Verdades que doem
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Verdades que doem
Relembrando a primeira mensagem :
.
O Presidente Pilatos
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
1. Segundo a sua própria doutrina, Cavaco Silva dá uns recados em privado aos primeiros-ministros. Se de facto assim for, Passos Coelhos ouviu das boas na última reunião com o Presidente da República. Disse ao primeiro-pinistro que "o corte nos subsídios violava as mais básicas regras de equidade", que "a austeridade orçamental não garante que, no futuro, o País se encontrará numa trajectória de crescimento", que "ajustamentos baseados numa trajectória recessiva são insustentáveis", que "o sucesso, em boa parte, não depende só de nós, depende da conjuntura internacional e da capacidade que a UE demonstrar para resolver a crise financeira da Zona Euro". Também não se deve ter esquecido de dizer que não vê espelhadas no Orçamento quaisquer reformas estruturais e que sem elas todos os sacrifícios serão em vão. Mas, mais que tudo, disse ao primeiro-ministro que o caminho escolhido não é o único possível e mostrou-lhe alternativas que não passam pela destruição completa da nossa economia, pela falência de milhares de empresas, por um ainda maior défice, pela criação da maior taxa de desemprego jamais vista e pela fuga em massa dos melhores elementos da administração pública. Enfim, deve ter dito a Passos Coelho o que disse no discurso na Ordem dos Economistas e numa conversa (!) com jornalistas.
Pode ser até que lhe tenha mostrado o artigo do Pedro Lains no Jornal de Negócios onde o economista, insuspeito de qualquer tipo de carinho pela antiga governação, escreve que a estratégia de Passos Coelho "está profundamente desactualizada e mesmo errada" e que "a dimensão do "ajustamento", como lhe querem chamar, é de tal forma grande, é de tal forma brutal que, como é evidente, ultrapassa qualquer estrago que tenha sido feito pelo Governo anterior".
Ora, o primeiro-ministro ouviu isto tudo e fez orelhas moucas. O Presidente da República, que pode ter muitos defeitos mas não embarca em suicídios colectivos, resolveu não esperar cinco anos, como fez com Sócrates, e bastaram-lhe quatro meses para se demarcar publicamente do Governo.
É bem verdade que a monstruosidade da proposta orçamental não deixava grande espaço de manobra a Cavaco Silva. Ele sabe como qualquer pessoa que não esteja completamente cega por fidelidades partidárias ou que acredita na patranha do "vivemos acima das nossas possibilidades", "gorduras" e afins, que a estrada escolhida nos conduz directamente para o inferno. Mas, mais cedo ou mais tarde, o conflito iria instalar-se entre o primeiro-ministro e o Presidente da República. Pena é que tenha sido esta a razão. A retórica utilizada por Passos Coelho enquanto candidato era diametralmente oposta à de Cavaco (infelizmente, Passos Coelho pré-candidato a primeiro-ministro também não tem rigorosamente nada a ver com o Passos Coelho primeiro-ministro). Nada os unia. Nem convicções ideológicas, nem costumes, nem valores, nada. Enquanto o objectivo era afastar o antigo primeiro-ministro, não existiam problemas europeus, nem crise internacional, nem de-sequilíbrios estruturais: era tudo culpa do antigo Governo.
Apenas a existência de um inimigo comum juntou, por breves instantes, Cavaco e Passos Coelho. O fim de Sócrates seria sempre o fim de uma impossível relação.
Foi a cooperação institucional mais curta da história da nossa democracia.
2. O "eu avisei" vai marcar para sempre o mandato de Cavaco Silva. Seja através das suas mensagens no Facebook, seja em discursos que ninguém ouviu, seja por o ter dito em particular, o Presidente da República previu todas as desgraças e apontou sempre os melhores caminhos. Cavaco pensa que fica bem na fotografia por dizer umas coisas, sem que actue em função das suas palavras. Troca os seus poderes constitucionais por um negligente conforto pessoal mascarado de aviso, convencido de que assim fica a salvo de críticas quando o caos se instalar.
O que o Presidente da República fez esta semana pode ser resumido numa frase: "o caminho proposto pelo Governo vai desembocar numa catástrofe, depois não digam que não avisei". E o que vai fazer além de ter verbalizado a sua oposição? Rigorosamente nada. Pilatos não faria melhor.
3. António José Seguro, quando ouviu as palavras de Cavaco Silva, deve ter sido assolado por sentimentos confusos. O primeiro foi de alegria. Em vez de andar perdido em disparates como o código de ética e o pacote requentado contra a corrupção, copia na íntegra as declarações do Presidente e, pronto, já tem discurso. Por outro lado, também deve ter percebido que continua a não ser o líder da oposição. Até aqui foram algumas vozes do PSD, agora é o próprio Presidente da República.
In DN
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O Presidente Pilatos
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
1. Segundo a sua própria doutrina, Cavaco Silva dá uns recados em privado aos primeiros-ministros. Se de facto assim for, Passos Coelhos ouviu das boas na última reunião com o Presidente da República. Disse ao primeiro-pinistro que "o corte nos subsídios violava as mais básicas regras de equidade", que "a austeridade orçamental não garante que, no futuro, o País se encontrará numa trajectória de crescimento", que "ajustamentos baseados numa trajectória recessiva são insustentáveis", que "o sucesso, em boa parte, não depende só de nós, depende da conjuntura internacional e da capacidade que a UE demonstrar para resolver a crise financeira da Zona Euro". Também não se deve ter esquecido de dizer que não vê espelhadas no Orçamento quaisquer reformas estruturais e que sem elas todos os sacrifícios serão em vão. Mas, mais que tudo, disse ao primeiro-ministro que o caminho escolhido não é o único possível e mostrou-lhe alternativas que não passam pela destruição completa da nossa economia, pela falência de milhares de empresas, por um ainda maior défice, pela criação da maior taxa de desemprego jamais vista e pela fuga em massa dos melhores elementos da administração pública. Enfim, deve ter dito a Passos Coelho o que disse no discurso na Ordem dos Economistas e numa conversa (!) com jornalistas.
Pode ser até que lhe tenha mostrado o artigo do Pedro Lains no Jornal de Negócios onde o economista, insuspeito de qualquer tipo de carinho pela antiga governação, escreve que a estratégia de Passos Coelho "está profundamente desactualizada e mesmo errada" e que "a dimensão do "ajustamento", como lhe querem chamar, é de tal forma grande, é de tal forma brutal que, como é evidente, ultrapassa qualquer estrago que tenha sido feito pelo Governo anterior".
Ora, o primeiro-ministro ouviu isto tudo e fez orelhas moucas. O Presidente da República, que pode ter muitos defeitos mas não embarca em suicídios colectivos, resolveu não esperar cinco anos, como fez com Sócrates, e bastaram-lhe quatro meses para se demarcar publicamente do Governo.
É bem verdade que a monstruosidade da proposta orçamental não deixava grande espaço de manobra a Cavaco Silva. Ele sabe como qualquer pessoa que não esteja completamente cega por fidelidades partidárias ou que acredita na patranha do "vivemos acima das nossas possibilidades", "gorduras" e afins, que a estrada escolhida nos conduz directamente para o inferno. Mas, mais cedo ou mais tarde, o conflito iria instalar-se entre o primeiro-ministro e o Presidente da República. Pena é que tenha sido esta a razão. A retórica utilizada por Passos Coelho enquanto candidato era diametralmente oposta à de Cavaco (infelizmente, Passos Coelho pré-candidato a primeiro-ministro também não tem rigorosamente nada a ver com o Passos Coelho primeiro-ministro). Nada os unia. Nem convicções ideológicas, nem costumes, nem valores, nada. Enquanto o objectivo era afastar o antigo primeiro-ministro, não existiam problemas europeus, nem crise internacional, nem de-sequilíbrios estruturais: era tudo culpa do antigo Governo.
Apenas a existência de um inimigo comum juntou, por breves instantes, Cavaco e Passos Coelho. O fim de Sócrates seria sempre o fim de uma impossível relação.
Foi a cooperação institucional mais curta da história da nossa democracia.
2. O "eu avisei" vai marcar para sempre o mandato de Cavaco Silva. Seja através das suas mensagens no Facebook, seja em discursos que ninguém ouviu, seja por o ter dito em particular, o Presidente da República previu todas as desgraças e apontou sempre os melhores caminhos. Cavaco pensa que fica bem na fotografia por dizer umas coisas, sem que actue em função das suas palavras. Troca os seus poderes constitucionais por um negligente conforto pessoal mascarado de aviso, convencido de que assim fica a salvo de críticas quando o caos se instalar.
O que o Presidente da República fez esta semana pode ser resumido numa frase: "o caminho proposto pelo Governo vai desembocar numa catástrofe, depois não digam que não avisei". E o que vai fazer além de ter verbalizado a sua oposição? Rigorosamente nada. Pilatos não faria melhor.
3. António José Seguro, quando ouviu as palavras de Cavaco Silva, deve ter sido assolado por sentimentos confusos. O primeiro foi de alegria. Em vez de andar perdido em disparates como o código de ética e o pacote requentado contra a corrupção, copia na íntegra as declarações do Presidente e, pronto, já tem discurso. Por outro lado, também deve ter percebido que continua a não ser o líder da oposição. Até aqui foram algumas vozes do PSD, agora é o próprio Presidente da República.
In DN
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Amigos?Longe! Inimigos? O mais perto possível!
Joao Ruiz- Pontos : 32035
A União Europeia não sai da cepa torta
.
A União Europeia não sai da cepa torta
por MÁRIO, SOARES
Hoje
1. O Tratado que resultou da cimeira de Bruxelas da semana passada, intitulado pomposamente Tratado de Estabilidade, Coordenação e Governação da União Económica e Financeira, apesar de subscrito por 25 chefes de Governo dos Estados membros (com a exceção do Reino Unido e da República Checa) não parece ter trazido à crescente inquietação da opinião europeia e mundial nenhum benefício que possa dar à União alguma esperança quanto ao futuro próximo. Primeiro porque o Tratado só entrará em vigor - se lá chegar - depois de ratificado pelos Parlamentos nacionais, pelos Tribunais Constitucionais e pelo referendo da Irlanda.
É talvez possível que os mercados especulativos não rejubilem com o Tratado. A promessa vaga e futura de uma governação financeira e económica talvez lhes suscite alguns engulhos. Mas como o que continua a contar é a redução dos deficits - e o não crescimento das economias reais - os desempregados, cada vez mais, como as desigualdades e a pobreza crescem avassaladoramente, os mercados especulativos, que comandam os Estados, continuam satisfeitos. Têm amplas razões para isso...
A verdade é que sem os mercados - e as agências de avaliação - serem postas na ordem, a crise global que afeta a União Europeia não terá solução. Não se trata só dos Estados da Zona Euro mas também dos que não lhe pertencem, como o Reino Unido, que não estará, seguramente, numa situação melhor do que a Itália ou a Espanha.
Não se espere que os Estados vítimas das medidas de austeridade - como a Grécia, a Irlanda ou Portugal - estejam pior do que os outros Estados membros, mesmo os considerados mais ricos, como França e a Alemanha. Enquanto não for mudado o paradigma de desenvolvimento da União e os líderes europeus não quiserem perceber que com austeridade sem crescimento económico e sem um combate sério contra o desemprego a situação da Europa irá sempre de mal a pior. Não há troikas que lhes valham. Bem pelo contrário. Principalmente os governantes que consideram as troikas beneficiárias (em vez de usurárias) e não ficam chocados no seu patriotismo, quando as veem a tutelar os Estados e os Governos, democraticamente eleitos. Que aberração! Quanto às desgraças que criam as políticas de austeridade, contribuindo para aumentar a recessão, o desemprego e as desigualdades sociais, leiam-se dois artigos muito lúcidos de Pacheco Pereira e Miguel Sousa Tavares, no Público e no Expresso, do fim de semana passado.
2. A surpresa Rajoy.
Mariano Rajoy, chefe do Governo espanhol, eleito por grande maioria, tomou uma atitude que espantou a União Europeia. E que, a meu ver, foi lúcida e corajosa. Sem prevenir os lideres europeus - e após a última Cimeira, precisamente no dia seguinte - anunciou ao Banco Central Europeu, à Comissão Europeia e ao Conselho, a sua decisão de deixar subir o deficit público de 4,4% para 5,8% em 2012 ou seja, não fazer tantos cortes como a União exigia.
Note-se que quando começaram os cortes assassinos, os espanhóis desceram à rua para manifestar o seu descontentamento em Madrid, Barcelona e noutras cidades de Espanha. Quem conhece a história e a sensibilidade dos espanhóis, não se admira nada com essas manifestações hostis à política restritiva do Governo... Por outro lado as Autonomias, começaram igualmente a protestar, principalmente a Catalunha, o País Basco e a própria Andaluzia, onde o PP, aliás, acabou de conseguir uma vitória histórica.
O Presidente do Banco Central Europeu, Mário Draghi, censurou a Espanha por não ter apresentado o Orçamento para 2012. A questão, ao que parece, é que vai haver eleições na Andaluzia e nas Astúrias, salvo erro, em abril e Mariano Rajoy para não ter dissabores não quer dar conhecimento dos grandes cortes exigidos - e tão impopulares - antes delas. Depois, certamente, dará conhecimento do Orçamento. Mas daí a que cumpra os cortes exigidos, a que Bruxelas submeteu a Espanha, vai uma certa diferença.
Curiosamente, quando a Comissão Europeia criticava a posição do presidente Rajoy dizendo que "Espanha estava a perder credibilidade", o líder do PSOE, rival de Rajoy, Alfredo Pérez Rubalcava, afirmou, em sentido inverso, que Espanha "vai na direção correta" (vide El País de sábado).
Espanha não é um Estado qualquer. O descontentamento profundo da população - e das Autonomias - perante as chamadas medidas de austeridade e os cortes sociais que implicam, especialmente a contra-reforma laboral, criaram já um desgaste significativo no Governo, mas não no PP. É o que mostra o último barómetro.
Contudo, não haja dúvida de que o aumento do desemprego (um quarto da população ativa) e os cortes que tanto vão atingir a classe média tornam muito difícil a aplicação das medidas impostas por Bruxelas. O que vai ter consequências sérias, nos diferentes Estados membros da União, de Espanha à Itália e até à própria França, sem excluir os Estados mais pequenos. Como veremos...
3. Um prémio Nobel em Lisboa.
Devo ter sido dos primeiros portugueses - excetuando, obviamente, os economistas de formação - a ler os artigos e algumas das conferências de Paul Krugman, prémio Nobel da economia. Antes dele, aliás, li dois ou três livros de Joseph Stiglitz, que me ensinaram a compreender a origem da crise global que vivemos e como a podemos - se quisermos - vencer. Como a austeridade, por si só, não leva a lugar nenhum, é urgente e necessário meter os mercados especulativos na ordem, acabar com os paraísos fiscais, a economia virtual e voltar aos tempos em que a meta era o pleno emprego e uma democracia social que funcionasse, ao serviço também dos mais desfavorecidos.
Entretanto, os Estados Unidos entraram em crise - uma crise financeira e económica séria - que se tem prolongado e tornado também política, social e ética ou de respeito pelos grandes valores. Comunicou-se à União Europeia e tem vindo a aprofundar-se, pondo em causa a relação de forças em termos mundiais. É o Ocidente que está em crise no seu conjunto. Crise, alimentada pela ideologia neoliberal dos teóricos americanos e depois aplicada, em termos de governação, pelo presidente Reagan e pela primeira-ministra inglesa, Thatcher, sem esquecer a infeliz "terceira via" do Senhor Blair.
Foi depois dessas experiências, para mim desagradáveis, que comecei a ler os artigos críticos de Paul Krugman com grande aprazimento e concordância. Citei-o, aliás, em muitas das minhas crónicas.
Quando soube que o prémio Nobel vinha a Lisboa para receber um doutoramento honoris causa, fiquei satisfeito e naturalmente interessado. Foi re- cebido, aliás, com a maior cordialidade e simpatia. No entanto, embora não renegasse as suas ideias, segundo li nos jornais portugueses, foi elogioso para a troika, talvez por estar em Lisboa e para ser agradável aos nossos atuais lideres, que o homenagearam com um almoço. Reconheceu a necessidade das "medidas de austeridade" e esqueceu-se da recessão crescente e de o desemprego ter subido a 14,8%...
