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O último Verão na Praia da Luz -PELO sARAIVA ( CASO mADDIE )

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O último Verão na Praia da Luz  -PELO sARAIVA ( CASO mADDIE ) Empty O último Verão na Praia da Luz -PELO sARAIVA ( CASO mADDIE )

Mensagem por Vitor mango Seg Ago 11, 2008 2:24 pm

O último Verão na Praia da Luz
09 August 08 08:01 AM
O DESAPARECIMENTO de Maddie McCann deu origem a um espectáculo mediático pouco edificante. Ficou mais uma vez claro que a preocupação dos jornais (em todo o mundo) deixou de ser informar. A grande preocupação dos jornais, nos tempos que correm, é vender.

Vender, vender, vender jornais a qualquer preço – é a palavra de ordem. E estes são momentos privilegiados para o conseguir.

Que importa a verdade? O que importa é conseguir a manchete mais sensacional, o título mais chocante, o isco mais eficaz, independentemente de quem possa sair ferido do combate.

Escreveram-se coisas terríveis. A menina passou de raptada a morta, os pais passaram de vítimas a suspeitos, a PJ passou de óptima a péssima, etc. Caiu um director nacional da Judiciária e o responsável pelas investigações foi substituído. Tudo aconteceu neste triste caso.



A ssente a poeira, uma hipótese prevaleceu: a menina morreu no apartamento e foi levada dali para fora por alguém. Esse alguém podem ter sido os pais (como foi aventado), um amigo, um desconhecido…

Remoendo ao volante do meu carro as notícias publicadas sobre os McCann (tenho o vício de aproveitar o tempo a conduzir para resolver problemas pendentes ou enigmas por decifrar, pelo que nunca me aborreço em viagem nem desespero nas bichas), recordei subitamente o enredo do primeiro livro de ficção que escrevi (e do qual já aqui falei): O Último Verão na Ria Formosa.



A história passa-se no Algarve, durante as férias de uma família de Lisboa. Mariana Mendes é casada em segundas núpcias com Diogo Caldeira. Tem um filho do primeiro casamento, Luiz, que vive com eles. Um dia Diogo chega a casa (em Tavira) e encontra o enteado morto. Fica aflito. Em pânico, imagina Mariana a confrontar-se com o cadáver do filho – e toma a decisão de a poupar a esse horror, levando o corpo do rapaz dali para fora. Agarra então nele, transporta-o de carro para um local ermo longe de casa e simula um acidente de automóvel.

As consequências deste acto (bem intencionado) serão terríveis, porque Mariana pensará sempre que foi Diogo quem lhe matou o filho. E não lhe perdoará. As relações entre ambos conhecerão o inferno, e o ar dentro de casa tornar-se-á irrespirável. Não conto o final, para não roubar o interesse a quem ainda não leu o livro.



LEMBREI-ME desta história, como disse, a propósito dos McCann e do desaparecimento da menina. Também para eles, certamente, as férias de 2007 foram as últimas no Algarve. Para aquela família, tratou-se do último Verão na Praia da Luz…

E, inevitavelmente, fiz a pergunta que o leitor já está a fazer a si próprio: e se tudo se tivesse passado como no enredo do livro? Admitamos que, por hipótese, o pai chegou ao apartamento, encontrou a menina morta – e, não querendo que a mulher se confrontasse com a terrível realidade, pegou nela e levou-a para fora dali. É implausível? Não sei. Tudo depende da relação que existia entre o casal, e da própria relação que existia entre cada um dos seus membros e a filha.

É perfeitamente admissível um homem cometer um acto insensato, louco, como aquele, para impedir a mulher de ver a filha morta num apartamento onde passam férias. Até porque – quem sabe? – Gerry McCann poderia ter sido atacado pelos remorsos, por deixar tempo demais as crianças sozinhas no quarto, sendo levado a ‘apagar’ a prova da sua culpa.



ESTA hipótese – naturalmente especulativa, como todas as outras – deitaria por terra muito do que se disse e escreveu sobre o caso e lançaria sobre ele uma nova luz, permitindo a exploração de novas pistas. Se as coisas se passaram assim, a menina teria morrido no apartamento – como tem sido dito –, por doença, por acidente ou por acção (intencional ou inadvertida) de alguém, mas, ao contrário do que todos pensaram, os pais não seriam ambos cúmplices no desaparecimento do corpo nem teriam agido em conjunto. Pelo contrário: um teria actuado com o objectivo de poupar o outro a um choque.

Seria um comportamento insensato, eventualmente desvairado e certamente perigoso – porque, como sucedeu com o personagem da Ria Formosa, esse acto acabaria sempre por atrair as suspeitas sobre ele. Mas o que um homem faz num momento de desnorte não está na sua mão controlar nem se subordina a qualquer lógica.



SE ESTA hipótese fosse verdadeira, não seria a primeira vez que a ficção serviria para ajudar a decifrar a realidade. Quantos crimes reais não foram deslindados a partir de hipóteses colocadas na literatura policial?

Francamente, de todas as teses apresentadas para explicar o que aconteceu, esta é a que encaixa melhor nos factos. Por um lado, explica o odor a cadáver que os cães sentiram no apartamento. Por outro lado, explica o desaparecimento do corpo da criança. Finalmente, não lança sobre os pais a suspeita de terem cometido um crime hediondo. Apenas coloca a possibilidade de um deles ter levado dali a menina para poupar o outro ao tremendo choque de se confrontar com o cadáver da filha.

No limite, esta atitude até seria humanitária, corajosa, quase heróica. Seria uma prova de amor – embora trágica – relativamente ao outro cônjuge.

Foi assim? Não foi? Talvez nunca se saiba. Nesta crónica também mais não fiz do que trazer a ficção ao encontro da realidade. Sentado ao volante do carro.
Publicadopor JAS | 1 Comentário(s)
Vitor mango
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