Verdades que doem
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Verdades que doem
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O Presidente Pilatos
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
1. Segundo a sua própria doutrina, Cavaco Silva dá uns recados em privado aos primeiros-ministros. Se de facto assim for, Passos Coelhos ouviu das boas na última reunião com o Presidente da República. Disse ao primeiro-pinistro que "o corte nos subsídios violava as mais básicas regras de equidade", que "a austeridade orçamental não garante que, no futuro, o País se encontrará numa trajectória de crescimento", que "ajustamentos baseados numa trajectória recessiva são insustentáveis", que "o sucesso, em boa parte, não depende só de nós, depende da conjuntura internacional e da capacidade que a UE demonstrar para resolver a crise financeira da Zona Euro". Também não se deve ter esquecido de dizer que não vê espelhadas no Orçamento quaisquer reformas estruturais e que sem elas todos os sacrifícios serão em vão. Mas, mais que tudo, disse ao primeiro-ministro que o caminho escolhido não é o único possível e mostrou-lhe alternativas que não passam pela destruição completa da nossa economia, pela falência de milhares de empresas, por um ainda maior défice, pela criação da maior taxa de desemprego jamais vista e pela fuga em massa dos melhores elementos da administração pública. Enfim, deve ter dito a Passos Coelho o que disse no discurso na Ordem dos Economistas e numa conversa (!) com jornalistas.
Pode ser até que lhe tenha mostrado o artigo do Pedro Lains no Jornal de Negócios onde o economista, insuspeito de qualquer tipo de carinho pela antiga governação, escreve que a estratégia de Passos Coelho "está profundamente desactualizada e mesmo errada" e que "a dimensão do "ajustamento", como lhe querem chamar, é de tal forma grande, é de tal forma brutal que, como é evidente, ultrapassa qualquer estrago que tenha sido feito pelo Governo anterior".
Ora, o primeiro-ministro ouviu isto tudo e fez orelhas moucas. O Presidente da República, que pode ter muitos defeitos mas não embarca em suicídios colectivos, resolveu não esperar cinco anos, como fez com Sócrates, e bastaram-lhe quatro meses para se demarcar publicamente do Governo.
É bem verdade que a monstruosidade da proposta orçamental não deixava grande espaço de manobra a Cavaco Silva. Ele sabe como qualquer pessoa que não esteja completamente cega por fidelidades partidárias ou que acredita na patranha do "vivemos acima das nossas possibilidades", "gorduras" e afins, que a estrada escolhida nos conduz directamente para o inferno. Mas, mais cedo ou mais tarde, o conflito iria instalar-se entre o primeiro-ministro e o Presidente da República. Pena é que tenha sido esta a razão. A retórica utilizada por Passos Coelho enquanto candidato era diametralmente oposta à de Cavaco (infelizmente, Passos Coelho pré-candidato a primeiro-ministro também não tem rigorosamente nada a ver com o Passos Coelho primeiro-ministro). Nada os unia. Nem convicções ideológicas, nem costumes, nem valores, nada. Enquanto o objectivo era afastar o antigo primeiro-ministro, não existiam problemas europeus, nem crise internacional, nem de-sequilíbrios estruturais: era tudo culpa do antigo Governo.
Apenas a existência de um inimigo comum juntou, por breves instantes, Cavaco e Passos Coelho. O fim de Sócrates seria sempre o fim de uma impossível relação.
Foi a cooperação institucional mais curta da história da nossa democracia.
2. O "eu avisei" vai marcar para sempre o mandato de Cavaco Silva. Seja através das suas mensagens no Facebook, seja em discursos que ninguém ouviu, seja por o ter dito em particular, o Presidente da República previu todas as desgraças e apontou sempre os melhores caminhos. Cavaco pensa que fica bem na fotografia por dizer umas coisas, sem que actue em função das suas palavras. Troca os seus poderes constitucionais por um negligente conforto pessoal mascarado de aviso, convencido de que assim fica a salvo de críticas quando o caos se instalar.
O que o Presidente da República fez esta semana pode ser resumido numa frase: "o caminho proposto pelo Governo vai desembocar numa catástrofe, depois não digam que não avisei". E o que vai fazer além de ter verbalizado a sua oposição? Rigorosamente nada. Pilatos não faria melhor.
3. António José Seguro, quando ouviu as palavras de Cavaco Silva, deve ter sido assolado por sentimentos confusos. O primeiro foi de alegria. Em vez de andar perdido em disparates como o código de ética e o pacote requentado contra a corrupção, copia na íntegra as declarações do Presidente e, pronto, já tem discurso. Por outro lado, também deve ter percebido que continua a não ser o líder da oposição. Até aqui foram algumas vozes do PSD, agora é o próprio Presidente da República.
In DN
O Presidente Pilatos
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
1. Segundo a sua própria doutrina, Cavaco Silva dá uns recados em privado aos primeiros-ministros. Se de facto assim for, Passos Coelhos ouviu das boas na última reunião com o Presidente da República. Disse ao primeiro-pinistro que "o corte nos subsídios violava as mais básicas regras de equidade", que "a austeridade orçamental não garante que, no futuro, o País se encontrará numa trajectória de crescimento", que "ajustamentos baseados numa trajectória recessiva são insustentáveis", que "o sucesso, em boa parte, não depende só de nós, depende da conjuntura internacional e da capacidade que a UE demonstrar para resolver a crise financeira da Zona Euro". Também não se deve ter esquecido de dizer que não vê espelhadas no Orçamento quaisquer reformas estruturais e que sem elas todos os sacrifícios serão em vão. Mas, mais que tudo, disse ao primeiro-ministro que o caminho escolhido não é o único possível e mostrou-lhe alternativas que não passam pela destruição completa da nossa economia, pela falência de milhares de empresas, por um ainda maior défice, pela criação da maior taxa de desemprego jamais vista e pela fuga em massa dos melhores elementos da administração pública. Enfim, deve ter dito a Passos Coelho o que disse no discurso na Ordem dos Economistas e numa conversa (!) com jornalistas.
Pode ser até que lhe tenha mostrado o artigo do Pedro Lains no Jornal de Negócios onde o economista, insuspeito de qualquer tipo de carinho pela antiga governação, escreve que a estratégia de Passos Coelho "está profundamente desactualizada e mesmo errada" e que "a dimensão do "ajustamento", como lhe querem chamar, é de tal forma grande, é de tal forma brutal que, como é evidente, ultrapassa qualquer estrago que tenha sido feito pelo Governo anterior".
Ora, o primeiro-ministro ouviu isto tudo e fez orelhas moucas. O Presidente da República, que pode ter muitos defeitos mas não embarca em suicídios colectivos, resolveu não esperar cinco anos, como fez com Sócrates, e bastaram-lhe quatro meses para se demarcar publicamente do Governo.
É bem verdade que a monstruosidade da proposta orçamental não deixava grande espaço de manobra a Cavaco Silva. Ele sabe como qualquer pessoa que não esteja completamente cega por fidelidades partidárias ou que acredita na patranha do "vivemos acima das nossas possibilidades", "gorduras" e afins, que a estrada escolhida nos conduz directamente para o inferno. Mas, mais cedo ou mais tarde, o conflito iria instalar-se entre o primeiro-ministro e o Presidente da República. Pena é que tenha sido esta a razão. A retórica utilizada por Passos Coelho enquanto candidato era diametralmente oposta à de Cavaco (infelizmente, Passos Coelho pré-candidato a primeiro-ministro também não tem rigorosamente nada a ver com o Passos Coelho primeiro-ministro). Nada os unia. Nem convicções ideológicas, nem costumes, nem valores, nada. Enquanto o objectivo era afastar o antigo primeiro-ministro, não existiam problemas europeus, nem crise internacional, nem de-sequilíbrios estruturais: era tudo culpa do antigo Governo.
Apenas a existência de um inimigo comum juntou, por breves instantes, Cavaco e Passos Coelho. O fim de Sócrates seria sempre o fim de uma impossível relação.
Foi a cooperação institucional mais curta da história da nossa democracia.
2. O "eu avisei" vai marcar para sempre o mandato de Cavaco Silva. Seja através das suas mensagens no Facebook, seja em discursos que ninguém ouviu, seja por o ter dito em particular, o Presidente da República previu todas as desgraças e apontou sempre os melhores caminhos. Cavaco pensa que fica bem na fotografia por dizer umas coisas, sem que actue em função das suas palavras. Troca os seus poderes constitucionais por um negligente conforto pessoal mascarado de aviso, convencido de que assim fica a salvo de críticas quando o caos se instalar.
O que o Presidente da República fez esta semana pode ser resumido numa frase: "o caminho proposto pelo Governo vai desembocar numa catástrofe, depois não digam que não avisei". E o que vai fazer além de ter verbalizado a sua oposição? Rigorosamente nada. Pilatos não faria melhor.
3. António José Seguro, quando ouviu as palavras de Cavaco Silva, deve ter sido assolado por sentimentos confusos. O primeiro foi de alegria. Em vez de andar perdido em disparates como o código de ética e o pacote requentado contra a corrupção, copia na íntegra as declarações do Presidente e, pronto, já tem discurso. Por outro lado, também deve ter percebido que continua a não ser o líder da oposição. Até aqui foram algumas vozes do PSD, agora é o próprio Presidente da República.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Miguel Macedo e outros coveiros da Democracia
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Miguel Macedo e outros coveiros da Democracia
por PEDRO TADEU
Hoje
Um dos clássicos truques dos maus políticos apanhados em situação dúbia é argumentarem terem a lei a seu favor. O ministro Miguel Macedo cedeu à pressão e abdicou do subsídio de deslocação pago pelo Estado. Antes disso, porém, argumentara que a sua residência oficial era em Braga (apesar de em Algés ter um apartamento registado no Tribunal Constitucional como segunda morada), que o direito a este subsídio "existe há muito tempo na lei" e que "a questão colocada não é nova, tem muitos anos".
O secretário de Estado José Cesário, apanhado na mesma situação, argumentou: "Ter casa aberta em Lisboa tem custos, que são elevados. A de Viseu suporto com o meu orçamento." O governante (ó espanto!) parecia mesmo querer que o Estado ajudasse à compra da casa na capital, pois argumentou que o tal subsídio servia para suportar, passo a citar, "os custos do empréstimo, mais a abertura da dita (IMI, condomínio, água, luz) e os custos de estar deslocado". E, claro, "estava na lei".
Noutro caso, o das subvenções vitalícias, as declarações foram parcas e, nitidamente, o PSD estava preparado, pois, logo no dia seguinte à notícia do DN, apareceu a anunciar um projecto de lei para acabar com a coisa. Mas ainda li uma frase curta e grossa de Dias Loureiro, o administrador que nada sabia do que se passava no BPN: "Cumpro a lei."
O mesmo pensamento legalista ilude, certamente, a consciência de Ângelo Correia, Armando Vara, Jorge Coelho ou Ferreira do Amaral, todos eles com rendimentos alternativos que lhes permitem manter um padrão de vida digno, mas a que juntam valores mensais que variam entre os 1700 e os 3000 euros, pagos pelos contribuintes.
Usar a letra da lei para colher benefícios contrários ao espírito da lei é coisa que não se vê como pode estar tipificada nos códigos como crime, ilegalidade ou mera infracção. Resta a condenação na opinião pública... Só que essa condenação é totalmente ineficaz, pois ninguém será demitido ou perderá eleições por causa disto!
O que acontece, perversamente, é a condenação política geral de todos os políticos, mesmo daqueles que, no meio desta gente, procuram portar-se de forma ética e patriótica e de muitos que deveriam beneficiar destes subsídios e acabarão por os perder, pagando assim o justo pelo pecador.
Pior: numa situação de crise económica, quando se exigem enormes sacrifícios ao povo, não é preciso ser-se mestre em ciência política para adivinhar que cada situação imoral imputada à classe política é mais um prego no caixão do regime a que chamamos, ainda e esperançosamente, Democracia.
In DN
Miguel Macedo e outros coveiros da Democracia
por PEDRO TADEU
Hoje
Um dos clássicos truques dos maus políticos apanhados em situação dúbia é argumentarem terem a lei a seu favor. O ministro Miguel Macedo cedeu à pressão e abdicou do subsídio de deslocação pago pelo Estado. Antes disso, porém, argumentara que a sua residência oficial era em Braga (apesar de em Algés ter um apartamento registado no Tribunal Constitucional como segunda morada), que o direito a este subsídio "existe há muito tempo na lei" e que "a questão colocada não é nova, tem muitos anos".
O secretário de Estado José Cesário, apanhado na mesma situação, argumentou: "Ter casa aberta em Lisboa tem custos, que são elevados. A de Viseu suporto com o meu orçamento." O governante (ó espanto!) parecia mesmo querer que o Estado ajudasse à compra da casa na capital, pois argumentou que o tal subsídio servia para suportar, passo a citar, "os custos do empréstimo, mais a abertura da dita (IMI, condomínio, água, luz) e os custos de estar deslocado". E, claro, "estava na lei".
Noutro caso, o das subvenções vitalícias, as declarações foram parcas e, nitidamente, o PSD estava preparado, pois, logo no dia seguinte à notícia do DN, apareceu a anunciar um projecto de lei para acabar com a coisa. Mas ainda li uma frase curta e grossa de Dias Loureiro, o administrador que nada sabia do que se passava no BPN: "Cumpro a lei."
O mesmo pensamento legalista ilude, certamente, a consciência de Ângelo Correia, Armando Vara, Jorge Coelho ou Ferreira do Amaral, todos eles com rendimentos alternativos que lhes permitem manter um padrão de vida digno, mas a que juntam valores mensais que variam entre os 1700 e os 3000 euros, pagos pelos contribuintes.
Usar a letra da lei para colher benefícios contrários ao espírito da lei é coisa que não se vê como pode estar tipificada nos códigos como crime, ilegalidade ou mera infracção. Resta a condenação na opinião pública... Só que essa condenação é totalmente ineficaz, pois ninguém será demitido ou perderá eleições por causa disto!
O que acontece, perversamente, é a condenação política geral de todos os políticos, mesmo daqueles que, no meio desta gente, procuram portar-se de forma ética e patriótica e de muitos que deveriam beneficiar destes subsídios e acabarão por os perder, pagando assim o justo pelo pecador.
Pior: numa situação de crise económica, quando se exigem enormes sacrifícios ao povo, não é preciso ser-se mestre em ciência política para adivinhar que cada situação imoral imputada à classe política é mais um prego no caixão do regime a que chamamos, ainda e esperançosamente, Democracia.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Vitalício, hoje, só como alcunha
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Vitalício, hoje, só como alcunha
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Ângelo Correia, o último dos ingénuos (e isso, claro, é elogio), interrogado sobre as pensões vitalícias dos ex-políticos e actuais gestores de empresas, quase se engasgou perante a hipótese de ficar sem aquela verba de arredondar o fim do mês (no caso dele, 2200 euros). Aquela pensão é, disse, um "direito adquirido". Adquê?, espanto-me eu. Em Outubro de 2011, direito adquirido pertence à família de ceroula, é termo que nos é muito chegado mas que caiu em desuso. Entre as catástrofes que nos acontecem, incluindo o fim dos direitos adquiridos, acontece-nos também termos de perder a ilusão de que os direitos adquiridos eram direitos e adquiridos. Mesmo os funcionários públicos mais angélicos já sabem que os 13.º e 14.º meses, para o ano e para o ano a seguir, já eram (e até suspeitam o mesmo para os anos seguintes aos a seguir). Os únicos crentes num mundo imutável parecem ser os ex-políticos gestores de topo: acreditam na pensão vitalícia. Homens de demasiada fé! Hoje, para muitos, pode mudar-se do emprego certo para a indigência, e só não se podia, para uns poucos, mudar de pensão vitalícia, é? Pois não é. Seria se aos políticos que mandam lhes interessassem mais os políticos que mandaram do que lhes interessa continuarem a mandar. Ontem, quando havia (ou se julgava haver) margem de manobra, podia ser-se corporativamente generoso. Infelizmente para Ângelo Correia, hoje os que mandam têm, mesmo, de parecer justos.
In DN
Vitalício, hoje, só como alcunha
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Ângelo Correia, o último dos ingénuos (e isso, claro, é elogio), interrogado sobre as pensões vitalícias dos ex-políticos e actuais gestores de empresas, quase se engasgou perante a hipótese de ficar sem aquela verba de arredondar o fim do mês (no caso dele, 2200 euros). Aquela pensão é, disse, um "direito adquirido". Adquê?, espanto-me eu. Em Outubro de 2011, direito adquirido pertence à família de ceroula, é termo que nos é muito chegado mas que caiu em desuso. Entre as catástrofes que nos acontecem, incluindo o fim dos direitos adquiridos, acontece-nos também termos de perder a ilusão de que os direitos adquiridos eram direitos e adquiridos. Mesmo os funcionários públicos mais angélicos já sabem que os 13.º e 14.º meses, para o ano e para o ano a seguir, já eram (e até suspeitam o mesmo para os anos seguintes aos a seguir). Os únicos crentes num mundo imutável parecem ser os ex-políticos gestores de topo: acreditam na pensão vitalícia. Homens de demasiada fé! Hoje, para muitos, pode mudar-se do emprego certo para a indigência, e só não se podia, para uns poucos, mudar de pensão vitalícia, é? Pois não é. Seria se aos políticos que mandam lhes interessassem mais os políticos que mandaram do que lhes interessa continuarem a mandar. Ontem, quando havia (ou se julgava haver) margem de manobra, podia ser-se corporativamente generoso. Infelizmente para Ângelo Correia, hoje os que mandam têm, mesmo, de parecer justos.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Bizarrias e desonestidades
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Bizarrias e desonestidades
por NUNO SARAIVA
Hoje
O ministro da Economia, foi quarta-feira passada à Assembleia da República responder a uma interpelação do Bloco de Esquerda sobre o desemprego. Já todos sabemos que do Orçamento do Estado constam poucas ou nenhumas medidas de incentivo ao emprego. Aumentam-se impostos sobre o rendimento, cortam-se subsídios e congelam-se ordenados e pensões, aumenta-se o horário de trabalho pagando o mesmo. Porém, exige-se o aumento da produtividade como contrapartida para uma eventual subida - sabe Deus quando - do salário mínimo nacional.
No Parlamento, Álvaro Santos Pereira "atirou-se" aos comunistas que, "demagogicamente", continuam a defender que a remuneração mínima deve chegar aos 600 euros em 2013, considerando que fazê-lo "seria condenar a economia portuguesa ao que aconteceu após o 25 de Abril". Nessa época, afirmou Santos Pereira, houve aumentos nominais dos salários "de tal modo grandes" que as exportações nacionais "tiveram o maior recuo" dos últimos anos.
Em primeiro lugar, é conveniente lembrar que o salário mínimo foi criado para reduzir os níveis de pobreza extrema. Ora, uma coisa é a inevitabilidade de "termos de empobrecer", e a necessidade de reconhecermos que, nos últimos anos, temos vivido acima das nossas reais possibilidades. Não nos sirvamos porém deste acto de contrição para advogar um retrocesso até aos dias do Estado Novo, em que o miserabilismo era a palavra de ordem. Fazer depender a subida do salário mínimo do aumento da produtividade é o mesmo que fazer sujeitar a produção agrícola à existência de chuva. Isto é, o que este ministro da Economia nos está a dizer - à semelhança aliás dos seus antecessores - é que a culpa do estado comatoso a que chegámos, por via da punição que lhes é imposta, é de quem sobrevive e não de quem, passe a expressão, consegue orientar-se. Os governos, sejam eles quais forem, nunca dizem que a ruína vem dos sobreiros do caso Portucale, das luvas pagas em negócios de compra de submarinos ou licenciamento de projectos imobiliários, da Operação Furacão ou de quem ganhou dinheiro à custa do BPN, só para dar alguns exemplos. A culpa, passe o esquerdismo exacerbado, é sempre de quem vive do seu trabalho.
Por outro lado, sabemos hoje que as chamadas "gorduras do Estado", em vez de diminuírem, continuam a aumentar. Ao que parece, em vez de recorrer aos inúmeros juristas de indiscutível competência de que a Presidência do Conselho de Ministros dispõe, o Governo - certamente sem olhar a poupanças - aprovou as leis orgânicas dos ministérios elaboradas por alguns dos maiores escritórios de advogados nacionais. Aliás, no Orçamento do Estado para 2012, o mais severo da democracia portuguesa, a rubrica referente a pareceres técnicos e jurídicos é maior do que no anterior. E o ministério que dispõe de maior verba para recorrer ao outsourcing é precisamente o de Álvaro Santos Pereira. Assim, de facto, não há dinheiro que chegue para aumentar o salário mínimo.
Percebemos assim melhor por que razão já admite o primeiro-ministro que os funcionários públicos passem a receber apenas 12 vencimentos e não 14 como até aqui. O ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares sustentou aliás que "muitos países da União Europeia só têm 12 vencimentos. Esta tem sido uma tradição [pagar 14 vencimentos] mais acentuada nos países do Sul da Europa, aqueles que até se encontram nas piores circunstâncias". A discussão que importa fazer não é tanto a de saber se recebemos 12 ou 14 salários, mas sim quanto dinheiro levamos para casa ao fim de um ano de trabalho. Mas para que esse debate seja intelectualmente honesto é bom que, quando se faz a comparação entre Portugal e os Estados do Norte da Europa - porque é disso que se trata -, se diga que o rendimento médio nesses países é três vezes superior ao nosso. E, ao contrário do que se passa em Portugal, onde só ouvimos falar de cortes e aumentos de impostos, nesses mesmos países a taxa de esforço fiscal, que não deve andar muito longe da nossa, serve para garantir que o Estado assegure serviços essenciais de qualidade como a saúde ou a educação.
É certo que as sondagens ainda mostram que a maioria dos portugueses está disposta a acatar as medidas necessárias para reerguer o País. Ainda dão o benefício da dúvida a este Governo. Dispensavam por isso a demagogia e a falta de verdade.
In DN
Bizarrias e desonestidades
por NUNO SARAIVA
Hoje
O ministro da Economia, foi quarta-feira passada à Assembleia da República responder a uma interpelação do Bloco de Esquerda sobre o desemprego. Já todos sabemos que do Orçamento do Estado constam poucas ou nenhumas medidas de incentivo ao emprego. Aumentam-se impostos sobre o rendimento, cortam-se subsídios e congelam-se ordenados e pensões, aumenta-se o horário de trabalho pagando o mesmo. Porém, exige-se o aumento da produtividade como contrapartida para uma eventual subida - sabe Deus quando - do salário mínimo nacional.
No Parlamento, Álvaro Santos Pereira "atirou-se" aos comunistas que, "demagogicamente", continuam a defender que a remuneração mínima deve chegar aos 600 euros em 2013, considerando que fazê-lo "seria condenar a economia portuguesa ao que aconteceu após o 25 de Abril". Nessa época, afirmou Santos Pereira, houve aumentos nominais dos salários "de tal modo grandes" que as exportações nacionais "tiveram o maior recuo" dos últimos anos.