Espero não estar enganado. Mas, para mim, Paul Krugman foi uma deceção... Quando o oportunismo dos académicos os leva a contradições, a sua honorabilidade desce... É dos livros!
4. A tragédia da Síria.
A carnificina que tem continuado na Síria é inaceitável e impensável no século XXI. É preciso acabar com esse ditador sanguinário que nos tempos que correm só tem paralelo com Kadhafi.
O secretário-geral da ONU, o coreano Ban Ki-moon, veio às televisões mundiais condenar o ditador e os seus fiéis. Mas não basta falar. É preciso agir. E agora que a China e a Rússia parecem ter-se arrependido do veto vergonhoso com que paralisaram o Conselho de Segurança, é a boa altura para que a ONU tome rapidamente uma iniciativa condenatória do Governo sírio e obrigue todos os Estados membros a pronunciar-se contra uma situação tão injusta e trágica que nos envergonha a todos.
5. Stefan Zweig 70 anos depois.
A imprensa internacional - e a brasileira - destacaram os setenta anos que já passaram depois que o grande escritor, humanista e pacifista Stefan Zweig e a sua segunda Mulher puseram fim às suas vidas, em Petrópolis, perto do Rio de Janeiro.
Fui desde jovem um leitor apaixonado de Stefan Zweig, não do poeta ou do dramaturgo - que também foi - mas sim do novelista e, sobretudo, do biógrafo e autobiógrafo. Quase todos os livros escritos por Zweig estão traduzidos em português, por uma escritora e tradutora, excelente, que conheci pessoalmente, Alice Ogando, aparentada com um meu companheiro do MUD, no imediato pós- -guerra, o médico comunista Luciano Serrão de Moura. Entre as biografias que li, apaixonadamente, nunca esqueci a de Maria Antonieta, por onde começou o meu conhecimento, mais aprofundado, da Revolução Francesa, de Maria Stuart e de Fouché, o político que soube sobreviver na época de Bonaparte a todas as mudanças. Além de grandes génios, entre outros, que também biografou, como: Erasmo de Roterdão, Casanova, Stendhal, Tolstoi, Nietzsche, Freud, Balzac, Rilke e Dostoievski, sem esquecer o seu grande amigo e meu tão admirado, desde sempre, Romain Rolland. Cito também a biografia do corajoso navegador português Fernão de Magalhães - que devia ser lida pelos patriotas portugueses -, que encontrou a passagem gelada, no extremo sul, entre o Atlântico e o Pacífico, cujos lugares tão inóspitos tive a honra de observar e conhecer.
Zweig nasceu em Viena de Áustria em 1881 e suicidou-se (com a sua Mulher) no Brasil em janeiro de 1942. Foi, toda a vida, um humanista e um pacifista, ou não fosse grande amigo e quase discípulo de Romain Rolland. Era um homem extremamente afetivo e de grandes amizades, que conservou até à sua morte, como o descreveu a sua biógrafa Dominique Bona, no seu livro Stefan Zweig, l'ami blessé. Não suportou o peso do nazismo nem das perseguições e ameaças que lhe foram feitas. Antes de morrer, publicou uma autobiografia, que ainda não tive oportunidade de ler e que julgo ser póstuma, intitulada O Mundo de ontem, que foi o seu, inexoravelmente. E antes publicou um clássico, em forma de ensaio "Brasil, País de Futuro", que foi profético. Porque hoje o Brasil não é uma ideia de futuro: é o futuro, com um passado e um presente absolutamente excecionais.
Espero que os jovens de hoje não deixem de ler Zweig. Ficariam com uma bagagem cultural de extrema atualidade. Recomendo- -lhes, para começar a conhecer o personagem, que leiam uma biografia que sobre ele escreve o grande jornalista e escritor, brasileiro, Alberto Dines.
In DN
A União Europeia não sai da cepa torta
por MÁRIO, SOARES
Hoje
1. O Tratado que resultou da cimeira de Bruxelas da semana passada, intitulado pomposamente Tratado de Estabilidade, Coordenação e Governação da União Económica e Financeira, apesar de subscrito por 25 chefes de Governo dos Estados membros (com a exceção do Reino Unido e da República Checa) não parece ter trazido à crescente inquietação da opinião europeia e mundial nenhum benefício que possa dar à União alguma esperança quanto ao futuro próximo. Primeiro porque o Tratado só entrará em vigor - se lá chegar - depois de ratificado pelos Parlamentos nacionais, pelos Tribunais Constitucionais e pelo referendo da Irlanda.
É talvez possível que os mercados especulativos não rejubilem com o Tratado. A promessa vaga e futura de uma governação financeira e económica talvez lhes suscite alguns engulhos. Mas como o que continua a contar é a redução dos deficits - e o não crescimento das economias reais - os desempregados, cada vez mais, como as desigualdades e a pobreza crescem avassaladoramente, os mercados especulativos, que comandam os Estados, continuam satisfeitos. Têm amplas razões para isso...
A verdade é que sem os mercados - e as agências de avaliação - serem postas na ordem, a crise global que afeta a União Europeia não terá solução. Não se trata só dos Estados da Zona Euro mas também dos que não lhe pertencem, como o Reino Unido, que não estará, seguramente, numa situação melhor do que a Itália ou a Espanha.
Não se espere que os Estados vítimas das medidas de austeridade - como a Grécia, a Irlanda ou Portugal - estejam pior do que os outros Estados membros, mesmo os considerados mais ricos, como França e a Alemanha. Enquanto não for mudado o paradigma de desenvolvimento da União e os líderes europeus não quiserem perceber que com austeridade sem crescimento económico e sem um combate sério contra o desemprego a situação da Europa irá sempre de mal a pior. Não há troikas que lhes valham. Bem pelo contrário. Principalmente os governantes que consideram as troikas beneficiárias (em vez de usurárias) e não ficam chocados no seu patriotismo, quando as veem a tutelar os Estados e os Governos, democraticamente eleitos. Que aberração! Quanto às desgraças que criam as políticas de austeridade, contribuindo para aumentar a recessão, o desemprego e as desigualdades sociais, leiam-se dois artigos muito lúcidos de Pacheco Pereira e Miguel Sousa Tavares, no Público e no Expresso, do fim de semana passado.
2. A surpresa Rajoy.
Mariano Rajoy, chefe do Governo espanhol, eleito por grande maioria, tomou uma atitude que espantou a União Europeia. E que, a meu ver, foi lúcida e corajosa. Sem prevenir os lideres europeus - e após a última Cimeira, precisamente no dia seguinte - anunciou ao Banco Central Europeu, à Comissão Europeia e ao Conselho, a sua decisão de deixar subir o deficit público de 4,4% para 5,8% em 2012 ou seja, não fazer tantos cortes como a União exigia.
Note-se que quando começaram os cortes assassinos, os espanhóis desceram à rua para manifestar o seu descontentamento em Madrid, Barcelona e noutras cidades de Espanha. Quem conhece a história e a sensibilidade dos espanhóis, não se admira nada com essas manifestações hostis à política restritiva do Governo... Por outro lado as Autonomias, começaram igualmente a protestar, principalmente a Catalunha, o País Basco e a própria Andaluzia, onde o PP, aliás, acabou de conseguir uma vitória histórica.
O Presidente do Banco Central Europeu, Mário Draghi, censurou a Espanha por não ter apresentado o Orçamento para 2012. A questão, ao que parece, é que vai haver eleições na Andaluzia e nas Astúrias, salvo erro, em abril e Mariano Rajoy para não ter dissabores não quer dar conhecimento dos grandes cortes exigidos - e tão impopulares - antes delas. Depois, certamente, dará conhecimento do Orçamento. Mas daí a que cumpra os cortes exigidos, a que Bruxelas submeteu a Espanha, vai uma certa diferença.
Curiosamente, quando a Comissão Europeia criticava a posição do presidente Rajoy dizendo que "Espanha estava a perder credibilidade", o líder do PSOE, rival de Rajoy, Alfredo Pérez Rubalcava, afirmou, em sentido inverso, que Espanha "vai na direção correta" (vide El País de sábado).
Espanha não é um Estado qualquer. O descontentamento profundo da população - e das Autonomias - perante as chamadas medidas de austeridade e os cortes sociais que implicam, especialmente a contra-reforma laboral, criaram já um desgaste significativo no Governo, mas não no PP. É o que mostra o último barómetro.
Contudo, não haja dúvida de que o aumento do desemprego (um quarto da população ativa) e os cortes que tanto vão atingir a classe média tornam muito difícil a aplicação das medidas impostas por Bruxelas. O que vai ter consequências sérias, nos diferentes Estados membros da União, de Espanha à Itália e até à própria França, sem excluir os Estados mais pequenos. Como veremos...
3. Um prémio Nobel em Lisboa.
Devo ter sido dos primeiros portugueses - excetuando, obviamente, os economistas de formação - a ler os artigos e algumas das conferências de Paul Krugman, prémio Nobel da economia. Antes dele, aliás, li dois ou três livros de Joseph Stiglitz, que me ensinaram a compreender a origem da crise global que vivemos e como a podemos - se quisermos - vencer. Como a austeridade, por si só, não leva a lugar nenhum, é urgente e necessário meter os mercados especulativos na ordem, acabar com os paraísos fiscais, a economia virtual e voltar aos tempos em que a meta era o pleno emprego e uma democracia social que funcionasse, ao serviço também dos mais desfavorecidos.
Entretanto, os Estados Unidos entraram em crise - uma crise financeira e económica séria - que se tem prolongado e tornado também política, social e ética ou de respeito pelos grandes valores. Comunicou-se à União Europeia e tem vindo a aprofundar-se, pondo em causa a relação de forças em termos mundiais. É o Ocidente que está em crise no seu conjunto. Crise, alimentada pela ideologia neoliberal dos teóricos americanos e depois aplicada, em termos de governação, pelo presidente Reagan e pela primeira-ministra inglesa, Thatcher, sem esquecer a infeliz "terceira via" do Senhor Blair.
Foi depois dessas experiências, para mim desagradáveis, que comecei a ler os artigos críticos de Paul Krugman com grande aprazimento e concordância. Citei-o, aliás, em muitas das minhas crónicas.
Quando soube que o prémio Nobel vinha a Lisboa para receber um doutoramento honoris causa, fiquei satisfeito e naturalmente interessado. Foi re- cebido, aliás, com a maior cordialidade e simpatia. No entanto, embora não renegasse as suas ideias, segundo li nos jornais portugueses, foi elogioso para a troika, talvez por estar em Lisboa e para ser agradável aos nossos atuais lideres, que o homenagearam com um almoço. Reconheceu a necessidade das "medidas de austeridade" e esqueceu-se da recessão crescente e de o desemprego ter subido a 14,8%...
Espero não estar enganado. Mas, para mim, Paul Krugman foi uma deceção... Quando o oportunismo dos académicos os leva a contradições, a sua honorabilidade desce... É dos livros!
4. A tragédia da Síria.
A carnificina que tem continuado na Síria é inaceitável e impensável no século XXI. É preciso acabar com esse ditador sanguinário que nos tempos que correm só tem paralelo com Kadhafi.
O secretário-geral da ONU, o coreano Ban Ki-moon, veio às televisões mundiais condenar o ditador e os seus fiéis. Mas não basta falar. É preciso agir. E agora que a China e a Rússia parecem ter-se arrependido do veto vergonhoso com que paralisaram o Conselho de Segurança, é a boa altura para que a ONU tome rapidamente uma iniciativa condenatória do Governo sírio e obrigue todos os Estados membros a pronunciar-se contra uma situação tão injusta e trágica que nos envergonha a todos.
5. Stefan Zweig 70 anos depois.
A imprensa internacional - e a brasileira - destacaram os setenta anos que já passaram depois que o grande escritor, humanista e pacifista Stefan Zweig e a sua segunda Mulher puseram fim às suas vidas, em Petrópolis, perto do Rio de Janeiro.
Fui desde jovem um leitor apaixonado de Stefan Zweig, não do poeta ou do dramaturgo - que também foi - mas sim do novelista e, sobretudo, do biógrafo e autobiógrafo. Quase todos os livros escritos por Zweig estão traduzidos em português, por uma escritora e tradutora, excelente, que conheci pessoalmente, Alice Ogando, aparentada com um meu companheiro do MUD, no imediato pós- -guerra, o médico comunista Luciano Serrão de Moura. Entre as biografias que li, apaixonadamente, nunca esqueci a de Maria Antonieta, por onde começou o meu conhecimento, mais aprofundado, da Revolução Francesa, de Maria Stuart e de Fouché, o político que soube sobreviver na época de Bonaparte a todas as mudanças. Além de grandes génios, entre outros, que também biografou, como: Erasmo de Roterdão, Casanova, Stendhal, Tolstoi, Nietzsche, Freud, Balzac, Rilke e Dostoievski, sem esquecer o seu grande amigo e meu tão admirado, desde sempre, Romain Rolland. Cito também a biografia do corajoso navegador português Fernão de Magalhães - que devia ser lida pelos patriotas portugueses -, que encontrou a passagem gelada, no extremo sul, entre o Atlântico e o Pacífico, cujos lugares tão inóspitos tive a honra de observar e conhecer.
Zweig nasceu em Viena de Áustria em 1881 e suicidou-se (com a sua Mulher) no Brasil em janeiro de 1942. Foi, toda a vida, um humanista e um pacifista, ou não fosse grande amigo e quase discípulo de Romain Rolland. Era um homem extremamente afetivo e de grandes amizades, que conservou até à sua morte, como o descreveu a sua biógrafa Dominique Bona, no seu livro Stefan Zweig, l'ami blessé. Não suportou o peso do nazismo nem das perseguições e ameaças que lhe foram feitas. Antes de morrer, publicou uma autobiografia, que ainda não tive oportunidade de ler e que julgo ser póstuma, intitulada O Mundo de ontem, que foi o seu, inexoravelmente. E antes publicou um clássico, em forma de ensaio "Brasil, País de Futuro", que foi profético. Porque hoje o Brasil não é uma ideia de futuro: é o futuro, com um passado e um presente absolutamente excecionais.
Espero que os jovens de hoje não deixem de ler Zweig. Ficariam com uma bagagem cultural de extrema atualidade. Recomendo- -lhes, para começar a conhecer o personagem, que leiam uma biografia que sobre ele escreve o grande jornalista e escritor, brasileiro, Alberto Dines.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Os perigos da política do ministro Vítor Gaspar
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Os perigos da política do ministro Vítor Gaspar
por Pedro Tadeu
Hoje
Vítor Gaspar nunca disse, suponho que não dirá e aparenta um perfil democrático que me dá esperança de que nunca quererá dizê-lo... Refiro-me à frase "sei muito bem o que quero e para onde vou", ditada pelo ministro das Finanças de 1928, António de Oliveira Salazar. Arrisca-se, no entanto, a ser colocado no patamar dos homens providenciais que os pequenos poderes deste país, sempre à espera de milagreiros predestinados, acabarão por lhe destinar, caso persista este desatino governativo que o episódio da disputa da gestão dos fundos do QREN com o ministro da Economia evidencia.
A exigência de controlo de um dos poucos instrumentos de investimento público que restam tem familiaridade com a imposição, pelo então futuro líder do Estado Novo, de policiamento absoluto de todas as despesas e receitas de todos os ministérios, nos Governos ilusoriamente liderados pelos esquecidos José Vicente de Freitas, Artur Ivens Ferraz e Domingos da Costa Oliveira.
Na questão de agora, segundo a imprensa, estão em jogo cinco mil milhões de euros de investimento. Metade já terão sido destinados pelo ministro Álvaro Santos Pereira, não se sabe se bem ou mal.
Sabe-se é que a restante metade (pelo menos), se nada se intrometer, passará a ser controlada pelo ministério das Finanças. Razão? Usar esses dinheiros de forma a que contribuam como ferramentas indiretas de ajuda à política orçamental e não para o que estavam destinados - estimular o desenvolvimento.
