas: cumprir a meta de 4,5% de défice é absolutamente vital para o Governo.

Não será fácil explicar aos portugueses que todos os sacrifícios foram em vão. Que tiveram de suportar uma brutal subida de impostos, que muitos ficaram sem emprego, que milhares de empresas faliram, que, em resumo, o País ficou pior para rigorosamente nada. O discurso político do Governo resume-se ao controlo do défice, se não o consegue controlar não lhe resta discurso nenhum, terá de criar outro, e, nesse caso, qualquer coisa teria de mudar ou ser acrescentada. Não, uma remodelação governamental não chegará para mudar a mais que certa sensação de engano que os portugueses sentirão.

Não é preciso ter uma bola de cristal para saber que o orçamento para 2013 não será propriamente fácil de apresentar, e muito menos de executar. Se, este ano, com toda a austeridade, tudo indica que o défice chegue perto dos 6% (logo vemos, logo vemos), o que terá de ser feito para atingir, como consta do memorando de entendimento, 3%... não augura nada de agradável - o aumento brutal da carga fiscal é inevitável, com as consequências já conhecidas, e a degradação da saúde e educação públicas é mais que certa. Mesmo que a troika envie mais dinheiro, mesmo que aceite um valor de défice mais alto, nada aponta para que, na essência, a receita seja mudada e que os níveis de austeridade diminuam, bem pelo contrário. Agora, imagine-se o tipo de reacção dos portugueses quando lhes for dito que apesar de não termos atingido os objectivos, da receita se ter revelado errada, ainda se vão pedir mais sacrifícios e se vai reforçar a dose de austeridade.

Pois é, Passos Coelho é capaz de estar mesmo a pensar numa coligação. E, verdade seja dita, António José Seguro tem dado sinais de não ser completamente avesso à ideia. Para já, não a descartou imediatamente no debate. Vale a pena lembrar que Seguro não se opôs às principais medidas governamentais, mesmo as que não constam no acordo com a troika; a alternativa que tem apresentado é conhecida: mais um ano - até deputados do PSD já sugeriram dois. No fundo, o que parece distinguir Passos de Seguro é a dose, não a receita. Nada mais fácil de acomodar.

Não será preciso, também, lembrar o agrado com que o Presidente da República encararia uma solução destas, particularmente se lhe fosse permitido sugerir meia dúzia de pessoas. Cavaco Silva seria o primeiro a apelar à responsabilidade de Seguro para que num momento particularmente difícil esquecesse as suas ambições em prol do País. Todos sabemos a sensibilidade do secretário-geral para o tema responsabilidade.

Vamos chegar a Outubro, altura da apresentação do orçamento mais exigente da história da democracia portuguesa, com um primeiro-ministro fragilizado por não ter cumprido as metas a que se propôs, um líder de oposição fragilizado por não ter conseguido construir uma alternativa e um Presidente fragilizado pelos disparates conhecidos e com a mais baixa taxa de popularidade desde o 25 de Abril. Tanta fragilidade faz temer o pior.

Não consigo imaginar uma solução politicamente pior para o País que uma coligação PSD/PS, mas que é mais provável do que parece ninguém tenha dúvidas.

(Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico)

In DN

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Análises II - Página 2 Empty O valor das palavras

Mensagem por Joao Ruiz Sáb Jul 28, 2012 8:37 am

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O valor das palavras

por JOÃO MARCELINO
Hoje

Análises II - Página 2 Joao_marcelino

1Na segunda-feira Mario Draghi, governador do Banco Central Europeu (BCE), dizia que a poderosa organização que dirige não estava para resolver os problemas dos países em crise. Três dias depois, em voz pausada, depois de uma reunião londrina, veio uma declaração em sentido aparentemente contrário, imbuída do espírito olímpico que já deveria animar as instituições europeias há mais tempo: "O BCE está disposto a fazer o que for necessário para preservar o euro. E, acreditem, será o suficiente."

É conhecido o regozijo das bolsas e a imediata recuperação do euro face ao dólar. Falta entender as motivações políticas que terão levado a esta inflexão do discurso, que é toda uma novidade para além de uma necessidade há muito tempo apontada por muita gente na Zona Euro: que o BCE atue firmemente no mercado da dívida e ajude a baixar os juros que agora se abatem sobre a Espanha e a Itália, dando outra dimensão, ainda mais grave, à crise europeia.

Se ainda falta saber como se dará seguimento a estas virtuosas palavras de Draghi, e como elas se vão articular com outras intenções (a partir dos limitados fundos de resgate permanente do Mecanismo Europeu de Estabilidade) para formar o tal "escudo antijuros" de que falava o seu compatriota Mario Monti, o primeiro-ministro não eleito de Itália, é pelo menos um pouco tranquilizador entender que as instituições europeias vão, apesar de tudo, trilhando o caminho do realismo.

2 As palavras de Draghi são importantes pelo conteúdo, que terá de ser entendido muito rapidamente (talvez a partir da reunião do conselho dos governadores, na próxima quinta-feira, em Frankfurt), mas também porque permitem acreditar que a solução da crise europeia pode ter outros protagonistas que não apenas a chanceler alemã, Angela Merkel - que, curiosamente, está de férias neste preciso momento.

A União Europeia precisa que todas as suas instituições revelem autonomia em relação ao passo marcado pela Alemanha. O caminho seguro, de responsabilização, muitas vezes não bem recebido pelas opiniões públicas e publicadas, imprimido a partir de Berlim, era, e é, necessário, mas não pode anestesiar as responsabilidades da comissão de Barroso, do conselho de Van Rompuy e, claro, do banco de Draghi, entre outros. E o que é válido para as instituições é-o igualmente para os países.

3 O que não se percebe da ação do Governo português neste contexto da crise é precisamente que não produza declarações de independência que revelem autonomia em relação à "medicina" decretada; que não apareça a marcar terreno quando os pretextos são já mais que muitos, das declarações de responsáveis do FMI ao relatório, também, de anteontem da OCDE onde está, preto no branco, a recomendação para Portugal equacionar o deixar resvalar o défice em contraponto a arriscar uma recessão mais profunda. Quando esta realidade se impuser, e a inevitável "autorização" chegar, vai parecer que o Governo português foi um simples beneficiário, colateral, das necessidades gerais - e Portugal um País marginal, periférico até, na discussão.

Entre a convicção no caminho e as retificações na estratégia define-se a liderança política, e também a forma como os cidadãos olham os seus circunstanciais representantes.

Pedro Passos Coelho parece acreditar que o papel de bom e disciplinado aluno é tão importante para o País que um dia as virtualidades dessa paciência serão compreendidas pelos eleitores. Não há a certeza disso.

E por falar em marcar terreno: Paulo Portas, numa "oportuna" carta aos militantes do CDS-PP, deixou bem claro que os impostos chegaram ao limite e que recusa estender aos trabalhadores do privado os cortes admitidos precipitadamente por Passos Coelho no dia em que soube da decisão do Tribunal Constitucional sobre a impossibilidade de retirar aos funcionários públicos e pensionistas regalias adquiridas em 2013 e sabia-se lá até quando. Para bom entendedor, Portas explicou-se bem... Ou seja, o primeiro-ministro está a perder o tempo de entrada lá fora e cá dentro. Mau sinal.

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Análises II - Página 2 Empty A monja e o capitalismo não ético

Mensagem por Joao Ruiz Sáb Jul 28, 2012 8:45 am

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A monja e o capitalismo não ético

por ANSELMO BORGES
Hoje

Análises II - Página 2 Anselmo_borges

Nasceu em Barcelona em 1966. É doutorada em Medicina e em Teologia. Muito conhecida pelas suas posições feministas e pelas críticas às multinacionais farmacêuticas, Teresa Forcades é uma monja beneditina do Mosteiro de Sant Benet de Monserrat.

Conheci-a em Julho de 2011, em Santander, num Congresso de Teologia e Ética, e a impressão que me ficou foi a de uma mulher séria e agradável, descontraidamente inteligente e interventiva.

Foi recentemente convidada para a conferência inaugural de um encontro de empresários, talvez o mais importante da Catalunha, com a presença de umas seiscentas pessoas.

Ela é absolutamente favorável ao empreendedorismo. Quereria que isso fosse uma possibilidade para todos, pois isso significa realizar possibilidades e ter iniciativas próprias. Mas põe em causa o empresariado baseado numa relação contratual num quadro capitalista sem ética. Por três motivos.

