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Para mais tarde recordar por Miguel Sousa Tavares

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Mensagem por Vagueante Qui Jun 17, 2010 10:35 am

Junho 2010: para mais tarde recordar
Miguel Sousa Tavares (www.expresso.pt)
0:00 Quinta-feira, 10 de Junho de 2010
1 Apresento-vos o SUCH: uma empresa pública juridicamente disfarçada de associação de utilidade pública, cujo fim é "promover a redução de custos e a qualidade e eficiência da prestação de serviço por parte do Serviço Nacional de Saúde". Na sua última gestão, o SUCH conseguiu a proeza de perder 5 milhões de euros, com a mesma naturalidade com que empresas como a EPUL (que constrói casas por conta da CML, sem ter de pagar os terrenos) consegue perder dinheiro. Mas o prejuízo e o endividamento bancário não são nada que preocupe os administradores do SUCH - os quais, segundo um relatório preliminar do Tribunal de Contas, se aumentaram 50% no vencimento no triénio 2006/8, atribuíram-se 25 viaturas de "uso não exclusivamente profissional" e despesas de representação referentes a 14 meses por ano, além de prémios de 130.000 euros a três directores por terem conseguido cumprir a que era a sua função: cobrar créditos. Pormenor irrelevante é que o TC conclua ainda que o SUCH revele "falta de conhecimento das idiossincrasias do sector público da saúde".
Quantos SUCH haverá por essa Administração Pública e Local fora? Quantos biliões não se poupariam se o primeiro-ministro, pura e simplesmente, decretasse que cada Ministério teria de reduzir a sua despesa corrente em 10% - e eles que se dessem ao trabalho de puxar pela imaginação e passar a pente fino todos os gastos inúteis ou injustificados da teia de institutos e empresas públicas, fundações e associações, que tutelam? Pois é: mas é tão mais fácil e imediato subir impostos a quem trabalha e produz riqueza para sustentar um exército de milhares de afilhados e protegidos!
2 Vê-se que o Governo está em decomposição quando um homem competente e empenhado como Teixeira dos Santos já não sabe o que há-de prever, o que há-de fazer, o que há-de dizer. Ele espera apenas que "este ano" não seja preciso voltar a aumentar os impostos. Ele sabe que o aumento retroactivo de impostos é proibido pela Constituição, mas acha que essa não é uma "proibição absoluta", que não deva ceder face ao "bem comum" e à situação de emergência financeira em que estamos. Ou seja: segundo o ministro, parece que a Constituição tem princípios absolutos e princípios relativos e que cabe a quem governa determinar, em cada momento, quais são uns e quais são outros. Será que já vivemos em estado de sítio, quando a Constituição, ou parte ela, pode ser suspensa?
Pois é, senhor ministro, suspenda a Constituição, que a gente paga, que remédio! Mas, se ao menos, não houvesse o SUCH! Se não houvesse a EPUL! Se não houvesse umas centenas de empresas municipais a duplicar as funções, os lugares e as despesas das câmaras! Se não houvesse o metro do Porto (praticamente todo feito à superfície), que, em meia dúzia de anos acumulou quase 2000 milhões de prejuízo, onde as receitas não chegam sequer para pagar metade das despesas com a dívida e cada bilhete que um utente paga custa aos contribuintes 3,2 euros mais! Ah, senhor ministro, o Estado português é como um chefe de família que passa o dia na taberna e no casino e depois rouba o ordenado à mulher e aos filhos para se sustentar! Por favor, faça, diga-nos qualquer coisa que nos possa consolar patrioticamente dos sucessivos assaltos fiscais de que somos alvo!
3 A Espanha suspendeu a construção de um dos troços da sua linha de TGV Madrid-Caia. É apenas um troço, nada mais, mas a tão invocada ligação "estratégica" de Portugal à Europa em alta-velocidade precisa de todos os troços. Parece que a Espanha manterá o seu compromisso de completar a sua parte no prazo previsto, até 2013. Parece que continua a valer um telefonema entre o nosso ministro das Obras Públicas e o ministro do Fomento deles. Abençoado telefonema: neste momento, é o melhor instrumento "jurídico" de que dispomos para não nos vermos amanhã com a gloriosa tarefa de rentabilizar um TGV entre Caia e o Poceirão. Francamente, seria de mais.