É sempre mais fácil apresentar resultados contabilísticos (basta saber somar, diminuir e fazer cumprir, cegamente, essas contas) do que demonstrar o êxito de um qualquer investimento público, cujos efeitos muitas vezes só se fazem sentir ao fim de vários anos. Salazar, na primeira fase da sua intervenção governativa, percebeu--o e, ao fim de apenas um ano, através de cortes brutais, conseguiu que as contas do Estado tivessem saldo positivo. Esse suposto "milagre económico" deu-lhe a veneração de quem viu ali alguma coisa que, no meio de um clássico caos governativo, corrupto, tinha sentido lógico. Que o País estivesse na miséria já era coisa secundária.
Olhamos para o caos deste tempo e Gaspar aparece como aquele que não cede, que aplica as contas sem vacilar, que mantém o sentido lógico de uma política simplória, é verdade, mas que se percebe. Se lhe passar pela cabeça decidir conquistar o poder total, está a construir o caminho. Que essa política coloque, mesmo contra as suas boas intenções, o País na miséria, arrisca-se, para muitos, a ser coisa irrelevante. Isso é perigoso.
In DN
Os perigos da política do ministro Vítor Gaspar
por Pedro Tadeu
Hoje
Vítor Gaspar nunca disse, suponho que não dirá e aparenta um perfil democrático que me dá esperança de que nunca quererá dizê-lo... Refiro-me à frase "sei muito bem o que quero e para onde vou", ditada pelo ministro das Finanças de 1928, António de Oliveira Salazar. Arrisca-se, no entanto, a ser colocado no patamar dos homens providenciais que os pequenos poderes deste país, sempre à espera de milagreiros predestinados, acabarão por lhe destinar, caso persista este desatino governativo que o episódio da disputa da gestão dos fundos do QREN com o ministro da Economia evidencia.
A exigência de controlo de um dos poucos instrumentos de investimento público que restam tem familiaridade com a imposição, pelo então futuro líder do Estado Novo, de policiamento absoluto de todas as despesas e receitas de todos os ministérios, nos Governos ilusoriamente liderados pelos esquecidos José Vicente de Freitas, Artur Ivens Ferraz e Domingos da Costa Oliveira.
Na questão de agora, segundo a imprensa, estão em jogo cinco mil milhões de euros de investimento. Metade já terão sido destinados pelo ministro Álvaro Santos Pereira, não se sabe se bem ou mal.
Sabe-se é que a restante metade (pelo menos), se nada se intrometer, passará a ser controlada pelo ministério das Finanças. Razão? Usar esses dinheiros de forma a que contribuam como ferramentas indiretas de ajuda à política orçamental e não para o que estavam destinados - estimular o desenvolvimento.
É sempre mais fácil apresentar resultados contabilísticos (basta saber somar, diminuir e fazer cumprir, cegamente, essas contas) do que demonstrar o êxito de um qualquer investimento público, cujos efeitos muitas vezes só se fazem sentir ao fim de vários anos. Salazar, na primeira fase da sua intervenção governativa, percebeu--o e, ao fim de apenas um ano, através de cortes brutais, conseguiu que as contas do Estado tivessem saldo positivo. Esse suposto "milagre económico" deu-lhe a veneração de quem viu ali alguma coisa que, no meio de um clássico caos governativo, corrupto, tinha sentido lógico. Que o País estivesse na miséria já era coisa secundária.
Olhamos para o caos deste tempo e Gaspar aparece como aquele que não cede, que aplica as contas sem vacilar, que mantém o sentido lógico de uma política simplória, é verdade, mas que se percebe. Se lhe passar pela cabeça decidir conquistar o poder total, está a construir o caminho. Que essa política coloque, mesmo contra as suas boas intenções, o País na miséria, arrisca-se, para muitos, a ser coisa irrelevante. Isso é perigoso.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Um pequeno fogo
.
Um pequeno fogo
por ADRIANO MOREIRA
Hoje
Em 16 de janeiro de 1969, o facto mais importante e significativo para a história da Europa não foi talvez a primeira ligação de duas naves espaciais habitadas, acompanhado do anúncio soviético do programa Vénus, antes foi um sacrifício humano que alimentou a vontade eficaz de libertar o povo checo do domínio da URSS.
Nesse dia, o estudante Jan Palach imolou-se pelo fogo, depois da liquidação do movimento que foi chamado a "Primavera de Praga", na Praça Wenzel, tudo esperando pela depois chamada Revolução de Veludo para que, em 1989, Václav Havel pudesse consagrá-lo como herói nacional, dando o seu nome a uma praça da capital da nova república.
Em dezembro de 2010, um infeliz e anónimo súbdito da Tunísia, que um dia será lembrado, igualmente se imolou pelo fogo, dando força a um movimento que colocou um ponto final no regime de Zine el-Abidine Ben Ali, seguido da queda de Moubarak e do turbilhão que logo foi chamado "Primavera Árabe", que mostra querer reformular a estrutura política da região, embora nada ainda permita concluir que a semântica usada para definir o futuro da região tenha o significado ocidental.
A aproximação de ambos os martírios, por igual lembrados por analistas como marco da queda de um regime opressor, também por igual não iluminam sobre qual será o futuro do movimento que já conta com violentas intervenções militares ocidentais, e um numeroso contributo de vítimas das populações civis.
Alguém ligou ambos os acontecimentos à imprevisibilidade dos efeitos do pequeno fósforo com que foram iniciados os sacrifícios, pensando possivelmente na imagem com que os povos foram advertidos de que o bater de asas de uma borboleta poderia desencadear um tufão.
É mais fácil tentar identificar e enumerar as causas que levaram à circunstância explosiva iluminada pelo excecional sacrifício humano de protesto contra a violência do tempo em que a esses mártires aconteceu viver, do que prognosticar sobre o futuro posto em marcha.
Não pode ser ignorado, por exemplo, que na década de oitenta do século passado se verificou a guerra do Afeganistão contra a invasão soviética, que viria a articular-se com a intervenção brutal da Al- -Qaeda e dos Talibãs, nem a invasão do Ko-weit por Sadam Hussain em 1990, que levou à primeira guerra do Golfo em 1991, e à segunda infeliz intervenção americana do republicano Bush, tudo levando ao reforço do enganado sentimento ocidental de conseguir resultados superiores aos desastres das populações civis.
Entre as ameaças mais preocupantes, tudo conduziu ao atual reforço do Irão, que já não esconde que considera próxima a posse das armas atómicas, nem dá mostras de inquietação com as ameaças latentes e as medidas efetivas tomadas contra a indiferença com que encara os alinhamentos que contrariam os seus objetivos e políticas.
A impotência da revolta da população da Síria contra o regime que vai agravando os crimes contra a humanidade parece contribuir para fortalecer o descaso para a ameaça de que os ocidentais passarão das palavras aos factos. De tudo resulta a certeza de que é uma visão distante dos factos a que leva a União Europeia a colocar antes de tudo a crise financeira, e restauração do sistema que a enquadra, sem acrescentar um olhar prevenido, e ativo, sobre a circunstância, que cresce de risco, que lhe desafia a segurança e prosperidade, sem responsabilidade de nenhuma instância particularmente autorizada e decidida a organizar a forma de enfrentar a perigosa evolução dos factos.
Aprofundar as divisões da União entre povos europeus ricos e pobres, assumir a arrogância de opinar sobre populações que evidentemente a chanceler alemã não conhece, como se passa com a Madeira, tudo podem ser apenas sinais de uma perceção mal orientada do projeto europeu. Mas nada justifica não relacionar a unidade indispensável com os riscos exteriores não avaliados.
In DN
Um pequeno fogo
por ADRIANO MOREIRA
Hoje
Em 16 de janeiro de 1969, o facto mais importante e significativo para a história da Europa não foi talvez a primeira ligação de duas naves espaciais habitadas, acompanhado do anúncio soviético do programa Vénus, antes foi um sacrifício humano que alimentou a vontade eficaz de libertar o povo checo do domínio da URSS.
Nesse dia, o estudante Jan Palach imolou-se pelo fogo, depois da liquidação do movimento que foi chamado a "Primavera de Praga", na Praça Wenzel, tudo esperando pela depois chamada Revolução de Veludo para que, em 1989, Václav Havel pudesse consagrá-lo como herói nacional, dando o seu nome a uma praça da capital da nova república.
Em dezembro de 2010, um infeliz e anónimo súbdito da Tunísia, que um dia será lembrado, igualmente se imolou pelo fogo, dando força a um movimento que colocou um ponto final no regime de Zine el-Abidine Ben Ali, seguido da queda de Moubarak e do turbilhão que logo foi chamado "Primavera Árabe", que mostra querer reformular a estrutura política da região, embora nada ainda permita concluir que a semântica usada para definir o futuro da região tenha o significado ocidental.
A aproximação de ambos os martírios, por igual lembrados por analistas como marco da queda de um regime opressor, também por igual não iluminam sobre qual será o futuro do movimento que já conta com violentas intervenções militares ocidentais, e um numeroso contributo de vítimas das populações civis.
Alguém ligou ambos os acontecimentos à imprevisibilidade dos efeitos do pequeno fósforo com que foram iniciados os sacrifícios, pensando possivelmente na imagem com que os povos foram advertidos de que o bater de asas de uma borboleta poderia desencadear um tufão.
É mais fácil tentar identificar e enumerar as causas que levaram à circunstância explosiva iluminada pelo excecional sacrifício humano de protesto contra a violência do tempo em que a esses mártires aconteceu viver, do que prognosticar sobre o futuro posto em marcha.
Não pode ser ignorado, por exemplo, que na década de oitenta do século passado se verificou a guerra do Afeganistão contra a invasão soviética, que viria a articular-se com a intervenção brutal da Al- -Qaeda e dos Talibãs, nem a invasão do Ko-weit por Sadam Hussain em 1990, que levou à primeira guerra do Golfo em 1991, e à segunda infeliz intervenção americana do republicano Bush, tudo levando ao reforço do enganado sentimento ocidental de conseguir resultados superiores aos desastres das populações civis.
Entre as ameaças mais preocupantes, tudo conduziu ao atual reforço do Irão, que já não esconde que considera próxima a posse das armas atómicas, nem dá mostras de inquietação com as ameaças latentes e as medidas efetivas tomadas contra a indiferença com que encara os alinhamentos que contrariam os seus objetivos e políticas.
A impotência da revolta da população da Síria contra o regime que vai agravando os crimes contra a humanidade parece contribuir para fortalecer o descaso para a ameaça de que os ocidentais passarão das palavras aos factos. De tudo resulta a certeza de que é uma visão distante dos factos a que leva a União Europeia a colocar antes de tudo a crise financeira, e restauração do sistema que a enquadra, sem acrescentar um olhar prevenido, e ativo, sobre a circunstância, que cresce de risco, que lhe desafia a segurança e prosperidade, sem responsabilidade de nenhuma instância particularmente autorizada e decidida a organizar a forma de enfrentar a perigosa evolução dos factos.
Aprofundar as divisões da União entre povos europeus ricos e pobres, assumir a arrogância de opinar sobre populações que evidentemente a chanceler alemã não conhece, como se passa com a Madeira, tudo podem ser apenas sinais de uma perceção mal orientada do projeto europeu. Mas nada justifica não relacionar a unidade indispensável com os riscos exteriores não avaliados.
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Ao vivo e a cores
.
Ao vivo e a cores
por FERNANDA CÂNCIO
Hoje
É oficial: bastaram oito meses para o Governo passos entrar na fase horribilis. À guerra aberta com o PR (e vice-versa), junta-se a guerra intestina, com relatos de conselhos de ministros nos jornais, frases cortantes de Gaspar para Álvaro, e ataques de nervos deste perante o desmantelamento da sua tutela, num expressivo desenho da descoordenação governamental e da ausência de uma autoridade central e aglutinadora por parte de quem tem de a ter - o PM.
Já devíamos, pois, estar preparados para o espetáculo servido esta semana sobre o caso Lusoponte, com Passos a evidenciar a sua falta de preparação e de pulso ao admitir nada saber do assunto no debate quinzenal para, a seguir, e face à insistência do BE, afirmar uma falsidade prontamente desmentida por um seu secretário de Estado nessa mesma tarde. Secretário de Estado que por sua vez teve de se desmultiplicar em explicações cada vez mais confusas quando colocado perante a evidência de que fora alertado, pela Estradas de Portugal, para o duplo pagamento à empresa e de que a própria Lusoponte considerava ser impossível, face ao contrato existente, o Estado fugir à entrega da indemnização correspondente à não cobrança de portagens mesmo que estas fossem cobradas (interpretação que o secretário de Estado acompanhou, ordenando à Estradas de Portugal que devolvesse o valor das portagens à Lusoponte).
Diz o secretário de Estado que o dinheiro arrecadado pela Lusoponte reverterá para o Estado no "acerto de contas" com a empresa que vai ter lugar no final deste mês. Pode ser assim, claro, e o Estado, ou seja nós todos, pode não ficar prejudicado financeiramente por esta baralhada (se, bem entendido, e para começar, os juros correspondentes ao valor que a Lusoponte meteu ao bolso todos estes meses reverterem para o erário público, facto sobre o qual até agora moita), mas a imagem do Governo ficou (ainda mais) irremediavelmente comprometida.
Temos um Governo que todos os dias fala em dar o exemplo e em "fazer em vez de anunciar" mas cujo exemplo, vertido neste caso, é o do mais óbvio intuito propagandístico aliado às mais lamentáveis incompetência, falta de rigor e de transparência; um Governo que ao constatar (isto na melhor das hipóteses) ter metido a pata na poça em relação ao caso das portagens tentou e tenta disfarçar o facto, em vez de assumir que quando tomou a decisão não acautelou a existência de um contrato que o obrigava (ainda de acordo com a sua interpretação) a pagar a indemnização e que está a tentar emendar o disparate. Um Governo que passa a vida a exigir sacrifício, responsabilidade e estoicismo e a propalar as virtudes da verdade, mas cujo primeiro-ministro, apanhado numa mentira no Parlamento, ainda não considerou necessário retirar disso as necessárias consequências.
Parafraseando um alegado dito de Gaspar a Santos Pereira num Conselho de Ministros, qual destas palavras, "que bela caricatura", não percebeu?
In DN
Ao vivo e a cores
por FERNANDA CÂNCIO
Hoje
É oficial: bastaram oito meses para o Governo passos entrar na fase horribilis. À guerra aberta com o PR (e vice-versa), junta-se a guerra intestina, com relatos de conselhos de ministros nos jornais, frases cortantes de Gaspar para Álvaro, e ataques de nervos deste perante o desmantelamento da sua tutela, num expressivo desenho da descoordenação governamental e da ausência de uma autoridade central e aglutinadora por parte de quem tem de a ter - o PM.
Já devíamos, pois, estar preparados para o espetáculo servido esta semana sobre o caso Lusoponte, com Passos a evidenciar a sua falta de preparação e de pulso ao admitir nada saber do assunto no debate quinzenal para, a seguir, e face à insistência do BE, afirmar uma falsidade prontamente desmentida por um seu secretário de Estado nessa mesma tarde. Secretário de Estado que por sua vez teve de se desmultiplicar em explicações cada vez mais confusas quando colocado perante a evidência de que fora alertado, pela Estradas de Portugal, para o duplo pagamento à empresa e de que a própria Lusoponte considerava ser impossível, face ao contrato existente, o Estado fugir à entrega da indemnização correspondente à não cobrança de portagens mesmo que estas fossem cobradas (interpretação que o secretário de Estado acompanhou, ordenando à Estradas de Portugal que devolvesse o valor das portagens à Lusoponte).
Diz o secretário de Estado que o dinheiro arrecadado pela Lusoponte reverterá para o Estado no "acerto de contas" com a empresa que vai ter lugar no final deste mês. Pode ser assim, claro, e o Estado, ou seja nós todos, pode não ficar prejudicado financeiramente por esta baralhada (se, bem entendido, e para começar, os juros correspondentes ao valor que a Lusoponte meteu ao bolso todos estes meses reverterem para o erário público, facto sobre o qual até agora moita), mas a imagem do Governo ficou (ainda mais) irremediavelmente comprometida.