É uma mentira o mercado que se diz livre. De facto, ao longo da história, o mercado nunca foi livre. "Foi sempre regulado a favor de certos interesses: da realeza, interesses proteccionistas, da classe dominante, do parente dos governantes de turno." Mercado livre é "uma hipocrisia, uma falácia".

Depois, a lógica do capitalismo, no quadro do mercado global, quer "o máximo lucro". Ora, é aberrante, do ponto de vista antropológico e humano, pensar que a melhor maneira de incentivar as pessoas, a sua criatividade, a actividade económica e, em última análise, o crescimento, seja o lucro máximo. Satisfeitas as necessidades básicas, "o que me estimula não é o dinheiro", mas a curiosidade intelectual, o desafio de descobrir potencialidades e encontrar quem ajude a realizá-las, o apreço dos colegas, a valorização do trabalho que faço, ver que o trabalho das pessoas transforma de modo positivo as suas vidas. Porque não criar uma sociedade fundada no que verdadeiramente nos dá gosto e nos realiza? E o direito à alimentação, à educação, à saúde, à reforma tem de estar acima do mercado e do lucro.

Portanto, o capitalismo não lhe parece ético. E assume a crítica marxista da mais-valia, dando um exemplo: no mosteiro, temos uma pequena empresa de cerâmica e há uma pessoa de fora que lá trabalha; se lhe pagarmos um euro e ganharmos mil, o capitalismo dirá: que bem! "Mas isto é indigno, pois vai contra a dignidade do trabalho." Há diferenças aberrantes: num contrato, "talvez esteja bem que eu ganhe um e tu ganhes quatro ou até dez, mas mil não pode ser de modo nenhum".

É, pois, claríssimo que temos de pensar e organizar uma alternativa. "Quem nos ensinou a não confiar que não nos podemos organizar melhor, ao constatarmos, como constatamos, que o modo actual é tão claramente contrário aos interesses da maioria?" O bloqueio da imaginação é um sinal de alarme. É como se se tornasse não possível para mim, que sou monja e prefiro esta vida, imaginar para mim própria uma vida fora do mosteiro. "Se já nem sequer posso imaginar uma alternativa, creio que isso é um sinal de alienação mental."

O que é e aonde leva a especulação? Eu compro todo o trigo e guardo-o. As pessoas vão morrendo, mas, quando os preços subirem, vendo pelo dobro. "Isto aconteceu, e estes senhores do Goldman Sachs sentam-se nas primeiras filas dos convénios e recebem prémios, mas deviam estar na cadeia." São responsáveis por mortes. Jean Ziegler, das Nações Unidas, diz que isto é assassínio organizado. Presentemente, produzem-se alimentos para 12 mil milhões de pessoas, mas há mil milhões com fome. Cada dia morrem 26 mil crianças de fome.

A conversão fundamental é, na nossa visão do mundo, a da passagem da relação sujeito-objecto para uma relação sujeito-sujeito, substituindo assim uma relação de dominação por uma relação de jogo de subjectividades, no qual entram dignidades.

Se continuarmos nesta "alienação mental", neste bloqueio da renovação social, porque os políticos só pensam nas próximas eleições, sem capacidade para criar uma alternativa, a nossa situação pode piorar e podemos assistir a um fascismo social e político e até a uma guerra.

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Análises II - Página 2 Empty O Estado e os partidos

Mensagem por Joao Ruiz Sáb Ago 11, 2012 8:54 am

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O Estado e os partidos

por JOÃO MARCELINO
Hoje

Análises II - Página 2 Joao_marcelino

1. As chamadas parcerias público-privadas (PPP), criadas no tempo dos Governos Cavaco Silva, eram uma razoável construção teórica. Os privados construíam logo. Os gover- nos garantiam e pagavam a prestações. A lógica, a reboque de uma certa ideia de progresso, sobretudo no alcatrão, decalcava a fúria consumista que então se começava a abater sobre a sociedade portuguesa para gáudio dos bancos.

Se as PPP se tornaram o escândalo que hoje se conhece, isso não foi principalmente culpa dos privados. As empresas propõem os negócios que entendem. O problema esteve em que, do outro lado, o dos partidos - perdão, o do Governo -, sempre esses privados puderam contar com gente pouco capaz de defender os interesses do País. Fosse por benigna incompetência ou lá pelo que fosse.

2. A feliz mando da troika, e porque o Tribunal Constitucional também decidiu o que decidiu em relação ao ataque aos sa- lários da função pública e às pensões, começou agora a renegociar-se estas PPP. Em apenas duas, e sem sair do sector rodoviário, o Estado poupou 400 milhões numa e 80 noutra!

Não sabemos se houve muito esforço negocial ou se foi coisa simples em função do eventual carácter leonino de ambos os contratos. O certo é que se fez, e rápido, como o País exige e as finanças precisam.

3. Este exemplo mostra como é frágil o poder em Portugal. Dá-nos uma ideia de como os partidos, que deveriam chegar ao poder para servir o Estado e os cidadãos, sempre que têm oportunidade se aliam aos interesses privados, e só mostram verdadeira von-tade reformista perante a absoluta necessidade. Não foi por acaso que, descontada a atual crise da Zona Euro, que amplia a dimensão da nossa precariedade económica, Portugal já vai na terceira ajuda externa desde Abril de 1974.

Mandados, os partidos - perdão, os governos - fazem.

Deixados à rédea solta é o que se sabe.

E é sobre esta realidade brutal que uma ínfima parte dos portugueses, militantes dos partidos, insistem em discutir o acessório: quem é que tem a culpa maior, o PS ou o PSD? Alguns, genuinamente, parecem até acreditar que a polémica, derramada em entrevistas, artigos, intervenções e posts, faz sentido para a grande maioria dos portugueses.

4. Bem se sabe que em todas as sociedades é mais ou menos assim. O Homem, mais as suas fraquezas, vale o que vale - e vale o mesmo em toda a parte.

A grande diferença da sociedade portuguesa, em comparação com as demais europeias, é a fraqueza da sua estrutura de cidadania. Os portugueses, de uma maneira geral, vivem pouco a dimensão coletiva e perdem-se nos seus afazeres. Protestam pouco, vigiam quase nada. Há pouco movimento associativo, faltam candidaturas políticas independentes, seja no poder local seja para a Presidência da República.

Este caminho que desagua nas PPP, no BPN, no Freeport, e por aí adiante, só tem a ver com a forma como os partidos, essenciais ao funcionamento de democracia tal qual a entendemos, têm feito parte do pro- blema.

Zita Seabra, antiga militante comunista, insinuou esta semana uma coisa terrível: o PCP ter-se-á servido, nos anos 80, do empresário Alexandre Alves, que teve uma empresa de ar condicionado (a cuja falência soube fazer escapar os seus haveres...), para promover escutas em importantes lugares do Estado! A insinuação é brutal e cava ainda mais a desconfiança dos cidadãos em relação aos partidos.

In DN

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Análises II - Página 2 Empty Golpe de Estado financeiro

Mensagem por Joao Ruiz Sáb Ago 11, 2012 9:03 am

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Golpe de Estado financeiro
por ANSELMO BORGESHoje17 comentários

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O pior que pode acontecer é o medo, porque não há confiança nem horizonte a abrir caminho. Mesmo sem se ser pessimista, percebe-se que a humanidade se encontra numa encruzilhada e é preciso estar preparado para o pior.

Nestas circunstâncias, não bastam boas intenções. É preciso reflectir e tentar ver claro. Deixo aí alguns pensamentos sobre a crise, a partir de reflexões do teólogo José Ignacio Calleja, prestigiado professor de Teologia Moral Social na Faculdade de Teologia de Vitoria, num texto em que afirma precisamente que "há um golpe de Estado financeiro no mundo, gerido por políticos", sendo necessário "impedir o fascismo social, para poder sair da crise".

É verdade que a crise é também de cultura moral e espiritual, mas não é possível avançar sem uma implicação séria e a fundo na social. Não se pode pretender fugir ao problema social, invocando apenas o caminho da crise espiritual e de valores. "Nada mais alienante e falso do que a religião desencarnada."

Aí ficam, pois, algumas reflexões fundamentais.

1. Na base, está "uma globalização económica, gerida no quadro do neoliberalismo, que apodreceu especulativamente todo o sistema financeiro e social". Para se ganhar dinheiro, este já não tinha de passar pela produção, pois o lucro tornava-se incomparavelmente mais fácil e vantajoso num mercado de capitais, "único, opaco e sem controlo sério". A apregoada auto-regulação não funcionou e o vírus especulativo tudo infectou e tornou-se incurável. Agora, há quem queira baixar a febre, mas, sem se ir às causas profundas, não se consegue. Sem reconhecer as causas desses efeitos e "os grupos sociais enriquecidos" que os protagonizam com vantagem, não se vai lá.