4 Os espanhóis quiseram também comprar os 50% da Vivo que a PT detém no Brasil: ofereceram 5,3 mil milhões, o que foi considerado pela PT, pelos seus principais accionistas, por José Sócrates, o ministro e o secretário de Estado como uma ofensiva hostil e atentatória do interesse nacional. Sócrates não se ensaiou mesmo nada para declarar que faria uso da golden share do Estado na PT para impedir a alternativa previsível - que seria uma OPA da Telefónica sobre a própria PT. Unidos como unha e carne, Governo e accionistas principais da PT garantiram que não cederiam, que a Vivo é estratégica para a PT e a PT é estratégica para Portugal. Cinco dias depois, a oferta subiu para 6,5 milhões e as razões "estratégicas" para não vender começaram a abrir caminho à estratégia de "tudo tem um preço". Vai haver violas metidas ao saco e um fado que virará flamenco, mas eu, francamente, não me apoquento nada: a minha dose de patriotismo está-se a esgotar com o assalto fiscal e o Mundial de futebol. De estratégico, para mim, é só isto: a PT é a maior e a pior empresa de Portugal. Funciona em regime de monopólio de facto e presta um serviço público que é caro e mau. Se alguém a quiser, e não apenas à sua enteada brasileira, eu até agradeço: pior não ficamos, de certeza.
5 Compreendo que uma escola com cinco ou dez alunos não é viável financeiramente nem aconselhável pedagogicamente. Mas fechar todas as escolas (e são todas no Interior) com menos de 20 alunos já é diferente e dificilmente explicável por razões que não apenas financeiras e de curto prazo. A médio e longo prazo, este é o caminho certeiro para acabar de matar o Interior: atrás das crianças, vão os pais; atrás dos pais, vão os empregos e a economia, o comércio e a vida activa; restam os avós, o vazio, as casas fechadas, as aldeias mortas. Se alguém pensasse Portugal a longo prazo ou se, ao menos, estudasse o seu passado recente, veria que este é o maior erro que cometemos. Poupamos hoje, pagamos amanhã. E caro.
6 O que mais me despertou a atenção na maravilhosa aventura programada da célebre professora stripper de Mirandela, foi descobrir duas coisas: uma, que ela, afinal, não é professora, mas sim "monitora de tempos livres"; a outra, que tem um ordenado por inteiro mas um horário de apenas seis horas semanais, as quais pode acumular todas num dia, ficando com o resto da semana livre. Será que se eu me despir, também me arranjam um emprego destes?
7 Pela segunda vez, o Governo vai tentar fazer passar a lei que tornará obrigatória a colocação de um chip em todos carros e que permitirá ao Big Brother saber, em cada instante, onde estamos, o que fazemos e a que velocidade circulamos. O objectivo evidente é poder sacar uma fortuna em multas sem levantar o traseiro da cadeira. Mas eu desconfio que não é só isso: desconfio que, tal como sucedeu com os coletes, algures, aí entre os 'especialistas', já alguém investiu uns milhares na compra dos chips e só espera, para os transformar em milhões, que a lei seja aprovada.
8 Alguma direita (não necessariamente recomendável) ficou zangada com Cavaco Silva por ele não ter usado o veto político à lei dos casamentos homossexuais. Eu percebo-os e não os percebo. Percebo-os, porque se um Presidente, que não é eleito com um programa de governo, porque não vai governar, também prescinde de ter um programa ideológico e de valores, então não está lá para fazer nada, excepto manter-se em funções. Mas não os percebo, porque esse é exactamente o caso de Cavaco Silva, como já todos tinham obrigação de saber. Cavaco não gosta de riscos, de atitudes morais, de confrontos ideológicos: gosta do terreno aplanado para seu uso pessoal. Em cada escolha, em cada dilema, ele nunca corta a direito: arranja sempre maneira de se encostar a uns sem se desencostar dos outros.
Texto publicado na edição do Expresso de 5 de Junho de 2010