Temos um Governo que todos os dias fala em dar o exemplo e em "fazer em vez de anunciar" mas cujo exemplo, vertido neste caso, é o do mais óbvio intuito propagandístico aliado às mais lamentáveis incompetência, falta de rigor e de transparência; um Governo que ao constatar (isto na melhor das hipóteses) ter metido a pata na poça em relação ao caso das portagens tentou e tenta disfarçar o facto, em vez de assumir que quando tomou a decisão não acautelou a existência de um contrato que o obrigava (ainda de acordo com a sua interpretação) a pagar a indemnização e que está a tentar emendar o disparate. Um Governo que passa a vida a exigir sacrifício, responsabilidade e estoicismo e a propalar as virtudes da verdade, mas cujo primeiro-ministro, apanhado numa mentira no Parlamento, ainda não considerou necessário retirar disso as necessárias consequências.
Parafraseando um alegado dito de Gaspar a Santos Pereira num Conselho de Ministros, qual destas palavras, "que bela caricatura", não percebeu?
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O ódio e a política
.
O ódio e a política
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
1. Com que objectivo o sr. Presidente da República escreve aquele prefácio nos seus "Roteiros"? Para quê abrir feridas antigas que apenas servem para dividir mais os portugueses? Que tipo de incómodo ainda lhe provoca José Sócrates? Será que não sabe que José Sócrates e o antigo Governo já foram julgados pelo eleitorado? Desconhecerá que nas suas funções não estão incluídos julgamentos morais? Lealdade institucional? Será o sr. Presidente capaz de dizer que foi sempre leal com o antigo Governo? De que tipo de lealdade ou mesmo de dignidade estamos a falar quando se ataca alguém que está afastado da vida política e que não se pode defender? Que diria se o Presidente da República na altura em que deixou de ser primeiro-ministro o viesse julgar na praça pública? A que propósito um Presidente em plenas funções faz balanços sobre as qualidades pessoais ou políticas de antigos primeiros-ministros? Terá esquecido as suas funções, a sua dignidade institucional?
Não, não pode ser. Cavaco Silva não pode estar a transformar-se numa caricatura dos colunistas que ficaram sem assunto quando Sócrates desapareceu da vida pública e que subitamente deixaram de escrever ou falar sobre política para se dedicarem a assuntos "mais elevados".
Não, o Presidente da República não pode estar a pensar em concorrer com pasquins que descobriram que a simples menção do nome Sócrates lhes faz subir as vendas, mesmo que seja preciso mandar às malvas as mais básicas regras da decência e que confundem jornalismo com insídia e desprezo pelos mais simples direitos de personalidade.
Não, Cavaco Silva não pode estar a pensar que ao pôr em causa o antigo primeiro-ministro compra alguma simpatia do actual Governo, numa altura em que as relações entre Passos Coelho e ele estão tão debilitadas, para ser austero nas palavras, e em que é notório que as soluções advogadas pelos dois não podem ser mais díspares. Passos Coelho estará até a pensar nos "Roteiros" do Presidente quando deixar de ocupar São Bento...
Não, o Presidente da República não pode imaginar que tirando o esqueleto de Sócrates do armário faz esquecer episódios como o das pensões ou o das escutas. Nós até estávamos dispostos a esquecer esses dislates, mas era por propósitos bem mais altos e bem mais importantes.
Não, Cavaco Silva não pode estar a embarcar na nau dos infelizes que é capaz de culpar Sócrates pela chuva na eira ou pelo sol no nabal.
Não, não é possível que o nosso representante desça a esse nível.
Mas, afinal, que objectivo quis o Presidente da República atingir com aquele texto ressabiado a tresandar a ajuste de contas? Não servirá, de certeza absoluta, para gerar consensos e unir os portugueses; não servirá para dignificar o papel institucional da Presidência da República, que não se coaduna com queixinhas e ataques a pessoas que lideraram, bem ou mal, o País; não dará peso político e respeitabilidade a quem vai ter de liderar o processo político quando, infelizmente, a crise económica degenerar em crise política; não ajudará o Governo que precisará do Presidente para mediar conflitos entre os partidos e parceiros sociais. Bom, conseguiu unir o PS, que pela primeira vez em muito tempo aparece a falar a uma só voz, mas a única coisa, pelos vistos, que agora agrega os socialistas é a indignação contra Cavaco Silva.
Só há uma explicação, e bem humana, para mais um infeliz momento do Presidente da República: há quem não domine os ódios e os rancores pessoais.
Pensar que há apenas uma semana pedia, neste mesmo espaço, para que o Presidente não voltasse a desiludir...
2. O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público obteve o patrocínio de várias instituições financeiras para a realização do seu Congresso.
Francisco Proença de Carvalho, na sua página do Facebook, resumiu exemplarmente a situação e a sua gravidade. Escreveu o advogado: "Se o sindicato do Ministério Público lhe pedisse um patrocínio, recusava?"
Como disse João Palma ao Expresso sobre investigações que não deram em nada: pois...
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico
In DN
O ódio e a política
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
1. Com que objectivo o sr. Presidente da República escreve aquele prefácio nos seus "Roteiros"? Para quê abrir feridas antigas que apenas servem para dividir mais os portugueses? Que tipo de incómodo ainda lhe provoca José Sócrates? Será que não sabe que José Sócrates e o antigo Governo já foram julgados pelo eleitorado? Desconhecerá que nas suas funções não estão incluídos julgamentos morais? Lealdade institucional? Será o sr. Presidente capaz de dizer que foi sempre leal com o antigo Governo? De que tipo de lealdade ou mesmo de dignidade estamos a falar quando se ataca alguém que está afastado da vida política e que não se pode defender? Que diria se o Presidente da República na altura em que deixou de ser primeiro-ministro o viesse julgar na praça pública? A que propósito um Presidente em plenas funções faz balanços sobre as qualidades pessoais ou políticas de antigos primeiros-ministros? Terá esquecido as suas funções, a sua dignidade institucional?
Não, não pode ser. Cavaco Silva não pode estar a transformar-se numa caricatura dos colunistas que ficaram sem assunto quando Sócrates desapareceu da vida pública e que subitamente deixaram de escrever ou falar sobre política para se dedicarem a assuntos "mais elevados".
Não, o Presidente da República não pode estar a pensar em concorrer com pasquins que descobriram que a simples menção do nome Sócrates lhes faz subir as vendas, mesmo que seja preciso mandar às malvas as mais básicas regras da decência e que confundem jornalismo com insídia e desprezo pelos mais simples direitos de personalidade.
Não, Cavaco Silva não pode estar a pensar que ao pôr em causa o antigo primeiro-ministro compra alguma simpatia do actual Governo, numa altura em que as relações entre Passos Coelho e ele estão tão debilitadas, para ser austero nas palavras, e em que é notório que as soluções advogadas pelos dois não podem ser mais díspares. Passos Coelho estará até a pensar nos "Roteiros" do Presidente quando deixar de ocupar São Bento...
Não, o Presidente da República não pode imaginar que tirando o esqueleto de Sócrates do armário faz esquecer episódios como o das pensões ou o das escutas. Nós até estávamos dispostos a esquecer esses dislates, mas era por propósitos bem mais altos e bem mais importantes.
Não, Cavaco Silva não pode estar a embarcar na nau dos infelizes que é capaz de culpar Sócrates pela chuva na eira ou pelo sol no nabal.
Não, não é possível que o nosso representante desça a esse nível.
Mas, afinal, que objectivo quis o Presidente da República atingir com aquele texto ressabiado a tresandar a ajuste de contas? Não servirá, de certeza absoluta, para gerar consensos e unir os portugueses; não servirá para dignificar o papel institucional da Presidência da República, que não se coaduna com queixinhas e ataques a pessoas que lideraram, bem ou mal, o País; não dará peso político e respeitabilidade a quem vai ter de liderar o processo político quando, infelizmente, a crise económica degenerar em crise política; não ajudará o Governo que precisará do Presidente para mediar conflitos entre os partidos e parceiros sociais. Bom, conseguiu unir o PS, que pela primeira vez em muito tempo aparece a falar a uma só voz, mas a única coisa, pelos vistos, que agora agrega os socialistas é a indignação contra Cavaco Silva.
Só há uma explicação, e bem humana, para mais um infeliz momento do Presidente da República: há quem não domine os ódios e os rancores pessoais.
Pensar que há apenas uma semana pedia, neste mesmo espaço, para que o Presidente não voltasse a desiludir...
2. O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público obteve o patrocínio de várias instituições financeiras para a realização do seu Congresso.
Francisco Proença de Carvalho, na sua página do Facebook, resumiu exemplarmente a situação e a sua gravidade. Escreveu o advogado: "Se o sindicato do Ministério Público lhe pedisse um patrocínio, recusava?"
Como disse João Palma ao Expresso sobre investigações que não deram em nada: pois...
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico
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Quanto vale Cavaco?
.
Quanto vale Cavaco?
por PAULO BALDAIA
Hoje
Cavaco Silva leva um ano de segundo mandato na Presidência da República. Começou com um Governo minoritário de José Sócrates e passou rapidamente para uma coligação maioritária liderada por Passos Coelho. Sobre o que pensa das relações com o actual primeiro-ministro (duram há oito meses) nada sabemos, mas sobre os quatro meses com o chefe do Governo anterior ficámos a saber tudo. É um ajuste de contas político que outros presidentes também fizeram, mas que surpreendeu por ser feito no exercício das funções.
Adiante. Sou dos que acreditam que as coisas valem sempre mais pela substância do que pela forma, mas não podemos ignorar que a forma escolhida por Cavaco para arrasar Sócrates pode condicionar fortemente a actuação do actual líder do PS e, por arrasto, o espaço de manobra do próprio Presidente da República. Cavaco Silva poderá ter tentado reencontrar a sua base de apoio natural (PSD e CDS), mas a única certeza que existe é que conseguiu unir o PS de Sócrates e o PS de Seguro, e isso afasta os socialistas de alguns consensos que é importante garantir para o sucesso de algumas reformas sectoriais.
O que se vem discutindo sobre as matérias referidas não é pouco, mas está longe de ser o essencial. Não tenho dúvida alguma de que Cavaco Silva sabia que para memória futura, do recente prefácio, iria sobrar apenas o arraso ao anterior primeiro-ministro e por isso tenho mais dificuldade em entender para que serviram essas passagens de um texto que valoriza a palavra de um Presidente a quem a história acabou por dar razão.
Todos os presidentes da República eleitos democraticamente utilizaram a "bomba atómica" e convocaram eleições antecipadas, o que mostra que o maior dos poderes que tem um chefe de Estado não os distingue no exercício do cargo. Quanto vale um presidente é mais facilmente avaliado pela sua capacidade de promover consensos, de ser o provedor do povo combatendo as prepotências dos governos maioritários, de ter uma boa leitura da situação do país e alertar para o perigo eminente.
Teria sido altamente vantajoso para todos que a leitura do texto de Cavaco Silva se tivesse concentrado nestas matérias, até porque aquele prefácio tem muita matéria para a discussão sobre os poderes do Presidente da República. O pior que nos pode acontecer é que a discussão se faça agora entre os que são contra Sócrates e os que são contra Cavaco.
Eu sou dos que pensam que Cavaco Silva tem, e teve, razão em muitos dos alertas que lançou e sei que o problema principal é das elites, jornalistas incluídos, que desvalorizam o que não lhes dá jeito ver com olhos de ver. E nunca, triste País, nunca há vontade de debater em tempo útil os erros crassos das diferentes governações.
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico
Quanto vale Cavaco?
por PAULO BALDAIA
Hoje
Cavaco Silva leva um ano de segundo mandato na Presidência da República. Começou com um Governo minoritário de José Sócrates e passou rapidamente para uma coligação maioritária liderada por Passos Coelho. Sobre o que pensa das relações com o actual primeiro-ministro (duram há oito meses) nada sabemos, mas sobre os quatro meses com o chefe do Governo anterior ficámos a saber tudo. É um ajuste de contas político que outros presidentes também fizeram, mas que surpreendeu por ser feito no exercício das funções.
Adiante. Sou dos que acreditam que as coisas valem sempre mais pela substância do que pela forma, mas não podemos ignorar que a forma escolhida por Cavaco para arrasar Sócrates pode condicionar fortemente a actuação do actual líder do PS e, por arrasto, o espaço de manobra do próprio Presidente da República. Cavaco Silva poderá ter tentado reencontrar a sua base de apoio natural (PSD e CDS), mas a única certeza que existe é que conseguiu unir o PS de Sócrates e o PS de Seguro, e isso afasta os socialistas de alguns consensos que é importante garantir para o sucesso de algumas reformas sectoriais.
O que se vem discutindo sobre as matérias referidas não é pouco, mas está longe de ser o essencial. Não tenho dúvida alguma de que Cavaco Silva sabia que para memória futura, do recente prefácio, iria sobrar apenas o arraso ao anterior primeiro-ministro e por isso tenho mais dificuldade em entender para que serviram essas passagens de um texto que valoriza a palavra de um Presidente a quem a história acabou por dar razão.
Todos os presidentes da República eleitos democraticamente utilizaram a "bomba atómica" e convocaram eleições antecipadas, o que mostra que o maior dos poderes que tem um chefe de Estado não os distingue no exercício do cargo. Quanto vale um presidente é mais facilmente avaliado pela sua capacidade de promover consensos, de ser o provedor do povo combatendo as prepotências dos governos maioritários, de ter uma boa leitura da situação do país e alertar para o perigo eminente.
Teria sido altamente vantajoso para todos que a leitura do texto de Cavaco Silva se tivesse concentrado nestas matérias, até porque aquele prefácio tem muita matéria para a discussão sobre os poderes do Presidente da República. O pior que nos pode acontecer é que a discussão se faça agora entre os que são contra Sócrates e os que são contra Cavaco.
Eu sou dos que pensam que Cavaco Silva tem, e teve, razão em muitos dos alertas que lançou e sei que o problema principal é das elites, jornalistas incluídos, que desvalorizam o que não lhes dá jeito ver com olhos de ver. E nunca, triste País, nunca há vontade de debater em tempo útil os erros crassos das diferentes governações.
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico
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Políticos desleais?! Naaa...
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Políticos desleais?! Naaa...
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Nesta pacata aldeia suíça, a vida corre plácida como o ruminar da vaca dos chocolates. O pai vende o leite que a Nestlé paga bem, a mãe é caixa no Crédit Suisse e de aventura só o filho, que coordena, de Genebra, o envio de comida para o Sudão. O franco, forte, o emprego, garantido, a crise, dos outros, por cá é um bocejo. Mas, de vez em quando, o Presidente decide mandar uma pedrada ao lago Léman. Desta vez, foi a deslealdade. Deslealdade entre políticos?! Como se quer que nós, povo feliz e sem histórias, acreditemos que um primeiro-ministro do partido X esconda do Presidente do partido Y um PEC IV? Aqui na aldeia pensávamos que fosse preciso nascer um político duas vezes para encontrar um desleal. Até aceitamos que um Presidente mande o seu homem de mão pedir a um jornalista para lançar o boato que o primeiro-ministro lhe anda a escutar os telefones. A política é assim, tem traquinices. Agora, esconder um PEC IV?! Ainda por cima sabemos, foi público, que o primeiro-ministro do partido X falou do PEC IV ao líder do partido Y, o do Presidente. Queres ver que o líder do partido Y também escondeu o PEC IV do seu Presidente, e lhe foi desleal? Naaa... Agora só nos faltava que o tal homem de mão tivesse dito ao jornalista para sugerir que a fonte do boato das escutas era o chefe de um cantão - um jardim, por sinal - que até era do partido do Presidente!!! Deslealdade
In DN
Políticos desleais?! Naaa...