2. Com o objectivo de encontrar paliativos para esses efeitos, mas sem descer ao fundo do mal, "há um golpe de Estado financeiro no mundo, com especial efeito nos elos mais débeis do sistema dos ricos e subordinação das democracias e dos gestores políticos do momento ao poder financeiro".

3. No sentido de pensar uma resposta alternativa, J. I. Calleja apresenta algumas pistas.

Uma: "Impedir socialmente o que alguns já chamam o fascismo social", ou seja, que cada sector da população, encostando-se ao velho princípio do "salve-se quem puder e cada um que se arranje", aceite tudo o que viola os direitos dos outros, desde que os nossos não sejam afectados.

Outra tem a ver com a justiça e a equidade nos impostos e com o modo como estão a ser repartidos os esforços e as dificuldades, sem capacidade para tocar nos privilégios injustos inclusivamente da classe politico-partidária. Entre parêntesis - lembro eu -, não se pode esquecer que Portugal continua a ser um dos países ou mesmo o país da União Europeia onde o abismo entre os muito ricos e os muito pobres é mais fundo. "Sem uma reforma fiscal, orçamental e política profunda, não há saída para a solidariedade, imprescindível hoje."

Em terceiro lugar, é necessário aprofundar a convicção de que "não há saída, sem o controlo 'social-democrático' do sistema económico e financeiro internacional e nacional, na sua opacidade, desregulação, acumulação e 'soberania expropriada'". Os governantes do G20 não se podem esquecer do que disseram no início da crise - Bento XVI juntou-se-lhes com entusiasmo na sua encíclica "Caridade na Verdade" -, exigindo "refundar o capitalismo, regular o sistema financeiro internacional, acabar com os paraísos fiscais (aqui, lembro que os média davam conta nestes dias dos biliões dos super-ricos nesses paraísos, sem pagamento de impostos), desenvolver a taxa Tobin". De outro modo, não há democracia, pois o que fica é "a obediência a um golpe de Estado financeiro".

Talvez não se esperasse a última exigência, mas estou de acordo com ela e julgo que é fundamental. Escreve: Se se quiser uma saída justa e duradoura, é imprescindível uma vida moderada, "o decrescimento no desenvolvimento, para viverem todos com menos e bem". Isto é muito difícil politicamente, mas é necessário a curto prazo. Nem os recursos nem o ecossistema geral da vida nos permitem outra alternativa.

In DN

Rolling Eyes

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Análises II - Página 2 Empty O postulado SPECTRE

Mensagem por Joao Ruiz Seg Ago 20, 2012 3:07 am

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O postulado SPECTRE

por JOÃO CÉSAR DAS NEVES
Hoje

Análises II - Página 2 Joao_Cesar_das_neves

Pense na origem da crise que nos aflige. Considere os causadores dos males, corrupções, crimes, explorações. Falamos muito mas pouco sabemos deles. E devíamos saber. Desde a antiguidade os sábios recomendam o conhecimento dos inimigos. Ajuda-nos a compreender o mundo.

Primeiro é bom situá-los, saber quem são. A maior parte acusa os políticos, os corredores do poder, salas de ministérios, gabinetes do Parlamento. Lá estão os manipuladores emproados que roubam o povo e destroem a liberdade. Outros dirigem a sua atenção para a economia, os conselhos de administração, bancos e mercados financeiros onde se compra influência e se vende felicidade. Há também os que lançam acusações a lugares mais distantes: o Clube de Bilderberg, os encontros de Davos, Internacional Socialista, Vaticano, império americano, Al-Qaeda, Maçonaria, Opus Dei, etc. Cada um destes, e muitos outros, têm em comum serem criticados, insultados e acusados pela desgraça do mundo.

Pode resumir-se esta teoria de conspiração numa palavra: SPECTRE. Os filmes de James Bond, agente 007, costumavam começar com uma reunião dos maus planeando a destruição do planeta. Hoje a cada passo encontramos quem baseie nisso a explicação da situação mundial. Em particular desde a crise financeira de 2008, a ideia do grupo de maus tornou-se contagiosa. Varia a identidade, acusando-se as mais diversas instituições, mas não enfraquece a certeza. Um exercício interessante é considerar precisamente esse grupo, quem quer que seja. Olhe então para o seu ódio de estimação.

A primeira coisa a notar é que lá estão seres humanos. Não são monstros, extra-terrestes, zombies, psicopatas ou super-heróis. Apesar da propaganda cinematográfica, na vida real esses seres míticos não existem. Só cá estamos nós. No local de todos os males há apenas gente. Pessoas que tiveram pai e mãe, que amam, sofrem, têm sonhos, desilusões, medos e alegrias. Todo o mal do mundo é feito por gente.

Este é o ponto central do exercício: ver o inimigo como uma pessoa. Vê-lo como próximo. Alguém como eu, que olha as coisas de forma diferente da minha. Às vezes, é preciso dizer, sou eu mesmo. De facto, ao definir a causa suprema do mal, muitos incluem aí gente como nós. Árabes e chineses acusam os ocidentais e vice-versa, como patrões e sindicatos, alunos e professores, clientes e lojistas se vêem mutuamente como culpados. Ora no banco dos réus as acusações parecem bem diferentes.

Mas se são gente, como podem fazer as coisas horríveis de que os acusamos? Como podem ser tão sedentos de dinheiro e poder? Tão obcecados pelo lucro e glória? Tão insensíveis ao mal alheio, miséria, injustiça? Como podem ser como são? Há várias respostas para a questão, todas educativas.

A explicação simples é que, afinal, não sejam como eu os vejo, e a minha acusação seja falsa. O mundo é muito mais complexo que as minhas teorias. As certezas que obtive por extrapolação linear, e que acabam na acusação taxativa, estão bastante longe da verdade. Ver o ponto de vista do inimigo ajuda a perceber isso. Nesse caso eu terei de abandonar o que me é mais querido, o meu ódio de estimação.

O ódio é sempre mau conselheiro. Mesmo quando tem razão. Por muito simplista que a minha teoria seja, ela tem sempre um grão de verdade. Conhecemos casos de pessoas sedentas, obcecadas, insensíveis. Afinal os seres humanos podem ser horríveis. Eu sei, porque o sou há muitos anos. Os homens são capazes do melhor e do pior. Como eu.

Apesar disso, sendo humanos, todos partilham a característica fundamental: procuram a felicidade e querem ser amados. Mesmo o pior bandido é assim, por ser humano. É fácil esquecê-lo no meio das nossas acusações. Porque ao descarregar as fúrias no nosso SPECTRE ficamos sedentos, obcecados, insensíveis, capazes do pior. E assim damos razão aos que nos acusam. "Nunca mandes saber por quem os sinos dobram; eles dobram por ti" (John Donne, 1624).

Os sábios recomendam o conhecimento dos inimigos. Apenas um disse para amarmos os inimigos: Mt 5, 44; Lc 6, 27.

In DN

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Análises II - Página 2 Empty Mais desiguais

Mensagem por Joao Ruiz Dom Set 02, 2012 4:09 am

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Mais desiguais

por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje

Análises II - Página 2 Pedro-marques-lopes2

Há uma consequência do revolucionário ajustamento: vem aprofundar ainda mais um problema endémico da sociedade portuguesa, a desigualdade.

Os números sobre o aumento de pessoas que ganham apenas o salário mínimo e os níveis de desemprego são prova disso. Convém não esquecer que as principais medidas para controlar as contas públicas e atingir os objectivos do défice teriam sempre como consequência o aumento da desigualdade. Portugal já é o mais desigual país da União Europeia e deliberadamente vai ser ainda mais.

O aumento dos impostos indirectos, os cortes de salários dos funcionários públicos, o corte nas pensões, o aumento do preços dos transportes, da electricidade, da água, afectam sobretudo a classe média, a mais baixa classe média. Não parece ser necessário enunciar que o aumento do IVA ou a subida de preços de transportes faz diminuir proporcionalmente muito mais o rendimento dos mais pobres do que dos mais ricos. Mais, sabemos que o sistema de saúde publica foi, a par com a educação pública, um dos factores de diminuição da desigualdade no século passado em Portugal. Se se põe em causa esse acesso as consequências serão devastadoras para o equilíbrio social.

A classe média portuguesa não é propriamente semelhante à da maioria dos países da União. Convém recordar que o salário médio em Portugal é cerca de 750 euros. O programa de empobrecimento em curso não diminuirá apenas o poder de compra da classe média, transformará essa imensa maioria em gente pobre.