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Mensagem por Vagueante Qui Jun 17, 2010 11:52 am

Este artigo, deixa-nos várias interrogações.
A primeira diz respeito ao SUCH, acrónimo com que me defrontei pela primeira vez.
O que se diz no artigo, é grave se corresponder à verdade.
Penso que o amigo Viriato tem algum conhecimento destas coisas e por isso, gostaria de ouvir (ver) o seu parecer.
No que diz respeito à EPUL, já de há muito tempo se diz que está falida, embora isso não tenha significado nenhum para os seus administradores que, pelo que vem nos jornais, se locupletam com altos ordenados e prémios pela forma "altamente profissional" como desempenham as suas funções.
O seu profissionalismo vai ao ponto de, como aqui já foi denunciado várias vezes, terem um empreendimento habitacional no Martim Moniz, parado há cerca de 3 anos. Este empreendimento foi criado com a finalidade de repovoar a baixa lisboeta com casais jovens. Tanto quanto veio a público, alguns destes casais contraíram empréstimos junto da banca para adquirirem casa própria, tendo em vista um casamento breve. Sabe-se que alguns desses casais acabaram por casar e comprar ou alugar alojamento alternativo, ficando com o ónus do empréstimo contraído para compra da casa no Martim Moniz.

A segunda interrogação diz respeito a afirmações de Teixeira dos Santos.
Será possível que a Lei que nos governa possa ser usada a bel-prazer dos governantes?
Não creio que Teixeira dos Santos tenha isso em mente e que, porque fazer duas declarações de IRS no mesmo ano seja muito difícil de levar a bom termo, tenha optado por diluir o aumento do IRS que deverá ser de 1% ou de 1,5% a partir de 1 de Julho, por todo o ano aplicando uma taxa correctora. Este é um exemplo daquilo que não deve ser feito por dar origem a várias interpretações que serão resolvidas em tribunal, sendo que, cada tribunal poderá decidir de forma diferente, criando ainda mais confusão.

A terceira interrogação, diz respeito à construção do TGV.
Sou, como sempre tenho dito um defensor dessa construção, na perspectiva de que seja uma forma de atingir rapidamente, não Madrid, mas a França, com características mistas de passageiros e transporte de mercadorias, actuando com um interface de logística aonde iriam parar também as mercadorias chegadas a Portugal por via marítima, especialmente a partir dos portos de Lisboa, Setúbal e Sines.
Não temos sido devidamente informados quanto às características da linha e, supondo que a Espanha poderá protelar por alguns anos a concretização das ligações com Portugal e a França, acrescentando ainda a dificuldade de construção da 3ª. ponte sobre o Tejo que já deixa dúvidas quanto à sua construção, atendendo ainda às dificuldades financeiras que o país atravessa, porque não se pensa seriamente em suspender essas obras para momento mais oportuno? Que interesses estarão por trás disto tudo?

A 4ª. interrogação diz respeito ao negócio da Telefónica que pretende comprar a parte portuguesa da VIVO.
Os accionistas portugueses, sempre se manifestaram "PATRIÓTICAMENTE". Como sabemos, ainda não há muitos anos o COMPROMISSO PORTUGAL, entendeu divulgar uma ideia saída das suas reuniões estratégicas, em que se defendia a conservação dos centros de decisão em Portugal. Pouco tempo depois, Vaz Guedes resolveu vender a sua empresa ......... aos espanhóis.
Os sinais que têm estado a ser dados, apontam para a venda da posição da PT na vivo, mais uma vez porque o dinheiro fala mais alto. E assim se conservam em Portugal os centros de decisão das empresas importantes para o país.

5ª interrogação: Estará o Ministério da Educação consciente daquilo que está a fazer? Será necessário aplicar a mesma medida a todos os ciclos? Acabo de chegar de Chaves aonde me foi dito que estão a levar para um mega-centro escolar que ali foi criado, alunos de terras muito distantes cujo tempo de trajecto entre o local onde vivem e a escola, chega a demorar mais que uma hora. No Inverno, as coisas complicam-se por causa da neve e do gêlo que se forma nas estradas.
As perguntas que eu faço, para não adiantar mais, é:
Qual a hora a que aqueles alunos têm que se levantar, e qual o estado de espírito com que chegam às aulas?
E depois de terminar as aulas, com que espírito chegam a casa dos pais e qual o tempo de convivência que têm com eles?

A 6ª. interrogação está muito bem feita por Sousa Tavares no que diz respeito à "professora" despida.