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Nesta pacata aldeia suíça, a vida corre plácida como o ruminar da vaca dos chocolates. O pai vende o leite que a Nestlé paga bem, a mãe é caixa no Crédit Suisse e de aventura só o filho, que coordena, de Genebra, o envio de comida para o Sudão. O franco, forte, o emprego, garantido, a crise, dos outros, por cá é um bocejo. Mas, de vez em quando, o Presidente decide mandar uma pedrada ao lago Léman. Desta vez, foi a deslealdade. Deslealdade entre políticos?! Como se quer que nós, povo feliz e sem histórias, acreditemos que um primeiro-ministro do partido X esconda do Presidente do partido Y um PEC IV? Aqui na aldeia pensávamos que fosse preciso nascer um político duas vezes para encontrar um desleal. Até aceitamos que um Presidente mande o seu homem de mão pedir a um jornalista para lançar o boato que o primeiro-ministro lhe anda a escutar os telefones. A política é assim, tem traquinices. Agora, esconder um PEC IV?! Ainda por cima sabemos, foi público, que o primeiro-ministro do partido X falou do PEC IV ao líder do partido Y, o do Presidente. Queres ver que o líder do partido Y também escondeu o PEC IV do seu Presidente, e lhe foi desleal? Naaa... Agora só nos faltava que o tal homem de mão tivesse dito ao jornalista para sugerir que a fonte do boato das escutas era o chefe de um cantão - um jardim, por sinal - que até era do partido do Presidente!!! Deslealdade
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O Presidente anarquista
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O Presidente anarquista
por VIRIATO SOROMENHO-MARQUES
Hoje
Existem banqueiros que justificam o título da obra de Pessoa. São capazes de dinamitar as bases financeiras de países inteiros, movidos só pela mais cega das ganâncias. O que ainda não sabíamos é que poderíamos ver sair de Belém os fumos de uma espécie de anarquismo intermitente, praticado pela pessoa do mais alto magistrado da Nação. O papel do Presidente na III República portuguesa não é fácil. Ele tem de reunir a maior qualidade do juízo político, que é a capacidade de se colocar no lugar dos Outros. Não admira que o cargo tenda a desenvolver uma espécie de gravitas, inerente à responsabilidade de se colocar no lugar plural de dez milhões de portugueses, ainda por cima a viverem numa época amargurada e incerta. Compensando os papéis do Governo e da Assembleia da República, que constituem os lugares da dilaceração democrática, da luta de ideias, do debate das escolhas, o Presidente é o símbolo da capacidade original de reconciliação em que assenta todo o poder legítimo. O Presidente é aquele que convoca a nação, se necessário for, para a renovação do contrato social, pois o poder de um povo é o seu desejo de permanecer unido no mar tempestuoso da história. Infelizmente, Cavaco Silva, ao longo deste mandato, tem preferido renunciar à sua função mais nobre, a de ser uma espécie de "alma do Estado", para surpreender o País com sucessivas exposições públicas dos seus "estados de alma". Seja a sua dificuldade em viver com um rendimento superior em quinze vezes ao salário médio nacional. Ou a sua ressentida tendência para ajustar contas com adversários, como se ainda fosse um líder de fação. A Nação não pode ser o grupo terapêutico do seu Presidente. E a República não pode
In DN
O Presidente anarquista
por VIRIATO SOROMENHO-MARQUES
Hoje
Existem banqueiros que justificam o título da obra de Pessoa. São capazes de dinamitar as bases financeiras de países inteiros, movidos só pela mais cega das ganâncias. O que ainda não sabíamos é que poderíamos ver sair de Belém os fumos de uma espécie de anarquismo intermitente, praticado pela pessoa do mais alto magistrado da Nação. O papel do Presidente na III República portuguesa não é fácil. Ele tem de reunir a maior qualidade do juízo político, que é a capacidade de se colocar no lugar dos Outros. Não admira que o cargo tenda a desenvolver uma espécie de gravitas, inerente à responsabilidade de se colocar no lugar plural de dez milhões de portugueses, ainda por cima a viverem numa época amargurada e incerta. Compensando os papéis do Governo e da Assembleia da República, que constituem os lugares da dilaceração democrática, da luta de ideias, do debate das escolhas, o Presidente é o símbolo da capacidade original de reconciliação em que assenta todo o poder legítimo. O Presidente é aquele que convoca a nação, se necessário for, para a renovação do contrato social, pois o poder de um povo é o seu desejo de permanecer unido no mar tempestuoso da história. Infelizmente, Cavaco Silva, ao longo deste mandato, tem preferido renunciar à sua função mais nobre, a de ser uma espécie de "alma do Estado", para surpreender o País com sucessivas exposições públicas dos seus "estados de alma". Seja a sua dificuldade em viver com um rendimento superior em quinze vezes ao salário médio nacional. Ou a sua ressentida tendência para ajustar contas com adversários, como se ainda fosse um líder de fação. A Nação não pode ser o grupo terapêutico do seu Presidente. E a República não pode
In DN
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Amigos?Longe! Inimigos? O mais perto possível!
Joao Ruiz- Pontos : 32035
Entre a vingança e a necessidade
.
Entre a vingança e a necessidade
por JOÃO MARCELINO
10 Março 2012
1. É fácil bater num ex-primeiro-ministro. Cavaco Silva sabe-o de experiência própria. Em 1995, depois de mais de dez anos em São Bento, com duas maiorias absolutas, tornou-se o bode expiatório de todos os políticos a precisarem de atenção. Eram visíveis "fortes marcas de ressentimento e desconfiança" em relação à forma autoritária como tinha exercido o cargo. A sua coexistência política e pessoal com Mário Soares presidente, que estimulou no País o célebre "direito à indignação", fora atribulada. E, em consequência, o bom povo português, que agora lhe merece "admiração profunda e o sentimento de gratidão", decidira conceder-lhe tempo para preparar a mudança para a distinta Aldeia da Coelha, preferindo colocar em Belém o presidente da Câmara de Lisboa, Jorge Sampaio.
2. Substantivamente, o prefácio do sexto volume dos "Roteiros" de Cavaco Silva, que ontem despertou polémica, tem notícias várias e confirma que as relações do Presidente da República (PR) com o ex-primeiro-ministro José Sócrates se foram deteriorando a ponto de este último ter cometido o erro, na altura largamente apontado, de não ter informado o PR do PEC IV. A questão de toda a polémica não está em que Cavaco Silva tenha referido os factos - está em que tenha decidido, pela primeira vez, fazê-los acompanhar da sua própria opinião, coisa em que sempre foi tão parco durante a sua longa vida política. É isso que motiva a desconfiança. Porquê agora? Por causa das desgraçadas declarações sobre as suas reformas que esta semana levaram 40 mil portugueses a pedirem a sua demissão numa petição entregue no Parlamento? Pela baixa de popularidade que os estudos de opinião têm assinalado ao PR desde essa altura, de que também ficou célebre a abortada deslocação a uma escola com receio de enfrentar os protestos de uns jovens? Sim... porquê?
3. Dirão os ingénuos da política o mesmo que agora assinalam os amigos do PR: ele sempre escreveu prefácios para os cinco livros anteriores. É verdade. Aliás, no primeiro, e para ilustrar a excelência, e as virtudes, da cooperação com Sócrates, escrevia então (ainda antes da intentona das escutas protagonizada pelo seu assessor Fernando Lima): "Desnecessário será dizer que, para construir uma relação de confiança entre os órgãos de soberania, não basta a vontade e a atitude de uma das partes." Mas também é verdade que Cavaco Silva durante todo este tempo que leva em Belém sempre foi avaro nas palavras sobre temas quentes. Insisto no roubo do BPN, no qual o PR se mantém solidamente mudo como uma rocha, quase fazendo acreditar que terá de nascer duas vezes para a ele algum dia se referir com a frontalidade que a democracia lhe deveria exigir. A este respeito, seis roteiros e nada! Estamos perante um silêncio institucional que, atrevo-me a dizer citando Cavaco, "ficará registado na história da nossa democracia".
4. As palavras do PR, na forma e no conteúdo, é claro que têm a dimensão de um ajuste de contas público com José Sócrates. É oportuno politicamente porque o PR tem de desviar atenções - e porque hoje é fácil a qualquer um dar uma canelada no ex-primeiro-ministro. Nem todos são capazes da grandeza pessoal de Teixeira dos Santos, atrás de quem o PR também se esconde, e que até hoje calou a ingratidão e a desconsideração final do seu primeiro-ministro. Aquelas 18 folhas do maior prefácio de sempre dos "Roteiros" valeram ao PR o regresso em glória aos braços da família laranja e o toque a reunir em nome da rosa, à qual desta vez não faltou Seguro. Sobra o País que, talvez agoniado, pensa seguramente que Sócrates seria muito bem capaz de fazer aquilo que Cavaco ontem fez. Ou seja, estão bem um para o outro.
O dinheiro pago indevidamente à Lusoponte mostra como o Estado se move, por vezes descontrolado e por inércia, entre erros políticos e servido por altos funcionários que executam sem pensar - assustador, não é?
In DN
Entre a vingança e a necessidade
por JOÃO MARCELINO
10 Março 2012
1. É fácil bater num ex-primeiro-ministro. Cavaco Silva sabe-o de experiência própria. Em 1995, depois de mais de dez anos em São Bento, com duas maiorias absolutas, tornou-se o bode expiatório de todos os políticos a precisarem de atenção. Eram visíveis "fortes marcas de ressentimento e desconfiança" em relação à forma autoritária como tinha exercido o cargo. A sua coexistência política e pessoal com Mário Soares presidente, que estimulou no País o célebre "direito à indignação", fora atribulada. E, em consequência, o bom povo português, que agora lhe merece "admiração profunda e o sentimento de gratidão", decidira conceder-lhe tempo para preparar a mudança para a distinta Aldeia da Coelha, preferindo colocar em Belém o presidente da Câmara de Lisboa, Jorge Sampaio.
2. Substantivamente, o prefácio do sexto volume dos "Roteiros" de Cavaco Silva, que ontem despertou polémica, tem notícias várias e confirma que as relações do Presidente da República (PR) com o ex-primeiro-ministro José Sócrates se foram deteriorando a ponto de este último ter cometido o erro, na altura largamente apontado, de não ter informado o PR do PEC IV. A questão de toda a polémica não está em que Cavaco Silva tenha referido os factos - está em que tenha decidido, pela primeira vez, fazê-los acompanhar da sua própria opinião, coisa em que sempre foi tão parco durante a sua longa vida política. É isso que motiva a desconfiança. Porquê agora? Por causa das desgraçadas declarações sobre as suas reformas que esta semana levaram 40 mil portugueses a pedirem a sua demissão numa petição entregue no Parlamento? Pela baixa de popularidade que os estudos de opinião têm assinalado ao PR desde essa altura, de que também ficou célebre a abortada deslocação a uma escola com receio de enfrentar os protestos de uns jovens? Sim... porquê?
3. Dirão os ingénuos da política o mesmo que agora assinalam os amigos do PR: ele sempre escreveu prefácios para os cinco livros anteriores. É verdade. Aliás, no primeiro, e para ilustrar a excelência, e as virtudes, da cooperação com Sócrates, escrevia então (ainda antes da intentona das escutas protagonizada pelo seu assessor Fernando Lima): "Desnecessário será dizer que, para construir uma relação de confiança entre os órgãos de soberania, não basta a vontade e a atitude de uma das partes." Mas também é verdade que Cavaco Silva durante todo este tempo que leva em Belém sempre foi avaro nas palavras sobre temas quentes. Insisto no roubo do BPN, no qual o PR se mantém solidamente mudo como uma rocha, quase fazendo acreditar que terá de nascer duas vezes para a ele algum dia se referir com a frontalidade que a democracia lhe deveria exigir. A este respeito, seis roteiros e nada! Estamos perante um silêncio institucional que, atrevo-me a dizer citando Cavaco, "ficará registado na história da nossa democracia".
4. As palavras do PR, na forma e no conteúdo, é claro que têm a dimensão de um ajuste de contas público com José Sócrates. É oportuno politicamente porque o PR tem de desviar atenções - e porque hoje é fácil a qualquer um dar uma canelada no ex-primeiro-ministro. Nem todos são capazes da grandeza pessoal de Teixeira dos Santos, atrás de quem o PR também se esconde, e que até hoje calou a ingratidão e a desconsideração final do seu primeiro-ministro. Aquelas 18 folhas do maior prefácio de sempre dos "Roteiros" valeram ao PR o regresso em glória aos braços da família laranja e o toque a reunir em nome da rosa, à qual desta vez não faltou Seguro. Sobra o País que, talvez agoniado, pensa seguramente que Sócrates seria muito bem capaz de fazer aquilo que Cavaco ontem fez. Ou seja, estão bem um para o outro.
O dinheiro pago indevidamente à Lusoponte mostra como o Estado se move, por vezes descontrolado e por inércia, entre erros políticos e servido por altos funcionários que executam sem pensar - assustador, não é?
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Coisas que o Presidente deveria mesmo saber
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Coisas que o Presidente deveria mesmo saber
por PEDRO TADEU
Hoje
Fico a olhar para as notícias mais relevantes da última semana. Não, não estou falar da reeleição como líder do PSD de Pedro Passos Coelho, com 95,5% dos votos (ainda se queixam dos congressos comunistas!). Vamos lá...
1 - O Governo autoriza a TAP e a Caixa Geral de Depósitos a manterem salários, ao contrário das reduções impostas às outras empresas públicas. ANA, NAV, CTT e RTP também pediram para ficar fora dos cortes salariais. Miguel Relvas diz que são apenas "adaptações".
2 - A equipa de António Borges que trata das privatizações custa 25 mil euros por mês. A propósito: a RTP, em pré-privatização, obtém lucros de 19 milhões de euros. Já não se percebe nada disto!
3 - O ministro da Economia é, numa publicidade na rádio, o dos "pastéis do Álvaro". Passos Coelho garante que quem manda nos dinheiros do QREN não é Álvaro, é Vítor Gaspar. Também diz que não há divisões no Governo...
4 - A redução da base das Lajes ameaça a economia dos Açores, diz o Governo Regional.
5 - Erros no IMI: o fisco está a receber milhares de reclamações contra as avaliações de imóveis, consideradas abusivas e feitas em cima de matrizes erradas.
6 - Há cem mil ordenados penhorados por dívidas. 800 militares têm um terço do salário caçado pelos credores.
7 - A gasolina custa 1 euro e 71.
8 - O secretário de Estado confirma que o dinheiro das portagens de agosto na Ponte 25 de Abril chegou duas vezes à Lusoponte. Isto não vai custar nada à empresa mas custará o lugar aos gestores da Estradas de Portugal, lá postos pelo PS de Sócrates.
9 - O Ministério Público investiga os rendimentos de antigos governantes. Só do PS de Sócrates?
10 - Quatro administradores da Parque Escolar demitem-se. O desvio orçamental nas obras foi de 87%. Tinham sido nomeados pelo PS de Sócrates.
11 - O recuo no PIB no quarto trimestre de 2011 foi de 1,3%. O investimento caiu 14%. O consumo das famílias desce ao abismo.
12 - A empresa Makro enviou uma carta de rescisão a todos os seus funcionários.
13 - Há pessoas que na Amadora chegam às cinco da manhã ao Centro de Emprego para garantir lugar na fila de espera.
14 - CGTP em Belém: Arménio Carlos pediu a Cavaco Silva que não promulgue a revisão da legislação laboral.
15 - E, perante esta realidade, o que tem o Presidente da República a dizer? Que o Governo anterior, do PS de Sócrates, há um ano, não lhe deu cavaco!... Será que, agora, alguém o informou do que se passa na vida quotidiana dos súbditos?
16 - Estamos doidos.
In DN
Coisas que o Presidente deveria mesmo saber
por PEDRO TADEU
Hoje
Fico a olhar para as notícias mais relevantes da última semana. Não, não estou falar da reeleição como líder do PSD de Pedro Passos Coelho, com 95,5% dos votos (ainda se queixam dos congressos comunistas!). Vamos lá...
1 - O Governo autoriza a TAP e a Caixa Geral de Depósitos a manterem salários, ao contrário das reduções impostas às outras empresas públicas. ANA, NAV, CTT e RTP também pediram para ficar fora dos cortes salariais. Miguel Relvas diz que são apenas "adaptações".
2 - A equipa de António Borges que trata das privatizações custa 25 mil euros por mês. A propósito: a RTP, em pré-privatização, obtém lucros de 19 milhões de euros. Já não se percebe nada disto!
3 - O ministro da Economia é, numa publicidade na rádio, o dos "pastéis do Álvaro". Passos Coelho garante que quem manda nos dinheiros do QREN não é Álvaro, é Vítor Gaspar. Também diz que não há divisões no Governo...
4 - A redução da base das Lajes ameaça a economia dos Açores, diz o Governo Regional.
5 - Erros no IMI: o fisco está a receber milhares de reclamações contra as avaliações de imóveis, consideradas abusivas e feitas em cima de matrizes erradas.