Níveis de desigualdade como os que temos e como os que vamos ter corroem a comunidade. Potenciam a percepção de existirem cidadãos de primeira e segunda classe, impossibilitam a concertação social, põem em causa aquilo que é a verdadeira argamassa social: a confiança entre os cidadãos. Sem a sensação de que há direitos e deveres iguais, que os sacrifícios são equitativamente distribuídos, que a justiça não distingue ricos e pobres (e essa impressão já existe) a sociedade corre o risco de desintegração. Quanto mais duro for o momento que uma comunidade viva, mais necessária é a sensação de pertença e de desígnio comum, e, que não restem dúvidas, a desigualdade extrema potencia todos os conflitos.

Claro está, o Governo - e a troika - está convencido de que este evidente agravamento da desigualdade será momentâneo ou pelo menos invertido num curto espaço de tempo. No fundo, o Governo acredita que desta forma será possível construir riqueza e que só a construindo se poderá depois distribuir. Esse caminho tem vários problemas. O primeiro é estar longe de ser provado que a fórmula que está a ser aplicada crie riqueza, os resultados até agora conhecidos provam exactamente o contrário. Mais, os países com mais bem-estar, mais desenvolvidos, com mais regalias sociais são as terras em que a desigualdade é menor e que cresceram sem a porem em causa. Se isto não diz nada sobre as consequências de ainda maior desigualdade não sei o que dirá. E que não restem dúvidas: a democracia corre sérios riscos. Atirar ainda mais pessoas para a pobreza, retirar ou dificultar o acesso à saúde e educação não será sustentável politicamente numa fase em que tanta gente está privada dos mais básicos bens. Já foi dito e redito: o amor à democracia não está no DNA dos povos, ninguém troca pão por votos. Experiências de grande crescimento económico nestes moldes existiram em ditaduras, nunca em democracias. Chile e agora a China são dois bons exemplos. Não deixa de ser perturbante que a direita portuguesa esteja distante do debate sobre a desigualdade e que dê de mão beijada à esquerda a liderança da análise deste problema. O combate contra a desigualdade não é, nunca foi, um exclusivo da esquerda, é uma questão civilizacional que a direita europeia - até a portuguesa com a normalidade democrática - liderou em diversas alturas. Mas é difícil pedir o que quer que seja ao PSD, ao nível da reflexão sobre as grandes questões, quando o partido está ideologicamente dominado por gente que se formou na extrema-esquerda ou por rapazes que nunca saíram da faculdade. Melhores dias virão.

In DN

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Mensagem por Joao Ruiz Dom Set 02, 2012 4:25 am

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O que importa

por PAULO BALDAIA
Hoje

Análises II - Página 2 Paulobaldaia

Os senhores da troika andam por cá, e de todas as coisas que nos podiam dizer há uma que com toda a certeza não nos vão dizer: paguem com honra o que devem, mas vivam com dignidade e demorem o tempo que for necessário para pagar até ao último tostão. Não queremos que nos digam demorem o tempo que quiserem, porque conhecemos a natureza humana e a facilidade com que se perde a honra não pagando. O que precisamos é, apenas, de mais tempo para cumprir as metas do défice do Estado e do endividamento externo.

O défice do Estado não é sequer o principal problema do País. Obviamente que um Estado que vive em défice permanente aumenta a sua dívida, mas não é isso que nos deixa nas mãos dos credores internacionais que nos impõem esta austeridade que se começa a tornar insuportável. O défice externo, a diferença entre aquilo que vendemos ao estrangeiro e o que importamos, é bem mais importante. E aí, por razões antagónicas, estamos a fazer caminho. A boa razão é o facto de estarmos a aumentar as nossas exportações, mesmo para mercados que estão em crise. A má razão é estarmos a diminuir as nossas importações porque a pobreza faz que o consumo interno caia a pique.

No ajustamento económico que estamos obrigados a fazer, o principal problema também não é o desemprego que estamos a criar. Numa economia saudável, as empresas que não são viáveis fecham para dar lugar a outras que melhor se adaptem ao mercado global, mas isso não acontece de um dia para o outro. O problema, portanto, é a capacidade do Estado de cumprir a sua função de redistribuição da riqueza, apoiando os que querem trabalhar mas não encontram emprego. E aí estamos a regredir décadas.

O que importa, portanto, é que o Governo e a oposição se entendam sobre a necessidade de afirmarem um modelo para o País em que a questão económica prevaleça sobre a questão financeira. Uns e outros devem obrigar-se a falar verdade ao povo que trabalha e ao que quer trabalhar mas não pode. O que importa para definir a nossa qualidade de vida é o que somos capazes de produzir para consumir ou para "trocar" pelo que não produzimos mas queremos consumir.

A legislação (laboral, de regulação dos diferentes sectores, da aplicação da justiça, etc...) é muito importante, mas não chega. O que importa é que nem quem governa veja no seu posto um trampolim para uma vida melhor no civil, o que muitas vezes é conseguido à custa de uns favores ao grande capital, nem que o povo apenas se lamente da sua má sorte. Todos temos de saber viver com aquilo que somos capazes de produzir em cada momento. O que importa (bem sei que soa a frase feita) é mudar de mentalidades. A vida fácil há muito que acabou.

In DN

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Mensagem por Joao Ruiz Qua Set 05, 2012 6:11 am

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RTP e serviço público

por VASCO GRAÇA MOURA
Hoje

Análises II - Página 2 Vasco_graca_moura

A discussão sobre o futuro da RTP tem dado lugar a uma multiplicidade de excitações tão bizarras quanto dispensáveis e também tem suscitado reflexões sobre o serviço público de rádio e televisão previsto na Constituição da República. Dessas reflexões resulta que ninguém sabe bem do que se trata quando se fala de serviço público e que é necessário começar por elaborar, delimitar e clarificar esse conceito. Mas, sendo assim, se nem o legislador, nem os partidos políticos e respectivos ideólogos, nem os especialistas da comunicação social são capazes de responder satisfatoriamente às questões suscitadas, fica-se na impossibilidade de achar à partida que a RTP esteja a prestar um serviço público em toda a extensão desejável e com todo o empenhamento, qualidade e credibilidade que são necessários...

Parece ser mais ou menos residual o carácter do serviço público cuja existência e funcionamento devem hoje depender do Estado. A comunicação social, o universo mediático e as suas tecnologias evoluíram muito nas últimas décadas. Por serviço público garantido pelo Estado deve entender-se aquele conjunto de prestações cuja existência regular é reputada de interesse nacional, mas que não são asseguradas pelas televisões comerciais. Mas também é difícil excluir as televisões comerciais da prestação de um verdadeiro serviço público (e prestam-no, como é evidente, em muitos aspectos), sendo possível conceber situações de complementaridade útil entre os vários parceiros em presença.

Também ocorre ponderar que, sendo inegável a relevância de uma projecção do serviço público de televisão nas áreas do mundo em que se fala a língua portuguesa e naquelas em que se radicou uma nossa emigração significativa, não basta o simples facto de haver emissões que são consagradas a essas audiências. Teríamos de ver que tipo de programação lhes é proposto. Nos dez anos em que fui deputado europeu (1999-2009), em quase todas as noites que passei em Bruxelas e em Estrasburgo desisti de ver mais do que os noticiários na RTP Internacional, tão fraca era a qualidade da maior parte da programação...

Por outro lado, haverá quem acredite seriamente que a RTP se aguentaria apenas com os 140 milhões de euros anuais correspondentes à taxa? Ou que está "quase" em vias de dar lucro? Independentemente dos méritos que sejam reconhecidos à gestão dos últimos anos e dos equívocos em que se possa cair quanto a tais perspectivas empresariais e financeiras, também se deve perguntar se alguém se convence de que a parte mais substancial da programação que nos é apresentada corresponde realmente à prestação de um serviço público.

Teríamos de fazer algumas aproximações empíricas para saber o que é que o contribuinte está a pagar. Acaso os custos que a RTP suporta com a programação visando matérias pertinentes à educação e à cultura são comparáveis aos que suporta com os concursos, os espectáculos de entretenimento de formato importado, os enlatados, ou as transmissões de jogos de futebol? Perguntando de outra maneira, acaso vemos áreas como as do teatro, da música dita clássica, do cinema, da dança, das artes plásticas, da literatura e do livro, da língua portuguesa, enfim, de tudo aquilo que envolve a criação cultural e de tudo aquilo que participa de uma matriz identitária, serem objecto de uma atenção ao menos semelhante àquela que é correntemente dedicada às mesmíssimas matérias que as televisões comerciais privilegiam? Além dos custos, qual o resultado da comparação entre o tempo e os horários de programação que a RTP consagra ao futebol, à música ligeira, aos concursos e a programas de entretenimento em geral e os que dedica àquelas temáticas? Quais os projectos já existentes para se alterar no futuro este estado de coisas, numa perspectiva que não se compadeça com a simples emissão de magazines semanais sobre este ou aquele tema?

