A distância que vai do insulto à ilegalidade
Vagueando na Notícia :: Salas das mesas de grandes debates de noticias :: Professor Dr e mister Mokas faz a analise do Mundo
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A distância que vai do insulto à ilegalidade
A distância que vai do insulto à ilegalidade
por João Miguel Tavares
Na última coluna que publicou no jornal Sol, o arquitecto José António Saraiva escreveu o seguinte post scriptum: "As conversas [entre José Sócrates e Armando Vara] contêm linguagem imprópria, com insultos e referências desprimorosas a figuras públicas, pelo que não podem ser divulgadas. Se isso acontecesse, Sócrates seria forçado a renunciar - ou o PR teria de o demitir." O Sol tem liderado o noticiário em torno do caso "Face Oculta", através dos textos de Felícia Cabrita, e portanto é de supor que o director do jornal já tenha tido contacto com algumas transcrições das conversas entre Sócrates e Vara. Nessa mesma edição, Felícia Cabrita apontava para a coincidência de Sócrates ter mudado de telemóvel no mesmo dia de Vara e avançava com mais alguns detalhes sobre aquilo a que os magistrados de Aveiro chamaram de atentado contra o Estado de direito.
Ora, convém ser muito claro na distinção entre uma coisa e outra. Entre aquilo que são "insultos e referências desprimorosas" e aquilo que são efectivamente alegadas ilegalidades cometidas pelo primeiro- -ministro. Quando José Sócrates, no Parlamento, acusa a oposição de ter como único interesse que "conversas privadas" sejam tornadas públicas, transformando assim a "coscuvilhice" em "linha política", é o mesmo tipo de confusão que está a promover - confusão essa que depois é potenciada pelo já espectacular silêncio do procurador-geral da República e pela sua recusa em fornecer argumentos que permitam compreender o arquivamento das certidões.
De facto, se o maior problema daquelas conversas, como sugere o arquitecto Saraiva, é a qualidade da linguagem de José Sócrates, que se supõe ser idêntica à de um estivador do porto de Lisboa, então Pinto Monteiro que faça um favor à pátria: explique que os telefonemas contêm linguagem imprópria e nada mais do que isso. Se hipoteticamente Sócrates, em conversa com Vara, decidiu referir-se a políticos importantes e a jornalistas famosos socorrendo-se do calão das Beiras, isso é problema dele e de mais ninguém. São conversas privadas - e assim devem permanecer.
Mas, que eu saiba, a função de um juiz e de um procurador não é velar pelo uso aprumado da língua portuguesa. Nem suponho que seja um atentado contra o Estado de direito classificar de forma pouco abonatória os progenitores das altas instâncias da pátria. Eu não consigo imaginar que alguém emita uma certidão com o argumento: "O primeiro-ministro usou a palavra começada por F." Portanto, convém que se pare de atirar areia para os olhos e se separem bem as coisas. Os portugueses são suficientemente inteligentes para perceber a diferença entre insultos e ilegalidades. O que está em causa não são "referências desprimorosas". O que está em causa são negócios desprimorosos.
por João Miguel Tavares
Na última coluna que publicou no jornal Sol, o arquitecto José António Saraiva escreveu o seguinte post scriptum: "As conversas [entre José Sócrates e Armando Vara] contêm linguagem imprópria, com insultos e referências desprimorosas a figuras públicas, pelo que não podem ser divulgadas. Se isso acontecesse, Sócrates seria forçado a renunciar - ou o PR teria de o demitir." O Sol tem liderado o noticiário em torno do caso "Face Oculta", através dos textos de Felícia Cabrita, e portanto é de supor que o director do jornal já tenha tido contacto com algumas transcrições das conversas entre Sócrates e Vara. Nessa mesma edição, Felícia Cabrita apontava para a coincidência de Sócrates ter mudado de telemóvel no mesmo dia de Vara e avançava com mais alguns detalhes sobre aquilo a que os magistrados de Aveiro chamaram de atentado contra o Estado de direito.