7ª. pergunta: O 25 de Abril de 1974, foi feito com que finalidade?
Antes dessa data, tinhamos um regime que nos controlava os movimentos e dentro do possível, a opinião. Todavia, nunca o regime salazarista aplicou tão bem os métodos de controlo dos cidadãos como o regime actual. Neste momento, não temos a certeza de que os nossos telefones ou telemóveis não estajam a ser ouvidos por outras pessoas. As nossas contas bancárias são controladas por vários organismos que não foram eleitos para essa finalidade. A obrigatoriedade de compra de um chip para instalar no carro, diz ao poder instituído ou a outros organismos que nada têm a ver com o Estado, aonde é que o cidadão se encontra em qualquer momento salvo se não usar viatura.
O que vem a ser isto? Ao lado deste, o regime salazarista não passava de um aprendiz.

8ª. pergunta: Para que temos nós um Presidente da República? será só para publicar Leis depois de fazer queixinhas a justificar como, embora não concorde com elas as publica?

Meus amigos, a este artigo subjazem muitas mais perguntas. Fico-me por aqui e espero ler mais alguma opinião semelhante a outras que por aqui tenho visto.

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Mensagem por Viriato Qui Jun 17, 2010 12:57 pm

Caro Vagueante. Temos de nos quotizar para lhe oferecer um portátil. Não deve estar tanto tempo ausente.

Mas já que consegue os artigos do Expresso do Souza Tavares, veja se publica o último. É exemplar. Ele diz tudo o que o governo nunca conseguiu dizer.

Sobre as críticas apresentadas, não sou tão informado como pensa. Sou tanto como o meu amigo, atento ao que se passa em redor ou no mundo. Estou de acordo com MST em quase tudo (uma vez que não fala nos dragões). Sobre as escolas, admitindo que se estudem as excepcções devido a dificuldades de comunicação ou outras, penso que se deve criar uma rede com um mínimo de alunos. Estamos a repetir o caso das maternidades e das chamadas urgências. As instituições estatais, durante anos e por motivos eleitoralistas, foram proliferando por esse país. Chegou a haver escolas com 1 ou 2 alunos. Qual é o número ideal? Não sei. Mas há quem estude esses métodos pedagógicos.

O fecho das maternidades não afectou a mortalidade infantil. Antes pelo contrário. Nas escolas aguardo um balanço sério.
Mas escolas com 20 alunos onde o mesmo professor assiste ás 4 classes, não me parece eficaz ou produtivo. É só uma opinião pessoal....
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Mensagem por Viriato Qui Jun 17, 2010 1:07 pm

A nossa esperança de vida é hoje 20 anos mais elevada do que em 1950, se os custos de saúde multiplicaram por dez, se cada vez estamos dispostos a trabalhar menos anos e se deixámos de fazer filhos, quem e como poderá sustentar isto?

Esta é uma das frazes que MST incluiu no seu excelente artigo do Expresso da semana passada. Aquele que gostaria de aqui ver publicado. Mas, pelo exemplo, vê-se que a mensagem nunca foi passada pelos diversos governos....
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Mensagem por Viriato Dom Jun 20, 2010 3:28 pm

Eis texto que referi há dias.


O PCP viu obviamente chumbada uma sua proposta para tributar os bancos a 25% e subir os impostos para os titulares de imóveis de valor superior a 1200 000 euros e de iates e aviões particulares. Metendo no mesmo saco realidades jurídicas e fiscais diferentes (os bancos estão aqui, mas os iates, aviões e casas de luxo estão sediados em paraísos fiscais e em nome de empresas estrangeiras), os comunistas mostraram não estar interessados nos resultados práticos da sua proposta mas apenas no seu efeito político. A justiça não é a utopia nem a demagogia, mas exactamente o contrário: fazer o que se deve quando se pode. Dê o mundo as voltas que der, os comunistas ortodoxos (que já quase só existem em Lisboa e no Alentejo) hão-de morrer a jurar que tudo se resolve tirando aos ricos para dar aos pobres. E esta crença atinge por igual o BE, mas faz-me muita confusão que um partido chefiado por um professor de economia se deixe arrastar sempre pelas teses económicas populistas e simplistas do PCP. Quando oiço Francisco Louçã ou Jerónimo de Sousa a falarem de economia e a reclamarem "uma política alternativa à de direita", ocorrem-me sempre as mesmas duas perguntas: "Quanto custa?", "quem paga?". Quanto custa, é problema que eles não têm, pois que se dispensaram de ter de se ocupar dessas questões de detalhe; quem paga, é simples: "os ricos". Será que sabem que já não vivemos nos tempos do Robin Hood?