Perguntas idênticas podem ser formuladas no tocante à educação e à ciência, aos clássicos, ao património em geral, aos grandes problemas do nosso tempo...

Se um décimo da energia histérica despendida no alvoroço político de emprenhar pelos ouvidos a propósito de um simples cenário, por muito discutível que ele seja, fosse gasto na formulação de críticas e na procura de soluções decentes para as questões relativas a conteúdos de serviço público (de que apenas ficam algumas enunciadas em termos que estão muito longe de as esgotar), talvez pudéssemos começar a ter algumas ideias mais claras a esse respeito.
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Análises II - Página 2 Empty A grande mistificação

Mensagem por Joao Ruiz Qui Set 13, 2012 9:57 am

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A grande mistificação

por MANUEL MARIA CARRILHO
Hoje

Análises II - Página 2 Manuelcarrilho

A gelada placidez com que o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, apresentou as suas novas medidas de austeridade, que fizeram estremecer todos os portugueses, surpreendeu muita gente. Mas não devia: mais do que, como alguns disseram, a outra face de um escondido cinismo, ou de uma lamentável impreparação, ela é na verdade a pura expressão de um conjunto de convicções nucleares, tão erradas como dogmáticas, que dominam hoje boa parte da política, da economia e dos "media".

A questão é de fundo, não é de forma. Trata-se da placidez de quem vive numa campânula, isolado do mundo, e age com base em alguns dogmas, imune à realidade. O problema é, de resto, muito geral, ele apenas toma entre nós uma forma mais aguda, dadas as circunstâncias do momento.

A placidez do primeiro-ministro, a campânula em que vive e os dogmas que o inspiram, tudo isto decorre de uma teoria que data já dos anos 70 do século passado, que é a teoria da eficiência dos mercados: ela postula o dogma que só os mercados contam, tudo o mais é irrelevante. E que eles se autorregulam automaticamente, dispensando qualquer intervenção do Estado, que só vem sempre, claro, complicar.

Esta teoria foi o passo decisivo na divinização dos mercados que se disseminou por todo o mundo contemporâneo como um vírus incontornável de uma nova servidão voluntária. Sobretudo quando se passou a aplicar a mesma cegueira também aos mercados financeiros, num movimento de intensidade tal que, apesar de se reconhecer a sua "exuberância irracional" - as palavras foram de Alan Greenspan -, foi muito aplaudido nos anos 90 e no começo do século XXI.

Não se prestou então a devida atenção a muitos fatores, e nomeadamente ao facto, simples mas determinante, de a finança não ter propriamente por objeto a relação dos indivíduos com as mercadorias, mas antes a relação dos indivíduos com o tempo, no preciso sentido em que um título financeiro é um direito sobre rendimentos futuros, por natureza bem incertos... Pelo contrário, pretendeu-se com a teoria da eficiência financeira justificar a própria "financeirização" da economia, o que se fez com os resul- tados que hoje todos conhecemos.

O que é absolutamente extraordinário - e exige hoje um novo tipo de lucidez política, que terá de se distanciar tanto da histérica apologia como da cega diabolização dos mercados -, é que esta grande mistificação, que tem sido sistematicamente desmentida pelos factos desde a eclosão da crise dos subprime, em 2007, continua a dominar imperialmente a economia, a pretender impor-se a todos os sectores (saúde, educação, televisão, segurança, etc.) e a condicionar completamente o discurso político-mediático, essa miscelânea ininteligível que cada vez mais parece uma conversa de papagaios amestrados em economês/financês.

Em rigor, a situação só é comparável com a do fanatismo religioso mais ortodoxo, em que é a própria implausibilidade dos dogmas que reforça a cegueira dos seus crentes. Assim se tem atribuído à economia um estatuto à parte, que a protege do confronto com a realidade e com os seus desmentidos. Estatuto que ninguém imagina que noutros saberes - pense-se, por exemplo, na medicina ou na aeronáutica - pudesse ser tolerado um minuto que fosse...

Repetidamente incapaz de qualquer previsão segura e útil, alimentada por cálculos matemáticos falaciosamente usados e manipulados (veja-se, a propósito, o esclarecedor livro O Vírus B - A Crise Financeira e as Matemáticas, de C. Walter e M. Pracontal), apoiando-se em conivências e cumplicidades de todo o género, nomeadamente na universidade e na política, esta economia revela-se uma disciplina de natureza astrológica, que - como ouvimos terça-feira nas redondas e intermináveis declarações do ministro das Finanças, Vítor Gaspar - tudo justifica sem na verdade nada explicar.

E foi a esta economia que se entregou o projeto europeu, como se todas as outras dimensões fundamentais - sociais, culturais, etc. - daí decorressem naturalmente. Viu-se! E o problema é que, também aqui, se persiste no erro, como ainda agora ocorreu com a generalidade dos dirigentes políticos, a demitirem-se das suas responsabilidades e a pendurarem- -se nas decisões do BCE, numa nova "fuga para a frente" cheia de armadilhas, como rapidamente iremos verificar.

O economês/financês tornou- -se a mais resistente forma de ignorância contemporânea sobre as pessoas, a sociedade e o mundo. Devia, por isso, era ser estudado pela "agnotologia", essa recente disciplina criada por Robert N. Proctor, da Universidade de Stanford, para estudar a ignorância, entendida esta não como algo destinado a ser superado, mas como algo de intencionalmente fabricado, produzido com a devotada colaboração de diversas formas de informação e de conhecimento.

É por isso urgente questionar seriamente, e em todas as dimensões, esta disciplina e os seus dogmas, com o objetivo de quebrar a arrogante ortodoxia que a estrutura, e de introduzir um verdadeiro pluralismo no seu interior, nas suas abordagens e nas suas propostas.

E não haja ilusões: tudo o que se possa procurar como alternativa política à situação atual, seja em termos de análise e de ideias seja de linguagem e de propostas, passa necessariamente por aqui. Só assim se conseguirá sair da campânula que já asfixia o País.

In DN


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Análises II - Página 2 Empty Cenários e sombras

Mensagem por Joao Ruiz Qui Set 20, 2012 4:13 am

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Cenários e sombras

por VIRIATO SOROMENHO-MARQUES
Hoje

Análises II - Página 2 Viriato_Soromenho_Marques

Portugal vive uma encruzilhada excecional. O Conselho de Estado irá amanhã debruçar-se sobre a situação mais delicada que a III República encontrou desde a sua estabilização constitucional em 1976. Em 1974-75, a convulsão revolucionária dividia o País. Hoje, a "terapia" da austeridade irracional, comandada pelo diretório de Berlim, e executada insensatamente por Lisboa, uniu a nação numa recusa unânime e transversal. A paisagem política é desoladora. O PSD está devorado por uma "guerra civil". A coligação perde em coesão o que sobra em pugilato verbal. O líder da oposição pede mais tempo.

Existem apenas três cenários sobre a mesa: a) Remodelação; b) Novas eleições; c) Novo governo apoiado pela presente composição do Parlamento, com pilotagem presidencial. Todos cenários de sucesso duvidoso. A remodelação parece a saída mais óbvia, mas tem um obstáculo letal. Um corpo pode sobreviver sem os membros, mas não sem a cabeça. Uma remodelação séria teria de afastar Passos, Portas, Gaspar (e informar Relvas de que os seus serviços já não são necessários). Estamos a falar de um novo Executivo. Infelizmente, o cenário das eleições defronta-se com a escassez do tempo e a falta de alternativas, quando o provável partido vencedor afirma não ter pressa. O cenário "Monti", um gabinete de quadros de competência reconhecida, teria de conquistar um improvável apoio do Parlamento, já que o Presidente, para além de muito desacreditado, há muito perdeu a capacidade constitucional de propor governos da sua iniciativa. Resta saber, ainda, se haveria um Monti português com capacidade de estabelecer empatia com um povo que não o elegeu.