Ora, convém ser muito claro na distinção entre uma coisa e outra. Entre aquilo que são "insultos e referências desprimorosas" e aquilo que são efectivamente alegadas ilegalidades cometidas pelo primeiro- -ministro. Quando José Sócrates, no Parlamento, acusa a oposição de ter como único interesse que "conversas privadas" sejam tornadas públicas, transformando assim a "coscuvilhice" em "linha política", é o mesmo tipo de confusão que está a promover - confusão essa que depois é potenciada pelo já espectacular silêncio do procurador-geral da República e pela sua recusa em fornecer argumentos que permitam compreender o arquivamento das certidões.
De facto, se o maior problema daquelas conversas, como sugere o arquitecto Saraiva, é a qualidade da linguagem de José Sócrates, que se supõe ser idêntica à de um estivador do porto de Lisboa, então Pinto Monteiro que faça um favor à pátria: explique que os telefonemas contêm linguagem imprópria e nada mais do que isso. Se hipoteticamente Sócrates, em conversa com Vara, decidiu referir-se a políticos importantes e a jornalistas famosos socorrendo-se do calão das Beiras, isso é problema dele e de mais ninguém. São conversas privadas - e assim devem permanecer.
Mas, que eu saiba, a função de um juiz e de um procurador não é velar pelo uso aprumado da língua portuguesa. Nem suponho que seja um atentado contra o Estado de direito classificar de forma pouco abonatória os progenitores das altas instâncias da pátria. Eu não consigo imaginar que alguém emita uma certidão com o argumento: "O primeiro-ministro usou a palavra começada por F." Portanto, convém que se pare de atirar areia para os olhos e se separem bem as coisas. Os portugueses são suficientemente inteligentes para perceber a diferença entre insultos e ilegalidades. O que está em causa não são "referências desprimorosas". O que está em causa são negócios desprimorosos.
Viriato- Pontos : 16657
Copenhaga e cidadania global
Copenhaga e cidadania global
por Mário Soares
1.Abriu ontem a tão falada Conferência de Copenhaga sobre as alterações climáticas e a problemática ecológica, no seu conjunto, organizada pela ONU, com a presença dos mais altos dirigentes do mundo inteiro. Prevê-se que estarão representados 192 Estados - muitos pelos respectivos Chefes de Estado - e cerca de 15 000 diplomatas e técnicos.
Mas, ao mesmo tempo, far-se-á também sentir o fenómeno novo da cidadania global, uma vez mobilizadas as consciências das pessoas comuns. Vêm de todos os continentes, angustiadas, relativamente aos perigos que corre o nosso planeta ameaçado, se não forem tomadas medidas eficazes e urgentes. Com o objectivo de pressionar os governos dos Estados, para lutarem contra o aquecimento da Terra, pelo efeito de estufa. Isto é: reclamam a redução radical das emissões de CO2 que pode, a não ser obtida, pôr em causa a própria sobrevivência da Humanidade. Aí, sim, seria o fim da História...
Muitos milhões de pessoas começam a ter consciência disso. Por essa razão organizam-se, voluntariamente, em associações e ONG em defesa do nosso planeta. Algumas muito poderosas, como o Green Peace e tantas outras. Vão estar em Copenhaga, paralelamente, à Conferência oficial a manifestar-se ruidosa e pacificamente, espero, como aconteceu na Conferência do Rio, em 1992 - em que estive e falei, na sessão de abertura -, em Quioto, em 1997, e em Bali, em 2007, bem como em tantas outras cimeiras, de variadas orientações. Como Seatle, por exemplo, que pôs em causa, como os leitores se lembrarão, a Organização Mundial do Comércio, onde só queriam fazer-se ouvir os grandes interesses do mundo dito desenvolvido, em prejuízo dos países menos desenvolvidos e dos então nascentes países emergentes que, pela primeira vez, ergueram as suas vozes e se fizeram ouvir...