Em primeiro lugar, é conveniente lembrar que o salário mínimo foi criado para reduzir os níveis de pobreza extrema. Ora, uma coisa é a inevitabilidade de "termos de empobrecer", e a necessidade de reconhecermos que, nos últimos anos, temos vivido acima das nossas reais possibilidades. Não nos sirvamos porém deste acto de contrição para advogar um retrocesso até aos dias do Estado Novo, em que o miserabilismo era a palavra de ordem. Fazer depender a subida do salário mínimo do aumento da produtividade é o mesmo que fazer sujeitar a produção agrícola à existência de chuva. Isto é, o que este ministro da Economia nos está a dizer - à semelhança aliás dos seus antecessores - é que a culpa do estado comatoso a que chegámos, por via da punição que lhes é imposta, é de quem sobrevive e não de quem, passe a expressão, consegue orientar-se. Os governos, sejam eles quais forem, nunca dizem que a ruína vem dos sobreiros do caso Portucale, das luvas pagas em negócios de compra de submarinos ou licenciamento de projectos imobiliários, da Operação Furacão ou de quem ganhou dinheiro à custa do BPN, só para dar alguns exemplos. A culpa, passe o esquerdismo exacerbado, é sempre de quem vive do seu trabalho.
Por outro lado, sabemos hoje que as chamadas "gorduras do Estado", em vez de diminuírem, continuam a aumentar. Ao que parece, em vez de recorrer aos inúmeros juristas de indiscutível competência de que a Presidência do Conselho de Ministros dispõe, o Governo - certamente sem olhar a poupanças - aprovou as leis orgânicas dos ministérios elaboradas por alguns dos maiores escritórios de advogados nacionais. Aliás, no Orçamento do Estado para 2012, o mais severo da democracia portuguesa, a rubrica referente a pareceres técnicos e jurídicos é maior do que no anterior. E o ministério que dispõe de maior verba para recorrer ao outsourcing é precisamente o de Álvaro Santos Pereira. Assim, de facto, não há dinheiro que chegue para aumentar o salário mínimo.
Percebemos assim melhor por que razão já admite o primeiro-ministro que os funcionários públicos passem a receber apenas 12 vencimentos e não 14 como até aqui. O ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares sustentou aliás que "muitos países da União Europeia só têm 12 vencimentos. Esta tem sido uma tradição [pagar 14 vencimentos] mais acentuada nos países do Sul da Europa, aqueles que até se encontram nas piores circunstâncias". A discussão que importa fazer não é tanto a de saber se recebemos 12 ou 14 salários, mas sim quanto dinheiro levamos para casa ao fim de um ano de trabalho. Mas para que esse debate seja intelectualmente honesto é bom que, quando se faz a comparação entre Portugal e os Estados do Norte da Europa - porque é disso que se trata -, se diga que o rendimento médio nesses países é três vezes superior ao nosso. E, ao contrário do que se passa em Portugal, onde só ouvimos falar de cortes e aumentos de impostos, nesses mesmos países a taxa de esforço fiscal, que não deve andar muito longe da nossa, serve para garantir que o Estado assegure serviços essenciais de qualidade como a saúde ou a educação.
É certo que as sondagens ainda mostram que a maioria dos portugueses está disposta a acatar as medidas necessárias para reerguer o País. Ainda dão o benefício da dúvida a este Governo. Dispensavam por isso a demagogia e a falta de verdade.
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
A justiça para Lima
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A justiça para Lima
por FILOMENA MARTINS
Hoje
O "caso Duarte Lima", independentemente do seu desfecho e dos seus protagonistas, veio colocar a nu mais uma enorme brecha da justiça portuguesa. Ficou claro que um cidadão português pode matar outro cidadão português, em alguns países, entre os quais o Brasil, e ficar impune. Pior: pode voltar para o nosso país e viver tranquilamente sem que a justiça o incomode. A Procuradoria-Geral da República não pode esconder-se atrás das regras da extradição para não actuar. O Ministério Público não pode, como afirmou a magistrada Cândida Almeida, ficar à espera que seja o Brasil a pedir para abrir a óbvia investigação. Este é o momento para discutir um assunto muito sério e alterar a lei e a constituição, se necessário for. Este é o momento de agir, em vez de se andar a medir o poder e a influência desta ou daquela associação judicial, os únicos assuntos que infelizmente parecem preocupar o sector.
Os recursos de Isaltino
Ainda em Justiça e o que ela não devia ser. Veja-se o caso Isaltino Morais. Depois do descrédito que foi o erro da sua detenção por menos de 24 horas, sabe-se agora que, apesar de a sua pena ter transitado finalmente em julgado, permitindo agora sim a sua detenção, vários recursos do autarca de Oeiras lançaram o caos nos tribunais, a poucas semanas da prescrição dos seus crimes. E tem de se estranhar que as mil e uma artimanhas processuais com que se atravancam os tribunais e se põe a justiça a passo de caracol - vide outro caso exemplar, o de Vale e Azevedo - só sejam usadas por advogados mais diligentes. Se estamos a falar sempre de meios legítimos, será que os responsáveis da nossa justiça não têm forma de os usar em sentido contrário? Não existe uma brecha legal para que se possa investigar Duarte Lima ou punir Isaltino Morais? Ou simplesmente não há interesse q.b.?
A democracia europeia
Vamos ser claros: a decisão do primeiro-ministro grego George Papandreou só é condenável porque ele decidiu dar valor à democracia a meio do jogo e não logo quando a Grécia pediu ajuda. De resto, é uma manobra de cálculo político, como têm sido as de Sarkozy e Merkel. Todos têm estado mais preocupados com a sua sobrevivência política, e/ou a dos seus partidos, do que em encontrar soluções globais. A diferença é que o francês e a alemã têm poder e dinheiro. O grego tem dívidas, necessidade absoluta de dinheiro e um cadastro histórico na arte de enganar. Por isso perdeu. E fez-nos perder a todos: porque Papandreou pôs a Europa a discutir o caso grego, adiando, uma vez mais, as eternamente adiadas soluções definitivas para a Zona Euro. Atrás da Grécia, quem virá: a Itália? E como se resolverá? Com mais cinco encontros a dois e uma mudança de Governo? A Europa não tem falta de liderança, tem falta de decisões. Porque quem manda está a fazê-lo pelos motivos errados.
A dúvida de Cavaco
Cavaco Silva não teve dúvidas em aprovar ao Governo de José Sócrates a cobrança de portagens em três Scut. Nunca questionou nem o modelo, nem sequer as razões da escolha daquelas três vias. Que razões o levarão agora a pedir esclarecimentos - sem esclarecer quais - sobre o alargamento da medida a todas as Scut, se a intenção era largamente conhecida, discutida e defendida pelo PSD, quer na oposição, quer na campanha eleitoral? Com o atraso na promulgação da medida a custar mais de 300 mil euros por dia aos cofres estatais, o mês e meio para decidir que o Presidente reclama só se compreende se Cavaco de repente tiver considerado que esta é uma das medidas da injustiça social que já criticou. Porque ninguém pode acreditar que, com o País a atravessar os graves momentos que atravessa, possa estar a decorrer uma guerra surda entre os dois principais órgãos de soberania; e que o timing e a oportunidade das críticas presidenciais sobre o orçamento tenha tido como resposta as notícias sobre a dimensão da comitiva que Belém levou à cimeira ibero-americana. Ou pode?
O tabu de Seguro
Dezassete dias depois, o PS anunciou aquilo de que poucos duvidavam: a abstenção na votação do Orçamento do Estado para o próximo ano. E fê-lo da forma correcta e com a justificação acertada: criticando medidas e propondo alternativas e fazendo-o em nome de um bem maior, a defesa do País. Mas se esta era a única decisão possível, e se há duas semanas António José Seguro a antecipou quando afirmou que as hipóteses de rejeição eram apenas de 0,1%, porquê a demora? Tratou-se de um erro tremendo do líder do PS ou de quem o aconselha. O arrastar do tabu ao longo destas duas semanas só serviu para mostrar ao País aquilo que já ficara claro no congresso de Braga: o quão divididos estão os socialistas. E o quanto essa divisão pode enfraquecer as posições do maior partido da oposição, numa altura em que Portugal mais precisa de contraditório responsável e alternativo.
In DN
A justiça para Lima
por FILOMENA MARTINS
Hoje
O "caso Duarte Lima", independentemente do seu desfecho e dos seus protagonistas, veio colocar a nu mais uma enorme brecha da justiça portuguesa. Ficou claro que um cidadão português pode matar outro cidadão português, em alguns países, entre os quais o Brasil, e ficar impune. Pior: pode voltar para o nosso país e viver tranquilamente sem que a justiça o incomode. A Procuradoria-Geral da República não pode esconder-se atrás das regras da extradição para não actuar. O Ministério Público não pode, como afirmou a magistrada Cândida Almeida, ficar à espera que seja o Brasil a pedir para abrir a óbvia investigação. Este é o momento para discutir um assunto muito sério e alterar a lei e a constituição, se necessário for. Este é o momento de agir, em vez de se andar a medir o poder e a influência desta ou daquela associação judicial, os únicos assuntos que infelizmente parecem preocupar o sector.
Os recursos de Isaltino
Ainda em Justiça e o que ela não devia ser. Veja-se o caso Isaltino Morais. Depois do descrédito que foi o erro da sua detenção por menos de 24 horas, sabe-se agora que, apesar de a sua pena ter transitado finalmente em julgado, permitindo agora sim a sua detenção, vários recursos do autarca de Oeiras lançaram o caos nos tribunais, a poucas semanas da prescrição dos seus crimes. E tem de se estranhar que as mil e uma artimanhas processuais com que se atravancam os tribunais e se põe a justiça a passo de caracol - vide outro caso exemplar, o de Vale e Azevedo - só sejam usadas por advogados mais diligentes. Se estamos a falar sempre de meios legítimos, será que os responsáveis da nossa justiça não têm forma de os usar em sentido contrário? Não existe uma brecha legal para que se possa investigar Duarte Lima ou punir Isaltino Morais? Ou simplesmente não há interesse q.b.?
A democracia europeia
Vamos ser claros: a decisão do primeiro-ministro grego George Papandreou só é condenável porque ele decidiu dar valor à democracia a meio do jogo e não logo quando a Grécia pediu ajuda. De resto, é uma manobra de cálculo político, como têm sido as de Sarkozy e Merkel. Todos têm estado mais preocupados com a sua sobrevivência política, e/ou a dos seus partidos, do que em encontrar soluções globais. A diferença é que o francês e a alemã têm poder e dinheiro. O grego tem dívidas, necessidade absoluta de dinheiro e um cadastro histórico na arte de enganar. Por isso perdeu. E fez-nos perder a todos: porque Papandreou pôs a Europa a discutir o caso grego, adiando, uma vez mais, as eternamente adiadas soluções definitivas para a Zona Euro. Atrás da Grécia, quem virá: a Itália? E como se resolverá? Com mais cinco encontros a dois e uma mudança de Governo? A Europa não tem falta de liderança, tem falta de decisões. Porque quem manda está a fazê-lo pelos motivos errados.
A dúvida de Cavaco
Cavaco Silva não teve dúvidas em aprovar ao Governo de José Sócrates a cobrança de portagens em três Scut. Nunca questionou nem o modelo, nem sequer as razões da escolha daquelas três vias. Que razões o levarão agora a pedir esclarecimentos - sem esclarecer quais - sobre o alargamento da medida a todas as Scut, se a intenção era largamente conhecida, discutida e defendida pelo PSD, quer na oposição, quer na campanha eleitoral? Com o atraso na promulgação da medida a custar mais de 300 mil euros por dia aos cofres estatais, o mês e meio para decidir que o Presidente reclama só se compreende se Cavaco de repente tiver considerado que esta é uma das medidas da injustiça social que já criticou. Porque ninguém pode acreditar que, com o País a atravessar os graves momentos que atravessa, possa estar a decorrer uma guerra surda entre os dois principais órgãos de soberania; e que o timing e a oportunidade das críticas presidenciais sobre o orçamento tenha tido como resposta as notícias sobre a dimensão da comitiva que Belém levou à cimeira ibero-americana. Ou pode?
O tabu de Seguro
Dezassete dias depois, o PS anunciou aquilo de que poucos duvidavam: a abstenção na votação do Orçamento do Estado para o próximo ano. E fê-lo da forma correcta e com a justificação acertada: criticando medidas e propondo alternativas e fazendo-o em nome de um bem maior, a defesa do País. Mas se esta era a única decisão possível, e se há duas semanas António José Seguro a antecipou quando afirmou que as hipóteses de rejeição eram apenas de 0,1%, porquê a demora? Tratou-se de um erro tremendo do líder do PS ou de quem o aconselha. O arrastar do tabu ao longo destas duas semanas só serviu para mostrar ao País aquilo que já ficara claro no congresso de Braga: o quão divididos estão os socialistas. E o quanto essa divisão pode enfraquecer as posições do maior partido da oposição, numa altura em que Portugal mais precisa de contraditório responsável e alternativo.
In DN
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O caso dos seis chocolates do Lidl
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O caso dos seis chocolates do Lidl
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Sim, eu sei que há diferenças. Jean Valjean roubou um pão e António Miguel roubou seis chocolates. Os Miseráveis abre com Waterloo, e o horrível desfalque nas prateleiras do Lidl, no Porto, é contemporâneo. Mas há semelhanças: o romance vai da batalha, em 1815, às barricadas de Paris, em 1832, e o processo do magistrado encarregado do caso dos chocolates, acontecido há 18 meses, vai a tribunal em Setembro próximo, daqui a dez. Olha, surgiu-me outro ponto comum: o procurador do Ministério Público é tão tenaz com o António Miguel como o inspector Javert a perseguir Valjean durante anos. E, no entanto (como eu conheço os portugueses...), aposto que o nosso procurador quando se cruzou com Os Miseráveis - o livro de Victor Hugo ou o musical na Broadway -, os seus olhos marejaram-se, não pela pertinácia do inspector Javert mas pela compaixão por Jean Valjean. Então, por que deixar o caso chegar a Setembro do ano que vem? Eu sei que há o Código Penal, tão intratável quando se trata de seis chocolates. Eu sei que há o gerente do Lidl que não soube dizer "António Miguel, tornas a pôr os pés na minha loja, levas nas trombas", resolvendo o caso do sem-abrigo que tentou - esqueci-me de dizer: foi só tentativa - roubar-lhe chocolates. Eu sei que um caso aterrando na Justiça não é fácil a um magistrado desfazer-se dele. Sei tudo isso mas também que o magistrado podia ter rejeitado a facilidade. E não nos ter envergonhado a todos.
In DN
O caso dos seis chocolates do Lidl
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Sim, eu sei que há diferenças. Jean Valjean roubou um pão e António Miguel roubou seis chocolates. Os Miseráveis abre com Waterloo, e o horrível desfalque nas prateleiras do Lidl, no Porto, é contemporâneo. Mas há semelhanças: o romance vai da batalha, em 1815, às barricadas de Paris, em 1832, e o processo do magistrado encarregado do caso dos chocolates, acontecido há 18 meses, vai a tribunal em Setembro próximo, daqui a dez. Olha, surgiu-me outro ponto comum: o procurador do Ministério Público é tão tenaz com o António Miguel como o inspector Javert a perseguir Valjean durante anos. E, no entanto (como eu conheço os portugueses...), aposto que o nosso procurador quando se cruzou com Os Miseráveis - o livro de Victor Hugo ou o musical na Broadway -, os seus olhos marejaram-se, não pela pertinácia do inspector Javert mas pela compaixão por Jean Valjean. Então, por que deixar o caso chegar a Setembro do ano que vem? Eu sei que há o Código Penal, tão intratável quando se trata de seis chocolates. Eu sei que há o gerente do Lidl que não soube dizer "António Miguel, tornas a pôr os pés na minha loja, levas nas trombas", resolvendo o caso do sem-abrigo que tentou - esqueci-me de dizer: foi só tentativa - roubar-lhe chocolates. Eu sei que um caso aterrando na Justiça não é fácil a um magistrado desfazer-se dele. Sei tudo isso mas também que o magistrado podia ter rejeitado a facilidade. E não nos ter envergonhado a todos.
In DN
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Consenso? Qual consenso?
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Consenso? Qual consenso?
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
1. Enquanto no Parlamento português Passos Coelho se mostrava contra uma intervenção mais alargada do Banco Central Europeu com afirmações do género "o BCE não deve pagar o preço da indisciplina de alguns países com mais inflação e financiamento monetário", conseguindo ser mais merkeliana que a própria sra. Merkel, David Cameron reclamava um papel muito mais activo para o banco através da atribuição de capacidade suficiente para resgatar as economias da região.
O primeiro-ministro britânico está longe de ser o único a reclamar mais poderes para essa instituição. Editoriais de órgãos de informação insuspeitos de esquerdismo ou de serem particularmente adeptos de fórmulas que excluam medidas de austeridade ou de defenderem a manutenção da espirais de endividamento até aqui prosseguidas, como o Economist ou o Financial Times, vêm repetindo número após número que a solução passa por atribuir ao BCE poderes para comprar quantidades ilimitadas de dívida. No limite, emitir moeda. A estes somam-se cada vez mais vozes dos mais diversos quadrantes políticos, empresariais e académicos. Em Portugal destaca-se Cavaco Silva, que vem defendendo esta posição desde o seu célebre discurso em Florença e que repetiu na última sexta-feira em entrevista à Bloomberg. Também ele não rejeita, como é patente e notório, medidas de austeridade ou defende qualquer tipo de indisciplina orçamental.
Temos assim dum lado Passos, Merkel e Sarkozy e do outro, entre muitos, o Presidente da República portuguesa.
Que não existam quaisquer tipos de dúvidas: é o maior conflito institucional entre um primeiro-ministro e um Presidente da República da história da democracia portuguesa. Não estão em causa escutas, guerras sobre competências, estatutos administrativos de regiões, aborto, presidências abertas, leis de responsabilidade extracontratual do Estado ou outras. Não será comparável sequer à diferença de pontos de vista quanto à equidade na distribuição dos sacrifícios. Não, numa questão em que se decide o futuro de Portugal e de gerações de portugueses, a vida ou morte do euro e do projecto europeu, há duas opções diametralmente opostas e os nossos dois maiores responsáveis políticos portugueses estão em campos opostos. Mais, não hesitam em defender de forma intransigente as suas tão díspares visões e apregoam-nos aos quatro ventos.
A viagem do Presidente da República aos Estados Unidos deve ter tido, aliás, momentos interessantes. Os americanos devem ter ficado muito confundidos com as posições portuguesas acerca da crise do euro e das soluções defendidas. Dum lado Cavaco a defender uma posição, e do outro o homem invisível Paulo Portas a sustentar um ponto de vista absolutamente contrário.
Se o Presidente da República e o primeiro-ministro não se entendem numa questão desta magnitude para que servem os desesperados apelos ao consenso e disparates do género com destaque para a enorme patetice do Governo de união nacional?
Insisto, estamos perante, de longe, o maior e mais grave conflito institucional da democracia portuguesa.
2. "A intervenção do BCE não deve ser feita pa- ra garantir que os indisciplinados obriguem, com inflação e com financiamento monetário, o BCE a pagar o preço da indisciplina e da irresponsabilidade", enfatizou o primeiro-ministro.
Sabendo que um dos países indisciplinados e irresponsáveis é Portugal, Passos Coelho, no fundo, diz-nos que se não fosse obrigado a impor uma austeridade violenta manteria o catastrófico anterior rumo. Ou seja, não se julga capaz de mudar antigos hábitos despesistas, acabar com parcerias público-privadas ruinosas, o Estado, dar mais relevância à iniciativa privada ou mudar por completo as empresas públicas. Numa palavra: não saberia governar.
O tempo, a travagem do crescimento do desemprego, o aumento das exportações, a estabilidade dos mercados (a inflação que certamente ocorreria seria o preço a pagar, mas face ao perigo iminente da desagregação do euro e da Europa é um risco que vale bem a pena correr) que se ganharia com a possibilidade de o BCE comprar ilimitadamente dívida não seriam aproveitadas, segundo a sua própria doutrina, para fazer as reformas de que tanto necessitamos - e que ninguém tenha dúvidas: não é possível, em dois anos, corrigir décadas de incompetência e irresponsabilidade. Não, continuaria o despautério. Com semelhante admissão de incapacidade o melhor mesmo é seguir à risca, ou mesmo extravasar, as receitas da sra. Merkel. Melhor ainda, pedir a um enviado alemão para tomar conta disto. Vendo bem, é o que está a acontecer.
In DN
Consenso? Qual consenso?
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
1. Enquanto no Parlamento português Passos Coelho se mostrava contra uma intervenção mais alargada do Banco Central Europeu com afirmações do género "o BCE não deve pagar o preço da indisciplina de alguns países com mais inflação e financiamento monetário", conseguindo ser mais merkeliana que a própria sra. Merkel, David Cameron reclamava um papel muito mais activo para o banco através da atribuição de capacidade suficiente para resgatar as economias da região.
O primeiro-ministro britânico está longe de ser o único a reclamar mais poderes para essa instituição. Editoriais de órgãos de informação insuspeitos de esquerdismo ou de serem particularmente adeptos de fórmulas que excluam medidas de austeridade ou de defenderem a manutenção da espirais de endividamento até aqui prosseguidas, como o Economist ou o Financial Times, vêm repetindo número após número que a solução passa por atribuir ao BCE poderes para comprar quantidades ilimitadas de dívida. No limite, emitir moeda. A estes somam-se cada vez mais vozes dos mais diversos quadrantes políticos, empresariais e académicos. Em Portugal destaca-se Cavaco Silva, que vem defendendo esta posição desde o seu célebre discurso em Florença e que repetiu na última sexta-feira em entrevista à Bloomberg. Também ele não rejeita, como é patente e notório, medidas de austeridade ou defende qualquer tipo de indisciplina orçamental.
Temos assim dum lado Passos, Merkel e Sarkozy e do outro, entre muitos, o Presidente da República portuguesa.
Que não existam quaisquer tipos de dúvidas: é o maior conflito institucional entre um primeiro-ministro e um Presidente da República da história da democracia portuguesa. Não estão em causa escutas, guerras sobre competências, estatutos administrativos de regiões, aborto, presidências abertas, leis de responsabilidade extracontratual do Estado ou outras. Não será comparável sequer à diferença de pontos de vista quanto à equidade na distribuição dos sacrifícios. Não, numa questão em que se decide o futuro de Portugal e de gerações de portugueses, a vida ou morte do euro e do projecto europeu, há duas opções diametralmente opostas e os nossos dois maiores responsáveis políticos portugueses estão em campos opostos. Mais, não hesitam em defender de forma intransigente as suas tão díspares visões e apregoam-nos aos quatro ventos.
A viagem do Presidente da República aos Estados Unidos deve ter tido, aliás, momentos interessantes. Os americanos devem ter ficado muito confundidos com as posições portuguesas acerca da crise do euro e das soluções defendidas. Dum lado Cavaco a defender uma posição, e do outro o homem invisível Paulo Portas a sustentar um ponto de vista absolutamente contrário.
Se o Presidente da República e o primeiro-ministro não se entendem numa questão desta magnitude para que servem os desesperados apelos ao consenso e disparates do género com destaque para a enorme patetice do Governo de união nacional?
Insisto, estamos perante, de longe, o maior e mais grave conflito institucional da democracia portuguesa.
2. "A intervenção do BCE não deve ser feita pa- ra garantir que os indisciplinados obriguem, com inflação e com financiamento monetário, o BCE a pagar o preço da indisciplina e da irresponsabilidade", enfatizou o primeiro-ministro.