A verdade, contudo, é que este governo atrelou o País à quadriga de Merkel, e à sua estratégia de uma Europa dual. De metecos e cidadãos. Devedores e credores. A um rumo que não vai vencer, mas que pode partir a Zona Euro (ZE) ao meio. Sobre todos os assuntos relevantes Portugal tem estado do lado errado: união bancária; papel do BCE; intervenção do Mecanismo Europeu de Estabilidade; euro-obrigações; união política. Neste momento, a sobrevivência do País passa por ficar dentro da ZE, mesmo que esta entre em rutura. Portugal precisa de ficar ao lado dos países que conservem o euro, usando-o para promover o desenvolvimento (até para pagar dívidas é preciso que a economia tenha vida), e não temam o federalismo constitucional. Só se estivermos preparados para a rutura da ZE poderemos evitá-la. Berlim pode não ligar à força dos argumentos, mas percebe o argumento da força. O memorando de entendimento tem de ser revisto, mas no quadro de uma mudança radical da estratégia europeia. O Presidente, os partidos e o Parlamento têm de ter a inteligência, imaginação e humildade necessárias para permitir, contribuir e apoiar uma solução capaz de superar o impasse do Executivo nesta encruzilhada da nossa opção europeia. Se o regime não conseguir resolver o problema da governação, então a avalanche da realidade não poupará o regime.

In DN

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Análises II - Página 2 Empty A falência é um estado de espírito

Mensagem por Joao Ruiz Dom Set 30, 2012 5:53 am

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A falência é um estado de espírito

por ALBERTO GONÇALVES
Hoje

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É extraordinária a quantidade de gente capaz de interpretar os sentimentos expressos nas manifestações de rua. Não possuo tal dom. Ouço e leio as palavras de ordem (pelo televisor, salvo seja) e acabo mais confuso do que comecei.

Ao que tudo indica, o povo em protesto não quer aumentos de impostos e, em simultâneo, não quer a redução na despesa que compensaria a manutenção dos impostos tal como estão ou estavam. O povo pretende a expulsão da troika e não se encontra minimamente preparado para a penúria que a partida da troika implicaria. O povo rejeita a austeridade sem perceber que a alternativa é uma austeridade maior e menos meiga. O povo está contra o Estado e vive apavorado com a ideia de que o Estado recue nas suas vidas. O povo insulta o Governo que desastradamente tenta corrigir as contas públicas embora não deseje que as corrija com acerto, nem dedique grandes insultos aos governos que deliberadamente transformaram as contas públicas na ruína actual. O povo, em suma, é realista à maneira do Maio de 68: pedindo o impossível. Impossível no sentido de que não tem pés nem cabeça.

É natural que o povo, às vezes constituído por serventes partidários, às vezes por gente em autênticas dificuldades, às vezes por sujeitos que berram qualquer coisa, caia nesta teia de contradições. Não deveria ser natural que as contradições chegassem a jornais ditos de referência sob a forma de colunas de opinião. A opinião é livre? É, e Deus nosso Senhor sabe o quanto agradeço a benesse. Por acaso, a irracionalidade também não conhece amarras, donde a emergência de textos do calibre do de José Vítor Malheiros, no Público de 25 de Setembro.

O título do texto ("A Dívida Existe Mesmo?) já arrepia. O pior é que após a pergunta do título o sr. Malheiros gasta uma data de caracteres a responder "não". Não perderei tempo a comentar os, digamos, "argumentos" do homem (o João Caetano Dias fê-lo brilhantemente no blogue Blasfémias). Basta resumi-los: para o sr. Malheiros, o défice e a dívida que decorre dos sucessivos défices (ele pensa ser ao contrário) são uma história mal contada, um provável estratagema para oprimir as massas que nada justifica, excepto talvez os favores às construtoras e aos bancos.

Perante isto, o que fazer? Podemos, claro, organizar uma colecta a fim de enviar o sr. Malheiros para um curso de Economia ou um merecido descanso. Porém, podemos igualmente aproveitar o mote e estender a tese ao que nos aprouver. A dívida não existe. O Estado esbanjador não existe. Os gastos com os salários e as prestações sociais não existem. Os custos da educação e da saúde não existem. As autarquias e as regiões autónomas não existem. As fundações e as empresas públicas não existem. O Magalhães não existe. Os estádios do "euro" não existem. Os pareceres, as consultorias e os estudos encomendados a amigos não existem. Os subsídios às energias "renováveis" não existem. Os apoios à "cultura" não existem. O socialismo não existe. O eng. Sócrates nunca existiu. E é duvidoso que, a médio prazo, o próprio país exista.

O exercício não é fortuito: se passarmos por doidos varridos, o mundo exterior comove-se e dá-nos um desconto moral. Infelizmente, dado que ninguém investe na demência, o mundo não nos dará um desconto material. Mas, de acordo com a escola financeira do sr. Malheiros, dinheiro não nos falta.

Terça-feira, 25 de Setembro

Objectividade pelos ares

A mulher de Mitt Romney viajava num avião que sofreu um pequeno incêndio e se encheu de fumo. A peripécia foi inconsequente. Ou nem por isso: mais tarde, numa sessão de campanha, o candidato referiu o assunto já ao lado da esposa, dizendo não perceber porque é que as janelas dos aviões não abrem para deixar entrar o ar. Tratou-se, conforme os correspondentes do Los Angeles Times e do New York Times (nenhum suspeito de simpatias republicanas) asseguraram, de uma brincadeira, aliás evidente no vídeo do episódio. É claro que a internet canhota local tentou remover as declarações do contexto e apresentar Romney como um tontinho, mas para efeitos internos a coisa morreu ali. Externamente, a coisa estava apenas a começar.

Um pouco por toda a parte, incluindo em muitos países europeus e incluindo, quase sem excepções, os media portugueses, o "jornalismo" a que temos direito diagnosticou em uníssono a idiotia terminal de Romney, o qual, segundo a opinião geral, gostaria de facto que as janelas de um jacto comercial descessem à semelhança das de um Fiat Punto. A veneração cega do actual inquilino da Casa Branca, misturada com a tendência para ver em cada membro do GOP um monumento à ignorância, dá nisto: uma mentira transformada em "notícia" e um espectáculo em que sujeitos com dificuldade para alinhavar uma singela peça sem erros ortográficos discorrem sobre a boçalidade de um discípulo de Stanford e Harvard. Boçal é o fanatismo.

Boçal e distraído, já que a reacção a gafes imaginárias impede inúmeros "jornalistas" de reagirem a gafes reais. Que eu saiba, por cá ninguém se riu após um político americano ter afirmado que os EUA construíram o "primeiro comboio intercontinental". Ou após um político americano ter exaltado o bom exemplo da FedEx por oposição ao dos correios públicos enquanto pretendia defender um sistema de saúde financiado pelo Estado. Ou após um político americano ter confessado que não sabia falar austríaco. Ou após um político americano ter declarado que percorrera 57 estados da União. Ou após um político americano ter classificado as recentes fúrias no Médio Oriente (que assassinaram um embaixador de Washington na Líbia) de "lombas na estrada". Em qualquer dos casos, o político americano era Barack Obama, um simpático colecionador de cargos públicos e um presidente medíocre que, ainda assim, paira largos furos acima do político indígena médio.

A terminar: nas circunstâncias adequadas (altitude, despressurização, etc.), os aviões podem voar com as janelas abertas. Fechadas sem remédio só algumas visões do mundo.

Quarta-feira, 26 de Setembro

A marca de Zorrinho

Não me canso de admitir algo de admirável no Partido Socialista: a rigorosa e absoluta falta de vergonha. Em seis miraculosos anos, o PS conseguiu duplicar a tendência para o desastre lentamente acumulada nas décadas anteriores e enfiar a pátria amada na bancarrota e na dependência de esmolas caríssimas. Em circunstâncias ideais, a derrota eleitoral de 2011 teria lançado os autores da façanha para um justificado limbo ou, no que respeita aos principais responsáveis, para a cadeia. Em Portugal, quase (quase) todos andam aí, a instruir os incréus sobre a arte de bem governar e a recriminar, com voz pungida, a má governação.

Esta semana, o descaramento maior coube a Carlos Zorrinho, o qual, a propósito dos pífios "cortes" nas fundações, lamentou com total precisão e nenhuma legitimidade: "Quando é para aumentar os sacrifícios aos portugueses, é sempre mais do que aquilo que esperamos; quando é para cortar despesa, é sempre menos do que aquilo que esperamos." Brincadeira? Parece. Mas não é. É apenas o PS a confiar na amnésia terminal do eleitorado.