Há pois duas conferências com a mesma preocupação ecológica, mas diferentes objectivos, entre os dias 7 e 18 deste mês: a oficial, a dos líderes e conselheiros especializados na vasta matéria, sem abandonar contudo os cálculos políticos, as geoestratégias e o equilíbrio dos Estados e seus interesses (cujos lideres, como Obama, só se apresentam nos últimos dias); e a dos que se reclamam, desinteressadamente, da cidadania global, o que não é menos importante, e se manifestam onde os deixarem (tanto mais ruidosos quanto mais reprimidos forem) para consciencializar e pressionar os políticos responsáveis e os cidadãos em geral do perigo em que a humanidade incorre, se não forem tomadas as medidas que se impõem. Como os dirigentes políticos, dependem dos votos para governar, pelo menos nas democracias, talvez desta vez se façam ouvir... Haja bom senso!
Para além do aquecimento global, mas em conexão com ele, há muitas outras questões de grande importância a debater: a escassez progressiva da água potável, um problema seriíssimo; a desertificação de muitos terrenos, produzida pelas secas; o ordenamento do território, especialmente nas zonas costeiras; as "lixeiras" em que estão a tornar-se os oceanos, com prejuízo manifesto da biodiversidade marinha e do clima; o desaparecimento progressivo das florestas e as chamadas "chuvas ácidas"; a preservação das espécies, vegetais e animais, (para manter a biodiversidade, em si mesma ameaçada); o problema energético, a escassez do carvão e do petróleo e a necessidade de criar as chamadas "energias renováveis" não poluentes; a questão da energia nuclear - com os seus perigos e potencialidades; a necessidade da alimentação biológica, face aos alimentos artificiais, de laboratório ou ditos de plástico; etc., etc...
Tudo isso tem a ver com a necessidade absoluta de criar outro modelo de desenvolvimento, com três vertentes principais: o crescimento ser mais justo e equitativo; levar em conta, muito seriamente, as preocupações ambientais, que são decisivas; lutar contra a pobreza, as desigualdades sociais e em favor de um sistema de justiça social. Além destas prioridades, importa ter ainda em conta a regulamentação da globalização e do sistema financeiro internacional, acabando com os "paraísos fiscais" e as escandalosas roubalheiras da finança internacional, com honrosas excepções, claro.
Há outras preocupações, é óbvio: o acréscimo das pandemias, não só a sida, como a tuberculose e a malária - que, em alguns países, foram quase erradicadas mas que estão, perigosamente, de regresso -, a gripe A, agora, bem como as doenças do foro neurológico, entre outras, causadas pelo stress, pela angústia do dia-a-dia e pela violência crescente das nossas sociedades (que importa combater); a pobreza, que continua sempre a crescer, apesar dos objectivos do novo milénio, votados nas Nações Unidas e que ficaram no papel; a criminalidade internacionalmente organizada; o tráfico de drogas, de prostituição, de órgãos humanos; etc.
A crise global sobrepôs-se a tudo isso e fez tremer o mundo dos ricos e da gente abastada, uma ínfima minoria. Não foi resolvida ainda, como sabemos. Mas o medo parece ter passado, para que tudo possa ficar mais ou menos na mesma. Erro fatal, que vamos pagar muito caro, se se persistir por esse caminho, a que chamaria de grande irresponsabilidade. É o que angustia - e revolta - as pessoas responsáveis, em todos os continentes...
Estamos a entrar num mundo multilateral em que o chamado Ocidente, e nele, principalmente, a União Europeia, por falta de iniciativa e coesão interna, perdeu peso político e influência, em favor dos novos Estados emergentes. Temos agora que contar com eles e ainda bem. O encontro entre a América e a China, os dois maiores poluentes mundiais, não foi muito conclusivo em relação à Cimeira de Copenhaga.