Sabendo que um dos países indisciplinados e irresponsáveis é Portugal, Passos Coelho, no fundo, diz-nos que se não fosse obrigado a impor uma austeridade violenta manteria o catastrófico anterior rumo. Ou seja, não se julga capaz de mudar antigos hábitos despesistas, acabar com parcerias público-privadas ruinosas, o Estado, dar mais relevância à iniciativa privada ou mudar por completo as empresas públicas. Numa palavra: não saberia governar.
O tempo, a travagem do crescimento do desemprego, o aumento das exportações, a estabilidade dos mercados (a inflação que certamente ocorreria seria o preço a pagar, mas face ao perigo iminente da desagregação do euro e da Europa é um risco que vale bem a pena correr) que se ganharia com a possibilidade de o BCE comprar ilimitadamente dívida não seriam aproveitadas, segundo a sua própria doutrina, para fazer as reformas de que tanto necessitamos - e que ninguém tenha dúvidas: não é possível, em dois anos, corrigir décadas de incompetência e irresponsabilidade. Não, continuaria o despautério. Com semelhante admissão de incapacidade o melhor mesmo é seguir à risca, ou mesmo extravasar, as receitas da sra. Merkel. Melhor ainda, pedir a um enviado alemão para tomar conta disto. Vendo bem, é o que está a acontecer.
In DN
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Uma anedota chamada Otelo
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Uma anedota chamada Otelo
por ALBERTO GONÇALVES
Hoje
Antes de 1974, o capitão Otelo Saraiva de Carvalho serviu diligentemente a ditadura salazarista. Após o 25 de Abril, de que ele próprio foi operacional destacado, ajudou a impor uma ditadura comunista. Derrotada esta no 25 de Novembro de 1975, prosseguiu a defesa dos macaquinhos que lhe habitam o sótão quase sozinho e literalmente à bomba até ser preso. Hoje, seria de esperar que duas tiranias, um golpe de Estado e uma apreciável incursão pelo terrorismo, satisfizessem as ambições profissionais do major Otelo Saraiva de Carvalho, que aproveitaria o Outono da vida para contemplar o passado heróico e gozar de uma reforma pacífica. Evidentemente, não satisfazem.
Há homens que não sossegam enquanto um único dos seus semelhantes estiver privado de exercer o direito de voto. O tenente-coronel Otelo Saraiva de Carvalho não é desses. O que o aflige é justamente a possibilidade de os semelhantes escolherem os respectivos destinos em liberdade. Parafraseando As Vinhas da Ira, onde houver o vestígio de um sistema democrático, o coronel Otelo Saraiva de Carvalho lá irá tentar acabar com ele. Ou pelo menos fica no sofá de casa a pedir a outros que o façam.
A última do brigadeiro Otelo Saraiva de Carvalho é aquela espécie de entrevista na qual explica que "os militares têm a tendência para estabelecer um determinado limite à actuação da classe política", que o poder político "está próximo de exceder os limites aceitáveis", que, "ultrapassados os limites", os militares devem "fazer uma operação militar e derrubar o Governo", e que "bastam 800 homens".
Em troca, alguém de bom senso deveria explicar ao general Otelo Saraiva de Carvalho que, grosso modo, a coisa funciona ao contrário. Os limites da política são decididos pela Constituição e pela lei. O poder militar está submetido ao político. O poder político, tontinho que seja, está submetido ao voto dos cidadãos e não aos apetites de 800 hipotéticos valentes. As sugestões em causa configuram o crime de incitação à violência. Etc.
Pensando melhor, não vale a pena. Há muito, provavelmente desde sempre, que o marechal Otelo Saraiva de Carvalho se encontra além da racionalidade, da imputabilidade e da paciência. Evangelizá-lo na exacta democracia que lhe permite ostentar os delírios seria tão inútil quanto pregar o feminismo aos aiatolas. Mais do que um déspota falhado e arcaico, o sr. Otelo é uma anedota, só perigosa na medida em que alguns ainda a ouvem sem se rir.
Sexta-feira, 11 de Novembro
Feriados
Para início de conversa, uma declaração de desinteresses: não gozo feriados. Sou, quando calha, gozado pelos que passam esses dias ao laréu enquanto trabalho, indiferente às pausas por decreto e - que remédio - atento aos prazos de entrega dos serviços que me encomendam. Este alheamento face ao calendário comum causa-me ocasionais embaraços sempre que tento marcar uma consulta no dentista ou uma inspecção no mecânico para amanhã e me informam, com suave condescendência, que nem pensar porque amanhã é feriado. Apetece-me responder: "para si." Sendo educado, respondo: "desculpe, não sabia."
Dito isto, proclamo aqui e agora que discordo da redução anunciada pelo Governo. Muito mais lógico do que cortar na quantidade de feriados seria cortar na quantidade de cidadãos abrangidos pelos feriados. Ou seja, em limitar as folgas àqueles que se sentem representados pelo seu significado e façam prova disso.
Nos casos de inspiração católica, a selecção demográfica é relativamente fácil: os feriados apenas beneficiariam sujeitos com currículo de baptismo, catequese, comunhão (primeira e solene), confissões regulares e frequência da igreja no mínimo semanal. Assim, inúmeros ateus, tresmalhados, não praticantes e afins ficariam de imediato sem justificação para escapar à labuta durante a Sexta-Feira Santa, o Corpo de Deus, a Assunção de Nossa Senhora, o Dia de Todos os Santos, a Imaculada Concepção e o Natal. Além de melhorar a produtividade, a medida eliminaria a dilacerante culpa dos que a cada 8 de Dezembro passeiam no shopping a pretexto de um fenómeno em que não acreditam.
Apurar os legítimos usufrutuários dos feriados civis implica maior detalhe, mas também se consegue chegar lá. O Dez de Junho, por exemplo, estaria vedado a indivíduos sem inclinação patriótica e/ou que não apreciam Os Lusíadas. O 1.º de Dezembro, a iberistas. O 5 de Outubro, a monárquicos e não-maçons. O 25 de Abril, a saudosistas do Estado Novo. Etc.
Com tacto, não se discriminava ninguém segundo crença, etnia, ideologia, classe social ou nacionalidade. Sobretudo não se fechava periodicamente um país arruinado sob argumentos que importam a uma fracção minoritária da população e ofendem a maioria restante, a qual só por oportunismo, perdão, timidez não confessa a ofensa.
Sábado, 12 de Novembro
A descoberta de Portugal
O Presidente da República, acompanhado da típica corte, anda pelos EUA a tentar, cito, "corrigir a imagem um pouco distorcida que às vezes aqui se projecta do nosso país". Ai, a velha questão da "imagem". Não deve haver povo que passe tanto tampo ao espelho quanto o português, e nem assim conseguimos que os outros nos vejam como gostaríamos que nos vissem. Talvez o problema seja do espelho, talvez seja dos outros, não sei.
O que também não sei é o tipo de distorção que os americanos "projectam" de Portugal. Sempre que um indígena de lá me pergunta pelas origens, a reacção à resposta é quase sempre a mesma: "Vasco da Gama!" Ou: "Magalhães!" (eles dizem Magellan, mas não os corrijo: Gengis Cão incluído, a adaptação lexical de um substantivo é prova da respectiva importância). À primeira vista, parece uma "imagem" preferível às referências futebolísticas, fatais quando um diálogo idêntico acontece na Europa. Na Itália, na Inglaterra ou na Polónia, é raríssimo sairmos das alu- sões a Cristiano Ronaldo e a José Mourinho, símbolos que, embora possivelmente mais exactos, dão à pátria um prestígio inferior ao conferido por navegadores quinhentistas.
Esta, porém, é a minha perspectiva, necessariamente pequenina e parcial. Se o prof. Cavaco garante que a "imagem" de Portugal na América não é grande coisa, fica decidido que a "imagem" de Portugal na América não é grande coisa. E o que fez o representante máximo da nação para contrariar a tendência? Resumidamente, contou umas histórias. Entre reuniões oficiais, encontros informais e conferências, o prof. Cavaco jurou que Portugal merece ser olhado enquanto "oportunidade de investimento", que Portugal é "um bom porto de entrada para a Europa e para os mercados lusófonos", que Portugal é um "país empreendedor e de talento", que Portugal "ultrapassará os problemas económicos e financeiros" e, numa abordagem internacional, que o euro não acabará. Na próxima segunda-feira, irá a Silicon Valley mostrar que Portugal é um lugar de "inovação tecnológica" e "capacidade inovadora". Se o passeio correr bem, haverá de espantar os moços da Intel com uma demonstração do computador Magalhães (inexplicavelmente ainda sem direito à anglicização do nome).
No fim da digressão presidencial, e dando de barato que a mesma não foi ignorada por cerca de 99,74% dos locais, será bastante provável que aconteça um profundo retoque da tal "imagem" e os americanos descubram que, além de descobridores, os portugueses são uns grandessíssimos mentirosos. Mas continuarão sem ideia nenhuma de quem é José Mourinho. Aquilo é uma terra de boçais.
In DN
Uma anedota chamada Otelo
por ALBERTO GONÇALVES
Hoje
Antes de 1974, o capitão Otelo Saraiva de Carvalho serviu diligentemente a ditadura salazarista. Após o 25 de Abril, de que ele próprio foi operacional destacado, ajudou a impor uma ditadura comunista. Derrotada esta no 25 de Novembro de 1975, prosseguiu a defesa dos macaquinhos que lhe habitam o sótão quase sozinho e literalmente à bomba até ser preso. Hoje, seria de esperar que duas tiranias, um golpe de Estado e uma apreciável incursão pelo terrorismo, satisfizessem as ambições profissionais do major Otelo Saraiva de Carvalho, que aproveitaria o Outono da vida para contemplar o passado heróico e gozar de uma reforma pacífica. Evidentemente, não satisfazem.
Há homens que não sossegam enquanto um único dos seus semelhantes estiver privado de exercer o direito de voto. O tenente-coronel Otelo Saraiva de Carvalho não é desses. O que o aflige é justamente a possibilidade de os semelhantes escolherem os respectivos destinos em liberdade. Parafraseando As Vinhas da Ira, onde houver o vestígio de um sistema democrático, o coronel Otelo Saraiva de Carvalho lá irá tentar acabar com ele. Ou pelo menos fica no sofá de casa a pedir a outros que o façam.
A última do brigadeiro Otelo Saraiva de Carvalho é aquela espécie de entrevista na qual explica que "os militares têm a tendência para estabelecer um determinado limite à actuação da classe política", que o poder político "está próximo de exceder os limites aceitáveis", que, "ultrapassados os limites", os militares devem "fazer uma operação militar e derrubar o Governo", e que "bastam 800 homens".
Em troca, alguém de bom senso deveria explicar ao general Otelo Saraiva de Carvalho que, grosso modo, a coisa funciona ao contrário. Os limites da política são decididos pela Constituição e pela lei. O poder militar está submetido ao político. O poder político, tontinho que seja, está submetido ao voto dos cidadãos e não aos apetites de 800 hipotéticos valentes. As sugestões em causa configuram o crime de incitação à violência. Etc.
Pensando melhor, não vale a pena. Há muito, provavelmente desde sempre, que o marechal Otelo Saraiva de Carvalho se encontra além da racionalidade, da imputabilidade e da paciência. Evangelizá-lo na exacta democracia que lhe permite ostentar os delírios seria tão inútil quanto pregar o feminismo aos aiatolas. Mais do que um déspota falhado e arcaico, o sr. Otelo é uma anedota, só perigosa na medida em que alguns ainda a ouvem sem se rir.
Sexta-feira, 11 de Novembro
Feriados
Para início de conversa, uma declaração de desinteresses: não gozo feriados. Sou, quando calha, gozado pelos que passam esses dias ao laréu enquanto trabalho, indiferente às pausas por decreto e - que remédio - atento aos prazos de entrega dos serviços que me encomendam. Este alheamento face ao calendário comum causa-me ocasionais embaraços sempre que tento marcar uma consulta no dentista ou uma inspecção no mecânico para amanhã e me informam, com suave condescendência, que nem pensar porque amanhã é feriado. Apetece-me responder: "para si." Sendo educado, respondo: "desculpe, não sabia."
Dito isto, proclamo aqui e agora que discordo da redução anunciada pelo Governo. Muito mais lógico do que cortar na quantidade de feriados seria cortar na quantidade de cidadãos abrangidos pelos feriados. Ou seja, em limitar as folgas àqueles que se sentem representados pelo seu significado e façam prova disso.
Nos casos de inspiração católica, a selecção demográfica é relativamente fácil: os feriados apenas beneficiariam sujeitos com currículo de baptismo, catequese, comunhão (primeira e solene), confissões regulares e frequência da igreja no mínimo semanal. Assim, inúmeros ateus, tresmalhados, não praticantes e afins ficariam de imediato sem justificação para escapar à labuta durante a Sexta-Feira Santa, o Corpo de Deus, a Assunção de Nossa Senhora, o Dia de Todos os Santos, a Imaculada Concepção e o Natal. Além de melhorar a produtividade, a medida eliminaria a dilacerante culpa dos que a cada 8 de Dezembro passeiam no shopping a pretexto de um fenómeno em que não acreditam.
Apurar os legítimos usufrutuários dos feriados civis implica maior detalhe, mas também se consegue chegar lá. O Dez de Junho, por exemplo, estaria vedado a indivíduos sem inclinação patriótica e/ou que não apreciam Os Lusíadas. O 1.º de Dezembro, a iberistas. O 5 de Outubro, a monárquicos e não-maçons. O 25 de Abril, a saudosistas do Estado Novo. Etc.
Com tacto, não se discriminava ninguém segundo crença, etnia, ideologia, classe social ou nacionalidade. Sobretudo não se fechava periodicamente um país arruinado sob argumentos que importam a uma fracção minoritária da população e ofendem a maioria restante, a qual só por oportunismo, perdão, timidez não confessa a ofensa.
Sábado, 12 de Novembro
A descoberta de Portugal
O Presidente da República, acompanhado da típica corte, anda pelos EUA a tentar, cito, "corrigir a imagem um pouco distorcida que às vezes aqui se projecta do nosso país". Ai, a velha questão da "imagem". Não deve haver povo que passe tanto tampo ao espelho quanto o português, e nem assim conseguimos que os outros nos vejam como gostaríamos que nos vissem. Talvez o problema seja do espelho, talvez seja dos outros, não sei.
O que também não sei é o tipo de distorção que os americanos "projectam" de Portugal. Sempre que um indígena de lá me pergunta pelas origens, a reacção à resposta é quase sempre a mesma: "Vasco da Gama!" Ou: "Magalhães!" (eles dizem Magellan, mas não os corrijo: Gengis Cão incluído, a adaptação lexical de um substantivo é prova da respectiva importância). À primeira vista, parece uma "imagem" preferível às referências futebolísticas, fatais quando um diálogo idêntico acontece na Europa. Na Itália, na Inglaterra ou na Polónia, é raríssimo sairmos das alu- sões a Cristiano Ronaldo e a José Mourinho, símbolos que, embora possivelmente mais exactos, dão à pátria um prestígio inferior ao conferido por navegadores quinhentistas.
Esta, porém, é a minha perspectiva, necessariamente pequenina e parcial. Se o prof. Cavaco garante que a "imagem" de Portugal na América não é grande coisa, fica decidido que a "imagem" de Portugal na América não é grande coisa. E o que fez o representante máximo da nação para contrariar a tendência? Resumidamente, contou umas histórias. Entre reuniões oficiais, encontros informais e conferências, o prof. Cavaco jurou que Portugal merece ser olhado enquanto "oportunidade de investimento", que Portugal é "um bom porto de entrada para a Europa e para os mercados lusófonos", que Portugal é um "país empreendedor e de talento", que Portugal "ultrapassará os problemas económicos e financeiros" e, numa abordagem internacional, que o euro não acabará. Na próxima segunda-feira, irá a Silicon Valley mostrar que Portugal é um lugar de "inovação tecnológica" e "capacidade inovadora". Se o passeio correr bem, haverá de espantar os moços da Intel com uma demonstração do computador Magalhães (inexplicavelmente ainda sem direito à anglicização do nome).
No fim da digressão presidencial, e dando de barato que a mesma não foi ignorada por cerca de 99,74% dos locais, será bastante provável que aconteça um profundo retoque da tal "imagem" e os americanos descubram que, além de descobridores, os portugueses são uns grandessíssimos mentirosos. Mas continuarão sem ideia nenhuma de quem é José Mourinho. Aquilo é uma terra de boçais.
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O triunfo dos porcos
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O triunfo dos porcos
por PAULO BALDAIA
Hoje
Os mercados estão a dar xeque-mate a uma série de governos europeus. Os governantes dos PIIGS (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha - Spain em inglês) receberam todos guia de marcha ou abdicaram de ir a jogo nas próximas eleições. Eles fizeram porcaria na gestão da economia e até podemos ser tentados a pensar que estes mercados sem rosto estão a prestar um favor à democracia. Quando ajudam a correr com governantes que levaram os seus países à pré-bancarrota, estão, de certa forma, a dizer aos políticos que a demagogia já não é aceitável. Governantes que gastem o que não tiverem saberão que têm os dias contados, porque os mercados lhes fecham a torneira. Por causa desses mesmos mercados, hoje vale mais um político que promete austeridade e rigor do que um que promete o céu e a terra. É até verdade que a crise das dívidas soberanas, crise ditada pelos mercados, obrigou os povos a pensar no que têm de sustentável e no que têm de efémero. Hoje tudo é altamente imprevisível, ninguém pode dizer quando vamos bater no fundo mas, ultrapassada esta crise, no futuro tudo será mais racional e, portanto, mais humano.
Mas não nos podemos deixar vencer pelas aparências. Os famosos mercados são pessoas a gerir capital e à procura do máximo rendimento possível. Não é excessivo dizer que os mercados sempre viveram tentados a ajudar a escolher os líderes que, a cada momento, melhor servem os seus interesses. Os exemplos que nos chegam da Grécia e da Itália são, aliás, preocupantes. Damos por adquirido que eleições antecipadas de imediato não são a melhor solução. Achamos normal que se procure agradar aos mercados colocando nesses governos gente mais desligada da política e mais ligada a esses mesmos mercados. Suspender a democracia passou a ser uma coisa aceitável. O que se torna cada vez mais difícil de aceitar é o não se saber antecipadamente o resultado de umas eleições, mas até de surpresas eleitorais a democracia já se livrou.
Olhemos para os nomes de que se fala na Itália e na Grécia. Mario Monti, ex-comissário europeu, é um economista consultor da Goldman Sachs, e Papademos, ex- -vice-presidente do BCE, andou pelas universidades norte-americanas e alemãs. Sem qualquer teoria da conspiração, registo apenas a coincidência: os dois estão ligados à Comissão Trilateral, fundada por Rockefeller. Uma organização criticada à direita pelo ex-senador republicano Goldwater e à esquerda por Chomsky, que entendiam haver nesta Trilateral uma visão pouco democrática da democracia. Eles governarão em nome do povo, mas ao povo nada foi perguntado. No meio das ditaduras, neste caso da ditadura dos mercados, como muito bem nos lembrou Orwell, "os animais são todos iguais, mas uns são mais iguais do que outros".
In DN
O triunfo dos porcos
por PAULO BALDAIA
Hoje
Os mercados estão a dar xeque-mate a uma série de governos europeus. Os governantes dos PIIGS (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha - Spain em inglês) receberam todos guia de marcha ou abdicaram de ir a jogo nas próximas eleições. Eles fizeram porcaria na gestão da economia e até podemos ser tentados a pensar que estes mercados sem rosto estão a prestar um favor à democracia. Quando ajudam a correr com governantes que levaram os seus países à pré-bancarrota, estão, de certa forma, a dizer aos políticos que a demagogia já não é aceitável. Governantes que gastem o que não tiverem saberão que têm os dias contados, porque os mercados lhes fecham a torneira. Por causa desses mesmos mercados, hoje vale mais um político que promete austeridade e rigor do que um que promete o céu e a terra. É até verdade que a crise das dívidas soberanas, crise ditada pelos mercados, obrigou os povos a pensar no que têm de sustentável e no que têm de efémero. Hoje tudo é altamente imprevisível, ninguém pode dizer quando vamos bater no fundo mas, ultrapassada esta crise, no futuro tudo será mais racional e, portanto, mais humano.
Mas não nos podemos deixar vencer pelas aparências. Os famosos mercados são pessoas a gerir capital e à procura do máximo rendimento possível. Não é excessivo dizer que os mercados sempre viveram tentados a ajudar a escolher os líderes que, a cada momento, melhor servem os seus interesses. Os exemplos que nos chegam da Grécia e da Itália são, aliás, preocupantes. Damos por adquirido que eleições antecipadas de imediato não são a melhor solução. Achamos normal que se procure agradar aos mercados colocando nesses governos gente mais desligada da política e mais ligada a esses mesmos mercados. Suspender a democracia passou a ser uma coisa aceitável. O que se torna cada vez mais difícil de aceitar é o não se saber antecipadamente o resultado de umas eleições, mas até de surpresas eleitorais a democracia já se livrou.
Olhemos para os nomes de que se fala na Itália e na Grécia. Mario Monti, ex-comissário europeu, é um economista consultor da Goldman Sachs, e Papademos, ex- -vice-presidente do BCE, andou pelas universidades norte-americanas e alemãs. Sem qualquer teoria da conspiração, registo apenas a coincidência: os dois estão ligados à Comissão Trilateral, fundada por Rockefeller. Uma organização criticada à direita pelo ex-senador republicano Goldwater e à esquerda por Chomsky, que entendiam haver nesta Trilateral uma visão pouco democrática da democracia. Eles governarão em nome do povo, mas ao povo nada foi perguntado. No meio das ditaduras, neste caso da ditadura dos mercados, como muito bem nos lembrou Orwell, "os animais são todos iguais, mas uns são mais iguais do que outros".
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
O vírus da ópera-bufa alastra
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O vírus da ópera-bufa alastra
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Extraterrestres inocularam um vírus em Mussolini, ele morreu e o fascismo italiano caiu. Os partigiani e o povo vieram para a rua, todos cantaram Bella Ciao. Até a igreja social de Don Camillo pôs os sinos a repicar de alegria... Mas celebravam o quê? A vitória do Bem sobre o Mal? A coragem dos que venceram quem lhes negava a liberdade? Não, aqueles italianos saudavam um vírus que eles desconheciam, inoculado por discos voadores de cujas intenções eles ignoravam. O que contei é uma farsa, felizmente a história verdadeira é outra: Mussolini caiu porque as democracias se juntaram para isso e muitos italianos lutaram por isso. O que permite emocionarmo-nos ainda hoje com Roma, Cidade Aberta, filme de Rossellini, em 1945 - a História quando tem uma moral, uma explicação ou uma vontade colectiva vale mais do que acasos ou ficção científica barata. Não sei em que dia foi a cadeira de Salazar; o 25 de Abril, sim. Ontem, porém, surpreendi-me com multidões a festejar a partida de Berlusconi: "Festa frente ao Palácio do Quirinal [onde o primeiro-ministro apresentou a demissão]", titulavam os sites dos jornais italianos. Um vídeo mostrava Antonio Di Pietro, o célebre juiz que lutou contra a corrupção, eufórico: "Para casa! Para casa", gritava ele a Berlusconi. Mas Berlusconi caiu porque o povo o quis? Caiu com o que o juiz investigou? Não, caiu porque porque uns extraterrestres deram má nota a Itália. E isso celebra-se?
