A tragédia de Jerusalém esclarece-nos sobre muitos extremismos religiosos
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A tragédia de Jerusalém esclarece-nos sobre muitos extremismos religiosos
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[size=32]Jerusalém e o terrorismo da antiguidade[/size] |
A História não se repete, mas por vezes rima, terá dito Mark Twain. A narrativa da revolta judaica, da destruição do Templo e da consequente diáspora incentivam analogias com o nosso tempo, em pleno conflito israelo-palestiniano. Mas, há quase dois mil anos, não havia palestinianos, mas romanos e judeus. As analogias são perigosas, embora o mapa actual do Médio Oriente tenha um ténue fio de ligação com a queda de Jerusalém, a começar pela fundação do Estado de Israel. E o terrorismo evoca estranhas similitudes. Mais importante que fazer analogias, é perceber que os mitos e traumatismos do passado continuam vivos na mente de muitos contemporâneos. O Templo O incêndio e destruição do Templo de Jerusalém, em 30 de Agosto do ano 70 da nossa era, é um momento que marca indelevelmente a História e não apenas a judaica. No dia 8 de Setembro, os romanos controlam toda a cidade, que em grande parte é arrasada, e saqueiam e arrasam os restos do Templo, de que restará apenas a parede ocidental, futuro Muro das Lamentações. O Templo tinha de ser destruído, pensam os historiadores de hoje, porque era o coração da resistência. Será também um momento marcante na multiplicação da então já grande diáspora judaica. Uma outra revolta, de Simon Bar Kokhba, será esmagada pelos romanos em 135. O imperador Adriano dissolve o reino da Judeia e os judeus são interditos de entrar em Jerusalém. O Templo deixa de ser o seu centro e passa a ser uma memória de perda e de dor. No Israel de hoje, depois do ataque do Hamas, assiste-se ao renascer de um absurdo medo de destruição. Ao mesmo tempo, os nacionalistas messiânicos falam em reconstruir o Templo. E também os novos terrorismos parecem uma réplica dos antigos. A tragédia aconteceu após um longo cerco e uma sangrenta guerra de quatro anos. Conhecemos estes factos graças à obra de um historiador judeu de cultura grega, José Ben Matthias, que feito cidadão romano passou a ser Flavius Titus Josephus. Foi uma testemunha presencial e dos dois lados: primeiro como comandante da revolta judaica na Galileia, depois como colaborador dos romanos, tradutor e conselheiro de Vespasiano e Tito. Revelou-se um grande historiador. Narra os factos na sua célebre Guerra dos Judeus. Dele e da sua vida fantástica, falarei na próxima semana. A grande revolta judaica, entre 66 e 70, teve numerosas motivações: o sentimento de opressão pelos romanos e a crença apocalíptica no fim dos tempos e da vinda do reino de Deus. A revolta depressa se tornou violenta, com os sicários a assassinar funcionários romanos e, sobretudo, judeus que se submetem ao ocupante. Paralelamente aos sicários, emergem os zelotas, jovens religiosos caracterizados pelo seu "zelo" na interpretação da Lei. Põem termo aos sacrifícios oferecidos aos deuses romanos em nome do imperador, apelando à luta armada contra Roma. Depressa tomam conta de Jerusalém. Roma retira os seus funcionários e Nero envia para a Judeia o general Vespasiano a fim de liquidar a revolta. Acompanha-o o seu filho Tito. Terroristas da Antiguidade Mais do que das peripécias da guerra, é interessante falar dos que a desencadearam, sicários e zelotas. Durante anos uma minoria, composta por bandos rivais, impôs o terror em Jerusalém. Zelotas e sicários são grupos distintos, que ora se digladiam ora se aliam. Outros bandos entram em cena. Os sicários escondem nos seus mantos um punhal recurvo, dito sica em latim. São também chamados "assassinos" e "bandidos". Praticavam de facto uma forma de "terrorismo urbano", escreve a historiadora Mireille Hadas-Lebel – assassínios, pilhagens, tomada de reféns ou incêndios de bens de cidadãos que consideravam cúmplices dos romanos. Raptam, por exemplo, o filho do grande sacerdote Ananias, para obter a libertação de dez sicários. Conseguiram. Isto lançou uma vaga de raptos. Os sicários, diz Josephus, assassinavam em pleno dia, sobretudo durante as festas, e quando golpeavam os inimigos eram os primeiros a gritar por socorro, ficando quase sempre impunes. A sua primeira grande vítima foi o sumo sacerdote Jonathan. Terror: qualquer judeu sabia que podia ser abatido de um momento para o outro. Os sicários eram seguidores de um místico, Judas da Galileia. Professam um messianismo revolucionário e uma visão apocalíptica e escatológica, que temos dificuldade em compreender. Para eles, é Deus que deixa cercar Jerusalém e, mais tarde, incendiar o Templo e provocar a Diáspora – tudo castigo divino pelos pecados de Israel. Se Deus quer a destruição de Israel ou o fim do povo judeu, isto quer dizer que o seu Reino está ao alcance da mão e os sicários contribuem para realizar a vontade de Deus. A violência é uma forma de purificação. Os sicários recusam qualquer autoridade que não seja a divina. A sua derradeira aventura será o "suicídio" em massa no forte de Massada em 73. São incompreensíveis sem o fundo escatológico. Não eram apenas eles. A época foi marcada pela aparição de numerosos pretendentes proféticos e messiânicos. "Os seus discípulos recrutam-se em círculos intelectuais, mas também entre os desesperados que nada têm a perder", escreve o historiador Christophe Mésange. Praticam um "terrorismo de tipo moderno". Também os zelotas, jovens religiosos radicalizados no seu "zelo", não combatem apenas os romanos mas os compatriotas que aceitam a ocupação. "A sua interpretação extremista das Escrituras não fazia unanimidade mas, pelo seu estatuto, dispunham de certa autoridade", acrescenta Mésange. Esta doutrina e o assassínio de grandes sacerdotes provocaram uma cisão no judaísmo. Uns e outros tanto se combatiam como se aliavam. Os zelotas massacraram os sicários que tiveram de se refugiar em Massada. O longo cerco de Jerusalém foi comandado por Tito. Vespasiano fora entretanto feito imperador. Resta dizer que a repressão foi terrível. Josephus viu centenas de judeus crucificados ou mortos de outra forma cruel. Muitos foram vendidos com escravos. Nos últimos tempos do cerco, os habitantes de Jerusalém morriam de fome. Josephus retrata crianças de barriga inchada e fala em cenas de antropofagia. É que os sicários tinham incendiado as reservas de cereais. Os familiares, diz, já não tinham força para enterrar os seus mortos. O mais impressionante é que, durante grande parte do cerco, a cidade continuou a viver uma guerra civil entre bandos. Mesmo assim, a resistência foi desesperada, o que suscitou a vingança romana. Os sitiados recusaram, até ao fim, uma rendição em troca das suas vidas. A tragédia de Jerusalém esclarece-nos sobre muitos extremismos religiosos actuais, conclui Mésange. "Sicários e zelotas continuam a ser numerosos dois mil anos depois." Até sexta-feira |
Jorge Almeida Fernandes jafernandes@publico.pt |
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