Contudo, grandes massas humanas, em todos os Continentes, estão a mobilizar-se e a erguer as suas vozes. Muitas são de grandes cientistas e de reputados ecologistas. Veremos como na próxima semana e meia de negociações cerradas e do confronto de interesses contraditórios, a Cimeira de Copenhaga vai decorrer. Veremos, também, como Barack Obama, cujo pensamento conhecemos, próximo de Al Gore, vai comportar-se. Sem ceder aos chineses, seus parceiros, nem às pressões dos interesses das grandes multinacionais americanas... Tenho, apesar de tudo, alguma esperança.
2.Um governo de Assembleia? Não é esse o caso, embora na passada semana os partidos da Oposição, irmanados, Esquerda e Direita, tenham dado a impressão que o queriam. Não se compreende porquê. Derrubado Sócrates, quem o poderia substituir?
Vivemos num regime semipresidencial, não parlamentar. Não o devemos esquecer. A Assembleia da República é um órgão de soberania, que eu sempre gostei de ver prestigiado, para bem da nossa democracia pluralista e civilista. Mas de acordo com o princípio constitucional, da separação de poderes, a Assembleia fiscaliza e legisla, mas não governa. Quem governa é, como o nome indica, o Governo. O qual também depende do Presidente da República, que o pode demitir e provocar novas eleições se, em consciência, considerar que está em causa o "regular funcionamento das instituições democráticas" e da Assembleia, se puder apresentar - e fizer votar por maioria - uma moção de censura. Ora, nas actuais condições, que são conhecidas, isso é muito difícil de acontecer, senão impossível.
Sendo, assim, por que razão os partidos da Oposição estão a criar uma guerrilha parlamentar, que enfraquece o parlamento e os próprios Partidos que a provocam? Note-se: sem consequências práticas, para alem do desprestígio geral, a começar pelos dois partidos dos extremos - Bloco de Esquerda e Centro Democrático e Social/Partido Popular - que, na semana passada, tácita e tacticamente, se aliaram?
Por outro lado, é óbvio que o primeiro--ministro, José Sócrates, e o ministro dos Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão, não se devem deixar irritar, sejam quais forem as provocações que lhes sejam feitas. Porque é a melhor prenda que podem dar à Oposição. Por outro lado, em política, a irritação é sempre má conselheira...
Se o País caísse - como às vezes parecem crer alguns deputados - numa crise de governabilidade, que viria em acréscimo da crise global aguda em que vivemos, seria um desastre para todos os portugueses, podendo pôr em risco o próprio regime democrático. Além de desprestigiar todos os partidos e o regime democrático, passado pouco mais de um mês das eleições legislativas. Ninguém pense que a União Europeia seria hoje, necessariamente, um escudo protector do regime. Isso era o que pensávamos em 1985. Mas as circunstâncias internacionais mudaram e a União Europeia tem hoje problemas a mais e iniciativas a menos, como todos sabemos. É prudente, pois, que a não sobrecarreguemos com mais os nossos...
Vamos entrar numa fase de reflexão, na quadra natalícia que se aproxima, quer sejamos crentes ou não. Permito-me, por isso, apelar para os Partidos e Grupos Parlamentares, bem como, obviamente, ao Governo para que pensem no nosso futuro colectivo e para as colossais dificuldades económicas, financeiras e ambientais que iremos ter pela frente, em 2010. O Povo e os mais pobres, em especial, são quem vai sofrer mais. Como de costume. Não nos perdoaríamos, a todos, se lhe acrescentássemos uma crise de governabilidade, sem finalidade prática nem senso. Só porque estamos irritados com os outros?
3 .O Afeganistão de mal a pior. Como, aliás, o Iraque. Ou, pelo menos, tão mal como o Iraque. Entretanto, Barack Obama viu-se obrigado pela sua própria retórica, dada a distinção que fez entre as duas guerras, a enviar para o Afeganistão mais 30 000 soldados das suas Forças Armadas. Provavelmente, contra a sua vontade e estratégia. Enviou-os com o pretexto de marcar o regresso das tropas dentro de um ano. Em 2011. Foi uma medida que lhe custou muito tomar - não duvido -, mas que representa uma concessão táctica muito impopular, pelo qual irá pagar um alto preço.