6 - Há cem mil ordenados penhorados por dívidas. 800 militares têm um terço do salário caçado pelos credores.
7 - A gasolina custa 1 euro e 71.
8 - O secretário de Estado confirma que o dinheiro das portagens de agosto na Ponte 25 de Abril chegou duas vezes à Lusoponte. Isto não vai custar nada à empresa mas custará o lugar aos gestores da Estradas de Portugal, lá postos pelo PS de Sócrates.
9 - O Ministério Público investiga os rendimentos de antigos governantes. Só do PS de Sócrates?
10 - Quatro administradores da Parque Escolar demitem-se. O desvio orçamental nas obras foi de 87%. Tinham sido nomeados pelo PS de Sócrates.
11 - O recuo no PIB no quarto trimestre de 2011 foi de 1,3%. O investimento caiu 14%. O consumo das famílias desce ao abismo.
12 - A empresa Makro enviou uma carta de rescisão a todos os seus funcionários.
13 - Há pessoas que na Amadora chegam às cinco da manhã ao Centro de Emprego para garantir lugar na fila de espera.
14 - CGTP em Belém: Arménio Carlos pediu a Cavaco Silva que não promulgue a revisão da legislação laboral.
15 - E, perante esta realidade, o que tem o Presidente da República a dizer? Que o Governo anterior, do PS de Sócrates, há um ano, não lhe deu cavaco!... Será que, agora, alguém o informou do que se passa na vida quotidiana dos súbditos?
16 - Estamos doidos.
In DN
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Nacionalismo de miséria
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Nacionalismo de miséria
por VIRIATO SOROMENHO-MARQUES
Hoje
Se, em 1975, o espectro português era o "socialismo de miséria", hoje a ameaça é a do "nacionalismo de miséria". É possível encontrar conservadores empedernidos de braço dado com esquerdistas assumidos, cantando em uníssono o refrão da reestruturação da dívida, e da eventual saída do euro, como se tal constituísse um desígnio estratégico. Do mesmo modo, é possível encontrar gente de todo o espectro partidário que compreende, ou pelo menos pressente, a enormidade que seria um tal caminho. A reestruturação da dívida grega foi mais uma má ideia da chanceler Merkel. Os gregos foram obrigados a engolir esse presente envenenado. Cada euro "perdoado" pelos credores custará dez euros à economia grega, quer na fuga de capitais, que continua como uma mortífera hemorragia, quer no afastamento dos mercados, que, se nada mudar na política europeia, ameaça eternizar-se. O problema sobra, contudo, para nós. A subida brutal dos nossos títulos de dívida no mercado secundário, assim como o coro de todos os analistas financeiros, incluindo o oráculo de Roubini, parecem condenar Portugal a seguir a dolorosa via dolorosa. Contra isso, que podemos fazer? Investir em todas as frentes, pela causa da sobrevivência europeia. O Governo, os partidos, as associações, os indivíduos devem pugnar junto dos seus congéneres europeus, e das instituições comunitárias, por uma solução federal, que inclua a mutualização da dívida. Há eleições, nos próximos meses, que podem trazer mudanças importantes em Paris e em Berlim. Quem não quiser regressar à pobreza do nacionalismo, deve erguer a sua voz agora. Reestruturar a dívida e sair do euro não seriam uma escolha, mas uma derrota.
In DN
Nacionalismo de miséria
por VIRIATO SOROMENHO-MARQUES
Hoje
Se, em 1975, o espectro português era o "socialismo de miséria", hoje a ameaça é a do "nacionalismo de miséria". É possível encontrar conservadores empedernidos de braço dado com esquerdistas assumidos, cantando em uníssono o refrão da reestruturação da dívida, e da eventual saída do euro, como se tal constituísse um desígnio estratégico. Do mesmo modo, é possível encontrar gente de todo o espectro partidário que compreende, ou pelo menos pressente, a enormidade que seria um tal caminho. A reestruturação da dívida grega foi mais uma má ideia da chanceler Merkel. Os gregos foram obrigados a engolir esse presente envenenado. Cada euro "perdoado" pelos credores custará dez euros à economia grega, quer na fuga de capitais, que continua como uma mortífera hemorragia, quer no afastamento dos mercados, que, se nada mudar na política europeia, ameaça eternizar-se. O problema sobra, contudo, para nós. A subida brutal dos nossos títulos de dívida no mercado secundário, assim como o coro de todos os analistas financeiros, incluindo o oráculo de Roubini, parecem condenar Portugal a seguir a dolorosa via dolorosa. Contra isso, que podemos fazer? Investir em todas as frentes, pela causa da sobrevivência europeia. O Governo, os partidos, as associações, os indivíduos devem pugnar junto dos seus congéneres europeus, e das instituições comunitárias, por uma solução federal, que inclua a mutualização da dívida. Há eleições, nos próximos meses, que podem trazer mudanças importantes em Paris e em Berlim. Quem não quiser regressar à pobreza do nacionalismo, deve erguer a sua voz agora. Reestruturar a dívida e sair do euro não seriam uma escolha, mas uma derrota.
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Destas normas Bruxelas não manda
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Destas normas Bruxelas não manda
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Este fim de semana privei com vários funcionários europeus em Bruxelas. Quis saber sobre o que é frequentar os lobbyistas das farmácias, os legisladores do plantio da oliveira, os distribuidores das quotas do atum. De todos tentei adivinhar se a Europa já era o terreno da sua ambição ou mero trampolim para subirem na pátria. Enfim, estando na capital do império quis beber ensinamentos para a periferia onde vivo. Segue-se o mais notável que me contaram... Numa destas manhãs, uma portuguesa com de 20 anos de Bruxelas, vivendo num bairro no meio da cidade, acordou com a campainha pressionada por dedo fixo, intermitente. Sobre o som estridente ela ouviu um altifalante que gritava um nome: "Carlos Silva! Carlos Silva!". Era o nome (que eu mudei) do filho. Ela espreitou pela janela e viu dois polícias, correu ao quarto e viu o filho a dormir, foi à porta e disse: "O meu filho está a dormir". O polícia, falando para o altifalante: "Acorde-o! Carlos Silva! Carlos Silva!" O rapaz já acorria, assustado. E ele ouviu, sempre do altifalante: "Tens o carro mal estacionado na praça do mercado!" O rapaz foi buscar a chave e correu com o altifalante perseguindo-o: "'Vite'! Depressa!" Mudou o lugar do carro, pagou 25 euros de multa. Os pais adoraram a lição ao filho (até porque, se o carro tivesse sido rebocado, pagariam muito mais). E eu, nesta Bruxelas que tanta norma me impõe, sem perceber porque não me exportaram esta civilização.
In DN
Destas normas Bruxelas não manda
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Este fim de semana privei com vários funcionários europeus em Bruxelas. Quis saber sobre o que é frequentar os lobbyistas das farmácias, os legisladores do plantio da oliveira, os distribuidores das quotas do atum. De todos tentei adivinhar se a Europa já era o terreno da sua ambição ou mero trampolim para subirem na pátria. Enfim, estando na capital do império quis beber ensinamentos para a periferia onde vivo. Segue-se o mais notável que me contaram... Numa destas manhãs, uma portuguesa com de 20 anos de Bruxelas, vivendo num bairro no meio da cidade, acordou com a campainha pressionada por dedo fixo, intermitente. Sobre o som estridente ela ouviu um altifalante que gritava um nome: "Carlos Silva! Carlos Silva!". Era o nome (que eu mudei) do filho. Ela espreitou pela janela e viu dois polícias, correu ao quarto e viu o filho a dormir, foi à porta e disse: "O meu filho está a dormir". O polícia, falando para o altifalante: "Acorde-o! Carlos Silva! Carlos Silva!" O rapaz já acorria, assustado. E ele ouviu, sempre do altifalante: "Tens o carro mal estacionado na praça do mercado!" O rapaz foi buscar a chave e correu com o altifalante perseguindo-o: "'Vite'! Depressa!" Mudou o lugar do carro, pagou 25 euros de multa. Os pais adoraram a lição ao filho (até porque, se o carro tivesse sido rebocado, pagariam muito mais). E eu, nesta Bruxelas que tanta norma me impõe, sem perceber porque não me exportaram esta civilização.
In DN
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Amigos?Longe! Inimigos? O mais perto possível!
Joao Ruiz- Pontos : 32035
Não há negócios da China
.
Não há negócios da China
por PEDRO MARQUES LOPES
Ontem
1 Ninguém duvidará da vontade do Governo e do primeiro-ministro de reduzir as rendas da EDP. Todos nos lembramos dos discursos durante a campanha eleitoral e, a bem da verdade, era um tema recorrente na narrativa política de Passos Coelho mesmo antes de se apresentar a eleições.
O primeiro-ministro sabe perfeitamente o que os preços da electricidade no nosso país provocam na competitividade das nossas empresas, sobretudo nas exportadoras. Também não desconhecerá, certamente, o peso demasiado elevado para as famílias portuguesas da factura da energia.
Por outro lado, é impossível que Passos Coelho não esteja ciente das consequências políticas de aparecer perante os portugueses como alguém que não hesita em retirar-lhes salários, ignorar os direitos de quem fez descontos uma vida inteira, confiscar subsídios, ou seja, rasgar os contratos que tinha com os cidadãos, e depois mostrar-se muito respeitador dos compromissos assinados com grandes corporações. No momento em que decide manter as rendas da EDP, e de outras empresas de energia, e demitir um secretário de Estado que defendia a sua redução - não cabe agora analisar o comportamento de Henrique Gomes, a sua pouca capacidade negocial ou a sua discutível visão de qual deve ser a política energética -, faz cair por terra qualquer discurso sobre repartição de sacrifícios. A mensagem, por muitos repetida, certa ou errada, está passada: o Governo é fraco com os fortes e forte com os fracos.
O primeiro-ministro fez tão simplesmente o que os políticos fazem: escolhas. Mas não as fez neste momento, fê-las quando elegeu como prioridade absoluta encaixar o máximo de dinheiro com as privatizações sem qualquer outro critério que não fosse o financeiro, com o objectivo único de baixar a dívida pública, e quando decidiu vender a EDP ao Estado chinês.
O negócio com a Three Georges foi-nos apresentado como um feito extraordinário. Um verdadeiro negócio da China. Na altura não faltou gente a querer saber mais sobre o negócio, mas era quase crime lesa-majestade que alguém duvidasse da excelência do acordo. O preço pago era obra da habilidade negocial do Governo e da vontade dos chineses de terem uma "porta aberta" na Europa. Pois claro, os chineses seriam uns beneméritos e não tinham acautelado os seus interesses. Não se importariam de que as rendas descessem de repente ou até, quem sabe, a EDP começasse a dar prejuízo. Iriam ser compreensivos com a situação de Portugal. Parece afinal, apesar de o Governo garantir o contrário, que existiam uma letras pequenitas no contrato, tão pequenas que só a Three Georges, o primeiro-ministro e o ministro das Finanças conseguiam ler. E nessas o Governo ter-se-ia comprometido em não baixar as rendas da EDP.
Há outra hipótese, porém. As tais letras pequenitas não existem e o Governo convenceu-se de que depois do contrato feito podia alterar a seu bel-prazer as ditas rendas. Só que tomar posições de força com investidores nacionais ou com simples empresas privadas não é e não será a mesma coisa que confrontar o Estado chinês. Não parece assim que o argumento, dado pelo Governo, de estar à espera do restante pagamento para depois actuar possa ser levado a sério.
Digamos que a China tem argumentos mais fortes e que terá meios para não aceitar uma alteração ás condições contratuais actuais.
O que parece ter acontecido foi tão somente isto: o Governo achou que era mais importante receber o dinheiro que recebeu do que baixar as rendas dos produtores de energia. Não se importou de rasgar compromissos com os eleitores, de esquecer o que chamou, e bem, ao Governo anterior e decidiu, até ver, manter os custos da energia para as empresas e cidadãos, ficando tudo como estava.
Uma escolha política, repito.
2 O Presidente da República requereu ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva da constitucionalidade do diploma que cria o crime de enriquecimento ilícito. Não seria de esperar outra coisa.
Esta lei envergonha quem a aprovou e constitui um dos maiores ataques ao Estado de direito desde a normalização da nossa democracia. Não tenho qualquer tipo de dúvidas de que o Tribunal Constitucional declarará a inconstitucionalidade da lei. Se assim não for estará consagrado em texto legal o mais iníquo principio: a inversão do ónus da prova. Nada mais perigoso.
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.
In DN
Não há negócios da China
por PEDRO MARQUES LOPES
Ontem
1 Ninguém duvidará da vontade do Governo e do primeiro-ministro de reduzir as rendas da EDP. Todos nos lembramos dos discursos durante a campanha eleitoral e, a bem da verdade, era um tema recorrente na narrativa política de Passos Coelho mesmo antes de se apresentar a eleições.
O primeiro-ministro sabe perfeitamente o que os preços da electricidade no nosso país provocam na competitividade das nossas empresas, sobretudo nas exportadoras. Também não desconhecerá, certamente, o peso demasiado elevado para as famílias portuguesas da factura da energia.
Por outro lado, é impossível que Passos Coelho não esteja ciente das consequências políticas de aparecer perante os portugueses como alguém que não hesita em retirar-lhes salários, ignorar os direitos de quem fez descontos uma vida inteira, confiscar subsídios, ou seja, rasgar os contratos que tinha com os cidadãos, e depois mostrar-se muito respeitador dos compromissos assinados com grandes corporações. No momento em que decide manter as rendas da EDP, e de outras empresas de energia, e demitir um secretário de Estado que defendia a sua redução - não cabe agora analisar o comportamento de Henrique Gomes, a sua pouca capacidade negocial ou a sua discutível visão de qual deve ser a política energética -, faz cair por terra qualquer discurso sobre repartição de sacrifícios. A mensagem, por muitos repetida, certa ou errada, está passada: o Governo é fraco com os fortes e forte com os fracos.
O primeiro-ministro fez tão simplesmente o que os políticos fazem: escolhas. Mas não as fez neste momento, fê-las quando elegeu como prioridade absoluta encaixar o máximo de dinheiro com as privatizações sem qualquer outro critério que não fosse o financeiro, com o objectivo único de baixar a dívida pública, e quando decidiu vender a EDP ao Estado chinês.
O negócio com a Three Georges foi-nos apresentado como um feito extraordinário. Um verdadeiro negócio da China. Na altura não faltou gente a querer saber mais sobre o negócio, mas era quase crime lesa-majestade que alguém duvidasse da excelência do acordo. O preço pago era obra da habilidade negocial do Governo e da vontade dos chineses de terem uma "porta aberta" na Europa. Pois claro, os chineses seriam uns beneméritos e não tinham acautelado os seus interesses. Não se importariam de que as rendas descessem de repente ou até, quem sabe, a EDP começasse a dar prejuízo. Iriam ser compreensivos com a situação de Portugal. Parece afinal, apesar de o Governo garantir o contrário, que existiam uma letras pequenitas no contrato, tão pequenas que só a Three Georges, o primeiro-ministro e o ministro das Finanças conseguiam ler. E nessas o Governo ter-se-ia comprometido em não baixar as rendas da EDP.
Há outra hipótese, porém. As tais letras pequenitas não existem e o Governo convenceu-se de que depois do contrato feito podia alterar a seu bel-prazer as ditas rendas. Só que tomar posições de força com investidores nacionais ou com simples empresas privadas não é e não será a mesma coisa que confrontar o Estado chinês. Não parece assim que o argumento, dado pelo Governo, de estar à espera do restante pagamento para depois actuar possa ser levado a sério.
Digamos que a China tem argumentos mais fortes e que terá meios para não aceitar uma alteração ás condições contratuais actuais.
O que parece ter acontecido foi tão somente isto: o Governo achou que era mais importante receber o dinheiro que recebeu do que baixar as rendas dos produtores de energia. Não se importou de rasgar compromissos com os eleitores, de esquecer o que chamou, e bem, ao Governo anterior e decidiu, até ver, manter os custos da energia para as empresas e cidadãos, ficando tudo como estava.
Uma escolha política, repito.
2 O Presidente da República requereu ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva da constitucionalidade do diploma que cria o crime de enriquecimento ilícito. Não seria de esperar outra coisa.
