Os deuses devem estar loucos

Os deuses devem estar loucos

Um idiota queria queimar o Corão. Vários idiotas prometem guerra santa ao infiel. E a maioria moderada vê o outro através destes loucos. Eles tomaram conta dos deuses e alimentam-se uns aos outros através desta espiral de insanidade.

Daniel Oliveira (www.arrastao.org)


O pastor Terry Jones conseguiu a senha para a fama: prometeu queimar Corão no dia 11 de Setembro. Mais do que ofender os muçulmanos, ofenderia as vítimas do atentado. Aproveitava-se delas para promover a sua igreja no competitivo mercado evangélico. O homem é apenas tonto. Mas como os tontos de todos os credos têm tempo de antena proporcional à sua insanidade, o homem seria perigoso se ninguém o parasse.

Do lado do Islão não têm faltado tontos de igual ou maior calibre. Gente que representa tanto os muçulmanos como Terry Jones representa os cristãos. Mas o Ocidente ouve o Oriente pela boca dos fundamentalistas islâmicos, o Oriente ouve o Ocidente pela boca do pastor de Gainsville.

A verdade é que a mediocracia em que vivemos faz das aberrações notícia e das notícias a norma. E qualquer débil mental pode acender o rastilho de novos conflitos. Os rastilhos podem detonar explosivos mais ou menos potentes, mas a lógica do ódio é a mesma.

Olhamos os outros por lentes distorcidas que os tornam incompreensíveis fanáticos, prontos para, a qualquer momento, nos destruir. Neste jogo, Terry Jones, Geert Wilders e mullahs mais ou menos obscuros determinam os medos e os rancores de uma esmagadora maioria de gente moderada. Uns só têm força graças aos outros. Alimentam-se e justificam-se uns aos outros. E só continuam a marcar o ritmo de um falso choque de civilizações porque nós deixamos.

Assim como a esmagadora maioria dos cristãos olha para a queima do Corão como para o bigode de Terry Jones, a maioria dos muçulmanos não sente menos do que desprezo pelas palavras e actos de lunáticos que apelam à guerra santa. Não acreditam? Os muçulmanos também não. Porque deixámos que os loucos tomassem conta dos deuses. Felizmente este não aguentou a pressão e desistiu. Vale a pena não os deixar à solta sem lhes tornar a brincadeira difícil