In DN
O vírus da ópera-bufa alastra
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Extraterrestres inocularam um vírus em Mussolini, ele morreu e o fascismo italiano caiu. Os partigiani e o povo vieram para a rua, todos cantaram Bella Ciao. Até a igreja social de Don Camillo pôs os sinos a repicar de alegria... Mas celebravam o quê? A vitória do Bem sobre o Mal? A coragem dos que venceram quem lhes negava a liberdade? Não, aqueles italianos saudavam um vírus que eles desconheciam, inoculado por discos voadores de cujas intenções eles ignoravam. O que contei é uma farsa, felizmente a história verdadeira é outra: Mussolini caiu porque as democracias se juntaram para isso e muitos italianos lutaram por isso. O que permite emocionarmo-nos ainda hoje com Roma, Cidade Aberta, filme de Rossellini, em 1945 - a História quando tem uma moral, uma explicação ou uma vontade colectiva vale mais do que acasos ou ficção científica barata. Não sei em que dia foi a cadeira de Salazar; o 25 de Abril, sim. Ontem, porém, surpreendi-me com multidões a festejar a partida de Berlusconi: "Festa frente ao Palácio do Quirinal [onde o primeiro-ministro apresentou a demissão]", titulavam os sites dos jornais italianos. Um vídeo mostrava Antonio Di Pietro, o célebre juiz que lutou contra a corrupção, eufórico: "Para casa! Para casa", gritava ele a Berlusconi. Mas Berlusconi caiu porque o povo o quis? Caiu com o que o juiz investigou? Não, caiu porque porque uns extraterrestres deram má nota a Itália. E isso celebra-se?
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Indignado!
.
Indignado!
por JOÃO CÉSAR DAS NEVES
Hoje
Estou indignado! Por isso me manifesto. Estou indignado porque o sistema devia funcionar bem e não funciona; porque os políticos deviam dizer a verdade e não dizem; porque estou a sofrer e não quero. Por isso estou aqui.
São quase seis da manhã e toda a gente dorme no acampamento da manifestação. Mas eu não consigo dormir. Por isso me vim sentar no passeio, meio tapado pelo meu cartaz. Não consigo dormir porque estou indignado. Indignado porque a crise cai sempre sobre os mesmos, porque as promessas são sempre falsas, porque os ricos, bancários, políticos conseguem sempre escapar e é o povo que sofre pelos erros deles. O pior de tudo é a falta de esperança. Este sistema não dá esperança aos jovens.
A noite está fria e o cartaz não foi feito para aconchegar. Este já não é aquele que trouxe de casa. Quando cá cheguei tinha uma folha de cartolina que dizia "Nós somos os 99%", mas a rapariga da tenda ao lado perguntou a rir: "99%? Então porque somos tão poucos?". Eu disse-lhe que havia manifestações destas por todo o mundo. No protesto mundial de 15 de Outubro foram quase 1000 cidades em mais de 80 países, e está outra marcada para 24 de Novembro. Ela só sorriu mas eu fiquei a pensar. Afinal os manifestantes não chegaram a 1% da população do país. Por isso mudei o cartaz, que agora diz: "Este é o princípio do fim do capitalismo".
O problema afinal é mudar o sistema. Aquilo que as manifestações nos países árabes conseguiram, derrubando opressão e ditadores, temos de fazer aqui. A nossa opressão é o dinheiro e oportunismo, os ditadores são banqueiros e empresários. Quando viu o novo cartaz a Bárbara (já lhe descobri o nome) abanou a cabeça e perguntou: "E depois do fim, começa o quê?" Não respondi, e mais uma vez pensei. Afinal qual é a solução para a situação? Os jovens não têm esperança, mas os outros também não. Os ricos têm medo, os políticos andam à nora e nós protestamos, mas ninguém tem solução. Dizemos que a manifestação só acaba quando vencermos. Mas que é vencer?
Puxei o saco-cama para a cabeça e repeti que esta era uma tradição de família. Na véspera contara à Bárbara que há gerações de indignados na minha casa. O meu avô era comunista e acreditava no Estaline e no sistema soviético. Ficou indignado com o que disseram dele no XX congresso, e ainda mais com a invasão de Praga. Acabou por perder a esperança e sair do partido, desiludido das falsas promessas e enganos repetidos. O meu outro avô era católico. Andou deslumbrado com o Concílio Vaticano II e as reformas da Igreja. Mas depois também ele se indignou com a falta de progresso em aspectos que considerava essenciais. Acabou por perder a esperança e abandonar a fé, como um "vencido do catolicismo". Os meus pais, jovens idealistas no 25 de Abril, viveram a revolução a sério, mas também eles acabaram indignados, desenganados e sem esperança com o que aconteceu depois. Esta manifestação contra a crise mundial é a minha participação nessa longa contestação.
De repente senti um calafrio pelas costas. E se o problema não é o mundo ou o sistema, mas nós? E se a razão da nossa insatisfação não vem da realidade, que é o que sempre foi, sempre difícil e exigente? E se o mal é que somos uma família de insatisfeitos, que nunca soube dar o valor ao que têm, exigindo sempre mais? É verdade que estamos em crise, mas afinal quando é que não as houve? Porque, tudo considerado, temos muito a agradecer. Estamos muito melhor do que no tempo dos meus avós. Lembro-me como ri ao receber há dias uma mensagem electrónica demonstrando como o país está pior que no tempo do Salazar, sem que o autor notasse que o simples uso da Internet refutava a tese.
O sol começa a nascer por entre as árvores e prédios. Está uma manhã linda. É bom sorver o ar fresco. No meio dos protestos é difícil dar valor a estas coisas. Quem quer mais do que tem nunca aproveita o que há. E a vida tem tantas coisas excelentes. Como a Bárbara, que ressona serenamente na tenda do lado. Nela, ao menos, tenho alguma esperança.
In DN
Indignado!
por JOÃO CÉSAR DAS NEVES
Hoje
Estou indignado! Por isso me manifesto. Estou indignado porque o sistema devia funcionar bem e não funciona; porque os políticos deviam dizer a verdade e não dizem; porque estou a sofrer e não quero. Por isso estou aqui.
São quase seis da manhã e toda a gente dorme no acampamento da manifestação. Mas eu não consigo dormir. Por isso me vim sentar no passeio, meio tapado pelo meu cartaz. Não consigo dormir porque estou indignado. Indignado porque a crise cai sempre sobre os mesmos, porque as promessas são sempre falsas, porque os ricos, bancários, políticos conseguem sempre escapar e é o povo que sofre pelos erros deles. O pior de tudo é a falta de esperança. Este sistema não dá esperança aos jovens.
A noite está fria e o cartaz não foi feito para aconchegar. Este já não é aquele que trouxe de casa. Quando cá cheguei tinha uma folha de cartolina que dizia "Nós somos os 99%", mas a rapariga da tenda ao lado perguntou a rir: "99%? Então porque somos tão poucos?". Eu disse-lhe que havia manifestações destas por todo o mundo. No protesto mundial de 15 de Outubro foram quase 1000 cidades em mais de 80 países, e está outra marcada para 24 de Novembro. Ela só sorriu mas eu fiquei a pensar. Afinal os manifestantes não chegaram a 1% da população do país. Por isso mudei o cartaz, que agora diz: "Este é o princípio do fim do capitalismo".
O problema afinal é mudar o sistema. Aquilo que as manifestações nos países árabes conseguiram, derrubando opressão e ditadores, temos de fazer aqui. A nossa opressão é o dinheiro e oportunismo, os ditadores são banqueiros e empresários. Quando viu o novo cartaz a Bárbara (já lhe descobri o nome) abanou a cabeça e perguntou: "E depois do fim, começa o quê?" Não respondi, e mais uma vez pensei. Afinal qual é a solução para a situação? Os jovens não têm esperança, mas os outros também não. Os ricos têm medo, os políticos andam à nora e nós protestamos, mas ninguém tem solução. Dizemos que a manifestação só acaba quando vencermos. Mas que é vencer?
Puxei o saco-cama para a cabeça e repeti que esta era uma tradição de família. Na véspera contara à Bárbara que há gerações de indignados na minha casa. O meu avô era comunista e acreditava no Estaline e no sistema soviético. Ficou indignado com o que disseram dele no XX congresso, e ainda mais com a invasão de Praga. Acabou por perder a esperança e sair do partido, desiludido das falsas promessas e enganos repetidos. O meu outro avô era católico. Andou deslumbrado com o Concílio Vaticano II e as reformas da Igreja. Mas depois também ele se indignou com a falta de progresso em aspectos que considerava essenciais. Acabou por perder a esperança e abandonar a fé, como um "vencido do catolicismo". Os meus pais, jovens idealistas no 25 de Abril, viveram a revolução a sério, mas também eles acabaram indignados, desenganados e sem esperança com o que aconteceu depois. Esta manifestação contra a crise mundial é a minha participação nessa longa contestação.
De repente senti um calafrio pelas costas. E se o problema não é o mundo ou o sistema, mas nós? E se a razão da nossa insatisfação não vem da realidade, que é o que sempre foi, sempre difícil e exigente? E se o mal é que somos uma família de insatisfeitos, que nunca soube dar o valor ao que têm, exigindo sempre mais? É verdade que estamos em crise, mas afinal quando é que não as houve? Porque, tudo considerado, temos muito a agradecer. Estamos muito melhor do que no tempo dos meus avós. Lembro-me como ri ao receber há dias uma mensagem electrónica demonstrando como o país está pior que no tempo do Salazar, sem que o autor notasse que o simples uso da Internet refutava a tese.
O sol começa a nascer por entre as árvores e prédios. Está uma manhã linda. É bom sorver o ar fresco. No meio dos protestos é difícil dar valor a estas coisas. Quem quer mais do que tem nunca aproveita o que há. E a vida tem tantas coisas excelentes. Como a Bárbara, que ressona serenamente na tenda do lado. Nela, ao menos, tenho alguma esperança.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Hoje, os maçons escondem-se de quê?
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Hoje, os maçons escondem-se de quê?
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Por estes dias, o meu jornal está a dedicar várias páginas à Maçonaria. É um bom assunto. O melhor no mundo moderno ocidental, da igualdade à liberdade, está-lhe ligado. No último quarto de milénio, muitos dos nomes nobres que a História guardou foram maçons, e o seu legado, de uma maneira ou de outra, está relacionado com eles por terem sido maçons. Só para recordar um nome que parece não ter nada a ver com a frase anterior e tem: a Lisboa pombalina é luminosa porque o seu arquitecto, Carlos Mardel, foi maçom. Mas o próprio dos jornais não é fazer recolhas históricas, os seus leitores querem âncoras actuais: é assim tão forte a Maçonaria em Portugal, hoje? O bom e esforçado trabalho do meu jornal vai bater contra uma parede: muito da Maçonaria e quase todos os maçons são segredo. A Maçonaria destapa-se aqui e ali mas nunca se expõe, o resultado final de tentar focá-la acaba sempre em desilusão. O culto do segredo, por tão anacrónico, hoje, entende-se mal. A explicação mais imediata é que os maçons ganham por o ser, e fazem-no em segredo para ganharem ainda mais. Mas, ontem, António Reis, que liderou o Grande Oriente Lusitano, disse ao DN que não: serem maçons "pode-lhes causar dificuldades nas suas carreiras profissionais." Engraçado, tinha ideia do contrário: os maçons que exercem a minha profissão são mais do género a terem estátua sem eu saber porquê, do que não a terem embora a merecessem.
In DN
Hoje, os maçons escondem-se de quê?
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Por estes dias, o meu jornal está a dedicar várias páginas à Maçonaria. É um bom assunto. O melhor no mundo moderno ocidental, da igualdade à liberdade, está-lhe ligado. No último quarto de milénio, muitos dos nomes nobres que a História guardou foram maçons, e o seu legado, de uma maneira ou de outra, está relacionado com eles por terem sido maçons. Só para recordar um nome que parece não ter nada a ver com a frase anterior e tem: a Lisboa pombalina é luminosa porque o seu arquitecto, Carlos Mardel, foi maçom. Mas o próprio dos jornais não é fazer recolhas históricas, os seus leitores querem âncoras actuais: é assim tão forte a Maçonaria em Portugal, hoje? O bom e esforçado trabalho do meu jornal vai bater contra uma parede: muito da Maçonaria e quase todos os maçons são segredo. A Maçonaria destapa-se aqui e ali mas nunca se expõe, o resultado final de tentar focá-la acaba sempre em desilusão. O culto do segredo, por tão anacrónico, hoje, entende-se mal. A explicação mais imediata é que os maçons ganham por o ser, e fazem-no em segredo para ganharem ainda mais. Mas, ontem, António Reis, que liderou o Grande Oriente Lusitano, disse ao DN que não: serem maçons "pode-lhes causar dificuldades nas suas carreiras profissionais." Engraçado, tinha ideia do contrário: os maçons que exercem a minha profissão são mais do género a terem estátua sem eu saber porquê, do que não a terem embora a merecessem.
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O Governo atrapalha-se nas palavras difíceis
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O Governo atrapalha-se nas palavras difíceis
por PEDRO TADEU
Hoje
Pedro Passos Coelho pegou-se no Parlamento com um deputado do PS e, em tom peremptório, afirmou: "Nós não fazemos malabarices com as cativações!" O primeiro-ministro, nesse primeiro dia de debate sobre o Orçamento do Estado, repetiu a ideia, de forma a que o eco na abóbada do hemiciclo devolvesse em acusação, para a bancada socialista, partido que formou o anterior Governo, aquilo que terá entendido como insinuação contra o actual Executivo PSD/CDS: "Sim, senhor deputado. Nós não fazemos malabarices!"
"Malabarice" é giro, soa bem, mas não existe no dicionário. Há "malabarismo", "malabarista", "malabarístico", e, relativo ao território de Malabar, na Índia, as palavras "malabar", "malabarense", "malabaresco" e "malabárico". Também existe "malabruto", para designar um homem estúpido mas, julgo, Passos Coelho não queria ir por aí.
Não me atrevo a procurar definições rigorosas para "cativações", pois "cativar", que lhe está na origem, tanto significa subjugar, prender ou encantar e hoje não estou para debates ideológicos.
O ministro Álvaro Santos Pereira, ontem, em mais um episódio da mesma novela orçamental, esteve largos minutos a perorar sobre a "descompetividade" da economia. Entusiasmado, foi deleitando a audiência com "descompetividade" para lá e "descompetividade" para cá. Quando anunciou que em 2012 estaríamos no início do fim da crise, já toda a plateia sorria, condescendente, quase ignorando a nova piada do ministro.
É verdade que entre os actores políticos e os comentadores de televisão, estatutariamente sábios nas matérias que analisam mas comprovadamente ignorantes em língua portuguesa, está há muito vulgarizada a oralização da suposta palavra "competividade" em vez da correcta "competitividade". Também há quem use "precaridade" em vez de "precariedade". E já ofereceram ao povo, além de impostos, a "desorçamentação".
Mas o digníssimo doutorado em Economia pela Universidade Simon Fraser, Vancôver, Canadá (canudo para o qual, suponho, o domínio do português foi irrelevante), adicionou um contributo valioso: com o prefixo "des" propõe aos eruditos um neologismo para substituir a expressão "falta de competitividade". Com tantos cortes para impor não admira que ele pense também em diminuir as sílabas que temos para dizer.
Claro que um grande político, um fabuloso governante, pode, em tese, sem consequências graves, tratar a gramática ao pontapé. O pior não é eles falarem mal, é eles parecerem não saber o que estão a dizer.
In DN
O Governo atrapalha-se nas palavras difíceis
por PEDRO TADEU
Hoje
Pedro Passos Coelho pegou-se no Parlamento com um deputado do PS e, em tom peremptório, afirmou: "Nós não fazemos malabarices com as cativações!" O primeiro-ministro, nesse primeiro dia de debate sobre o Orçamento do Estado, repetiu a ideia, de forma a que o eco na abóbada do hemiciclo devolvesse em acusação, para a bancada socialista, partido que formou o anterior Governo, aquilo que terá entendido como insinuação contra o actual Executivo PSD/CDS: "Sim, senhor deputado. Nós não fazemos malabarices!"
"Malabarice" é giro, soa bem, mas não existe no dicionário. Há "malabarismo", "malabarista", "malabarístico", e, relativo ao território de Malabar, na Índia, as palavras "malabar", "malabarense", "malabaresco" e "malabárico". Também existe "malabruto", para designar um homem estúpido mas, julgo, Passos Coelho não queria ir por aí.
Não me atrevo a procurar definições rigorosas para "cativações", pois "cativar", que lhe está na origem, tanto significa subjugar, prender ou encantar e hoje não estou para debates ideológicos.
O ministro Álvaro Santos Pereira, ontem, em mais um episódio da mesma novela orçamental, esteve largos minutos a perorar sobre a "descompetividade" da economia. Entusiasmado, foi deleitando a audiência com "descompetividade" para lá e "descompetividade" para cá. Quando anunciou que em 2012 estaríamos no início do fim da crise, já toda a plateia sorria, condescendente, quase ignorando a nova piada do ministro.
É verdade que entre os actores políticos e os comentadores de televisão, estatutariamente sábios nas matérias que analisam mas comprovadamente ignorantes em língua portuguesa, está há muito vulgarizada a oralização da suposta palavra "competividade" em vez da correcta "competitividade". Também há quem use "precaridade" em vez de "precariedade". E já ofereceram ao povo, além de impostos, a "desorçamentação".
Mas o digníssimo doutorado em Economia pela Universidade Simon Fraser, Vancôver, Canadá (canudo para o qual, suponho, o domínio do português foi irrelevante), adicionou um contributo valioso: com o prefixo "des" propõe aos eruditos um neologismo para substituir a expressão "falta de competitividade". Com tantos cortes para impor não admira que ele pense também em diminuir as sílabas que temos para dizer.
Claro que um grande político, um fabuloso governante, pode, em tese, sem consequências graves, tratar a gramática ao pontapé. O pior não é eles falarem mal, é eles parecerem não saber o que estão a dizer.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Re: Verdades que doem
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Eu já estava a ficar traumatizado e a pensar que o (des)acordo ortográfico tinha ido muito mais longe do que se costumava dizer.
Obrigado, Tadeu, por me devolver a paz de espírito sobre este assunto e por já sermos dois a dar conta de como o mau domínio da própria língua se reflecte na péssima acção governativa de uns quantos energúmenos, que deveriam regressar aos bancos da escola, ao invés de pavonearem o seu analfabetismo, à custa do povo.
Se não fossse trágico, partia-me a rir, à gargalhada...
Eu já estava a ficar traumatizado e a pensar que o (des)acordo ortográfico tinha ido muito mais longe do que se costumava dizer.
Obrigado, Tadeu, por me devolver a paz de espírito sobre este assunto e por já sermos dois a dar conta de como o mau domínio da própria língua se reflecte na péssima acção governativa de uns quantos energúmenos, que deveriam regressar aos bancos da escola, ao invés de pavonearem o seu analfabetismo, à custa do povo.
Se não fossse trágico, partia-me a rir, à gargalhada...
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Duarte Lima e o espectáculo da justiça
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Duarte Lima e o espectáculo da justiça
por FILOMENA MARTINS
Hoje
A detenção de Duarte Lima foi absolutamente lamentável. Reveladora do pior que tem a nossa justiça e a nossa investigação. A vários níveis. É claro que não me refiro ao conteúdo, aos motivos que levaram à decisão do juiz Carlos Alexandre, que parecem estar mais do que justificados. Refiro-me à forma como tudo se processou, ao comportamento e às explicações dos vários protagonistas.
O caso BPN deveria ter sido apenas e só um caso de polícia, uma investigação a uma megaburla. Por alegadas razões conjunturais - a crise e o medo de contágio a todo o sistema bancário -, e, obviamente, políticas - pelas várias figuras de relevo que envolve -, transformou-se num processo económico que vai custar aos portugueses, e ao País, cinco mil milhões de euros (mais do dobro do que o Estado vai arrecadar com o corte dos dois subsídios à função pública). E tanto é assim que, desde 2007, a investigação ainda só conseguiu levar a julgamento um arguido famoso.
Agora, apesar de há mais de três anos Duarte Lima ser suspeito de contribuir para esse megaburaco do BPN em cerca de 50 milhões, o processo não avançou porque a justiça portuguesa o considerou urgente mas sim por pressão do Brasil, que no mesmo período de tempo reuniu provas para o acusar de um outro crime, o de homicídio. Incapaz de decidir como investigar um português suspeito de matar uma portuguesa num outro país, optou por uma saída "à Al Capone", que deixa todas as suspeitas no ar.
Por fim, alguém no processo avesso a causar surpresas desagradáveis convocou os media, que transformaram a detenção num episódio de novela barata, e deu tempo a Duarte Lima para tratar das provas e da sua defesa. Como se não bastasse, o procurador- -geral da República ainda confessou publicamente que não tem mão na sua gente, ao lamentar não ter sido respeitado o seu pedido de secretismo e contenção, e até a ministra da Justiça mostrou desconhecer as leis da extradição.
Este é apenas o último episódio da desacreditada justiça nacional. Que prefere dar espectáculo em vez de ser espectacular. Absolutamente lamentável, repito.
Os sorrisos de Gaspar
É impossível ficar indiferente a Vítor Gaspar. O ministro das Finanças é o elemento mais desarmante deste Governo e acaba de provar que é político além de técnico de estilo professoral. Por isso não faltará quem o adore e quem o odeie. Para já, e ao contrário do seu colega da Economia e de o momento não aconselhar gargalhadas despudoradas como a da imagem, não lhe faltam motivos para sorrir. Viu o Orçamento ser aprovado por larga maioria, ouviu elogios da troika, dialogou cortes com um irreconhecível e calmíssimo Jardim, e até tem os banqueiros, após a pequena vitória no timing para o refinanciamento da banca, temporariamente satisfeitos. Se somarmos a isto o facto de ter encostado à parede um PS, que refém da sua assinatura no memorando se mostra impossibilitado e incapaz de apresentar alternativas concretas, não há gaffe de Passos Coelho que lhe retire a boa disposição.
A comissão do costume
A comissão de estudo para o serviço público já nasceu torta. Ainda nem tinha feito a primeira reunião e já o ministro Miguel Relvas anunciara todas as intenções do Governo para a RTP, fazendo questão de as pormenorizar semana após semana, e esvaziando todo o trabalho encomendado aos comissários. O resultado que agora foi conhecido não passa pois de um nado-morto, que fez três baixas pelo caminho e nem ao Governo agradou, com a agravante de trazer para o debate uma polémica que tem tanto de estéril como de preocupante: a proposta de redução e o controlo da informação, cujo exemplo extremo é colocar os Negócios Estrangeiros a mandar na RTP Internacional. Eis pois apenas mais um exemplo de uma comissão que não serve para nada, a não ser fazer perder tempo. Felizmente parece que desta vez pelo menos não se perdeu dinheiro.
