O triunfo do derrotismo
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O triunfo do derrotismo
O triunfo do derrotismo
trouxeram-nos provavelmente a maior manifestação de indignação sentida
nas últimas décadas no nosso país. Os motivos são óbvios e
compreensíveis: as medidas anunciadas pelo Primeiro Ministro são
duríssimas e são colocadas em cima duma população que tem aguentado
estoicamente sucessivos aumentos de impostos, um desemprego recorde e
crescente, uma contracção de quase todas as áreas económicas do país e
um declínio contínuo que não parece dar tréguas.
Ao contrário de outros
países onde medidas de austeridade levaram a actos de violência nas ruas
colocando as capitais a ferro e fogo, como aconteceu na Grécia durante
meses ou na Inglaterra de forma mais breve, Portugal beneficiou até
agora de um povo que finalmente mereceu o antigo, e até há pouco tempo
injusto, título de sereno.
As derrotas sucedem-se
com os números oficiais a provarem-se quase sempre piores do que o
esperado e as previsões em constante actualização em baixa. Os
portugueses emigram a uma escala cujos únicos precedentes comparáveis
foram autênticas fomes e guerras. Não existe, para onde quer que se
olhe, um ténue brilho de esperança a que nos possamos agarrar. Não mais.
Esgotou-se.
Durante muitos meses,
acompanhamos as vindas da troika, seguindo a forma previsível como
assinavam a aprovação de novas tranches quase de cruz, já que ao
contrário de outros em situação semelhante, Portugal assumia
orgulhosamente as suas responsabilidades e cumpria o combinado. E isso
dava-nos alguma esperança.
Os mercados
internacionais começavam a ver-nos como um caso muito diferente da
Grécia. As nossas ruas tinham menos carros, os transportes públicos mais
gente, mas as ruas não estavam bloqueadas por manifestantes nem os
dirigentes políticos eram alvo da ira pública. Os sindicatos organizavam
as suas greves e demonstrações de forma pacífica e ordeira exigindo
direitos, salários e contratações, mas sempre sem inflamarem as ruas. E
isso dava-nos alguma esperança.
A indústria e os
serviços, compreendendo as dificuldades do país e o rápido esgotamento
da capacidade financeira dos bancos, das empresas e das famílias
portuguesas, adaptaram-se de um modo formidável e vimos as exportações
crescerem para a Europa, mesmo estando em crise, e redobraram esforços
nas suas vendas para fora desta de forma espectacular. Acalentamos então
a esperança de que mais uns anos assim e teríamos um novo Portugal,
mais poupado, menos consumista e mais produtor e exportador. Como que
uma pequena Alemanha. E isso dava-nos alguma esperança.
Vimos um novo governo
nascer, conseguindo uma coligação estável e de maioria parlamentar à
qual se juntava o maior partido da oposição, todos juntos na
determinação de cumprir o acordo com os financiadores de portugal, a
troika. E isso dava-nos alguma esperança.
Na Europa, as palavras
de apreço de ministros, líderes de governo e chefes de estado,
mostravam-nos que não estávamos sozinhos nesta luta e que desde que
estivéssemos à altura dos acontecimentos, que estes nunca nos deixariam
cair. E isso dava-nos alguma esperança.
E subitamente, toda a
esperança desapareceu. Os eleitores sentem-se defraudados. A coligação
governamental treme. A economia gela de medo. Os consumidores não
compram. As empresas não investem. Os bancos não emprestam. A própria
Europa assusta-se com a reacção dos portugueses.
Todos gritam a injustiça
das últimas medidas, mas não se ouvem alternativas. Todos clamam que
este caminho é o mais errado possível mas não se atrevem a defender o
caminho que nos trouxe até aqui. A governação do nosso ingovernável país
parece mais do que nunca uma pena em vez de um prémio. Os próprios
partidos, tão ávidos de poder, dão sinais de não quererem ficar com o
bebé nos braços. Os deputados dos partidos do governo, normalmente tão
obsequiosos face aos seus líderes partidários tentam esconder-se ou
lavar as suas mãos de responsabilidades de uma situação calamitosa e
pela qual não se querem chamuscar.
Mais assustador ainda, é
o facto de subitamente velhas ideologias provadas erradas vezes sem
conta levantarem de nova a sua voz. Comunistas e fascistas emergem dos
buracos onde estiveram escondidos durante décadas para nos relembrarem
que as suas opções teriam evitado este descalabro.
Estamos perante nada
menos do que o triunfo total e em toda a linha do próprio derrotismo.
Neste momento a rua portuguesa sente que simplesmente não existem
possibilidades de alguma vez ultrapassarmos a catástrofe. E isso é pior
do que todas as derrotas que sofremos antes. Porque a certeza da derrota
é também o garante da derrota. O derrotismo não é condição sine qua non para
a derrota. Podemos perder mesmo com o maior dos optimismos. Mas é
certamente condição suficiente. A minha maior revolta não é para com as
dificuldades crescentes por que temos que passar. É sim para o fatalismo
com que todos à minha volta olham para a certeza da destruição total do
país. Sem alternativas, sem ideias, sem energia, sem sequer o sonho de
um dia melhor.
Não haverá ninguém que
dê um murro na mesa? Que grite ao país que, não obstante todas as
dificuldades porque hoje passamos, não há nada que nos impeça de sermos
um país rico daqui a duas ou três décadas? Que não há nada de errado com
a genética ou cultura dos portugueses? Que sobrevivemos a invasões,
guerras civis, ditaduras e crises de todos os tipos e sempre fomos
capazes de nos levantar novamente?
Nestas alturas a última
coisa que precisamos é de um Primeiro Ministro que chore connosco, que
partilhe connosco as suas dificuldades e incertezas como pai e cidadão.
Nós não o elegemos para ser igual a nós. Não precisamos da sua
compreensão. Esta é altura para dar um estalo e acordar o povo português
da letargia e colocá-lo em acção. Mostre o caminho. Mostre esperança.
Mostre certeza. Não dê parte de fraco a ninguém, nem mesmo a si próprio.
Posted by
Antonio
at
11:08
9 comentários:
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Labels:
Pedro Passos Coelho,
Portugal
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Só discuto o que nao sei ...O ke sei ensino ...POIZ
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