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Mensagem por Viriato Qua Dez 22, 2010 9:23 am

Se o Estado garante não paga ao privado

por Daniel Oliveira

Mesmo que se pudessem fazer acertos para garantir o mínimo de previsibilidade na gestão dos colégios privados, o espírito do decreto de lei do governo sobre os contratos de associação com o ensino privado está correcto. Acaba o financiamento automático, muito dele resultado de contratos assinados há trinta anos, quando a rede pública era outra, e que retirava ao Estado a possibilidade soberana de avaliar o que financia. E de adaptar esse financiamento às suas próprias necessidades.



A coisa é simples: por princípio, o Estado não deve financiar um colégio se tem ao lado uma oferta gratuita que ele próprio garante. O financiamento público apenas deve existir quando o Estado não está em condições de, num determinado lugar ou para uma determinada população escolar, garantir o direito de todos os cidadãos à educação. O espírito deve ser o de dar ao sistema privado um caracter supletivo: para quem o quer e por isso o paga e para quem não tem alternativas e por isso é financiado. Ao manter o financiamento automático, independentemente da oferta pública, esse caracter supletivo era distorcido. Desviavam-se fundos da escola pública para aquilo que é, muito legitimamente, um negócio. Mas os negócios devem depender do mercado e não do Orçamento de Estado.



Cavaco Silva é que não gostou do decreto do governo. O mesmo Presidente que se manteve em silêncio quando foram cortadas as prestações sociais ou recursos para os serviços públicos não hesitou em falar quando estevam em causa os dinheiros para colégios privados. E já se antevê um veto. As prioridades de Cavaco ficam assim evidentes.



Mas, na verdade, o Presidente da República está longe de ser o único a ter de explicar os critérios políticos das suas opções. Esta semana o CDS regressou à sua batalha de sempre pelos subsidios públicos aos colégios privados. E para tropedear o decreto do governo regressa ao espírito da Lei de Bases apresentada por Durão Barroso, que Jorge Sampaio então vetou, onde se dizia: "o dimensionamento da rede escolar dependente do Ministério da Educação, no que respeita ao seu alargamento, reconversão ou ajustamento, terá obrigatoriamente em consideração os estabelecimentos particulares e cooperativos já existentes". Ou seja, Escola Pública seria supletiva em relação à escola privada. Basicamente, uma forma enviesada de impor a ideia do cheque-ensino.



Aconteceu uma coisa estranha: ou para agradar aos professores do sector privado - que estão legitimamente preocupados com a sua situação laboral - ou apenas para atacar o PS, Bloco de Esquerda e PCP viabilizaram, através da abstenção, a proposta de Paulo Portas. Quando a perspectiva meramente sindical ou táctica cria este tipo de enviesamento ideológico percebemos que alguém anda desnorteado.

Nos próximos anos, à boleia da crise, serão muitas as tentativas de, por portas travessas, conseguir o velho sonho de privatizar a Escola Pública. Que Cavaco Silva seja um aliado natural desta estratégia, não espanta. Essa é uma das razões que assusta a ideia de o ter em Belém quando Passos Coelho chegar a São Bento. Que a esquerda à esquerda do PS, por razões táticas ou meramente sindicais, não perceba o que está em causa neste espisódio já me deixa mais preocupado. Estou certo que, na especialidade, tratará de corrigir o tiro. Há combates demasiado importantes para estar a pensar em ganhos de circunstância.



Publicado no Expresso Online


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