Dos buracos aos remates
Francisco José Viegas descobriu despesas ilegais de cinco, seis milhões na Cultura. Paulo Macedo revelou que, apesar dos cortes, o seu Ministério da Saúde vai chegar ao final de 2012 com um défice de 200 milhões, tal o montante de desvios descobertos e de dívidas por pagar. Miguel Relvas viu confirmado que o Estádio Nacional tinha facturas escondidas e contas por liquidar de mais de seis milhões. Do buraco da Madeira e das empresas de transportes já todos sabemos (saberemos?) os montantes. E não há dia em que não se descubra mais uma extravagância de uma empresa ou de um gestor público, os tais que ninguém sabe ao certo quantos são. Não vale a pena disfarçar: o estado a que chegámos e de onde não será fácil sair é pior do que o relvado onde a selecção jogou na Bósnia. Valha-nos o futebol: apesar de alguns sustos, Portugal estará no Euro 2012, a sua sétima fase final consecutiva, com grande mérito para Paulo Bento, que conseguiu corrigir o chorrilho de erros cometidos por Carlos Queiroz e a asneira de quem o escolheu. Infelizmente, ao País não bastam os remates geniais de Ronaldo, Nani e C.ª.
In DN
Duarte Lima e o espectáculo da justiça
por FILOMENA MARTINS
Hoje
A detenção de Duarte Lima foi absolutamente lamentável. Reveladora do pior que tem a nossa justiça e a nossa investigação. A vários níveis. É claro que não me refiro ao conteúdo, aos motivos que levaram à decisão do juiz Carlos Alexandre, que parecem estar mais do que justificados. Refiro-me à forma como tudo se processou, ao comportamento e às explicações dos vários protagonistas.
O caso BPN deveria ter sido apenas e só um caso de polícia, uma investigação a uma megaburla. Por alegadas razões conjunturais - a crise e o medo de contágio a todo o sistema bancário -, e, obviamente, políticas - pelas várias figuras de relevo que envolve -, transformou-se num processo económico que vai custar aos portugueses, e ao País, cinco mil milhões de euros (mais do dobro do que o Estado vai arrecadar com o corte dos dois subsídios à função pública). E tanto é assim que, desde 2007, a investigação ainda só conseguiu levar a julgamento um arguido famoso.
Agora, apesar de há mais de três anos Duarte Lima ser suspeito de contribuir para esse megaburaco do BPN em cerca de 50 milhões, o processo não avançou porque a justiça portuguesa o considerou urgente mas sim por pressão do Brasil, que no mesmo período de tempo reuniu provas para o acusar de um outro crime, o de homicídio. Incapaz de decidir como investigar um português suspeito de matar uma portuguesa num outro país, optou por uma saída "à Al Capone", que deixa todas as suspeitas no ar.
Por fim, alguém no processo avesso a causar surpresas desagradáveis convocou os media, que transformaram a detenção num episódio de novela barata, e deu tempo a Duarte Lima para tratar das provas e da sua defesa. Como se não bastasse, o procurador- -geral da República ainda confessou publicamente que não tem mão na sua gente, ao lamentar não ter sido respeitado o seu pedido de secretismo e contenção, e até a ministra da Justiça mostrou desconhecer as leis da extradição.
Este é apenas o último episódio da desacreditada justiça nacional. Que prefere dar espectáculo em vez de ser espectacular. Absolutamente lamentável, repito.
Os sorrisos de Gaspar
É impossível ficar indiferente a Vítor Gaspar. O ministro das Finanças é o elemento mais desarmante deste Governo e acaba de provar que é político além de técnico de estilo professoral. Por isso não faltará quem o adore e quem o odeie. Para já, e ao contrário do seu colega da Economia e de o momento não aconselhar gargalhadas despudoradas como a da imagem, não lhe faltam motivos para sorrir. Viu o Orçamento ser aprovado por larga maioria, ouviu elogios da troika, dialogou cortes com um irreconhecível e calmíssimo Jardim, e até tem os banqueiros, após a pequena vitória no timing para o refinanciamento da banca, temporariamente satisfeitos. Se somarmos a isto o facto de ter encostado à parede um PS, que refém da sua assinatura no memorando se mostra impossibilitado e incapaz de apresentar alternativas concretas, não há gaffe de Passos Coelho que lhe retire a boa disposição.
A comissão do costume
A comissão de estudo para o serviço público já nasceu torta. Ainda nem tinha feito a primeira reunião e já o ministro Miguel Relvas anunciara todas as intenções do Governo para a RTP, fazendo questão de as pormenorizar semana após semana, e esvaziando todo o trabalho encomendado aos comissários. O resultado que agora foi conhecido não passa pois de um nado-morto, que fez três baixas pelo caminho e nem ao Governo agradou, com a agravante de trazer para o debate uma polémica que tem tanto de estéril como de preocupante: a proposta de redução e o controlo da informação, cujo exemplo extremo é colocar os Negócios Estrangeiros a mandar na RTP Internacional. Eis pois apenas mais um exemplo de uma comissão que não serve para nada, a não ser fazer perder tempo. Felizmente parece que desta vez pelo menos não se perdeu dinheiro.
Dos buracos aos remates
Francisco José Viegas descobriu despesas ilegais de cinco, seis milhões na Cultura. Paulo Macedo revelou que, apesar dos cortes, o seu Ministério da Saúde vai chegar ao final de 2012 com um défice de 200 milhões, tal o montante de desvios descobertos e de dívidas por pagar. Miguel Relvas viu confirmado que o Estádio Nacional tinha facturas escondidas e contas por liquidar de mais de seis milhões. Do buraco da Madeira e das empresas de transportes já todos sabemos (saberemos?) os montantes. E não há dia em que não se descubra mais uma extravagância de uma empresa ou de um gestor público, os tais que ninguém sabe ao certo quantos são. Não vale a pena disfarçar: o estado a que chegámos e de onde não será fácil sair é pior do que o relvado onde a selecção jogou na Bósnia. Valha-nos o futebol: apesar de alguns sustos, Portugal estará no Euro 2012, a sua sétima fase final consecutiva, com grande mérito para Paulo Bento, que conseguiu corrigir o chorrilho de erros cometidos por Carlos Queiroz e a asneira de quem o escolheu. Infelizmente, ao País não bastam os remates geniais de Ronaldo, Nani e C.ª.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Os mercados mas não só
.
Os mercados mas não só
por JOÃO MARCELINO
Hoje
1. "Os mercados" começaram a habituar-se a fazer aquilo que, ainda não há muitas semanas, era um exclusivo dos eleitores: mudar governos.
Na Grécia, a "salvação nacional" inclui até a extrema-direita e foi entregue a Lucas Papademos, um ex- -vice-presidente de Jean-Claude Trichet no Banco Central Europeu (BCE). Mas se esse nome tivesse falhado, as alternativas seriam fornecidas ou pela União Europeia, ou pelo provedor Nikiforos Diamantouros ou por um director do Fundo Monetário Internacional, Panagiotis Roumeliotis. Ou seja, a solução viria sempre da troika de credores.
Em Itália está agora Mario Monti à frente de um Governo em que não há nenhum político, só tecnocratas: economistas e outros! Curiosidade: Monti, como Mario Draghi, o novo presidente do BCE, trabalhou na consultora Goldman Sachs, além de ser membro da Trilateral, o movimento neoliberal fundado por David Rockefeller e do comité directivo do Grupo Bilderberg.
Em Portugal, como se sabe, o descalabro das finanças públicas também jogou um papel determinante na queda de Sócrates, assim como em Espanha antecipou a saída de Zapatero, e em ambos os casos patrocinando mudanças partidárias de sinal contrário (aqui ao lado todas as sondagens apontam para a vitória folgada, talvez com maioria absoluta, do PP de Rajoy sobre o PSOE de Rubalcaba, nas eleições de amanhã).
Na República da Irlanda já se passara uma primeira situação de mudança política a reboque do empréstimo internacional, cuja origem foi o descalabro da banca.
Estes são os factos.
2. Estamos perante uma nova realidade, delimitada pelos governos, pela banca e pelos organismos internacionais da alta finança, nos quais o indivíduo, no futuro - pode especular-se -, porventura irá escolher mais pela vontade demonstrada como investidor individual (quando existe capacidade para isso) do que como cidadão-eleitor.
Podemos, numa altura destas, começar a praticar a diabolização dos mercados (sobretudo se quisermos esquecer que uma parte destes mercados somos nós, e as nossas escolhas) e a temer pelo futuro da democracia tal e qual a conhecemos até aqui.
Este, no entanto, ainda é, em primeiro lugar, o tempo para reflectirmos sobre a qualidade das pessoas que têm sido geradas pelas máquinas partidárias um pouco por toda a Europa e que nos temos permitido eleger para governar, independentemente de qualquer défice e do acumular das dívidas.
Não precisamos de ir ao puzzle conhecido por Itália e a esse personagem menor chamado Silvio Berlusconi. Em Portugal, os processos judiciais - mas não só - têm mostrado à evidência a qualidade pessoal de muitas das pessoas que têm constituído a vida pública portuguesa nas últimas décadas. Sendo injusto tomar essa parte pelo todo, é claro, a miséria humana salta à vista, tanto na política como no mundo dos negócios. Só não percebe quem não quer.
3. As mudanças políticas na Europa têm sido produzidas num determinado sentido nas últimas semanas. Na sua génese há uma lógica perigosa que merece ser monitorizada pela cidadania.
Devemos convir, no entanto, quando assistimos aos factos atrás descritos, que eles foram precedidos por muita irresponsabilidade, de governos e de países.
"Os mercados" não fizeram mal nenhum à Finlândia, à Holanda e à Áustria, por exemplo, para já nem falar na Alemanha.
Onde há responsabilidade, sentido de Estado e uma vida colectiva dentro dos parâmetros da riqueza criada, não tem havido problema com os mercados.
Essa é a outra verdade.
A revolta das pessoas no Norte de África e Médio Oriente e as mudanças na Europa fazem, ambas, parte de um processo de "limpeza" do pessoal dirigente e, tendo naturezas diferentes, têm muito mais em comum do que aquilo que se poderá notar à primeira vista...
In DN
Os mercados mas não só
por JOÃO MARCELINO
Hoje
1. "Os mercados" começaram a habituar-se a fazer aquilo que, ainda não há muitas semanas, era um exclusivo dos eleitores: mudar governos.
Na Grécia, a "salvação nacional" inclui até a extrema-direita e foi entregue a Lucas Papademos, um ex- -vice-presidente de Jean-Claude Trichet no Banco Central Europeu (BCE). Mas se esse nome tivesse falhado, as alternativas seriam fornecidas ou pela União Europeia, ou pelo provedor Nikiforos Diamantouros ou por um director do Fundo Monetário Internacional, Panagiotis Roumeliotis. Ou seja, a solução viria sempre da troika de credores.
Em Itália está agora Mario Monti à frente de um Governo em que não há nenhum político, só tecnocratas: economistas e outros! Curiosidade: Monti, como Mario Draghi, o novo presidente do BCE, trabalhou na consultora Goldman Sachs, além de ser membro da Trilateral, o movimento neoliberal fundado por David Rockefeller e do comité directivo do Grupo Bilderberg.
Em Portugal, como se sabe, o descalabro das finanças públicas também jogou um papel determinante na queda de Sócrates, assim como em Espanha antecipou a saída de Zapatero, e em ambos os casos patrocinando mudanças partidárias de sinal contrário (aqui ao lado todas as sondagens apontam para a vitória folgada, talvez com maioria absoluta, do PP de Rajoy sobre o PSOE de Rubalcaba, nas eleições de amanhã).
Na República da Irlanda já se passara uma primeira situação de mudança política a reboque do empréstimo internacional, cuja origem foi o descalabro da banca.
Estes são os factos.
2. Estamos perante uma nova realidade, delimitada pelos governos, pela banca e pelos organismos internacionais da alta finança, nos quais o indivíduo, no futuro - pode especular-se -, porventura irá escolher mais pela vontade demonstrada como investidor individual (quando existe capacidade para isso) do que como cidadão-eleitor.
Podemos, numa altura destas, começar a praticar a diabolização dos mercados (sobretudo se quisermos esquecer que uma parte destes mercados somos nós, e as nossas escolhas) e a temer pelo futuro da democracia tal e qual a conhecemos até aqui.
Este, no entanto, ainda é, em primeiro lugar, o tempo para reflectirmos sobre a qualidade das pessoas que têm sido geradas pelas máquinas partidárias um pouco por toda a Europa e que nos temos permitido eleger para governar, independentemente de qualquer défice e do acumular das dívidas.
Não precisamos de ir ao puzzle conhecido por Itália e a esse personagem menor chamado Silvio Berlusconi. Em Portugal, os processos judiciais - mas não só - têm mostrado à evidência a qualidade pessoal de muitas das pessoas que têm constituído a vida pública portuguesa nas últimas décadas. Sendo injusto tomar essa parte pelo todo, é claro, a miséria humana salta à vista, tanto na política como no mundo dos negócios. Só não percebe quem não quer.
3. As mudanças políticas na Europa têm sido produzidas num determinado sentido nas últimas semanas. Na sua génese há uma lógica perigosa que merece ser monitorizada pela cidadania.
Devemos convir, no entanto, quando assistimos aos factos atrás descritos, que eles foram precedidos por muita irresponsabilidade, de governos e de países.
"Os mercados" não fizeram mal nenhum à Finlândia, à Holanda e à Áustria, por exemplo, para já nem falar na Alemanha.
Onde há responsabilidade, sentido de Estado e uma vida colectiva dentro dos parâmetros da riqueza criada, não tem havido problema com os mercados.
Essa é a outra verdade.
A revolta das pessoas no Norte de África e Médio Oriente e as mudanças na Europa fazem, ambas, parte de um processo de "limpeza" do pessoal dirigente e, tendo naturezas diferentes, têm muito mais em comum do que aquilo que se poderá notar à primeira vista...
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Obrigado, sr. Kröger
.
Obrigado, sr. Kröger
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
1. Esta semana, a troika veio-nos dizer que está tudo a correr bem. Como o Governo deve ter medo de que não acreditemos, combinou, presumo, com o sr. Jürgen Kröger ser este cavalheiro a dar as boas notícias.
Posso imaginar as palmadinhas de "nice work" dos comissários nas costas dos membros do Governo e os "yes" de satisfação pela boa nota obtida.
Como bom mestre decidiu conceder-nos uma palavrinha de acalento e um conselho para ainda melhorarmos mais o nosso desempenho.
"Portugal não é a Grécia, há estabilidade e as pessoas são boas", disse o bom do Jürgen. Não consta, sendo nós o país com mais problemas a seguir à Grécia, que um jornalista ou governante presente na sala se tenha lembrado de perguntar: "Quer Vexa dizer que nos devamos alegrar por sermos o penúltimo dos países em dificuldade?" ou "quando for para a Espanha dirá que os espanhóis não são os portugueses?" ou ainda "qual o 'x' a que corresponde na equação dos problemas económicos dos diversos povos a bondade?" A festa estava tão boa, as notícias eram tão encorajadoras que ninguém quis maçar o senhor. E fizeram muito bem, não fosse ele zangar-se. Manda quem pode, obedece quem precisa. Provavelmente, foi mesmo para não o aborrecer que ninguém lhe recordou que as duas primeiras avaliações do plano de ajuda à Grécia também foram excelentes. Os gregos, nessa altura, também eram bons, depois, com a implementação do brilhantíssimo plano, é que ficaram maus. Vá-se lá saber porquê.
Entusiasmado com a simpatia dos presentes, lá veio o conselho: "As empresas privadas também devem baixar os salários." Bem visto, sim senhor. Assim a nossa economia ficava mais competitiva. Claro que existe essa chatice de as leis não o permitirem, dos patrões teimarem em querer gerir as suas empresas, mas o Jürgen não é homem para se deixar abater com pormenores. E ninguém venha com essa conversa tola de qualificar os trabalhadores, de apostar na qualidade, de aproveitar as universidades, de fazer marcas fortes, isso é para os povos mesmo bons ou muito bons. Os alemães, os holandeses, os dinamarqueses, os italianos (esses, se calhar, não). Os chineses é que devem ter ficado preocupados, às tantas vão ter de passar de uma malga de arroz por dia para meia.
Obrigado, sr. Jürgen Kröger. Volte sempre. Tem aqui um povo atento e venerando.
2. O ministro Álvaro, a cada dia que passa, demonstra mais e melhor a sua enorme utilidade. Não será propriamente na condução das diversas pastas que tem a seu cargo. O seu desconhecimento total da realidade portuguesa, a sua confrangedora inexperiência política, o facto de não ter gerido outra coisa na vida que não fosse a sua conta bancária, tudo isto associado a um deslumbramento ideológico típico de quem nunca saiu do conforto de uma faculdade, está a dar o resultado previsível: um desastre total e absoluto. Esta semana ficou mais claro o seu papel e onde ele pode, de facto, ajudar o Governo: o ministro Álvaro distrai. Só assim se pode explicar a laracha do anúncio do princípio do fim da crise para Dezembro de 2012. E não há dúvida de que resultou. Assim, pouca gente ligou às palavras de Passos Coelho acusando indirectamente o Presidente da República de defender uma "solução fácil" para a Europa e a inexplicável declaração também do primeiro-ministro, que, quando confrontado com a possibilidade de emissão de moeda, afirmou: "Na Europa isso já aconteceu há largas dezenas de anos e a Europa viveu uma guerra muito forte por causa disso." Só mesmo o impagável Santos Pereira para abafar o insustentável clima que se vive entre o Presidente da República e o primeiro-ministro e as pouco esclarecidas palavras de Passos Coelho. Convinha um certo refrear deste tipo de afirmações, se não ainda vamos ter o ministro Álvaro a anunciar a descoberta de petróleo no Chiado ou mesmo a descida do desemprego para 2013.
3. Muito edificante a troca de argumentos entre a ministra da Justiça e o bastonário da Ordem dos Advogados. A primeira conclusão já é do conhecimento público: Paula Teixeira da Cruz não gosta de Marinho e Pinto e Marinho e Pinto não gosta da Paula Teixeira da Cruz.
Entretanto, o procurador-geral da República ficou chocado com o circo mediático montado em redor da detenção do mais recente condenado sem julgamento, Duarte Lima. Pinto Monteiro já anunciou um inquérito para apurar as fugas de informação que permitiram aos jornalistas presenciar a operação do Ministério Público. Infelizmente, segundo ele, nunca se chega a apurar nada com estes inquéritos.
Para os lados da Justiça nada de novo.
In DN
Obrigado, sr. Kröger
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
1. Esta semana, a troika veio-nos dizer que está tudo a correr bem. Como o Governo deve ter medo de que não acreditemos, combinou, presumo, com o sr. Jürgen Kröger ser este cavalheiro a dar as boas notícias.
Posso imaginar as palmadinhas de "nice work" dos comissários nas costas dos membros do Governo e os "yes" de satisfação pela boa nota obtida.
Como bom mestre decidiu conceder-nos uma palavrinha de acalento e um conselho para ainda melhorarmos mais o nosso desempenho.
"Portugal não é a Grécia, há estabilidade e as pessoas são boas", disse o bom do Jürgen. Não consta, sendo nós o país com mais problemas a seguir à Grécia, que um jornalista ou governante presente na sala se tenha lembrado de perguntar: "Quer Vexa dizer que nos devamos alegrar por sermos o penúltimo dos países em dificuldade?" ou "quando for para a Espanha dirá que os espanhóis não são os portugueses?" ou ainda "qual o 'x' a que corresponde na equação dos problemas económicos dos diversos povos a bondade?" A festa estava tão boa, as notícias eram tão encorajadoras que ninguém quis maçar o senhor. E fizeram muito bem, não fosse ele zangar-se. Manda quem pode, obedece quem precisa. Provavelmente, foi mesmo para não o aborrecer que ninguém lhe recordou que as duas primeiras avaliações do plano de ajuda à Grécia também foram excelentes. Os gregos, nessa altura, também eram bons, depois, com a implementação do brilhantíssimo plano, é que ficaram maus. Vá-se lá saber porquê.
Entusiasmado com a simpatia dos presentes, lá veio o conselho: "As empresas privadas também devem baixar os salários." Bem visto, sim senhor. Assim a nossa economia ficava mais competitiva. Claro que existe essa chatice de as leis não o permitirem, dos patrões teimarem em querer gerir as suas empresas, mas o Jürgen não é homem para se deixar abater com pormenores. E ninguém venha com essa conversa tola de qualificar os trabalhadores, de apostar na qualidade, de aproveitar as universidades, de fazer marcas fortes, isso é para os povos mesmo bons ou muito bons. Os alemães, os holandeses, os dinamarqueses, os italianos (esses, se calhar, não). Os chineses é que devem ter ficado preocupados, às tantas vão ter de passar de uma malga de arroz por dia para meia.
Obrigado, sr. Jürgen Kröger. Volte sempre. Tem aqui um povo atento e venerando.
2. O ministro Álvaro, a cada dia que passa, demonstra mais e melhor a sua enorme utilidade. Não será propriamente na condução das diversas pastas que tem a seu cargo. O seu desconhecimento total da realidade portuguesa, a sua confrangedora inexperiência política, o facto de não ter gerido outra coisa na vida que não fosse a sua conta bancária, tudo isto associado a um deslumbramento ideológico típico de quem nunca saiu do conforto de uma faculdade, está a dar o resultado previsível: um desastre total e absoluto. Esta semana ficou mais claro o seu papel e onde ele pode, de facto, ajudar o Governo: o ministro Álvaro distrai. Só assim se pode explicar a laracha do anúncio do princípio do fim da crise para Dezembro de 2012. E não há dúvida de que resultou. Assim, pouca gente ligou às palavras de Passos Coelho acusando indirectamente o Presidente da República de defender uma "solução fácil" para a Europa e a inexplicável declaração também do primeiro-ministro, que, quando confrontado com a possibilidade de emissão de moeda, afirmou: "Na Europa isso já aconteceu há largas dezenas de anos e a Europa viveu uma guerra muito forte por causa disso." Só mesmo o impagável Santos Pereira para abafar o insustentável clima que se vive entre o Presidente da República e o primeiro-ministro e as pouco esclarecidas palavras de Passos Coelho. Convinha um certo refrear deste tipo de afirmações, se não ainda vamos ter o ministro Álvaro a anunciar a descoberta de petróleo no Chiado ou mesmo a descida do desemprego para 2013.
3. Muito edificante a troca de argumentos entre a ministra da Justiça e o bastonário da Ordem dos Advogados. A primeira conclusão já é do conhecimento público: Paula Teixeira da Cruz não gosta de Marinho e Pinto e Marinho e Pinto não gosta da Paula Teixeira da Cruz.
Entretanto, o procurador-geral da República ficou chocado com o circo mediático montado em redor da detenção do mais recente condenado sem julgamento, Duarte Lima. Pinto Monteiro já anunciou um inquérito para apurar as fugas de informação que permitiram aos jornalistas presenciar a operação do Ministério Público. Infelizmente, segundo ele, nunca se chega a apurar nada com estes inquéritos.
Para os lados da Justiça nada de novo.
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Porca miséria
.
Porca miséria
por PAULO BALDAIA
Hoje
Não sei se Duarte Lima é culpado. Não sei e, para já, não quero saber. Presumo-o inocente, que é o estatuto devido a todos os portugueses que caem na alçada da justiça. Até prova em contrário, e a prova deve fazer-se apenas em tribunal. Mas não tenho ilusões, com o reality show montado à volta da sua detenção, o País inteiro já o condenou.