Os seus aliados da NATO, uma organização dita defensiva, que todos os dias perde credibilidade, conseguiu, com enorme esforço e manifesta dificuldade, enviar mais 7000 soldados para o Afeganistão. Pergunto-me: porquê? O Afeganistão é um vespeiro como foi o Vietname, sem solução militar. Tem um Presidente que parece pouco recomendável e acaba de ter eleições que foram, a acreditar nos observadores internacionais, uma verdadeira farsa. Além do mais, está a contaminar o Paquistão, outro grave problema à vista.
Será que é o complexo industrial-militar, de que falava Eisenhower, com conhecimento de causa, que força Obama a enviar mais tropas para o Afeganistão? Se assim for, representa uma fraqueza imperdoável... O tempo o dirá.
por Mário Soares
1.Abriu ontem a tão falada Conferência de Copenhaga sobre as alterações climáticas e a problemática ecológica, no seu conjunto, organizada pela ONU, com a presença dos mais altos dirigentes do mundo inteiro. Prevê-se que estarão representados 192 Estados - muitos pelos respectivos Chefes de Estado - e cerca de 15 000 diplomatas e técnicos.
Mas, ao mesmo tempo, far-se-á também sentir o fenómeno novo da cidadania global, uma vez mobilizadas as consciências das pessoas comuns. Vêm de todos os continentes, angustiadas, relativamente aos perigos que corre o nosso planeta ameaçado, se não forem tomadas medidas eficazes e urgentes. Com o objectivo de pressionar os governos dos Estados, para lutarem contra o aquecimento da Terra, pelo efeito de estufa. Isto é: reclamam a redução radical das emissões de CO2 que pode, a não ser obtida, pôr em causa a própria sobrevivência da Humanidade. Aí, sim, seria o fim da História...
Muitos milhões de pessoas começam a ter consciência disso. Por essa razão organizam-se, voluntariamente, em associações e ONG em defesa do nosso planeta. Algumas muito poderosas, como o Green Peace e tantas outras. Vão estar em Copenhaga, paralelamente, à Conferência oficial a manifestar-se ruidosa e pacificamente, espero, como aconteceu na Conferência do Rio, em 1992 - em que estive e falei, na sessão de abertura -, em Quioto, em 1997, e em Bali, em 2007, bem como em tantas outras cimeiras, de variadas orientações. Como Seatle, por exemplo, que pôs em causa, como os leitores se lembrarão, a Organização Mundial do Comércio, onde só queriam fazer-se ouvir os grandes interesses do mundo dito desenvolvido, em prejuízo dos países menos desenvolvidos e dos então nascentes países emergentes que, pela primeira vez, ergueram as suas vozes e se fizeram ouvir...
Há pois duas conferências com a mesma preocupação ecológica, mas diferentes objectivos, entre os dias 7 e 18 deste mês: a oficial, a dos líderes e conselheiros especializados na vasta matéria, sem abandonar contudo os cálculos políticos, as geoestratégias e o equilíbrio dos Estados e seus interesses (cujos lideres, como Obama, só se apresentam nos últimos dias); e a dos que se reclamam, desinteressadamente, da cidadania global, o que não é menos importante, e se manifestam onde os deixarem (tanto mais ruidosos quanto mais reprimidos forem) para consciencializar e pressionar os políticos responsáveis e os cidadãos em geral do perigo em que a humanidade incorre, se não forem tomadas as medidas que se impõem. Como os dirigentes políticos, dependem dos votos para governar, pelo menos nas democracias, talvez desta vez se façam ouvir... Haja bom senso!