Em matéria de amnésia, nem vale a pena notar o impulso do PS a incontáveis fundações. Sobretudo, importa descontar a facilidade com que o PS alterna as exigências de "investimento" público com a mágoa de que a despesa pública não seja devidamente reduzida. O primeiro sermão tem a atenuante da coerência face ao modus operandi que nos deixou na penúria. No segundo, trata-se de puro desplante. E se apetecer ao cidadão médio comparar o caso ao do gatuno que condena as escassas medidas de segurança depois de esvaziar o banco, a comparação é redundante: é literalmente isso o que se passa.

O pior é que, se calhar, o cidadão médio prefere o encanto do logro a uma dose de realidade e não está para aí virado. Se calhar, a acreditar nas sondagens recentes, uma quantidade suficiente de pessoas esqueceu-se de facto de quem as colocou nos limites da indigência. Se calhar, os drs. Zorrinhos deste mundo sabem o que fazem e o que dizem. Se calhar, o PS merece o país, e o país merece o PS.

In DN

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Mensagem por Joao Ruiz Sáb Nov 10, 2012 11:10 am

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A visita de Merkel

por JOÃO MARCELINO
Hoje

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1 Angela Merkel visitará Portugal por várias razões. Uma, com certeza, será "ajudar" - na perspetiva dela, claro - o Governo de Pedro Passos Coelho. A chanceler alemã não desconhecerá que o Executivo português se encontra confrontado com uma opinião pública cada vez mais hostil às medidas de austeridade necessárias à consolidação das contas públicas neste curto espaço temporal que nos foi concedido.

Tal como José Sócrates lhe mereceu, na devida altura, um elogio na hora de saída (sobretudo pelo chumbado PEC IV), o atual primeiro-ministro ganhou perante Merkel, evidentemente, o crédito de estar a promover um ajustamento convicto, sem desfalecimentos.

Ou seja, agora como antes, a Alemanha percebe que tem aqui, nos governantes portugueses, bons aliados para a sua visão de uma União Europeia homogénea, formada por países responsáveis e cumpridores (alguns deles conscientes dos erros cometidos no passado), competitiva no mercado global, com menos direitos e regalias no trabalho. Não é que isto nos deva tranquilizar; é um facto.

Concedendo que esta viagem, como a anterior à Grécia, tenha também, perante os eleitores alemães, algum valor facial, o importante é que ela seja igualmente uma oportunidade para os líderes nacionais, naquela escassa meia dúzia de horas, apresentarem a realidade do País e explicarem a razão pela qual o caminho de consolidação das contas públicas pode, afinal, vir a revelar-se um outro desastre se não for acompanhado de medidas para o crescimento económico dinamizadas a partir da Europa que a Alemanha evidentemente lidera.

2 Os sinais do País em rutura são evidentes. O Orçamento do Estado, recentemente aprovado, será insuficiente para chegar ao objetivo traçado: 4,5% de défice em 2013. Nem os fiéis acreditam nisso. Para cumprir, serão necessárias então mais medidas de austeridade. E o PS encontrou nesta escalada de contestação social o espaço para reforçar a sua via de descolagem política relativamente ao consenso sobre o memorando e a sua evolução (a peça a que Passos chamou "refundação").

O Governo irá, assim, já se percebeu, arcar sozinho com os cortes de quatro mil milhões de euros na despesa do Estado (social) para 2014. Piorará a relação com os portugueses porque não conseguirá qualquer pacto com António José Seguro, que seria social e politicamente útil, na apreciação dos custos do chamado Estado social e sua adequação à realidade que podemos ter. O líder do PS colocou-se numa posição simétrica àquela que Passos Coelho adotou perante Sócrates: resolva lá os problemas com as suas ideias que as nossas estarão num programa eleitoral...

Esta é uma dialética política nacional de mais de 30 anos que não tem vítimas inocentes nem vilões sistemáticos. À vez, e sucessivamente, os líderes do PSD e do PS têm alternado nas posições relativas, sentindo-se sempre com enorme à-vontade só por terem chegado de fresco e libertos - acham sempre... - das culpas do passado. Que são de outros...

3 É importante que a realidade social portuguesa seja percebida pela chanceler alemã, assim como a vontade maioritária do País de não falhar as metas acordadas. Nesse campo, Cavaco Silva pode aproveitar para dizer em privado o que já ousou dizer em público sobre os mecanismos europeus de controlo à crise, começando pelo papel do Banco Central Europeu, e explicar como a recessão, produto da austeridade, está a atrapalhar o esforço nacional. E no encontro de empresários devem passar as referências ao crescimento económico necessário para amparar este caminho de ajuste.

O ativo da vontade política de cumprir os objetivos assumidos não pode faltar ao encontro com Merkel. A coragem de falar nas necessidades da sociedade portuguesa também não.

António José Seguro não terá nenhum encontro com Merkel. Normal. O secretário-geral do PS já esteve há pouco tempo na Alemanha com o líder do SPD...

In DN

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Mensagem por Joao Ruiz Dom Nov 11, 2012 7:52 am

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América

por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje

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1- "Hello Freedom Fighters", foi assim que o reformado Colonel Perkins, do Partido Republicano, candidato ao Congresso dos Estados Unidos pelo Estado da Virgínia, saudou as pessoas apinhadas no pavilhão desportivo duma universidade em Fairfax. Lá dentro estavam mais de dez mil pessoas e cá fora estariam outras tantas. Esperaram muitas horas em filas infindáveis, debaixo dum frio de rachar, sujeitas a uma revista pior do que a dos aeroportos, para poder saudar os candidatos do Partido Republicano, sobretudo aquele que queriam ver como Presidente dos Estados Unidos, Mitt Romney. Já trazia comigo a enorme constipação que tinha apanhado no dia anterior durante o comício de Obama em Bristow. Mais gente, muito mais frio, mas o mesmo entusiasmo.

Sou suficientemente antigo para me recordar da capacidade de mobilização dos partidos para comícios aqui em Portugal. Mas já há muito que a única maneira de arregimentar pessoas para eventos do género é transportar meia dúzia de pessoas de cá para lá, pagar-lhes uns lanches, enfiar-lhes umas bandeiras na mão e mandá-las gritar quando as câmaras de televisão aparecem. Agora as grandes manifestações são sempre contra alguma coisa e, se se quiser mesmo garantir a presença de muita gente, a fórmula ideal é fazê-las contra os políticos.

Nesta campanha, nos EUA, assisti mais uma vez a grupos de pessoas, a esmagadora maioria sem ligação a partidos, a organizarem reuniões nas suas casas para telefonarem a amigos e conhecidos para os convencer a votar no seu candidato; homens e mulheres que no intervalo dos seus trabalhos ou nas suas folgas iam de porta em porta fazer campanha. Gente mobilizada por valores, ideais, interesses, claro está, mas que acredita inabalavelmente no seu papel na democracia, na sua capacidade de mudar as coisas através do seu voto e da sua acção na comunidade.

Para quem está habituado a campanhas políticas em Portugal é quase um alívio não assistir a ataques aos políticos, sobretudo pelos próprios políticos (não tive coragem de dizer a ninguém que em Portugal há políticos que fizeram a sua carreira a dizer mal da sua própria profissão). Quando muito assistimos a críticas aos políticos de Washington não por serem políticos mas pelo facto de a sua quantidade na capital federal ser quase uma questão ideológica. Sim, há ataques baixos, propaganda de fazer corar um carroceiro, mentiras, promessas lunáticas, mas não há quem não conheça ao que vem cada um dos candidatos nas questões essenciais.

A democracia americana tem muitos problemas: a eterna questão da desigualdade, o sistema judicial, o sistema prisional, o racismo latente e patente, a demasiada força do dinheiro nas eleições, a profusão de referendos e muitos, muitos outros. Mas a verdade é que a democracia na América está de boa saúde e recomenda-se.

2 - Obama é o primeiro político importante a ser apanhado pela crise e que consegue ser reeleito.

Os Estados Unidos estão em pior situação do que estavam há quatro anos: mais desemprego, mais endividamento, a economia em pior estado. Mesmo assim o povo americano deu-lhe mais um mandato. Não faltarão explicações: a crise de identidade do Partido Republicano perdido entre o Tea Party, os fundamentalistas religiosos entre outros loucos semelhantes e os moderados que, aparentemente, estão reféns dessa gente perigosa; os que falam de demografia ( confundindo sexo e raça, por exemplo, com opções ideológicas, enfim...); o papel de Bill Clinton na campanha lembrando os recentes anos de abundância. Os especialistas gastarão rios de tinta a tentar explicar o que está por trás da vitória de Obama, mas há algo que ninguém pode negar: Obama ganhou tendo executado políticas de resposta à crise radicalmente diferentes das europeias, e prometendo insistir nelas.