O que sei hoje é que as fugas de informação que permitem a montagem do circo mediático não são inéditas. Essas fugas de informação tanto podem servir jornalistas ávidos de mostrar serviço, como podem servir para os suspeitos destruírem provas ou preparem a fuga, mas nunca servem para fazer justiça. Com gente famosa ou poderosa é quase sempre assim que acontece. No final, quase nunca são condenados nos tribunais, mas já estão condenados na praça pública. Alguns magistrados do Ministério Público é assim que gostam que as coisas aconteçam. Incapazes de produzir prova irrefutável, não desarmam. Para eles a maior prova é a sua própria convicção. Não serve em tribunal, mas serve-lhes a eles.
Não é com Duarte Lima que estou preocupado; é com a justiça que tem o meu país. Um procurador-geral que diz que tudo isto é uma vergonha, mas que reconhece a sua incapacidade para resolver o assunto é a prova da falência de um Estado Democrático. Um presidente do Supremo que considera que Isaltino já devia estar preso e que atribui as culpas aos processos penal e civil é a prova da falência de um Estado Democrático. Poderiam seguir mais mil exemplos para mostrar que a justiça em Portugal não funciona, mas, tendo em conta que quem falou atrás foram os chefes da investigação e dos tribunais, não vale a pena gastar mais papel.
Penso que ninguém tem dúvidas de que é a Democracia que é posta em causa quando não há justiça. Perder soberania para os funcionários de 7.ª linha da troika é coisa pouca comparada com esta prepotência de uns quantos senhores da justiça em relação a todos os portugueses. Prefiro ouvir os disparates dos funcionários da troika, mesmo quando eles se metem onde não são chamados, do que ver milhões de portugueses acreditarem que podem julgar alguém com base no circo a que assistem nos órgãos de comunicação social.
Em relação à perda de soberania para os senhores da troika a opção é clara: ou queremos ser senhores do nosso destino sem o dinheiro dos outros, ou queremos o dinheiro deles e aceitamos que eles nos imponham as condições em que nos emprestam. Mas na justiça não há a alternativa que nos querem impor. Eu não quero cidadãos do meu país com a opção de serem condenados, por serem poderosos, na praça pública ou nos tribunais. A única alternativa que pode haver é a de serem condenados porque se prova a sua culpa ou inocentados porque não se prova a sua culpa.
In DN
Porca miséria
por PAULO BALDAIA
Hoje
Não sei se Duarte Lima é culpado. Não sei e, para já, não quero saber. Presumo-o inocente, que é o estatuto devido a todos os portugueses que caem na alçada da justiça. Até prova em contrário, e a prova deve fazer-se apenas em tribunal. Mas não tenho ilusões, com o reality show montado à volta da sua detenção, o País inteiro já o condenou.
O que sei hoje é que as fugas de informação que permitem a montagem do circo mediático não são inéditas. Essas fugas de informação tanto podem servir jornalistas ávidos de mostrar serviço, como podem servir para os suspeitos destruírem provas ou preparem a fuga, mas nunca servem para fazer justiça. Com gente famosa ou poderosa é quase sempre assim que acontece. No final, quase nunca são condenados nos tribunais, mas já estão condenados na praça pública. Alguns magistrados do Ministério Público é assim que gostam que as coisas aconteçam. Incapazes de produzir prova irrefutável, não desarmam. Para eles a maior prova é a sua própria convicção. Não serve em tribunal, mas serve-lhes a eles.
Não é com Duarte Lima que estou preocupado; é com a justiça que tem o meu país. Um procurador-geral que diz que tudo isto é uma vergonha, mas que reconhece a sua incapacidade para resolver o assunto é a prova da falência de um Estado Democrático. Um presidente do Supremo que considera que Isaltino já devia estar preso e que atribui as culpas aos processos penal e civil é a prova da falência de um Estado Democrático. Poderiam seguir mais mil exemplos para mostrar que a justiça em Portugal não funciona, mas, tendo em conta que quem falou atrás foram os chefes da investigação e dos tribunais, não vale a pena gastar mais papel.
Penso que ninguém tem dúvidas de que é a Democracia que é posta em causa quando não há justiça. Perder soberania para os funcionários de 7.ª linha da troika é coisa pouca comparada com esta prepotência de uns quantos senhores da justiça em relação a todos os portugueses. Prefiro ouvir os disparates dos funcionários da troika, mesmo quando eles se metem onde não são chamados, do que ver milhões de portugueses acreditarem que podem julgar alguém com base no circo a que assistem nos órgãos de comunicação social.
Em relação à perda de soberania para os senhores da troika a opção é clara: ou queremos ser senhores do nosso destino sem o dinheiro dos outros, ou queremos o dinheiro deles e aceitamos que eles nos imponham as condições em que nos emprestam. Mas na justiça não há a alternativa que nos querem impor. Eu não quero cidadãos do meu país com a opção de serem condenados, por serem poderosos, na praça pública ou nos tribunais. A única alternativa que pode haver é a de serem condenados porque se prova a sua culpa ou inocentados porque não se prova a sua culpa.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Contágio
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Contágio
por JOÃO CÉSAR DAS NEVES
Hoje
Na era da globalização um dos piores medos é a pandemia. Já surgiram várias: a sida desde 1981, SARS em 2003, gripe das aves (H5N1) em 2005 e gripe A (H1N1) em 2009. Teme-se uma pior, descrita no último filme de Steven Soderbergh, Contágio (2011). Mas o mundo sofre já a pandemia de um vírus muito mais virulento: a desconfiança.
Hoje não se acredita no sistema, autoridades, especialistas. A sociedade mediática até institucionalizou a suspeita. Uma crise financeira é um assunto perigoso e delicado, mas fica muito mais perigoso se for enfrentada ao lado de jornais que histericamente exageram cada dificuldade, antecipam obstáculos imaginários, auguram os piores fiascos. No meio de tanta gritaria mediática o que espanta é que as coisas não estejam pior.
Nos casos mais avançados da infecção incrédula vemos quem suspeita e insulta o Estado para pôr a sua fé em boatos desmiolados ou bloggers desconhecidos (como Soderbergh relata no filme). Os disparates extremistas e irónicos do Bloco de Esquerda têm mais credibilidade que discursos de ministros e estudos de organizações internacionais. As atoardas incendiárias de manifestações são levados a sério por pessoas pacatas.
No fundo dá-nos gozo ver os políticos às aranhas incapazes de solucionar a crise. Parece justiça poética e muitos sentem-se vingados e felizes com a imagem. Sem perceber que se os chefes falharem, quem sofre não são eles, mas nós. Se o capitalismo chegar ao fim, se o euro acabar, se Portugal falhar na troika, o desemprego e a austeridade de hoje parecerão brincadeira. Ao menos era bom não rir disso.
Porque esta desconfiança e cinismo significam serrar o próprio ramo em que nos sentamos. Senão por inteligência ao menos por medo devíamos acreditar no que temos, desejar que as soluções vinguem, apostar nos que mandam, em vez de torcer sempre pelo pior. Isto é uma grave doença social, que leva ao desastre. A saudável caricatura que ironiza sobre os poderosos para manter o equilíbrio social nada tem a ver com esta mesquinha calúnia que considera os responsáveis alvos das piores acusações simplesmente por serem responsáveis. Não se punem os culpados, como os ex-ministros, insultam-se os poderosos do momento. Por serem poderosos.
Qual é a causa desta atitude infecto-contagiosa? Muitos dizem que é a má qualidade dos políticos. Esta tese constitui aliás a explicação mais comum para a crise. Mas não faz sentido. Primeiro porque os actuais dirigentes não são muito diferentes dos das épocas de prosperidade. Obama não é pior que Kennedy, Sarkozy que Giscard, Passos que Soares, até Berlusconi que Mussolini. Depois, porque, ao contrário de tempos antigos, os responsáveis que temos foram escolhidos por nós. São consequência, não causa.
A origem da desconfiança é o esquecimento de um princípio muito simples, absolutamente evidente, que sempre se ensinou às crianças, mas hoje foi invertido. Desde pequeno aprendi a enorme dívida que tenho para com a sociedade onde vivo. Aquilo que ela me dá, a todos os níveis, é muito mais do que consigo entender. A cultura, segurança, alimentação, infraestruturas são apenas a parte visível. Sem ela, numa ilha deserta, viveria na miséria, se sobrevivesse. Dessa verdade sai a exigência que eu contribua o mais que possa para a comunidade, de forma a minimizar o meu débito. É importante estudar, trabalhar, poupar e esforçar-se, não para ganhar o que nunca posso merecer, mas para contribuir para o povo a quem devo tudo o que sou.
É verdade que este princípio foi abusado por alguns, usando-o em proveito próprio. Isso inverteu a atitude e hoje os indivíduos sentem que é a sociedade que lhes deve algo. As pessoas têm direito que a comunidade lhes dê emprego, casa, vida próspera. Se não dá, a culpa é dela, não nossa. Caímos numa cultura de exigência, não de cidadania, de reivindicação, não de produção e dedicação.
A última vez que esta pandemia de incredulidade surgiu no mundo, após a gripe espanhola em 1918, gerou ditaduras totalitárias que quase destruíram a humanidade
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Contágio
por JOÃO CÉSAR DAS NEVES
Hoje
Na era da globalização um dos piores medos é a pandemia. Já surgiram várias: a sida desde 1981, SARS em 2003, gripe das aves (H5N1) em 2005 e gripe A (H1N1) em 2009. Teme-se uma pior, descrita no último filme de Steven Soderbergh, Contágio (2011). Mas o mundo sofre já a pandemia de um vírus muito mais virulento: a desconfiança.
Hoje não se acredita no sistema, autoridades, especialistas. A sociedade mediática até institucionalizou a suspeita. Uma crise financeira é um assunto perigoso e delicado, mas fica muito mais perigoso se for enfrentada ao lado de jornais que histericamente exageram cada dificuldade, antecipam obstáculos imaginários, auguram os piores fiascos. No meio de tanta gritaria mediática o que espanta é que as coisas não estejam pior.
Nos casos mais avançados da infecção incrédula vemos quem suspeita e insulta o Estado para pôr a sua fé em boatos desmiolados ou bloggers desconhecidos (como Soderbergh relata no filme). Os disparates extremistas e irónicos do Bloco de Esquerda têm mais credibilidade que discursos de ministros e estudos de organizações internacionais. As atoardas incendiárias de manifestações são levados a sério por pessoas pacatas.
No fundo dá-nos gozo ver os políticos às aranhas incapazes de solucionar a crise. Parece justiça poética e muitos sentem-se vingados e felizes com a imagem. Sem perceber que se os chefes falharem, quem sofre não são eles, mas nós. Se o capitalismo chegar ao fim, se o euro acabar, se Portugal falhar na troika, o desemprego e a austeridade de hoje parecerão brincadeira. Ao menos era bom não rir disso.
Porque esta desconfiança e cinismo significam serrar o próprio ramo em que nos sentamos. Senão por inteligência ao menos por medo devíamos acreditar no que temos, desejar que as soluções vinguem, apostar nos que mandam, em vez de torcer sempre pelo pior. Isto é uma grave doença social, que leva ao desastre. A saudável caricatura que ironiza sobre os poderosos para manter o equilíbrio social nada tem a ver com esta mesquinha calúnia que considera os responsáveis alvos das piores acusações simplesmente por serem responsáveis. Não se punem os culpados, como os ex-ministros, insultam-se os poderosos do momento. Por serem poderosos.
Qual é a causa desta atitude infecto-contagiosa? Muitos dizem que é a má qualidade dos políticos. Esta tese constitui aliás a explicação mais comum para a crise. Mas não faz sentido. Primeiro porque os actuais dirigentes não são muito diferentes dos das épocas de prosperidade. Obama não é pior que Kennedy, Sarkozy que Giscard, Passos que Soares, até Berlusconi que Mussolini. Depois, porque, ao contrário de tempos antigos, os responsáveis que temos foram escolhidos por nós. São consequência, não causa.
A origem da desconfiança é o esquecimento de um princípio muito simples, absolutamente evidente, que sempre se ensinou às crianças, mas hoje foi invertido. Desde pequeno aprendi a enorme dívida que tenho para com a sociedade onde vivo. Aquilo que ela me dá, a todos os níveis, é muito mais do que consigo entender. A cultura, segurança, alimentação, infraestruturas são apenas a parte visível. Sem ela, numa ilha deserta, viveria na miséria, se sobrevivesse. Dessa verdade sai a exigência que eu contribua o mais que possa para a comunidade, de forma a minimizar o meu débito. É importante estudar, trabalhar, poupar e esforçar-se, não para ganhar o que nunca posso merecer, mas para contribuir para o povo a quem devo tudo o que sou.
É verdade que este princípio foi abusado por alguns, usando-o em proveito próprio. Isso inverteu a atitude e hoje os indivíduos sentem que é a sociedade que lhes deve algo. As pessoas têm direito que a comunidade lhes dê emprego, casa, vida próspera. Se não dá, a culpa é dela, não nossa. Caímos numa cultura de exigência, não de cidadania, de reivindicação, não de produção e dedicação.
A última vez que esta pandemia de incredulidade surgiu no mundo, após a gripe espanhola em 1918, gerou ditaduras totalitárias que quase destruíram a humanidade
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Resumindo, ganhou Espanha
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Resumindo, ganhou Espanha
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Visto de fora, como devem ser vistas as eleições dos outros, o essencial do que se passou ontem em Espanha é que o partido vencedor não vai precisar de pactos com forças minoritárias para governar. A maior vitória de sempre do PP (conservador) e a maior derrota de sempre do PSOE (socialista) resume-se nisto: o PP tem a maioria absoluta. Calculem um país não com uma Madeira mas 17 comunidades autonómicas, assim é Espanha. Onde todas as regiões abusavam, contando que o poder central lhes poria a mão por baixo em caso de desvios orçamentais, o que era comum em tempos de vacas gordas, mas perigoso na magna crise internacional e com Espanha sendo um dos países europeus mais frágeis. O que era costume era o governo de Madrid ser obrigado a pactuar com partidos que só valiam meia dúzia de deputados, geralmente eleitos por se concentrarem numa região do país - Galiza, País Basco, Catalunha... -, que vendiam caro o seu apoio. Mas via-se mal como no nebuloso 2011 e nos anos que vamos entrar, um país europeu podia continuar a pagar resgates tão altos pela unidade e para se poder governar. Com a lucidez que os maus momentos por vezes trazem, os espanhóis fortaleceram o governo central. O paradoxo da federação conservadora catalã, CiU, ilustra essa situação. Pela primeira vez, em eleições gerais, a CiU ganhou na Catalunha mas, ontem, sentiu-se derrotada: os conservadores do PP não vão precisar dela para governar.
In DN
Resumindo, ganhou Espanha
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Visto de fora, como devem ser vistas as eleições dos outros, o essencial do que se passou ontem em Espanha é que o partido vencedor não vai precisar de pactos com forças minoritárias para governar. A maior vitória de sempre do PP (conservador) e a maior derrota de sempre do PSOE (socialista) resume-se nisto: o PP tem a maioria absoluta. Calculem um país não com uma Madeira mas 17 comunidades autonómicas, assim é Espanha. Onde todas as regiões abusavam, contando que o poder central lhes poria a mão por baixo em caso de desvios orçamentais, o que era comum em tempos de vacas gordas, mas perigoso na magna crise internacional e com Espanha sendo um dos países europeus mais frágeis. O que era costume era o governo de Madrid ser obrigado a pactuar com partidos que só valiam meia dúzia de deputados, geralmente eleitos por se concentrarem numa região do país - Galiza, País Basco, Catalunha... -, que vendiam caro o seu apoio. Mas via-se mal como no nebuloso 2011 e nos anos que vamos entrar, um país europeu podia continuar a pagar resgates tão altos pela unidade e para se poder governar. Com a lucidez que os maus momentos por vezes trazem, os espanhóis fortaleceram o governo central. O paradoxo da federação conservadora catalã, CiU, ilustra essa situação. Pela primeira vez, em eleições gerais, a CiU ganhou na Catalunha mas, ontem, sentiu-se derrotada: os conservadores do PP não vão precisar dela para governar.
In DN
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Jovens, fora daqui!
.
Jovens, fora daqui!
por BAPTISTA-BASTOS
Hoje
Uma televisão esteve a fazer perguntas a jovens portugueses. Os jovens portugueses foram unânimes: estão fartos de ver os seus sonhos e ambições espezinhados, não se resignam a esta desordem política que lhes interdita o acesso ao bem-estar e à felicidade, e que eliminou do horizonte humano qualquer expressão de justiça. Uma rapariga, por sinal muito bonita e de frase curtida em leituras e decisões, preparava-se para abandonar o País e viajar até onde as suas faculdades fossem reconhecidas e estimadas. "Mas vai voltar, um dia?", perguntou-lhe, afobada, o jornalista, "Nunca mais! Aqui, não tenho futuro!" A luz, na televisão, era mais clara, e o rosto da rapariga atingiu uma inesperada dureza. Talvez o desprendimento de quem tem a sensação de não ser desejada.
Foi esse alheamento que me impressionou. De repente, na afirmação, "Aqui não tenho futuro!", deixara de residir a ternura e a intimidade, e passara a descoberto a factura de uma nova sabedoria, que me era estranha e, até, um pouco incómoda.
Na mesma reportagem, a informação, crua e grave, de que centenas de médicos e enfermeiros, por igual jovens, competentes e de confuso destino português, estavam de malas aviadas para se fixar no estrangeiro. Uma dessas, agora de abalada, demonstrou o seu desgosto com uma pequena frase: "Que havemos de fazer?"
Estes rapazes e raparigas são disputados em toda a Europa, e o interesse por eles, pela qualidade do seu trabalho, da sua devoção e da sua humanidade chegam à Austrália e à Nova Zelândia. Parece que o velho problema do mal na História renasce com a razão do Estado e a sua falta de ética da responsabilidade. O Estado, de certa forma corporizado no Governo, utiliza como meio específico a força da exclusão, da indiferença e do abandono, por detrás da qual se perfila a violência. As coisas complicam-se ainda mais se, noutra perspectiva, substituirmos a bondade pela grosseria. E recordo aquele membro do Governo (cujo nome desejo colocar à margem deste texto, desejadamente asseado) que incentivou os jovens portugueses a abandonar o País, violando, descaradamente, a palavra dada de respeito pela Constituição e pelos outros.
Perdemos a nossa gente nova porque estamos a ser friamente enganados por uma clique amoral, incompetente e inchada de soberba. Há qualquer coisa de infame numa política que não coincide com a justiça e com a procura do bem-estar das populações. A ilustração desta indignidade vemo-la todos os dias e atinge proporções insanas quando a juventude é assim dizimada por um Governo que a despreza ao ponto de a expulsar. "Pátria madrasta, país padrasto", concluiu João de Barros, o das Décadas, numa frase tão lacónica como excruciante.
"Aqui não tenho futuro!" A frase possui a amplitude de um desígnio e o ferrete de uma insuportável anargura.
In DN
Jovens, fora daqui!
por BAPTISTA-BASTOS
Hoje
Uma televisão esteve a fazer perguntas a jovens portugueses. Os jovens portugueses foram unânimes: estão fartos de ver os seus sonhos e ambições espezinhados, não se resignam a esta desordem política que lhes interdita o acesso ao bem-estar e à felicidade, e que eliminou do horizonte humano qualquer expressão de justiça. Uma rapariga, por sinal muito bonita e de frase curtida em leituras e decisões, preparava-se para abandonar o País e viajar até onde as suas faculdades fossem reconhecidas e estimadas. "Mas vai voltar, um dia?", perguntou-lhe, afobada, o jornalista, "Nunca mais! Aqui, não tenho futuro!" A luz, na televisão, era mais clara, e o rosto da rapariga atingiu uma inesperada dureza. Talvez o desprendimento de quem tem a sensação de não ser desejada.
Foi esse alheamento que me impressionou. De repente, na afirmação, "Aqui não tenho futuro!", deixara de residir a ternura e a intimidade, e passara a descoberto a factura de uma nova sabedoria, que me era estranha e, até, um pouco incómoda.
Na mesma reportagem, a informação, crua e grave, de que centenas de médicos e enfermeiros, por igual jovens, competentes e de confuso destino português, estavam de malas aviadas para se fixar no estrangeiro. Uma dessas, agora de abalada, demonstrou o seu desgosto com uma pequena frase: "Que havemos de fazer?"
Estes rapazes e raparigas são disputados em toda a Europa, e o interesse por eles, pela qualidade do seu trabalho, da sua devoção e da sua humanidade chegam à Austrália e à Nova Zelândia. Parece que o velho problema do mal na História renasce com a razão do Estado e a sua falta de ética da responsabilidade. O Estado, de certa forma corporizado no Governo, utiliza como meio específico a força da exclusão, da indiferença e do abandono, por detrás da qual se perfila a violência. As coisas complicam-se ainda mais se, noutra perspectiva, substituirmos a bondade pela grosseria. E recordo aquele membro do Governo (cujo nome desejo colocar à margem deste texto, desejadamente asseado) que incentivou os jovens portugueses a abandonar o País, violando, descaradamente, a palavra dada de respeito pela Constituição e pelos outros.
Perdemos a nossa gente nova porque estamos a ser friamente enganados por uma clique amoral, incompetente e inchada de soberba. Há qualquer coisa de infame numa política que não coincide com a justiça e com a procura do bem-estar das populações. A ilustração desta indignidade vemo-la todos os dias e atinge proporções insanas quando a juventude é assim dizimada por um Governo que a despreza ao ponto de a expulsar. "Pátria madrasta, país padrasto", concluiu João de Barros, o das Décadas, numa frase tão lacónica como excruciante.
"Aqui não tenho futuro!" A frase possui a amplitude de um desígnio e o ferrete de uma insuportável anargura.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
A páginas tantas, Portugal
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A páginas tantas, Portugal
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Lendo o começo da semana. Na cozinha, um casal dá conta que a sua casa está a ser assaltada. A velhota reagiu: "Comecei a gritar e ainda fui buscar a vassoura." Naturalmente, não lhe serviu de nada. Dos bandidos, um tinha faca que pôs no pescoço da mulher e outro tinha uma pistola: "Dá um tiro no velho para ele se calar", ouviu-se, sem consequências. Os assaltantes levaram ouro e um relógio. Noutras páginas, um casal chega a casa às três da manhã. Quatro encapuzados, "todos com caçadeiras em punho", batem no homem, enfiam-no num carro mas abandonam a mulher que ficou à porta de casa. Às cinco da manhã, ela recebe uma chamada do telemóvel do marido. Os raptores pedem um resgate, enquanto se ouvem, ao fundo, gritos do raptado. Onde está uma mulher apavorada, duas horas depois de o marido ter sido raptado? Claro, na esquadra. Os polícias tomam boa nota de tudo, até do telefonema, e o gang raptor é preso no mesmo dia. Duas histórias dos dias de hoje e de duas desadaptações. A mulher do primeiro casal assaltado ainda pensa que a coisa vai lá com vassouradas. O gang do segundo caso já aprendeu a violência moderna (que atravessa os dois crimes), mas ainda não a ciência que os raptos exigem ("não previna a polícia!", diz-se sempre ou faz-se com que os familiares entendam). Dos dois enganos, o da velhota é enternecedor e o da brutalidade burra assusta. Ambos são bons subsídios para um País perplexo.