Para além do aquecimento global, mas em conexão com ele, há muitas outras questões de grande importância a debater: a escassez progressiva da água potável, um problema seriíssimo; a desertificação de muitos terrenos, produzida pelas secas; o ordenamento do território, especialmente nas zonas costeiras; as "lixeiras" em que estão a tornar-se os oceanos, com prejuízo manifesto da biodiversidade marinha e do clima; o desaparecimento progressivo das florestas e as chamadas "chuvas ácidas"; a preservação das espécies, vegetais e animais, (para manter a biodiversidade, em si mesma ameaçada); o problema energético, a escassez do carvão e do petróleo e a necessidade de criar as chamadas "energias renováveis" não poluentes; a questão da energia nuclear - com os seus perigos e potencialidades; a necessidade da alimentação biológica, face aos alimentos artificiais, de laboratório ou ditos de plástico; etc., etc...
Tudo isso tem a ver com a necessidade absoluta de criar outro modelo de desenvolvimento, com três vertentes principais: o crescimento ser mais justo e equitativo; levar em conta, muito seriamente, as preocupações ambientais, que são decisivas; lutar contra a pobreza, as desigualdades sociais e em favor de um sistema de justiça social. Além destas prioridades, importa ter ainda em conta a regulamentação da globalização e do sistema financeiro internacional, acabando com os "paraísos fiscais" e as escandalosas roubalheiras da finança internacional, com honrosas excepções, claro.
Há outras preocupações, é óbvio: o acréscimo das pandemias, não só a sida, como a tuberculose e a malária - que, em alguns países, foram quase erradicadas mas que estão, perigosamente, de regresso -, a gripe A, agora, bem como as doenças do foro neurológico, entre outras, causadas pelo stress, pela angústia do dia-a-dia e pela violência crescente das nossas sociedades (que importa combater); a pobreza, que continua sempre a crescer, apesar dos objectivos do novo milénio, votados nas Nações Unidas e que ficaram no papel; a criminalidade internacionalmente organizada; o tráfico de drogas, de prostituição, de órgãos humanos; etc.
A crise global sobrepôs-se a tudo isso e fez tremer o mundo dos ricos e da gente abastada, uma ínfima minoria. Não foi resolvida ainda, como sabemos. Mas o medo parece ter passado, para que tudo possa ficar mais ou menos na mesma. Erro fatal, que vamos pagar muito caro, se se persistir por esse caminho, a que chamaria de grande irresponsabilidade. É o que angustia - e revolta - as pessoas responsáveis, em todos os continentes...
Estamos a entrar num mundo multilateral em que o chamado Ocidente, e nele, principalmente, a União Europeia, por falta de iniciativa e coesão interna, perdeu peso político e influência, em favor dos novos Estados emergentes. Temos agora que contar com eles e ainda bem. O encontro entre a América e a China, os dois maiores poluentes mundiais, não foi muito conclusivo em relação à Cimeira de Copenhaga.
Contudo, grandes massas humanas, em todos os Continentes, estão a mobilizar-se e a erguer as suas vozes. Muitas são de grandes cientistas e de reputados ecologistas. Veremos como na próxima semana e meia de negociações cerradas e do confronto de interesses contraditórios, a Cimeira de Copenhaga vai decorrer. Veremos, também, como Barack Obama, cujo pensamento conhecemos, próximo de Al Gore, vai comportar-se. Sem ceder aos chineses, seus parceiros, nem às pressões dos interesses das grandes multinacionais americanas... Tenho, apesar de tudo, alguma esperança.
2.Um governo de Assembleia? Não é esse o caso, embora na passada semana os partidos da Oposição, irmanados, Esquerda e Direita, tenham dado a impressão que o queriam. Não se compreende porquê. Derrubado Sócrates, quem o poderia substituir?