Esta lei envergonha quem a aprovou e constitui um dos maiores ataques ao Estado de direito desde a normalização da nossa democracia. Não tenho qualquer tipo de dúvidas de que o Tribunal Constitucional declarará a inconstitucionalidade da lei. Se assim não for estará consagrado em texto legal o mais iníquo principio: a inversão do ónus da prova. Nada mais perigoso.
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.
In DN
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Amigos?Longe! Inimigos? O mais perto possível!
Joao Ruiz- Pontos : 32035
O álibi de vulgar canalha
.
O álibi de vulgar canalha
por FERREIRA FERNANDES
22 Março 2012
Quando soube que o assassino da scooter estava cercado, Albert Chennouf disse: "Quero saber o que vai dizer esse monstro." Não queria nada. Ele queria era entender a morte do seu filho, paraquedista francês de origem argelina, e para isso não há explicação. Em vez de razões e sentido, Chennouf já ouviu ontem o que o assassino tinha para dizer: conversa barata. Tretas ideológicas. Antes de ter sido cercado Mohamed Merah, o assassino de Toulouse, comparei-o a Anders Breivik, o assassino norueguês: o mesmo rasto de lobo solitário. Quem desce da moto para abater três crianças equivale àquele que caça adolescentes numa ilha. Do norueguês conhecíamos os discursos de supremacia branca. Do francês, mesmo antes de ser apanhado, já podíamos esperar igual, dessa área (não matou ele soldados de origem magrebina?) ou de outra (não atacou uma escola judia?)... Soube-se agora que Merah se diz adepto da guerra islâmica - após percurso de bandideco de rua foi por duas vezes ao Afeganistão. Essas ideologias - racistas ou islâmicas radicais - as democracias podem combater até com pequenos gestos: ontem, o Presidente Sarkozy atravessou a parada do quartel de Montauban, mão na mão com a mãe argelina de um soldado morto. Mais difícil é prever a irrupção de raivosos Breiviks e Merahs. Pelo menos, que eles não nos enganem: nem cavaleiros de causas erradas são,
In DN
O álibi de vulgar canalha
por FERREIRA FERNANDES
22 Março 2012
Quando soube que o assassino da scooter estava cercado, Albert Chennouf disse: "Quero saber o que vai dizer esse monstro." Não queria nada. Ele queria era entender a morte do seu filho, paraquedista francês de origem argelina, e para isso não há explicação. Em vez de razões e sentido, Chennouf já ouviu ontem o que o assassino tinha para dizer: conversa barata. Tretas ideológicas. Antes de ter sido cercado Mohamed Merah, o assassino de Toulouse, comparei-o a Anders Breivik, o assassino norueguês: o mesmo rasto de lobo solitário. Quem desce da moto para abater três crianças equivale àquele que caça adolescentes numa ilha. Do norueguês conhecíamos os discursos de supremacia branca. Do francês, mesmo antes de ser apanhado, já podíamos esperar igual, dessa área (não matou ele soldados de origem magrebina?) ou de outra (não atacou uma escola judia?)... Soube-se agora que Merah se diz adepto da guerra islâmica - após percurso de bandideco de rua foi por duas vezes ao Afeganistão. Essas ideologias - racistas ou islâmicas radicais - as democracias podem combater até com pequenos gestos: ontem, o Presidente Sarkozy atravessou a parada do quartel de Montauban, mão na mão com a mãe argelina de um soldado morto. Mais difícil é prever a irrupção de raivosos Breiviks e Merahs. Pelo menos, que eles não nos enganem: nem cavaleiros de causas erradas são,
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Assim tão simples
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Assim tão simples
por FERNANDA CÂNCIO
Ontem
Cumprir um acordo de resgate do País com medidas duras e metas de défice mais que draconianas; partir de uma situação em que os juros da dívida soberana tinham ultrapassado os 7% para pagar uns generosos (!) 5,5% pelo empréstimo da troika; fazê-lo no meio de uma crise europeia e mundial e com a Europa transformada num império mal disfarçado; lidar com buracos como o do BPN, ao qual ninguém sabe o que fazer; encarar, como qualquer governo, os sempiternos "problemas estruturais" de um país pequeno, com uma economia pouco dinâmica, um dos maiores níveis de desigualdade da Europa e uma taxa de pobreza que, se descera nos últimos anos, só pode inverter a tendência com o desemprego em crescendo e os apoios sociais em baixa. Não, não podemos dizer que era fácil e simples - mesmo se, em campanha, PSD e PP o afiançaram. Aliás, tinham tudo "estudado", "contas feitas", "soluções" (entre as quais a da famosa descida da taxa social única, que, lembram-se, era a bala de prata da competitividade?) preparadas.
Certo é que aos nove meses de idade o executivo PSD/PP é confrontado com o agravar de todos os indicadores que antes reputara sinal de fracasso e incompetência: o desemprego que quando ganharam as eleições era 12,1% rasa já os 15% (com um aumento brutal desde o início do ano); as falências sucedem-se em catadupa; o risco de incumprimento cresceu e os juros da dívida estão nos 13%. "Fatores e contextos" que, descobriram agora ( para o tarde) Passos e seus ministros, "não podemos controlar". Mas também no que têm de controlar - o défice - as coisas correm mal, muito mal.
Que faz perante o desastre - porque isto é já o desastre - o Governo? Vai aos EUA anunciar, via Gaspar, que tudo corre à maravilha e o fundo do túnel é em 2013, mais precisamente a 23 de setembro (horas, por favor?). Se é da natureza dos governos ostentar voluntarismo e otimismo (aquilo que antes se chamava autismo, lembram-se?), convenhamos que isto é já território de dogma.
E não precisamos de ir mais longe que o próprio Executivo para encontrar quem o afirme. "Se a troika impuser uma política de austeridade cega e sem olhar a meios, o mais certo é que a economia nacional entre numa recessão ainda maior, o que agravará ainda mais os desequilíbrios das finanças públicas (pois as receitas fiscais cairão e os défices aumentarão nesse ambiente recessivo)." E ainda: "É simplesmente inaceitável que um país como o nosso tenha taxas de desemprego desta dimensão. Estes números são uma vergonha para todos nós. [...] E quanto mais tardarmos a lidar com esta situação potencialmente explosiva, piores serão as consequências para todos nós." Quem há um ano o disse é hoje - pelo menos formalmente - ministro da Economia e do Emprego. E das duas uma: ou está a morrer de vergonha, ou nem sabe o que isso é. Como usava rematar no seu blogue, "é assim tão simples".
In DN
Assim tão simples
por FERNANDA CÂNCIO
Ontem
Cumprir um acordo de resgate do País com medidas duras e metas de défice mais que draconianas; partir de uma situação em que os juros da dívida soberana tinham ultrapassado os 7% para pagar uns generosos (!) 5,5% pelo empréstimo da troika; fazê-lo no meio de uma crise europeia e mundial e com a Europa transformada num império mal disfarçado; lidar com buracos como o do BPN, ao qual ninguém sabe o que fazer; encarar, como qualquer governo, os sempiternos "problemas estruturais" de um país pequeno, com uma economia pouco dinâmica, um dos maiores níveis de desigualdade da Europa e uma taxa de pobreza que, se descera nos últimos anos, só pode inverter a tendência com o desemprego em crescendo e os apoios sociais em baixa. Não, não podemos dizer que era fácil e simples - mesmo se, em campanha, PSD e PP o afiançaram. Aliás, tinham tudo "estudado", "contas feitas", "soluções" (entre as quais a da famosa descida da taxa social única, que, lembram-se, era a bala de prata da competitividade?) preparadas.
Certo é que aos nove meses de idade o executivo PSD/PP é confrontado com o agravar de todos os indicadores que antes reputara sinal de fracasso e incompetência: o desemprego que quando ganharam as eleições era 12,1% rasa já os 15% (com um aumento brutal desde o início do ano); as falências sucedem-se em catadupa; o risco de incumprimento cresceu e os juros da dívida estão nos 13%. "Fatores e contextos" que, descobriram agora ( para o tarde) Passos e seus ministros, "não podemos controlar". Mas também no que têm de controlar - o défice - as coisas correm mal, muito mal.
Que faz perante o desastre - porque isto é já o desastre - o Governo? Vai aos EUA anunciar, via Gaspar, que tudo corre à maravilha e o fundo do túnel é em 2013, mais precisamente a 23 de setembro (horas, por favor?). Se é da natureza dos governos ostentar voluntarismo e otimismo (aquilo que antes se chamava autismo, lembram-se?), convenhamos que isto é já território de dogma.
E não precisamos de ir mais longe que o próprio Executivo para encontrar quem o afirme. "Se a troika impuser uma política de austeridade cega e sem olhar a meios, o mais certo é que a economia nacional entre numa recessão ainda maior, o que agravará ainda mais os desequilíbrios das finanças públicas (pois as receitas fiscais cairão e os défices aumentarão nesse ambiente recessivo)." E ainda: "É simplesmente inaceitável que um país como o nosso tenha taxas de desemprego desta dimensão. Estes números são uma vergonha para todos nós. [...] E quanto mais tardarmos a lidar com esta situação potencialmente explosiva, piores serão as consequências para todos nós." Quem há um ano o disse é hoje - pelo menos formalmente - ministro da Economia e do Emprego. E das duas uma: ou está a morrer de vergonha, ou nem sabe o que isso é. Como usava rematar no seu blogue, "é assim tão simples".
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
A culpa é 'deles'
.
A culpa é 'deles'
por Pedro Marques Lopes
Hoje
Ninguém estará esquecido de declarações de políticos condenados, acusados, indiciados ou simplesmente questionados sobre eventuais problemas com a lei do tipo "o povo responderá nas urnas" ou "os cidadãos mostraram em quem confiam". Lamentavelmente, não foram proferidas apenas por personagens menores do nosso panorama político, mas por gente com as mais elevadas responsabilidades. São frases que mostram um absoluto desprezo pelo Estado de direito. Neste, ninguém está acima da lei e não há eleição que possa pôr em causa a decisão de um tribunal ou uma investigação a quem quer que seja.
A Associação Sindical de Juízes (para quando uma associação sindical de deputados?) fez uma denúncia ao Ministério Público sobre eventuais ilegalidades no pagamento de despesas a membros do anterior Governo. Bom, se há indícios de irregularidades, investigue--se. Ninguém está acima da lei - como já se disse. É estranho, porém, que a associação sindical tenha razões para fazer uma denúncia contra o anterior Executivo e não tenha encontrado nenhuma hipótese de irregularidade noutros. Também não me recordo de denúncias da associação sindical deste ou doutro género contra quem quer que seja. Acresce a isto, como neste espaço José Manuel Pureza salientou, uma acção ser iniciada por quem depois a vai julgar. Causa, no mínimo, perturbações ao princípio fundamental da divisão de poderes.
Vários observadores justificaram esta atitude da associação sindical (não confundo a agremiação com a inteira classe profissional) com decisões do antigo Governo, nomeadamente a retirada de regalias, e até de poder servir como ameaça a possíveis futuras tomadas de posição do género já deste ou de próximos Governos.
Este cenário, a ser real, é grave. Os poderes conferidos pela Constituição aos juízes não podem ser utilizados como arma para lutas corporativas. Ou pior, para pressionar a feitura de leis, neste ou naquele sentido. Fazer isso seria pôr em causa todo o edifício constitucional. O juiz julga, não legisla. Quem faz as leis são os representantes do povo escolhidos em eleições.
A denúncia feita pela associação pode ser um indício de uma tendência perigosíssima a que vamos assistindo para que se criminalizem actos políticos. Mas, na essência, não é essa imensa perversão que está agora em causa. Não são decisões políticas que irão ser avaliadas. Esta atitude da associação vem, sim, na linha de um comportamento que passa por responsabilizar o poder político por todos os males do País - sobretudo os que se prendem com o sistema judicial. Os mesmos responsáveis sindicais do Ministério Público e dos juízes, que se mostram preocupadíssimos com as atitudes dos políticos, não demonstram qualquer tipo de preocupação ou de capacidade de olhar para a actuação dos seus representados.
Um exemplo: a corrupção é apenas um problema dos políticos, os juízes e os homens e as mulheres do Ministério Público são todos impolutos. O retrato que deles se traça é o de pessoas tocadas pelos deuses, entidades de uma superioridade ética e moral inquestionável, paladinos da justiça e da liberdade.
Mas a realidade é outra. Os processos arrastam-se nos tribunais durante anos e anos, o segredo de justiça é violado todos os dias, escutas ilegais aparecem em órgãos de comunicação, empresas vão à falência porque não conseguem reaver os seus créditos em tempo útil, a previsibilidade duma sentença é uma espécie de totobola. De quem é a culpa? Dos políticos, e das suas leis.
Um superprocurador tem indícios fortíssimos de gigantescas conspirações, de autênticos sindicatos de crime organizado, organiza-se uma equipa de peritos, faz-se uma equipa especial. Nada se descobre, nada se apura, a montanha pare um rato. De quem é a culpa? Dos políticos, pois claro.
Um agente judicial convence-se que um indivíduo qualquer é um criminoso. Vai tentar obter provas que consubstanciem a sua percepção (escuso-me de qualificar a iniquidade de um comportamento destes). Não as descobre. Mas como tem uma fé inabalável na sua intuição, diz a um amigo jornalista de que o tipo é um bandido. O jornalista faz uma manchete com base em indícios irrelevantes. Fica assim condenado o cidadão na opinião pública. De quem é a culpa desta vergonha? Dos políticos, obviamente.
O nosso sistema judicial está gravemente doente, e não há pior doença numa democracia. Os políticos terão a sua quota de culpas, mas convinha que os maiores responsáveis pelo estado de coisas assumissem os seus erros e tratassem da sua casa em vez de se meterem em assuntos que não são os seus e, principalmente, não arranjassem desculpas de mau pagador.
In DN
A culpa é 'deles'
por Pedro Marques Lopes
Hoje
Ninguém estará esquecido de declarações de políticos condenados, acusados, indiciados ou simplesmente questionados sobre eventuais problemas com a lei do tipo "o povo responderá nas urnas" ou "os cidadãos mostraram em quem confiam". Lamentavelmente, não foram proferidas apenas por personagens menores do nosso panorama político, mas por gente com as mais elevadas responsabilidades. São frases que mostram um absoluto desprezo pelo Estado de direito. Neste, ninguém está acima da lei e não há eleição que possa pôr em causa a decisão de um tribunal ou uma investigação a quem quer que seja.
A Associação Sindical de Juízes (para quando uma associação sindical de deputados?) fez uma denúncia ao Ministério Público sobre eventuais ilegalidades no pagamento de despesas a membros do anterior Governo. Bom, se há indícios de irregularidades, investigue--se. Ninguém está acima da lei - como já se disse. É estranho, porém, que a associação sindical tenha razões para fazer uma denúncia contra o anterior Executivo e não tenha encontrado nenhuma hipótese de irregularidade noutros. Também não me recordo de denúncias da associação sindical deste ou doutro género contra quem quer que seja. Acresce a isto, como neste espaço José Manuel Pureza salientou, uma acção ser iniciada por quem depois a vai julgar. Causa, no mínimo, perturbações ao princípio fundamental da divisão de poderes.
Vários observadores justificaram esta atitude da associação sindical (não confundo a agremiação com a inteira classe profissional) com decisões do antigo Governo, nomeadamente a retirada de regalias, e até de poder servir como ameaça a possíveis futuras tomadas de posição do género já deste ou de próximos Governos.
Este cenário, a ser real, é grave. Os poderes conferidos pela Constituição aos juízes não podem ser utilizados como arma para lutas corporativas. Ou pior, para pressionar a feitura de leis, neste ou naquele sentido. Fazer isso seria pôr em causa todo o edifício constitucional. O juiz julga, não legisla. Quem faz as leis são os representantes do povo escolhidos em eleições.
A denúncia feita pela associação pode ser um indício de uma tendência perigosíssima a que vamos assistindo para que se criminalizem actos políticos. Mas, na essência, não é essa imensa perversão que está agora em causa. Não são decisões políticas que irão ser avaliadas. Esta atitude da associação vem, sim, na linha de um comportamento que passa por responsabilizar o poder político por todos os males do País - sobretudo os que se prendem com o sistema judicial. Os mesmos responsáveis sindicais do Ministério Público e dos juízes, que se mostram preocupadíssimos com as atitudes dos políticos, não demonstram qualquer tipo de preocupação ou de capacidade de olhar para a actuação dos seus representados.