In DN
A páginas tantas, Portugal
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Lendo o começo da semana. Na cozinha, um casal dá conta que a sua casa está a ser assaltada. A velhota reagiu: "Comecei a gritar e ainda fui buscar a vassoura." Naturalmente, não lhe serviu de nada. Dos bandidos, um tinha faca que pôs no pescoço da mulher e outro tinha uma pistola: "Dá um tiro no velho para ele se calar", ouviu-se, sem consequências. Os assaltantes levaram ouro e um relógio. Noutras páginas, um casal chega a casa às três da manhã. Quatro encapuzados, "todos com caçadeiras em punho", batem no homem, enfiam-no num carro mas abandonam a mulher que ficou à porta de casa. Às cinco da manhã, ela recebe uma chamada do telemóvel do marido. Os raptores pedem um resgate, enquanto se ouvem, ao fundo, gritos do raptado. Onde está uma mulher apavorada, duas horas depois de o marido ter sido raptado? Claro, na esquadra. Os polícias tomam boa nota de tudo, até do telefonema, e o gang raptor é preso no mesmo dia. Duas histórias dos dias de hoje e de duas desadaptações. A mulher do primeiro casal assaltado ainda pensa que a coisa vai lá com vassouradas. O gang do segundo caso já aprendeu a violência moderna (que atravessa os dois crimes), mas ainda não a ciência que os raptos exigem ("não previna a polícia!", diz-se sempre ou faz-se com que os familiares entendam). Dos dois enganos, o da velhota é enternecedor e o da brutalidade burra assusta. Ambos são bons subsídios para um País perplexo.
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Greve geral
.
Greve geral
por VASCO GRAÇA MOURA
Hoje
Tenho a maior dificuldade em perceber quais as vantagens de uma greve geral num país falido. Nas presentes circunstâncias, com a greve geral, as reivindicações não são atendidas. O desemprego não diminui. A produção não aumenta. A legitimidade democrática das instituições não se altera. A crise não se resolve. Ninguém lucra absolutamente nada com ela, a começar pelos participantes. A situação em que se encontram ficará rigorosamente na mesma, se não piorar como é o mais provável.
No tempo de Marx, o enriquecimento crescente dos patrões podia ser visto como correlativo da pauperização crescente e acelerada da exploração dos trabalhadores. O alvo clássico de uma greve é, por definição, a entidade patronal que, comprando a força de trabalho alheia, acumula mais-valias à custa do esforço de cada um daqueles que a prestam. Trata-se portanto de impedir o capital de ter a sua esperada e fundamental rentabilidade.
Nos últimos 150 anos as coisas mudaram muito. O estatuto dos trabalhadores no século XXI não é, nem de perto nem de longe, comparável ao que era no século XIX. Já não é por essa via que, de diferenças quantitativas, se passa a diferenças qualitativas, mesmo numa situação de escassez e desigualdades gritantes como a de hoje.
Actualmente, que se saiba, a enorme maioria das entidades patronais, em Portugal, só acumula prejuízos e riscos de insolvência. Os milhares de pequenas e médias empresas que têm vindo a desaparecer de ano para ano não vão reagir a uma greve, desde logo pela razão singela de que fecharam as portas. A não ser que se pretenda realizar uma "greve geral de desempregados", o que será um conceito tão inédito quanto macabro.
Às empresas que ainda resistem, pouco ou nada resta para efeito de eventuais cedências ao que lhes seja exigido. Não têm crédito, não são competitivas, não conseguem adquirir matérias-primas ou não têm mercado para os seus produtos. Nenhuma greve geral dos que ainda têm a sorte de ter emprego conseguirá alterar uma situação que as transcende.
A situação nos mercados internacionais, a especulação bolsista, as dinâmicas financeiras desenfreadas, o verdadeiro capitalismo apátrida, a concorrência das economias emergentes, ocorrendo num plano de globalização de impossível controle por parte das autoridades nacionais e até das internacionais, implicam muitas vezes que manter postos de trabalho corresponda a um prejuízo e não a um lucro.
Entidades patronais e empresas, que já estão pelas ruas da amargura, não vão sentir-se compelidas a alterar o status quo da sua relação com os trabalhadores. Nem podem. A situação é de falência geral. A consequência lógica inevitável será a deterioração das condições de trabalho e ainda mais suspensões de actividade e despedimentos. Além disso, ninguém investe em potenciais de instabilidade e paralisação do trabalho, mesmo que a mão-de-obra seja mais barata... Para isso, há as deslocalizações de unidades industriais e de serviços para vários países da Ásia, onde todos os factores de produção, incluindo a disciplina, se conjugam mais a contento dos interessados.
No sector público, a consequência da greve geral será pois um conjunto de serviços e actividades ainda mais degradados com forte lesão dos interesses legítimos de muita gente. O Estado não é propriamente um patrão com a vocação de enriquecer. Os serviços públicos são, normalmente, geradores de prejuízos, e por isso é que se espera do Estado que os preste.
Pode dizer-se que algumas das medidas que o Governo está a tomar atingem as raias da barbaridade. É verdade. Mas também se pode dizer que as coisas se degradaram a tal ponto que não se vê nenhuma alternativa. Está-se agora ante a falência global do sistema e também não é a greve que vai regenerá-lo. Só vai agravar as coisas, em nome de chavões políticos que já não levam a lado nenhum. A questão deixou de ser ideológica para ser de simples bom senso.
Nos tempos que correm e numa situação como a nossa, a greve como instrumento de luta, torna-se inócua e sai cara demais a toda a gente.
Os custos da operação, da paralisação dos serviços, do empobrecimento agravado do país, vão ser, mais uma vez, inevitavelmente, suportados pelos contribuintes. Se os contribuintes resolvessem, por sua vez, fazer greve geral aos impostos, então até as greves gerais iriam por água abaixo...
In DN
Greve geral
por VASCO GRAÇA MOURA
Hoje
Tenho a maior dificuldade em perceber quais as vantagens de uma greve geral num país falido. Nas presentes circunstâncias, com a greve geral, as reivindicações não são atendidas. O desemprego não diminui. A produção não aumenta. A legitimidade democrática das instituições não se altera. A crise não se resolve. Ninguém lucra absolutamente nada com ela, a começar pelos participantes. A situação em que se encontram ficará rigorosamente na mesma, se não piorar como é o mais provável.
No tempo de Marx, o enriquecimento crescente dos patrões podia ser visto como correlativo da pauperização crescente e acelerada da exploração dos trabalhadores. O alvo clássico de uma greve é, por definição, a entidade patronal que, comprando a força de trabalho alheia, acumula mais-valias à custa do esforço de cada um daqueles que a prestam. Trata-se portanto de impedir o capital de ter a sua esperada e fundamental rentabilidade.
Nos últimos 150 anos as coisas mudaram muito. O estatuto dos trabalhadores no século XXI não é, nem de perto nem de longe, comparável ao que era no século XIX. Já não é por essa via que, de diferenças quantitativas, se passa a diferenças qualitativas, mesmo numa situação de escassez e desigualdades gritantes como a de hoje.
Actualmente, que se saiba, a enorme maioria das entidades patronais, em Portugal, só acumula prejuízos e riscos de insolvência. Os milhares de pequenas e médias empresas que têm vindo a desaparecer de ano para ano não vão reagir a uma greve, desde logo pela razão singela de que fecharam as portas. A não ser que se pretenda realizar uma "greve geral de desempregados", o que será um conceito tão inédito quanto macabro.
Às empresas que ainda resistem, pouco ou nada resta para efeito de eventuais cedências ao que lhes seja exigido. Não têm crédito, não são competitivas, não conseguem adquirir matérias-primas ou não têm mercado para os seus produtos. Nenhuma greve geral dos que ainda têm a sorte de ter emprego conseguirá alterar uma situação que as transcende.
A situação nos mercados internacionais, a especulação bolsista, as dinâmicas financeiras desenfreadas, o verdadeiro capitalismo apátrida, a concorrência das economias emergentes, ocorrendo num plano de globalização de impossível controle por parte das autoridades nacionais e até das internacionais, implicam muitas vezes que manter postos de trabalho corresponda a um prejuízo e não a um lucro.
Entidades patronais e empresas, que já estão pelas ruas da amargura, não vão sentir-se compelidas a alterar o status quo da sua relação com os trabalhadores. Nem podem. A situação é de falência geral. A consequência lógica inevitável será a deterioração das condições de trabalho e ainda mais suspensões de actividade e despedimentos. Além disso, ninguém investe em potenciais de instabilidade e paralisação do trabalho, mesmo que a mão-de-obra seja mais barata... Para isso, há as deslocalizações de unidades industriais e de serviços para vários países da Ásia, onde todos os factores de produção, incluindo a disciplina, se conjugam mais a contento dos interessados.
No sector público, a consequência da greve geral será pois um conjunto de serviços e actividades ainda mais degradados com forte lesão dos interesses legítimos de muita gente. O Estado não é propriamente um patrão com a vocação de enriquecer. Os serviços públicos são, normalmente, geradores de prejuízos, e por isso é que se espera do Estado que os preste.
Pode dizer-se que algumas das medidas que o Governo está a tomar atingem as raias da barbaridade. É verdade. Mas também se pode dizer que as coisas se degradaram a tal ponto que não se vê nenhuma alternativa. Está-se agora ante a falência global do sistema e também não é a greve que vai regenerá-lo. Só vai agravar as coisas, em nome de chavões políticos que já não levam a lado nenhum. A questão deixou de ser ideológica para ser de simples bom senso.
Nos tempos que correm e numa situação como a nossa, a greve como instrumento de luta, torna-se inócua e sai cara demais a toda a gente.
Os custos da operação, da paralisação dos serviços, do empobrecimento agravado do país, vão ser, mais uma vez, inevitavelmente, suportados pelos contribuintes. Se os contribuintes resolvessem, por sua vez, fazer greve geral aos impostos, então até as greves gerais iriam por água abaixo...
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Os enganos dos políticos
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Os enganos dos políticos
Nos EUA, um certo Sr. Cain com pretensões à Sala Oval passa o tempo a misturar alhos com bugalhos...
Com as actuais tensões no Próximo e no Médio Oriente, parece actualizada a lembrança de um seu correlegionário que também trocava os pés pelas mãos...
Este vê Talibãs afegãos na Líbia... o outro muito contribuiu para a instabilidade actual daquelas zonas ao desculpar-se com o 11 de Setembro para ajustar contas petrolíferas - recorde-se que a família Bush enriqueceu com o ouro negro - com o Iraque, que preferiu os contratos franceses aos americanos, e assim destruir o mais acérrimo inimigo dos aiatolas... quando podia ter aproveitado a ocasião para meter o Irão na ordem e contribuir para um menor desassossego naquela sempre conturbada região.
Esse mesmo correlegionário daquele senhor que não percebe nada de horta sabia já ao tempo em que não passava de Governador do Texas da crise que hoje o mundo enfrenta... como o sabia o seu pai que assistiu ao início, ainda restrito à América, com os problemas no sector imobiliário sem nada fazer para travar o que se desenvolveu, através das negociatas dos títulos sujos, na crise que hoje tantos problemas está a causar.
A crise dos anos 30 do S. XX foi lição que ninguém aprendeu.
E parece que a de agora também não vai ser bem estudada.
Uns paninhos quentes aqui, uns quase inúteis emplastros mal-cheirosos ali... e até parece que quiseram matar o actual presidente por estar a tentar fazer alguma coisa.
Por cá mais perto, há uma outra lição, também dada em terras do Tio Sam (mas eles lá aprenderam!), que não há meio de entrar nas cabeças dos políticos europeus... de facto, aqueles com quem falei no assunto nem nunca ouviram falar na Noite de Filadélfia, em que depois muita discussão inútil entre os representantes dos Estados Confederados da América, e após o abandono puro e simples da maioria, um punhado deles determinou o fim da Confederação.
Foi então, não com a Independência - colónia a colónia - que, verdadeiramente, nasceram os Estados Unidos da América.
Foi precisa uma sangrenta Guerra Civil para firmar o estado federal, é certo, mas Europa - então ainda bem longe da confederação, que é o que, de facto e de iure agora temos - passou por duas guerras que iam «acabar com todas as guerras», estando a velha Europa atrasada em relação à jovem América...
A filosofia da Europa das Nações, ainda escondida sob o rótulo de Europa dos Cidadãos - Cidadãos Nacionais daqui e dali, que não Cidadãos Europeus - está a impedir um real enfrentamento da crise, com soluções eficazes que todos sabem só serem possíveis com uma verdadeira União Europeia, Estado Federal, que tenha capacidade legislativa para estabelecer legislação de imediata e efectiva aplicação em todo o território sem depender de longas, fúteis e idióticas discussões nos parlamentos de cada Estado-membro...
- Quê! Alguém está aí a chamar-me anti-patriota?
- Sou-o tanto como um lombardo que diz que a Lombardia é a sua Pátria e a Itália o seu País, ou um catalão que afirma o mesmo em relação à Catalunha versus Espanha, ou - voltando ao outro lado do Atlântico - um texano que, orgulhoso da sua Pátria das grandes planuras, se ofenderá se não o considerarem americano!
Ainda mais perto, aqui mesmo em Portugal, também parece haver quem nada tenha aprendido com a História - que cada vez se estuda menos e se compreende pior ainda - estando os membros do Governo Nacional constantemente reféns dum desavergonhado ditador que, não tendo exército nem economia capazes de a estabelecer, ameaça todo um país com uma independência que sabe bem - ou é muito mais parvo que me parece - não ter hipóteses de sustentar... já que só brilha à custa dos apoios que todos nós, especialmente os continentais que ele tanto vitupera, pagamos do nosso bolso.
E mais uma vez, pior por ser em tempo de crise que a todos afecta, e depois de se descobrir que tinha um «buraco» escondido nas contas de que é responsável e que bastante contribui para o mal-estar geral, se recusa a que o seu governinho regional contribua para a solução do mal que a todos atinge...
E ninguém lhe baixa as calças para lhe dar o remédio que bem precisa a sua estúpida vaidade:
- Uma «menina de cinco olhos» aplicada com genica!
Moscavide, 2011/11/20
In DTM
Os enganos dos políticos
Nos EUA, um certo Sr. Cain com pretensões à Sala Oval passa o tempo a misturar alhos com bugalhos...
Com as actuais tensões no Próximo e no Médio Oriente, parece actualizada a lembrança de um seu correlegionário que também trocava os pés pelas mãos...
Este vê Talibãs afegãos na Líbia... o outro muito contribuiu para a instabilidade actual daquelas zonas ao desculpar-se com o 11 de Setembro para ajustar contas petrolíferas - recorde-se que a família Bush enriqueceu com o ouro negro - com o Iraque, que preferiu os contratos franceses aos americanos, e assim destruir o mais acérrimo inimigo dos aiatolas... quando podia ter aproveitado a ocasião para meter o Irão na ordem e contribuir para um menor desassossego naquela sempre conturbada região.
Esse mesmo correlegionário daquele senhor que não percebe nada de horta sabia já ao tempo em que não passava de Governador do Texas da crise que hoje o mundo enfrenta... como o sabia o seu pai que assistiu ao início, ainda restrito à América, com os problemas no sector imobiliário sem nada fazer para travar o que se desenvolveu, através das negociatas dos títulos sujos, na crise que hoje tantos problemas está a causar.
A crise dos anos 30 do S. XX foi lição que ninguém aprendeu.
E parece que a de agora também não vai ser bem estudada.
Uns paninhos quentes aqui, uns quase inúteis emplastros mal-cheirosos ali... e até parece que quiseram matar o actual presidente por estar a tentar fazer alguma coisa.
Por cá mais perto, há uma outra lição, também dada em terras do Tio Sam (mas eles lá aprenderam!), que não há meio de entrar nas cabeças dos políticos europeus... de facto, aqueles com quem falei no assunto nem nunca ouviram falar na Noite de Filadélfia, em que depois muita discussão inútil entre os representantes dos Estados Confederados da América, e após o abandono puro e simples da maioria, um punhado deles determinou o fim da Confederação.
Foi então, não com a Independência - colónia a colónia - que, verdadeiramente, nasceram os Estados Unidos da América.
Foi precisa uma sangrenta Guerra Civil para firmar o estado federal, é certo, mas Europa - então ainda bem longe da confederação, que é o que, de facto e de iure agora temos - passou por duas guerras que iam «acabar com todas as guerras», estando a velha Europa atrasada em relação à jovem América...
A filosofia da Europa das Nações, ainda escondida sob o rótulo de Europa dos Cidadãos - Cidadãos Nacionais daqui e dali, que não Cidadãos Europeus - está a impedir um real enfrentamento da crise, com soluções eficazes que todos sabem só serem possíveis com uma verdadeira União Europeia, Estado Federal, que tenha capacidade legislativa para estabelecer legislação de imediata e efectiva aplicação em todo o território sem depender de longas, fúteis e idióticas discussões nos parlamentos de cada Estado-membro...
- Quê! Alguém está aí a chamar-me anti-patriota?
- Sou-o tanto como um lombardo que diz que a Lombardia é a sua Pátria e a Itália o seu País, ou um catalão que afirma o mesmo em relação à Catalunha versus Espanha, ou - voltando ao outro lado do Atlântico - um texano que, orgulhoso da sua Pátria das grandes planuras, se ofenderá se não o considerarem americano!
Ainda mais perto, aqui mesmo em Portugal, também parece haver quem nada tenha aprendido com a História - que cada vez se estuda menos e se compreende pior ainda - estando os membros do Governo Nacional constantemente reféns dum desavergonhado ditador que, não tendo exército nem economia capazes de a estabelecer, ameaça todo um país com uma independência que sabe bem - ou é muito mais parvo que me parece - não ter hipóteses de sustentar... já que só brilha à custa dos apoios que todos nós, especialmente os continentais que ele tanto vitupera, pagamos do nosso bolso.
E mais uma vez, pior por ser em tempo de crise que a todos afecta, e depois de se descobrir que tinha um «buraco» escondido nas contas de que é responsável e que bastante contribui para o mal-estar geral, se recusa a que o seu governinho regional contribua para a solução do mal que a todos atinge...
E ninguém lhe baixa as calças para lhe dar o remédio que bem precisa a sua estúpida vaidade:
- Uma «menina de cinco olhos» aplicada com genica!
Moscavide, 2011/11/20
In DTM
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
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Hoje sinto-me um razoável moralista
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Hoje sinto-me um razoável moralista
por ANDRÉ MACEDO*
Hoje
Há pouco mais de um ano, quando os Toyota andavam por aí a acelerar sozinhos por causa de um defeito no pedal, o presidente da marca japonesa foi visto em St. Moritz, na Suíça, a fugir a bordo de um Audi para evitar as perguntas dos repórteres. Há gafes que não se cometem, boleias que não se apanham. O ministro Mota Soares, mais conhecido como o ministro Vespa por ter ido à tomada de posse do Governo num poupado veículo de duas rodas, decidiu há dias bater contra o muro da indignação popular ao volante de um Audi A6 com um preço à altura dos cromados. Afinal, o responsável pela sensível pasta da Segurança Social cedera, aparentemente, a uma série de pecados mortais numa só aceleração: o pecado da gula e o pecado da vaidade.
Como quase sempre acontece nestas histórias, a realidade, afinal, não era bem assim - até o modelo citado e o preço eram outros. Mas o rombo estava feito, alimentando com gasolina a ira pronto-a-comer daqueles que se acham capazes de tudo, até de caminhar sobre a água. Não há maneira de contrariar a natureza humana nestas pequenezas e não vale também a pena responder ao moralismo com mais moralismo. Há em todos nós um cobrador do fraque - ou de chinelos - sempre pronto a ceder à demagogia como resposta para os nossos infortúnios pessoais ou colectivos. Ou são os carros dos ministros, ou as contas de telemóvel dos políticos, as férias na neve - não faltam assuntos deste fino recorte. A abun-dância de acusações, obedecendo às regras da oferta e da procura, já fez, apesar de tudo, descer o custo político destes episódios, mas haverá sempre espaço para o aproveitamento, especialmente em tempos de empobrecimento forçado.
É por esse motivo que não me interessa saber se o primeiro-ministro viajou em classe turística ou em executiva. Não me interessa se os ministros usam gravata ou se preferem calças de ganga. Não me interessa se vivem em Massamá ou noutro sítio qualquer. Interessa-me saber se as regras do jogo são equilibradas, se são proporcionais, se são claras, se são cumpridas e se há alguém que as faça cumprir com transparência. Já não sei quem disse que o arco da justiça é longo, mas acaba sempre por pender para o lado certo. Eu espero que sim - embora admita e conheça erros -, mas prefiro acreditar nisso do que naqueles que se aproveitam da falsa virtude para ganhar simpatias que, se for por só isso, não merecem. Se é para votar na aparência, eu escolho de caras as miss Universo. Elas não oferecem pão, mas querem sempre acabar com a fome no mundo.
* DIRECTOR DO DINHEIRO VIVO
In DN
Hoje sinto-me um razoável moralista
por ANDRÉ MACEDO*
Hoje
Há pouco mais de um ano, quando os Toyota andavam por aí a acelerar sozinhos por causa de um defeito no pedal, o presidente da marca japonesa foi visto em St. Moritz, na Suíça, a fugir a bordo de um Audi para evitar as perguntas dos repórteres. Há gafes que não se cometem, boleias que não se apanham. O ministro Mota Soares, mais conhecido como o ministro Vespa por ter ido à tomada de posse do Governo num poupado veículo de duas rodas, decidiu há dias bater contra o muro da indignação popular ao volante de um Audi A6 com um preço à altura dos cromados. Afinal, o responsável pela sensível pasta da Segurança Social cedera, aparentemente, a uma série de pecados mortais numa só aceleração: o pecado da gula e o pecado da vaidade.
Como quase sempre acontece nestas histórias, a realidade, afinal, não era bem assim - até o modelo citado e o preço eram outros. Mas o rombo estava feito, alimentando com gasolina a ira pronto-a-comer daqueles que se acham capazes de tudo, até de caminhar sobre a água. Não há maneira de contrariar a natureza humana nestas pequenezas e não vale também a pena responder ao moralismo com mais moralismo. Há em todos nós um cobrador do fraque - ou de chinelos - sempre pronto a ceder à demagogia como resposta para os nossos infortúnios pessoais ou colectivos. Ou são os carros dos ministros, ou as contas de telemóvel dos políticos, as férias na neve - não faltam assuntos deste fino recorte. A abun-dância de acusações, obedecendo às regras da oferta e da procura, já fez, apesar de tudo, descer o custo político destes episódios, mas haverá sempre espaço para o aproveitamento, especialmente em tempos de empobrecimento forçado.