Vivemos num regime semipresidencial, não parlamentar. Não o devemos esquecer. A Assembleia da República é um órgão de soberania, que eu sempre gostei de ver prestigiado, para bem da nossa democracia pluralista e civilista. Mas de acordo com o princípio constitucional, da separação de poderes, a Assembleia fiscaliza e legisla, mas não governa. Quem governa é, como o nome indica, o Governo. O qual também depende do Presidente da República, que o pode demitir e provocar novas eleições se, em consciência, considerar que está em causa o "regular funcionamento das instituições democráticas" e da Assembleia, se puder apresentar - e fizer votar por maioria - uma moção de censura. Ora, nas actuais condições, que são conhecidas, isso é muito difícil de acontecer, senão impossível.
Sendo, assim, por que razão os partidos da Oposição estão a criar uma guerrilha parlamentar, que enfraquece o parlamento e os próprios Partidos que a provocam? Note-se: sem consequências práticas, para alem do desprestígio geral, a começar pelos dois partidos dos extremos - Bloco de Esquerda e Centro Democrático e Social/Partido Popular - que, na semana passada, tácita e tacticamente, se aliaram?
Por outro lado, é óbvio que o primeiro--ministro, José Sócrates, e o ministro dos Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão, não se devem deixar irritar, sejam quais forem as provocações que lhes sejam feitas. Porque é a melhor prenda que podem dar à Oposição. Por outro lado, em política, a irritação é sempre má conselheira...
Se o País caísse - como às vezes parecem crer alguns deputados - numa crise de governabilidade, que viria em acréscimo da crise global aguda em que vivemos, seria um desastre para todos os portugueses, podendo pôr em risco o próprio regime democrático. Além de desprestigiar todos os partidos e o regime democrático, passado pouco mais de um mês das eleições legislativas. Ninguém pense que a União Europeia seria hoje, necessariamente, um escudo protector do regime. Isso era o que pensávamos em 1985. Mas as circunstâncias internacionais mudaram e a União Europeia tem hoje problemas a mais e iniciativas a menos, como todos sabemos. É prudente, pois, que a não sobrecarreguemos com mais os nossos...
Vamos entrar numa fase de reflexão, na quadra natalícia que se aproxima, quer sejamos crentes ou não. Permito-me, por isso, apelar para os Partidos e Grupos Parlamentares, bem como, obviamente, ao Governo para que pensem no nosso futuro colectivo e para as colossais dificuldades económicas, financeiras e ambientais que iremos ter pela frente, em 2010. O Povo e os mais pobres, em especial, são quem vai sofrer mais. Como de costume. Não nos perdoaríamos, a todos, se lhe acrescentássemos uma crise de governabilidade, sem finalidade prática nem senso. Só porque estamos irritados com os outros?
3 .O Afeganistão de mal a pior. Como, aliás, o Iraque. Ou, pelo menos, tão mal como o Iraque. Entretanto, Barack Obama viu-se obrigado pela sua própria retórica, dada a distinção que fez entre as duas guerras, a enviar para o Afeganistão mais 30 000 soldados das suas Forças Armadas. Provavelmente, contra a sua vontade e estratégia. Enviou-os com o pretexto de marcar o regresso das tropas dentro de um ano. Em 2011. Foi uma medida que lhe custou muito tomar - não duvido -, mas que representa uma concessão táctica muito impopular, pelo qual irá pagar um alto preço.
Os seus aliados da NATO, uma organização dita defensiva, que todos os dias perde credibilidade, conseguiu, com enorme esforço e manifesta dificuldade, enviar mais 7000 soldados para o Afeganistão. Pergunto-me: porquê? O Afeganistão é um vespeiro como foi o Vietname, sem solução militar. Tem um Presidente que parece pouco recomendável e acaba de ter eleições que foram, a acreditar nos observadores internacionais, uma verdadeira farsa. Além do mais, está a contaminar o Paquistão, outro grave problema à vista.
Será que é o complexo industrial-militar, de que falava Eisenhower, com conhecimento de causa, que força Obama a enviar mais tropas para o Afeganistão? Se assim for, representa uma fraqueza imperdoável... O tempo o dirá.
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