O povo americano mostrou que é nessas políticas que acredita e, em democracia, o povo tem sempre razão. Mesmo quando não tem.

3 - A palavra de ordem nas campanhas dos dois partidos foi a mesma: empregos. Não estive por cá nos últimos tempos mas segundo o que li há gente no governo a dizer que despedir 50.000 pessoas é de caras. Mas que mal deu nesta gente.

In DN

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Análises II - Página 2 Empty O crescimento

Mensagem por Joao Ruiz Sáb Ago 17, 2013 10:27 am

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O crescimento


por JOÃO MARCELINO
Hoje

Análises II - Página 2 Joao_marcelino


1-A retoma económica é uma coisa tão inevitável quanto o nascer do Sol. Com uma diferença: o Sol volta todos os dias, a retoma da economia pode demorar anos. Nunca se sabe quanto tempo é necessário empobrecer para, finalmente, a luz aparecer de novo na linha do horizonte. Mas aparece sempre.

Cresce-se quando os índices de atividade económica são superiores aos do período imediatamente anterior ou do homólogo. E, portanto, quanto mais frágil e anémica for ficando a economia mais possibilidades temos de voltar a crescer - ou de, pelo menos, recebermos notícias como as que esta semana vieram do Instituto Nacional de Estatística e do Eurostat revelando um crescimento de 1,1% do PIB no segundo semestre deste 2013.

Em Portugal foram precisos mais de dois anos e meio, 913 dias exatos de queda, para aparecerem os primeiros sinais de alguma evidência de que a economia, rebocada por alguns sinais positivos na Europa, poderá a estar a sair do túnel recessivo. Essa é a notícia boa. A notícia má, sempre evitada pelos discursos técnicos, é de que não se sabe quanto anos teremos de esperar para podermos voltar aos níveis de antes da crise. O melhor é nem sequer pensar nisso...

2-O País está mais pobre mas o Governo parece mais rico em bom senso. Desta vez, e ao contrário do que acontecia no saloio passado recente, não se ouviram vivas ao final da crise - que, aliás, poderão vir a revelar-se notoriamente exagerados. Da boca de Marques Guedes e de António Pires de Lima vieram comentários sensatos, prudentes, de quem politicamente reconhece que ainda há muito a fazer, que estes dados precisam de ser confirmados por outros, que o rendimento das famílias não vai mudar de um dia para outro, e que, sobretudo isso, vem aí um Orçamento do Estado que exigirá do Governo uma capacidade de comunicação com os portugueses que não se coaduna com o decretar do fim da crise.

Na primeira fase do Governo de Passos Coelho o voluntarismo teria feito rebentar o fogo de artifício da demagogia. Agora há uma perspetiva mais inteligente, de quem não desconhece que a separar o presente do futuro ainda estão algumas reformas assumidas com os credores, entre as quais a principal: a reforma do Estado. E esta, estando cada vez mais longe um consenso mínimo com o PS, dispensa qualquer discurso triunfalista e antes sugere ponderação. Aqui também houve crescimento.

3-Passos Coelho tinha prometido, no Pontal de 2012, à porta fechada, a recuperação económica para 2013. Ontem, face aos já citados relatórios, e à porta de novo aberta, não resistiu: são dados "objetivos" que confirmam as "convicções" do Governo. O primeiro-ministro, como era esperado, passou ao lado das "tensões" que iam matando esse mesmo Governo ainda há pouco mais de um mês. E, para polémica, só não resistiu a um novo aviso ao Tribunal Constitucional, que terá de analisar a lei que pretende gerir a mobilidade dos funcionários públicos rumo ao despedimento. Mesmo assim, foi um discurso mais de Estado do que é habitual. Sinal de que o líder também aprende com os erros, e a conflitualidade, que no passado vinha desnecessariamente de São Bento vendo inimigos em todo o lado. Outro crescimento, portanto.

A chamada lei de limitação dos mandatos, que ameaçava algumas candidaturas autárquicas, está a originar a confusão esperada. Uns "dinossauros" podem candidatar-se, outros não.Tudo depende da subjetiva opinião de um juiz sobre um texto que os políticos quiseram assim: que parecesse uma coisa e se prestasse a outra...

In DN

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Análises II - Página 2 Empty Um país de políticos

Mensagem por Joao Ruiz Seg Set 02, 2013 9:51 am

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Um país de políticos

por JOÃO CÉSAR DAS NEVES
Hoje

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Então a recessão acabou? No segundo trimestre, na terrível crise política, como pode a economia ter crescido e o desemprego cair? Há aqui grande mistério!

Portugal é um país de políticos. Dois desconhecidos encontram-se e logo depois diz-se mal do Governo. Não interessa a realidade mas os dirigentes, culpados de todo o bem e mal que existe. Em dez milhões de cidadãos só contam quinze, os ministros. Pior, Portugal é um país de rivalidades. Todos temos clube e o do vizinho joga mal.

Juntando os dois elementos, sai o ridículo de 80% dos eleitores votarem em dois partidos iguais que se combatem sem cessar. Agora, na crise, parecem muito diferentes, com o PSD acusando o PS de criar a catástrofe e o PS considerando o PSD neoliberal. Mas há trinta anos a crise nasceu com o PDS/CDS e foi o PS a aplicar a austeridade do FMI.

O pior é que toda a esta superestrutura mediática oculta aquilo que realmente interessa. Só se fala de política, leis, medidas, eleições, omitindo a vida, sociedade, trabalho e mercados, que de facto orientam a nossa existência. Depois surgem surpresas, como a economia recuperar no meio da confusão institucional.

Imensa gente anda angustiadíssima com o futuro do País devido à má qualidade dos nossos dirigentes e jornalistas, sem pensar na excelente qualidade do povo. Muitos estão furiosos com os políticos, de um ou outro lado, por terem dado cabo de Portugal, sem notarem que Portugal está vivo e recupera dos disparates que todos cometemos.

É claro que a política tem influência, muita influência. Mas está longe da omnipotência que a nossa ilusão criou. Mais ainda, temos políticos maus há oito séculos e ainda por cá andamos. Aliás, tudo somado, os actuais até são muito melhores do que os antigos e o nosso nível de vida, mesmo com crise, está bastante acima das gerações anteriores. Para o ver basta afastar os mitos elegantes da nossa retórica e olhar para o mundo e para a história. Coisa que temos muita dificuldade em fazer, por sermos um país de políticos. Gostamos do fanatismo cómodo, raivoso ou laudatório que criámos para nós mesmos. É tão mais simples acusar um poder remoto pelos nossos sofrimentos do que assumir culpas e enfrentar dificuldades!

Se isto é sempre verdade, em tempos de crise sente-se mais. Nos últimos anos a obsessão pela política e a fúria partidária explodiram. Com isso aumentou em muito a cegueira face à realidade. Um buraco deste tamanho não pode ter sido culpa de um punhado de governos. Ele nasceu de vinte anos de ilusões de dez milhões de cidadãos. Se o País fosse povoado por alemães, as políticas de Sócrates não teriam tido os efeitos que tiveram. Nem sequer ele seria eleito e reeleito.

Agora, o essencial da solução não está em estratégias ministeriais ou na célebre reforma do Estado, mas no ajustamento que os dez milhões estão a dar às suas vidas, para resolverem a sua situação. Isso começou muito antes da troika e pouco depende do Orçamento. Assim se explica o mistério. A recessão, que se situa mais na sociedade do que nas políticas, foi fazendo o seu caminho, debaixo do alarido mediático e combates partidários. As famílias mudaram de vida, as empresas corrigiram estratégias e cortaram custos, muitas desapareceram. Os capitais e trabalhadores aumentaram a eficácia, inventaram novos caminhos, procuraram alternativas. A economia ajustou.

Agora, segundo as regras económicas que a dirigem, a conjuntura parou a queda. Isto não é mérito do Governo ou influência da Oposição. Foram os trabalhadores e consumidores, investidores e mercados, nacionais e estrangeiros, milhões deles, que determinaram a trajectória. A economia, que começou a reagir à situação, não em Abril de 2011 com a troika mas logo em Setembro de 2008 com o crash financeiro, tem avançado bastante o seu ajustamento. Nesse sentido pode dizer-se que a crise está próxima do fim.

Então as dificuldades acabaram? Claro que não. Ainda há muito a fazer. Por exemplo, no ajustamento do Estado em que devido a lutas, insultos e truques se fez muito pouco.

In DN

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