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O REGRESSO DA POLÍTICA

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Mensagem por Admin Ter Jun 24, 2008 12:20 am

O REGRESSO DA POLÍTICA

Mário Soares
A nostálgica viagem de George Bush pela Europa, para se despedir, não teve história. Bush acabou. Passeou com a senhora Merkel, nos arredores de Berlim, encontrou o Papa, que lhe prodigalizou imerecidos elogios, conversou com Sarkozy, na Embaixada dos Estados Unidos em Paris - onde inaugurou um monumento à amizade franco-americana - e, finalmente, correu a Londres, para tomar chá com a Rainha. Um programa social intenso. Nada de especialmente interessante. Os seus interlocutores tinham os pensamentos direccionados para as eleições presidenciais americanas que se aproximam. Bush fingiu, sorridente, não ter percebido.

No entanto, a crise múltipla, que teve o seu epicentro na América, chegou definitivamente à Europa e começou a fazer estragos sérios. O crescimento abrandou - e estamos só no começo - o custo de vida aumentou, com mais desemprego e os salários bloqueados, o preço dos combustíveis subiu em flecha, com todas as consequências que daí resultam, a revolta dos camionistas, dos taxistas, dos pescadores e dos agricultores, atingiu, ao mesmo tempo, o que é significativo, vários países europeus - e vai continuar com mais ou menos lockout e greves, uma vez que a Europa, com o não da Irlanda ao referendo, paralisou de novo as instituições, como se tivesse ocorrido algo de inesperado. Não foi. O pior, porém, é que ninguém sabe quando e como se vai sair do imbróglio.

Há quem se compraza, por razões ideológicas, ou por ser antieuropeísta, a proclamar que o Tratado de Lisboa está morto. Não estará. Mas a verdade é que a paralisação europeia vai continuar, pelo menos, dizem os tecnocratas de Bruxelas, até 2009, por volta do prazo limite das eleições para o novo Parlamento Europeu. Um período de tempo imenso, quando era tão necessário que a União estivesse activa.

Na reunião dos Chefes de Estado e de Governo dos 27 (Conselho Europeu), no passado dia 19 de Junho, em Bruxelas, dada a reticência irlandesa em propor qualquer solução próxima, o Conselho concedeu à Irlanda quatro meses de reflexão, após o referendo, para encontrar uma saída (!). Mas surgiram, entretanto, outras complicações: de um lado, o primeiro-ministro checo, Mirek Topolanek, que anunciou que o eurocepticismo está a subir no seu país, tanto que o Presidente da República, Vaclav Klaus, aproveitou o não irlandês para declarar publicamente a morte do Tratado de Lisboa, no dia seguinte ao não; e a questão que o primeiro-ministro inglês, Gordon Brown, trouxe ao Conselho, depois do Tratado ter sido ratificado pelas duas Câmaras do Parlamento (Lordes e Comuns) é que os tribunais ingleses terão levantado um problema jurídico à ratificação, a saber: se será legítimo ter procedido à ratificação depois do não irlandês ser conhecido… Está-se mesmo a ver em que sentido isto vai!

E, parafraseando alguns semanários franceses que começaram a referir a "má sorte" ("la poisse") de Nicolas Sarkozy que, aliás, em 1 de Julho próximo assumirá a presidência francesa da União. Porquê? Porque anunciou, na sua campanha eleitoral, três grandes objectivos estratégicos para a sua presidência: retomar o crescimento económico francês; aumentar o poder de compra dos franceses em geral; e pôr a Europa em marcha. Ora, todos os objectivos, parecem ter falhado… Só teve a grande satisfação (calculo) de se apaixonar, depois do infeliz desfecho do seu anterior casamento, e ter casado com Carla Bruni. É certo. Mas talvez não seja suficiente para quem se continua a ver como grande estadista… Seja, porém, como for, é a ele que cabe encontrar as soluções para a União se pôr de novo em marcha. Esperemos para ver.

Falta à União cidadania europeia. Os europeus, de todos os países membros, têm poucos meios para influenciar as decisões dos dirigentes e mesmo para as compreender. Estão a leste do que se congemina em Bruxelas. Ora é isso que leva ao desconhecimento do que está em jogo - de cada vez que são consultados - e à indiferença.

Alheiam-se dos problemas. O que não quer dizer que estejam dispostos a consentir que os seus Estados abandonem a construção europeia ou saiam da Comunidade. Porque a União é um grande e original projecto político que trouxe à Europa cinquenta anos de paz, de bem-estar às sociedades europeias - mesmo às mais desiguais - e de prestígio no mundo inteiro.

É verdade que desde há alguns anos a burocracia de Bruxelas e a influência hegemónica americana parecem ter subvertido os grandes ideais europeus. A Europa tornou-se muito conservadora. As duas maiores famílias políticas europeias - que praticamente fizeram a Europa - foram: a socialista ou social-democrata e a democracia cristã. Ambas perderam força. Hoje, em 27 Estados europeus, haverá apenas 3 ou 4 governos que ousam afirmar-se socialistas ou trabalhistas; e as democracias cristãs, tirando a alemã, evoluíram no sentido dos partidos populares, populistas e ultraconservadores, o que faz toda a diferença.

As crises múltiplas - e as terríveis dificuldades que trazem consigo -, para encontrarem qualquer solução e não desaguarem no caos ou em revoltas sangrentas, vão obrigar ao regresso em força da política e dos grandes ideais humanistas. Requer-se imaginação estratégica, persistência e coragem, muita coragem. Para transformar o que hoje nos parece impossível numa promissora realidade, amanhã.
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