Vamos lá ser sérios: os 'ricos' a quem José Sócrates não pára de subir o IRS, não são os verdadeiramente ricos, os donos de iates, aviões ou casas de luxo: esses, como toda a gente sabe, estão a salvo do assalto fiscal. Os 'ricos' que restam, a pagar 46,5% de IRS, são os que são bem pagos pelo seu trabalho e que não fogem ao fisco ... até ao dia em que fogem do país e vão ganhar mais e pagar menos noutro país, onde não são vistos como o alvo a abater. São uma ínfima minoria que, em termos de saldo final, quase nada representam no bolo das receitas fiscais: persegui-los é apenas um número de demagogia barata. Os grandes evasores, aqueles cujas receitas sonegadas ao fisco poderiam, de facto, fazer a diferença, são aqueles que todos querem proteger: as pequenas e médias empresas, as chamadas classe média e pequeno-burguesa São, por exemplo, os canalizadores, os electricistas, as empresas de reparação, de transporte, todos os prestadores de serviços à escala doméstica que, quando lhes pedimos a conta, nos fazem a fatal pergunta: "Quer recibo? Se for com recibo, são mais 20% de IVA... ". São uns milhares de agentes económicas que todos os dias contratam dezenas de milhares de transacções onde o cliente não paga IVA e eles não pagam nada e, se calhar ainda vão sacar apoios do Estado. Não que eles sejam desonestos por natureza, mas porque o discurso entranhado de que basta que os ricos paguem e tudo se resolve lhes criou a convicção de que estão dispensados de pagar. E como desfazer esta institucionalizada batota (o que não seria difícil, juridicamente) seria contrariar a tese de que os ricos é que devem pagar a crise, o poder político prefere apoiá-los a eles e castigar quem contrata os seus serviços (e que, apesar de tudo, foi responsável pelo crescimento de 1,8% do PIB no último trimestre, alavancado no consumo interno).

A esquerda tida como tal não gosta de enfrentar estas verdades, que contrariam a sua verdade ideológica. Assim como não gosta de enfrentar a mais terrível verdade do nosso tempo: a de que o Estado social europeu, tal como o conhecemos, está morto, não é mais sustentável. Nascido na Alemanha, nos primeiros anos do reinado do Imperador Guilherme II e nos últimos anos de governo do chanceler Bismarck, com a introdução do horário de trabalho de 60 horas semanais, o seguro de doença (1883) o de acidentes de trabalho (1884) e o de invalidez e reforma (1889), o denominado Estado social europeu foi uma das maiores conquistas dos últimos cem anos. Mas a sua longevidade só foi possível graças a 30 anos de devastação humana causada por duas guerras na Europa ou ao facto de ele só ter sido introduzido em países como Portugal no último quartel do século XX. O babyboom dos anos cinquenta conduziria, 30 anos mais tarde, a uma geração de reformados de luxo e à crença, feita doutrina de Estado, de que ninguém mais caminharia sozinho sem o apoio público. Essa conquista histórica nunca mais - nunca mais, acreditem - terá viabilidade. A menos que sejamos tão cínicos, tão loucos ou tão irresponsáveis que julguemos poder continuar a adiar a solução e chutar o problema, acrescentado, para as gerações seguintes. O Estado social europeu, tal como o construímos, está morto - não porque seja injusto, não porque não seja um sonho mobilizador, não por razões ideológicas, mas por razões lógicas: porque a matemática nos ensina que uma progressão aritmética jamais poderá alcançar uma progressão geométrica. E se a nossa esperança de vida é hoje 20 anos mais elevada do que em 1950, se os custos de saúde multiplicaram por dez, se cada vez estamos dispostos a trabalhar menos anos e se deixámos de fazer filhos, quem e como poderá sustentar isto e mais tudo o resto, em matéria de prestações sociais?

E quem poderá explicar à nossa esquerda que não há forma de fugir a este debate e que os cemitérios estarão cada vez mais cheios de mortos da fatal doença dos 'direitos adquiridos' e das verdades imutáveis? A crise, a tão falada e malfadada crise, além da pirataria financeira, tem como causa primeira e evidente 20 anos de mentira. Há 20 anos que todos os políticos europeus sabem que o regime em que vivemos não é sustentável. Mas preferiam ocultar a verdade durante 20 anos do que enfrentar os eleitores olhos nos olhos.

MST Expresso
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