É por esse motivo que não me interessa saber se o primeiro-ministro viajou em classe turística ou em executiva. Não me interessa se os ministros usam gravata ou se preferem calças de ganga. Não me interessa se vivem em Massamá ou noutro sítio qualquer. Interessa-me saber se as regras do jogo são equilibradas, se são proporcionais, se são claras, se são cumpridas e se há alguém que as faça cumprir com transparência. Já não sei quem disse que o arco da justiça é longo, mas acaba sempre por pender para o lado certo. Eu espero que sim - embora admita e conheça erros -, mas prefiro acreditar nisso do que naqueles que se aproveitam da falsa virtude para ganhar simpatias que, se for por só isso, não merecem. Se é para votar na aparência, eu escolho de caras as miss Universo. Elas não oferecem pão, mas querem sempre acabar com a fome no mundo.
* DIRECTOR DO DINHEIRO VIVO
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
A vocação da trapaça
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A vocação da trapaça
por BAPTISTA-BASTOS
Ontem
O Governo decidiu "suavizar" os cortes nos subsídios a pensionistas e funcionários públicos. O PS ficou muito contente e reivindicou para si o êxito do "recuo" do Executivo. Esqueceu-se, o PS, de dizer, que esteve à beira de aprovar o Orçamento. Não fora a ameaça de rebelião na sua bancada as coisas teriam sido borrascosas. O discurso socialista, no seu garbo aparente, é a banalização do disparate. O PS de Seguro não tem mais nada a dizer senão futilidades. E as migalhinhas que Passos Coelho e os seus atiram aos mais pobres dos portugueses fornecem-nos a verdadeira dimensão de um empreendimento de demolição do Estado com o reforço de uma insensibilidade social que deixou de ser simbólica. O "socialismo democrático" fez passar, com a ambiguidade cobarde da abstenção, esta nova afronta à miséria. E afundou, ainda mais, uma leitura exclusivamente de Esquerda, exigida a quem da Esquerda se reclama.
A coligação de Direita resvala, assustadoramente, para um autoritarismo cego, que nem as advertências de muita gente do seu lado conseguem demover. E o aproveitamento das federações patronais leva-nos a reequacionar a natureza da sua linguagem, cuja fria amoralidade elimina qualquer resquício de compreensão. Os movimentos da sociedade civil são ainda demasiado débeis para se esboçar os princípios de uma força que se opusesse à amplitude desta situação. A verdade, porém, é que nem uns nem outros são suficientemente livres. E os perigos configuram ameaças de magnitude, que não excluem ninguém. Ainda há pouco, o próprio Francisco Van Zeller aludia à falta de discernimento de quem governa e nos estava a levar por veredas muito arriscadas.
Não são, somente, a especulação financeira e a nebulosa a que chamam "o mercado", os fautores desta crise: a ausência de resposta ideológica que se antagonize com a monumental trapaça fortalece os desígnios dos que fortalecem esta economia criminosa. Trapaça, repito, é o que tentam inculcar, como generosa bondade, os cortes nos subsídios, sem que ninguém denunciasse a indignidade. O fatal Miguel Relvas veio dizer que essa decisão demonstrava a clemente humanidade do Governo e a inesgotável capacidade deste em promover o diálogo. Estamos em pleno cenário de hipocrisia, e a desfaçatez com que certa gente usa as palavras devia ser punida com a boca cheia de... areia.
A mentira continua a ser a regra e a honestidade a excepção. Em tempos que já lá vão, Pedro Passos Coelho, assumindo a pureza como princípio, pediu desculpa aos portugueses pelas baldrocas de José Sócrates. Parecia ter um indiscutível horror aos acontecimentos que nos circulavam. E agora, que faz ele, quando as circunstâncias são semelhantes ou piores? A vocação da sinceridade esvaziou-se nas exigências do "pragmatismo".
In DN
A vocação da trapaça
por BAPTISTA-BASTOS
Ontem
O Governo decidiu "suavizar" os cortes nos subsídios a pensionistas e funcionários públicos. O PS ficou muito contente e reivindicou para si o êxito do "recuo" do Executivo. Esqueceu-se, o PS, de dizer, que esteve à beira de aprovar o Orçamento. Não fora a ameaça de rebelião na sua bancada as coisas teriam sido borrascosas. O discurso socialista, no seu garbo aparente, é a banalização do disparate. O PS de Seguro não tem mais nada a dizer senão futilidades. E as migalhinhas que Passos Coelho e os seus atiram aos mais pobres dos portugueses fornecem-nos a verdadeira dimensão de um empreendimento de demolição do Estado com o reforço de uma insensibilidade social que deixou de ser simbólica. O "socialismo democrático" fez passar, com a ambiguidade cobarde da abstenção, esta nova afronta à miséria. E afundou, ainda mais, uma leitura exclusivamente de Esquerda, exigida a quem da Esquerda se reclama.
A coligação de Direita resvala, assustadoramente, para um autoritarismo cego, que nem as advertências de muita gente do seu lado conseguem demover. E o aproveitamento das federações patronais leva-nos a reequacionar a natureza da sua linguagem, cuja fria amoralidade elimina qualquer resquício de compreensão. Os movimentos da sociedade civil são ainda demasiado débeis para se esboçar os princípios de uma força que se opusesse à amplitude desta situação. A verdade, porém, é que nem uns nem outros são suficientemente livres. E os perigos configuram ameaças de magnitude, que não excluem ninguém. Ainda há pouco, o próprio Francisco Van Zeller aludia à falta de discernimento de quem governa e nos estava a levar por veredas muito arriscadas.
Não são, somente, a especulação financeira e a nebulosa a que chamam "o mercado", os fautores desta crise: a ausência de resposta ideológica que se antagonize com a monumental trapaça fortalece os desígnios dos que fortalecem esta economia criminosa. Trapaça, repito, é o que tentam inculcar, como generosa bondade, os cortes nos subsídios, sem que ninguém denunciasse a indignidade. O fatal Miguel Relvas veio dizer que essa decisão demonstrava a clemente humanidade do Governo e a inesgotável capacidade deste em promover o diálogo. Estamos em pleno cenário de hipocrisia, e a desfaçatez com que certa gente usa as palavras devia ser punida com a boca cheia de... areia.
A mentira continua a ser a regra e a honestidade a excepção. Em tempos que já lá vão, Pedro Passos Coelho, assumindo a pureza como princípio, pediu desculpa aos portugueses pelas baldrocas de José Sócrates. Parecia ter um indiscutível horror aos acontecimentos que nos circulavam. E agora, que faz ele, quando as circunstâncias são semelhantes ou piores? A vocação da sinceridade esvaziou-se nas exigências do "pragmatismo".
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Teerão volta ao jogo preferido
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Teerão volta ao jogo preferido
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Em 1979, os Guardas Revolucionários iranianos ocuparam a embaixada americana e sequestraram dezenas de funcionários. Foi o acto fundador da República islâmica. Combateram o "Grande Demónio" americano e venceram-no quando tinham pela frente o mais banana dos Presidentes americanos, Jimmy Carter. Os funcionários acabaram por ser libertados (no dia em que o presidente seguinte, Ronald Reagan, tomou posse), mas continua até hoje uma tragédia, o sequestro do povo inteiro por um bando de padrecas da Idade Média. A repetição ocorre agora, 30 anos depois. Não havendo embaixada americana, jovens barbudos ocuparam a embaixada do "Pequeno Demónio", a Grã-Bretanha. É um exercício gratuito, a Europa, hoje, é tão banana como Carter. O Governo iraniano faz de conta que os assanhados agem fora do controlo das autoridades. Na embaixada agora ocupada reuniram-se, em plena II Guerra Mundial, Churchill, Roosevelt e Estaline, quando se impôs um novo líder ao país, o jovem Xá, Mohammad Reza Pahlavi; mais tarde, em 1953, os ingleses deitaram abaixo o primeiro-ministro nacionalista Mossadegh - e esses pecados passados justificariam a ira do "povo" contra os britânicos... Ora, do que se trata é de recarregar as baterias de um regime assustado com as revoltas em outros países islâmicos. A ocupação da embaixada é um episódio menor da grande tragédia, o sequestro dos iranianos.
In DN
Teerão volta ao jogo preferido
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Em 1979, os Guardas Revolucionários iranianos ocuparam a embaixada americana e sequestraram dezenas de funcionários. Foi o acto fundador da República islâmica. Combateram o "Grande Demónio" americano e venceram-no quando tinham pela frente o mais banana dos Presidentes americanos, Jimmy Carter. Os funcionários acabaram por ser libertados (no dia em que o presidente seguinte, Ronald Reagan, tomou posse), mas continua até hoje uma tragédia, o sequestro do povo inteiro por um bando de padrecas da Idade Média. A repetição ocorre agora, 30 anos depois. Não havendo embaixada americana, jovens barbudos ocuparam a embaixada do "Pequeno Demónio", a Grã-Bretanha. É um exercício gratuito, a Europa, hoje, é tão banana como Carter. O Governo iraniano faz de conta que os assanhados agem fora do controlo das autoridades. Na embaixada agora ocupada reuniram-se, em plena II Guerra Mundial, Churchill, Roosevelt e Estaline, quando se impôs um novo líder ao país, o jovem Xá, Mohammad Reza Pahlavi; mais tarde, em 1953, os ingleses deitaram abaixo o primeiro-ministro nacionalista Mossadegh - e esses pecados passados justificariam a ira do "povo" contra os britânicos... Ora, do que se trata é de recarregar as baterias de um regime assustado com as revoltas em outros países islâmicos. A ocupação da embaixada é um episódio menor da grande tragédia, o sequestro dos iranianos.
In DN
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Hábitos de rico
.
Hábitos de rico
por JOÃO CÉSAR DAS NEVES
Hoje
Os portugueses, todos os portugueses, sofrem um único problema: hábitos de rico. Dívidas, falências, austeridade vêm daqui: acostumámo-nos ao que não podemos pagar.
Dizer isto é escandaloso. "Rico! Eu! Hábitos de rico têm os corruptos, políticos e poderosos, que gastam demais e arruínam o País. Mas pobres e classe média, não! Isso é truque para desculpar os grandes."
A culpa de corruptos e responsáveis é evidente, e muitos estão a sair impunes. Mas ela não chega para explicar um buraco deste tamanho. O problema do País é que todos gastam um bocadinho mais do que podem. Não é muito, mas esse pouco multiplicado por milhões de cidadãos honestos dá uma fortuna. Uma praga de gafanhotos come mais que meia dúzia de elefantes.
Os hábitos de rico não nos devem admirar porque os vemos bem, com outro nome. Chamam--se "critérios europeus". Todos exigem níveis comunitários, que são apenas hábitos de rico. Isso vê-se, primeiro porque essas exigências são as dos nossos parceiros mais abastados que nós, com quem convergimos, mais nos costumes de consumo que nas práticas de trabalho. Segundo, porque evidentemente não o conseguimos pagar, como mostra a dívida nacional que se acumulou inexoravelmente.
Outra prova de que o problema é geral, e não só dos chefes, está nos protestos destes dias. Muitos se indignam pelos cortes que aí vêm. A revolta é compreensível, exigindo que os ricos paguem. Mas ao mesmo tempo ela mostra como todos beneficiámos do trem de vida nacional, que se mostrou insustentável. Protestamos pelas reduções nos transportes, hospitais, escolas, sem reparar que o défice desses serviços, que todos usávamos, manifesta que eles estavam dimensionados para um nível que não podemos suportar. Aliás, quem fez a suposta "greve geral" foram só esses sectores protegidos. Funcionários, serviços públicos e afins podem reclamar, enquanto os mais afectados nunca se dão a esse luxo. Em Portugal os pobres não têm tempo para manifestações.
Tudo isto significa que a questão não está tanto na gravidade da situação, mas na disparidade entre realidade e expectativa. Se o pior dos colapsos económicos se vier a verificar, Portugal terá nos próximos tempos um nível de vida semelhante ao de há 15 anos. Isto é evidente exagero, implicando uma catástrofe que ninguém sensatamente prevê. Mas mesmo que esse cenário tão negro se concretizasse, temos de dizer que nos deixaria numa situação razoável. Aqueles que cá viviam em 1996 não se davam assim tão mal. Como é possível que essa circunstância, então aceitável, agora inspire tanto terror? Simplesmente porque as nossas ambições cresceram imenso nestes 15 anos. Ganhámos hábitos de rico.
Os sinais vêem-se em todo o lado. Hoje só andamos de carro com colete reflector, gasolina sem chumbo, inspecção periódica. Os períodos de chuva são "alerta amarelo na meteorologia". Não se vive sem TV por cabo com dezenas de canais e pelo menos dois telemóveis. Isto para não falar nas múltiplas exigênci-as de directivas eu- ropeias, ASAE, etc. Tudo coisas que há anos ninguém tinha, vivendo feliz, e se transformaram em necessidades básicas.
Isso também se manifesta no terrível drama do desemprego, o mais elevado de sempre, ao lado da enorme comunidade imigrante, também maior que nunca, que faz os trabalhos que os portugueses não querem. Dizemos que a solução nacional está na agricultura, pescas e indústria, mas ninguém quer ir para os campos, embarcar ou ser operário. Essas apostas estratégicas só seriam realizáveis com ucranianos, que também fazem funcionar outros sectores.
Encontramo-nos hoje na situação dramática dos nobres falidos, educados numa abundância que entretanto acabou. Esses são mais miseráveis que os seus criados, pois nem sequer sabem o que fazer para governar a vida.
Se o problema é este, qual a saída? Castigar corruptos e terminar abusos é indispensável, mas não chega. É preciso mudar de hábitos. Não há escolha. Falhar no programa da troika e sair do euro implicaria um colapso tal que os sacrifícios actuais pareceriam suaves.
In DN
Hábitos de rico
por JOÃO CÉSAR DAS NEVES
Hoje
Os portugueses, todos os portugueses, sofrem um único problema: hábitos de rico. Dívidas, falências, austeridade vêm daqui: acostumámo-nos ao que não podemos pagar.
Dizer isto é escandaloso. "Rico! Eu! Hábitos de rico têm os corruptos, políticos e poderosos, que gastam demais e arruínam o País. Mas pobres e classe média, não! Isso é truque para desculpar os grandes."
A culpa de corruptos e responsáveis é evidente, e muitos estão a sair impunes. Mas ela não chega para explicar um buraco deste tamanho. O problema do País é que todos gastam um bocadinho mais do que podem. Não é muito, mas esse pouco multiplicado por milhões de cidadãos honestos dá uma fortuna. Uma praga de gafanhotos come mais que meia dúzia de elefantes.
Os hábitos de rico não nos devem admirar porque os vemos bem, com outro nome. Chamam--se "critérios europeus". Todos exigem níveis comunitários, que são apenas hábitos de rico. Isso vê-se, primeiro porque essas exigências são as dos nossos parceiros mais abastados que nós, com quem convergimos, mais nos costumes de consumo que nas práticas de trabalho. Segundo, porque evidentemente não o conseguimos pagar, como mostra a dívida nacional que se acumulou inexoravelmente.
Outra prova de que o problema é geral, e não só dos chefes, está nos protestos destes dias. Muitos se indignam pelos cortes que aí vêm. A revolta é compreensível, exigindo que os ricos paguem. Mas ao mesmo tempo ela mostra como todos beneficiámos do trem de vida nacional, que se mostrou insustentável. Protestamos pelas reduções nos transportes, hospitais, escolas, sem reparar que o défice desses serviços, que todos usávamos, manifesta que eles estavam dimensionados para um nível que não podemos suportar. Aliás, quem fez a suposta "greve geral" foram só esses sectores protegidos. Funcionários, serviços públicos e afins podem reclamar, enquanto os mais afectados nunca se dão a esse luxo. Em Portugal os pobres não têm tempo para manifestações.
Tudo isto significa que a questão não está tanto na gravidade da situação, mas na disparidade entre realidade e expectativa. Se o pior dos colapsos económicos se vier a verificar, Portugal terá nos próximos tempos um nível de vida semelhante ao de há 15 anos. Isto é evidente exagero, implicando uma catástrofe que ninguém sensatamente prevê. Mas mesmo que esse cenário tão negro se concretizasse, temos de dizer que nos deixaria numa situação razoável. Aqueles que cá viviam em 1996 não se davam assim tão mal. Como é possível que essa circunstância, então aceitável, agora inspire tanto terror? Simplesmente porque as nossas ambições cresceram imenso nestes 15 anos. Ganhámos hábitos de rico.
Os sinais vêem-se em todo o lado. Hoje só andamos de carro com colete reflector, gasolina sem chumbo, inspecção periódica. Os períodos de chuva são "alerta amarelo na meteorologia". Não se vive sem TV por cabo com dezenas de canais e pelo menos dois telemóveis. Isto para não falar nas múltiplas exigênci-as de directivas eu- ropeias, ASAE, etc. Tudo coisas que há anos ninguém tinha, vivendo feliz, e se transformaram em necessidades básicas.
Isso também se manifesta no terrível drama do desemprego, o mais elevado de sempre, ao lado da enorme comunidade imigrante, também maior que nunca, que faz os trabalhos que os portugueses não querem. Dizemos que a solução nacional está na agricultura, pescas e indústria, mas ninguém quer ir para os campos, embarcar ou ser operário. Essas apostas estratégicas só seriam realizáveis com ucranianos, que também fazem funcionar outros sectores.
Encontramo-nos hoje na situação dramática dos nobres falidos, educados numa abundância que entretanto acabou. Esses são mais miseráveis que os seus criados, pois nem sequer sabem o que fazer para governar a vida.
Se o problema é este, qual a saída? Castigar corruptos e terminar abusos é indispensável, mas não chega. É preciso mudar de hábitos. Não há escolha. Falhar no programa da troika e sair do euro implicaria um colapso tal que os sacrifícios actuais pareceriam suaves.
In DN
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O "excedente" que o não é
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O "excedente" que o não é
por BAPTISTA-BASTOS
Hoje
Miguel Relvas foi apupado no XIII Congresso Nacional das Freguesias. O ministro é um homem infausto e tem a insensata tineta de desejar estar sempre em primeiro plano. Por vezes, até é confundido com o primeiro-ministro. Também nas contradições. Mas ambos fazem uma boa parelha de beques. Dizem uma coisa apressada e infundada e, logo a seguir, o seu contrário. Relvas foi pateado exactamente pela impetuosidade com que diz coisas. Sabe-se que a questão das freguesias deve ser tratada com extremo cuidado. Sabe-se, é como quem diz: pelos vistos, o ministro Relvas não sabe.
Acredito que as há a mais. Também acredito que esse excesso tem a ver com razões históricas, sentimentais, emocionais e outras. Tanto José Mattoso como António Borges Coelho podem explicar, dando-se o caso de os governantes estarem dispostos a ler e a ouvir. Duvido. E foi, eventualmente, por não querer ouvir, e por soberba e altanaria de poder, que Miguel Relvas levou com a pateada na visagem.
Apareceu na magna assembleia com um papel definitivo debaixo do braço. Não estava ali para atender: estava para falar. Um desastre. De desastre em desastre, parece que este Executivo possui, apenas, um desiderato: fazer valer o que entende ser, sem atentar nas razões dos outros. Agora, e de súbito, surgiu nas contas públicas um "excedente" de dois mil milhões de euros.
Passos revelou o facto, liso, formal, veemente e, até, um pouco dramático. Quase a seguir, disse que não dissera o que disse, e alinhavou uns remendos no discurso, deixando um legado de incredulidade e de perturbação no comum dos mortais. A pateada a Relvas e o diz-que-sim-e-que-não de Passos são sintomas de uma política confusa e indeterminada, obstinada e torta. Aliás, Passos Coelho afirma e repete, com enfadonha teimosia, que tanto se lhe dá como se lhe deu o protesto, a contestação, a revolta.
Quanto aos dois mil milhões de "excedente", que mereceram atabalhoadas "explicações" dos habituais comentadores do óbvio, e uma crítica académica e dispersa de Seguro, o seu destino estava traçado, e custar-nos-á os olhos da cara nos anos mais próximos. Como salientou Alfredo Barroso, no Frente-a-Frente da SIC Notícias, quem vai pagar são os trabalhadores.
Estas três personagens são exemplos típicos de uma época na qual a ignorância, a intemperança e a hipocrisia constituem valores tributários de uma nova leitura do mundo. Nada do que dizem é verdade, tudo o que dizem parte de equívocos e de evasivas. E estes "princípios" estão longe de ser passageiros. Podemos protestar, vaiar, proceder a acções mais ou menos violentas que o discurso deles é inalterável e, embora os não incomode, põe em evidência a sua amoralidade.
O assunto do "excedente" que o não é vem reforçar o conceito de agressividade (não apenas simbólico) comum à ideologia do Governo.
In DN
O "excedente" que o não é
por BAPTISTA-BASTOS
Hoje
Miguel Relvas foi apupado no XIII Congresso Nacional das Freguesias. O ministro é um homem infausto e tem a insensata tineta de desejar estar sempre em primeiro plano. Por vezes, até é confundido com o primeiro-ministro. Também nas contradições. Mas ambos fazem uma boa parelha de beques. Dizem uma coisa apressada e infundada e, logo a seguir, o seu contrário. Relvas foi pateado exactamente pela impetuosidade com que diz coisas. Sabe-se que a questão das freguesias deve ser tratada com extremo cuidado. Sabe-se, é como quem diz: pelos vistos, o ministro Relvas não sabe.
Acredito que as há a mais. Também acredito que esse excesso tem a ver com razões históricas, sentimentais, emocionais e outras. Tanto José Mattoso como António Borges Coelho podem explicar, dando-se o caso de os governantes estarem dispostos a ler e a ouvir. Duvido. E foi, eventualmente, por não querer ouvir, e por soberba e altanaria de poder, que Miguel Relvas levou com a pateada na visagem.
Apareceu na magna assembleia com um papel definitivo debaixo do braço. Não estava ali para atender: estava para falar. Um desastre. De desastre em desastre, parece que este Executivo possui, apenas, um desiderato: fazer valer o que entende ser, sem atentar nas razões dos outros. Agora, e de súbito, surgiu nas contas públicas um "excedente" de dois mil milhões de euros.
Passos revelou o facto, liso, formal, veemente e, até, um pouco dramático. Quase a seguir, disse que não dissera o que disse, e alinhavou uns remendos no discurso, deixando um legado de incredulidade e de perturbação no comum dos mortais. A pateada a Relvas e o diz-que-sim-e-que-não de Passos são sintomas de uma política confusa e indeterminada, obstinada e torta. Aliás, Passos Coelho afirma e repete, com enfadonha teimosia, que tanto se lhe dá como se lhe deu o protesto, a contestação, a revolta.
Quanto aos dois mil milhões de "excedente", que mereceram atabalhoadas "explicações" dos habituais comentadores do óbvio, e uma crítica académica e dispersa de Seguro, o seu destino estava traçado, e custar-nos-á os olhos da cara nos anos mais próximos. Como salientou Alfredo Barroso, no Frente-a-Frente da SIC Notícias, quem vai pagar são os trabalhadores.
Estas três personagens são exemplos típicos de uma época na qual a ignorância, a intemperança e a hipocrisia constituem valores tributários de uma nova leitura do mundo. Nada do que dizem é verdade, tudo o que dizem parte de equívocos e de evasivas. E estes "princípios" estão longe de ser passageiros. Podemos protestar, vaiar, proceder a acções mais ou menos violentas que o discurso deles é inalterável e, embora os não incomode, põe em evidência a sua amoralidade.
O assunto do "excedente" que o não é vem reforçar o conceito de agressividade (não apenas simbólico) comum à ideologia do Governo.
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