Um exemplo: a corrupção é apenas um problema dos políticos, os juízes e os homens e as mulheres do Ministério Público são todos impolutos. O retrato que deles se traça é o de pessoas tocadas pelos deuses, entidades de uma superioridade ética e moral inquestionável, paladinos da justiça e da liberdade.
Mas a realidade é outra. Os processos arrastam-se nos tribunais durante anos e anos, o segredo de justiça é violado todos os dias, escutas ilegais aparecem em órgãos de comunicação, empresas vão à falência porque não conseguem reaver os seus créditos em tempo útil, a previsibilidade duma sentença é uma espécie de totobola. De quem é a culpa? Dos políticos, e das suas leis.
Um superprocurador tem indícios fortíssimos de gigantescas conspirações, de autênticos sindicatos de crime organizado, organiza-se uma equipa de peritos, faz-se uma equipa especial. Nada se descobre, nada se apura, a montanha pare um rato. De quem é a culpa? Dos políticos, pois claro.
Um agente judicial convence-se que um indivíduo qualquer é um criminoso. Vai tentar obter provas que consubstanciem a sua percepção (escuso-me de qualificar a iniquidade de um comportamento destes). Não as descobre. Mas como tem uma fé inabalável na sua intuição, diz a um amigo jornalista de que o tipo é um bandido. O jornalista faz uma manchete com base em indícios irrelevantes. Fica assim condenado o cidadão na opinião pública. De quem é a culpa desta vergonha? Dos políticos, obviamente.
O nosso sistema judicial está gravemente doente, e não há pior doença numa democracia. Os políticos terão a sua quota de culpas, mas convinha que os maiores responsáveis pelo estado de coisas assumissem os seus erros e tratassem da sua casa em vez de se meterem em assuntos que não são os seus e, principalmente, não arranjassem desculpas de mau pagador.
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Lá chegaremos...
.
Lá chegaremos...
por Paulo Baldaia
Hoje
Estamos a meio da ponte, diz-nos o ministro das Finanças com o optimismo próprio de quem se vê a conduzir o povo. Nós não o queremos pessimista, precisamos dele crente nas soluções que preconiza, mas sabemos que ele sabe que pode não haver a outra metade da ponte para percorrer.
Nós podemos fazer o caminho, como estamos a fazer, carregando às costas os pedregulhos com que a outra metade da ponte tem de ser construída e não haver a argamassa para que os sacrifícios ganhem a forma de metade de uma ponte que nos leve para o outro lado, onde está a prosperidade.
É que essa argamassa vem dos mercados que podem olhar para os carregadores e desconfiarem da sua capacidade para fazer o trabalho de acabar a ponte. É que se o tamanho dos pedregulhos exigir um sacrifício superior ao que os carregadores podem suportar, então é natural que o trabalho, a partir de certa altura, não possa ser feito.
E sem ponte finalizada de pouco valerá ter carregado às costas pedras tão pesadas. É por isso que há muitos analistas a sugerir que se leve mais tempo a fazer e a percorrer a ponte, fazendo sacrifícios mais leves, para que todos possam chegar ao outro lado. Sugerem-nos que foi a pressa que tramou a Grécia. E acrescentam que o mesmo começa a fazer-se sentir em Portugal, onde há cada vez mais gente sem emprego e sem futuro.
Há, no entanto, quem esteja a ver a construção desta ponte de outro ângulo, como o ministro, e que entenda que não temos mais tempo para viver do lado errado da ponte. Para os que preconizam o plano de austeridade tal como está desenhado a questão prende-se essencialmente com a impossibilidade de construir esta ponte com pequenas pedras, porque ela iria ruir mesmo antes de estar terminada.
Lá chegaremos. Ao local onde a ponte deixa de existir e a recessão prospera ou ao outro lado da ponte, onde prospera a economia e o emprego. Como estamos a olhar para o futuro não pode haver certezas e o que sei é que, tendo nós eleito quem nos governa, só podemos trilhar o caminho que o primeiro-ministro e o ministro das Finanças traçaram. Por muito que custe a todos os que convictamente acreditam que o caminho devia ser outro, a alternativa é ficarmos parados no sítio da ponte onde nos encontramos.
Pede-se a quem traçou o caminho que tenha igualmente a ambição de não querer apenas fazer a travessia. Pede-se que acredite que é possível cuidar desde já do pomar onde todos sonhamos fazer a colheita, que acredite que é possível garantir que a terra não deixará de ser produtiva. O pior que nos podia acontecer era fazer a travessia para encontrar um deserto. Não há alternativa, podemos desconfiar dos políticos mas foi nas mãos deles que entregamos o nosso futuro. Lá chegaremos...
In DN
Lá chegaremos...
por Paulo Baldaia
Hoje
Estamos a meio da ponte, diz-nos o ministro das Finanças com o optimismo próprio de quem se vê a conduzir o povo. Nós não o queremos pessimista, precisamos dele crente nas soluções que preconiza, mas sabemos que ele sabe que pode não haver a outra metade da ponte para percorrer.
Nós podemos fazer o caminho, como estamos a fazer, carregando às costas os pedregulhos com que a outra metade da ponte tem de ser construída e não haver a argamassa para que os sacrifícios ganhem a forma de metade de uma ponte que nos leve para o outro lado, onde está a prosperidade.
É que essa argamassa vem dos mercados que podem olhar para os carregadores e desconfiarem da sua capacidade para fazer o trabalho de acabar a ponte. É que se o tamanho dos pedregulhos exigir um sacrifício superior ao que os carregadores podem suportar, então é natural que o trabalho, a partir de certa altura, não possa ser feito.
E sem ponte finalizada de pouco valerá ter carregado às costas pedras tão pesadas. É por isso que há muitos analistas a sugerir que se leve mais tempo a fazer e a percorrer a ponte, fazendo sacrifícios mais leves, para que todos possam chegar ao outro lado. Sugerem-nos que foi a pressa que tramou a Grécia. E acrescentam que o mesmo começa a fazer-se sentir em Portugal, onde há cada vez mais gente sem emprego e sem futuro.
Há, no entanto, quem esteja a ver a construção desta ponte de outro ângulo, como o ministro, e que entenda que não temos mais tempo para viver do lado errado da ponte. Para os que preconizam o plano de austeridade tal como está desenhado a questão prende-se essencialmente com a impossibilidade de construir esta ponte com pequenas pedras, porque ela iria ruir mesmo antes de estar terminada.
Lá chegaremos. Ao local onde a ponte deixa de existir e a recessão prospera ou ao outro lado da ponte, onde prospera a economia e o emprego. Como estamos a olhar para o futuro não pode haver certezas e o que sei é que, tendo nós eleito quem nos governa, só podemos trilhar o caminho que o primeiro-ministro e o ministro das Finanças traçaram. Por muito que custe a todos os que convictamente acreditam que o caminho devia ser outro, a alternativa é ficarmos parados no sítio da ponte onde nos encontramos.
Pede-se a quem traçou o caminho que tenha igualmente a ambição de não querer apenas fazer a travessia. Pede-se que acredite que é possível cuidar desde já do pomar onde todos sonhamos fazer a colheita, que acredite que é possível garantir que a terra não deixará de ser produtiva. O pior que nos podia acontecer era fazer a travessia para encontrar um deserto. Não há alternativa, podemos desconfiar dos políticos mas foi nas mãos deles que entregamos o nosso futuro. Lá chegaremos...
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
O bocejo mata o jornalismo
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O bocejo mata o jornalismo
por Ferreira Fernandes
Hoje
O problema do jornalismo político num congresso do PSD em março de 2012, quando ninguém contesta a liderança do partido, é idêntico ao do jornalismo desportivo em julho, quando já não há campeonato e às manchetes de A Bola só resta gritar: "Vem aí Borongonga!" Ao voltar do almoço, ontem, Passos Coelho disse aos repórteres: "Deixem-me entrar no congresso", o que, por mais estranho que pareça, queria só dizer que ele queria entrar no congresso. Sem se deixar iludir pela quietude dos propósitos, um repórter pôs-se a esgaravatar e lançou ao homem que só queria entrar: "Quase que disse: deixem-me trabalhar..." Há dias, Sarkozy lançou a um repórter: "Idiota." Mas isso é França, sem brandos costumes. Daí o repórter de ontem ter insistido: "Sabe quem disse 'deixem-me trabalhar', não sabe?" É duro ser repórter de congressos pacatos. Mais, só comentador. Pelo menos por cá. Num país em que os comentadores fossem tão pândegos como um dirigente do PSD que sobe à tribuna e diz que há que passar à fase pós-capitalista - num país em que os comentadores merecessem Alberto João Jardim -, um congresso pacato podia ser interessante. Mas na televisiva mesa redonda para que depois Jardim foi convidado, e onde ele falou da dialética e d'O Banquete, de Platão, ninguém lhe deu para troca Epicteto ou outro filósofo da Antiguidade. Rir-nos-íamos todos. Mas não, falou-se de coisas graves. Se calhar também nos devíamos rir disso, mas dói.
In DN
O bocejo mata o jornalismo
por Ferreira Fernandes
Hoje
O problema do jornalismo político num congresso do PSD em março de 2012, quando ninguém contesta a liderança do partido, é idêntico ao do jornalismo desportivo em julho, quando já não há campeonato e às manchetes de A Bola só resta gritar: "Vem aí Borongonga!" Ao voltar do almoço, ontem, Passos Coelho disse aos repórteres: "Deixem-me entrar no congresso", o que, por mais estranho que pareça, queria só dizer que ele queria entrar no congresso. Sem se deixar iludir pela quietude dos propósitos, um repórter pôs-se a esgaravatar e lançou ao homem que só queria entrar: "Quase que disse: deixem-me trabalhar..." Há dias, Sarkozy lançou a um repórter: "Idiota." Mas isso é França, sem brandos costumes. Daí o repórter de ontem ter insistido: "Sabe quem disse 'deixem-me trabalhar', não sabe?" É duro ser repórter de congressos pacatos. Mais, só comentador. Pelo menos por cá. Num país em que os comentadores fossem tão pândegos como um dirigente do PSD que sobe à tribuna e diz que há que passar à fase pós-capitalista - num país em que os comentadores merecessem Alberto João Jardim -, um congresso pacato podia ser interessante. Mas na televisiva mesa redonda para que depois Jardim foi convidado, e onde ele falou da dialética e d'O Banquete, de Platão, ninguém lhe deu para troca Epicteto ou outro filósofo da Antiguidade. Rir-nos-íamos todos. Mas não, falou-se de coisas graves. Se calhar também nos devíamos rir disso, mas dói.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
No PSD e no PS
,
No PSD e no PS
por JOÃO MARCELINO
Hoje
No congresso do PSD, Pedro Passos Coelho não conseguiu fazer passar algumas das suas propostas de abertura do partido. Os militantes chumbaram-lhe a figura de "simpatizante" e disseram-lhe que não querem eleições internas, "primárias", para a escolha de candidatos a autarcas e deputados. Ou seja, optaram pelo caminho de conservar intactos todos os poderes que fazem que os candidatos a qualquer cargo tenham de se preocupar muito mais com as ligações internas aos chefes do partido do que ao conjunto dos militantes da região. Passos também não perde nada com isso...
No PS, António José Seguro, aparentemente, também está a propor uma pequena abertura que será votada na comissão nacional do partido, reunida hoje na Guarda e na qual a maioria de militantes afetos às suas teses parece garantir a aprovação. Abertura aparente! A reforma dos estatutos, se aprovada, coloca os líderes distritais perante a possibilidade de listas concorrentes (com o alto patrocínio do Largo do Rato...), mas a nível nacional o secretário-geral conserva o poder. Caber-lhe-á escolher diretamente 30% dos deputados nacionais e todos os candidatos ao Parlamento europeu.
Passos Coelho talvez não se tenha empenhado muito nas mudanças propostas ao congresso de Lisboa. Tem tempo e deve considerar que haverá alturas mais propícias. Para já, não lhe convém desgastar-se em lutas de rentabilidade duvidosa.
Seguro, ao contrário, precisa destas alterações no imediato para conseguir, finalmente, começar a mandar num partido ainda demasiado agarrado ao legado de Sócrates e onde os pesos pesados olham ansiosos para todos os sinais que possam vir de António Costa.
Passos Coelho viu o exercício do cargo de primeiro- -ministro unir-lhe o PSD. Só Manuela Ferreira Leite resiste à conversão. De resto, estão todos lá, bem comportados, de Marcelo a Santana, de Marques Mendes ao núcleo fiel a Durão Barroso, com Arnault e Sarmento à cabeça, simulando fidelidade. Mas Passos Coelho não tem ilusões. Sabe que o poder se ocupa: e, por isso, vai colocando os seus homens, jovens saídos da JSD, como ele. No Governo tem Miguel Relvas (e Carlos Moedas). No partido tem Moreira da Silva (e Pedro Pinto). E um marca, e contrabalança, o outro, enquanto Marco António Costa tentar construir uma carreira autónoma a partir do Norte.
A Seguro falta poder para distribuir. Muitos deputados são de Sócrates. E os que não são ainda não têm a certeza do que quer António Costa, que nas eleições da sucessão se fez representar por Francisco Assis enquanto reflete se prefere candidatar-se a São Bento ou a Belém. Esta realidade, na qual também pesam as responsabilidades dos últimos seis anos, é um caldo difícil de gerir. Seguro precisa de afrontar as eleições autárquicas com todas as suas escolhas, sem limitações. Só uma vitória nessa primeira grande sondagem nacional à governação lhe permitirá acabar com as dúvidas à sua volta. E nessa corrida contra o tempo não pode hesitar nem ter contemplações nas escolhas.
No PSD, o período de oposição fez três vítimas: Marques Mendes, Manuela Ferreira Leite e Luís Filipe Menezes. E, antes, também houve quem apostasse que Durão Barroso nunca chegaria sequer a primeiro- -ministro.
No PS pós-Mário Soares queimaram-se as lideranças de Vítor Constâncio e Jorge Sampaio. Nunca é fácil estar na liderança da oposição. Os recados são sempre muitos (ver artigos desta semana de Manuel Maria Carrilho no DN e de Francisco Assis no Público) e as ambições também. Sobra estar no partido com a máxima que José Sócrates lembrava repetidamente enquanto inquilino de São Bento: "Só se passa por aqui uma vez." Ao menos nessa convicção estava inteiramente certo...
Podem os partidos um dia mudar, abrirem-se à sociedade civil, aos "simpatizantes" que Assis também propunha para o PS? Será que um dia as primárias, autárquicas e nacionais, serão até abertas aos não militantes? Pode ser que sim, mas vai demorar muito tempo. A crise, como se vê, ainda não é suficiente para produzir o milagre nas células que a Democracia, apesar de tudo, não pode dispensar...
In DN
No PSD e no PS
por JOÃO MARCELINO
Hoje
No congresso do PSD, Pedro Passos Coelho não conseguiu fazer passar algumas das suas propostas de abertura do partido. Os militantes chumbaram-lhe a figura de "simpatizante" e disseram-lhe que não querem eleições internas, "primárias", para a escolha de candidatos a autarcas e deputados. Ou seja, optaram pelo caminho de conservar intactos todos os poderes que fazem que os candidatos a qualquer cargo tenham de se preocupar muito mais com as ligações internas aos chefes do partido do que ao conjunto dos militantes da região. Passos também não perde nada com isso...
No PS, António José Seguro, aparentemente, também está a propor uma pequena abertura que será votada na comissão nacional do partido, reunida hoje na Guarda e na qual a maioria de militantes afetos às suas teses parece garantir a aprovação. Abertura aparente! A reforma dos estatutos, se aprovada, coloca os líderes distritais perante a possibilidade de listas concorrentes (com o alto patrocínio do Largo do Rato...), mas a nível nacional o secretário-geral conserva o poder. Caber-lhe-á escolher diretamente 30% dos deputados nacionais e todos os candidatos ao Parlamento europeu.
Passos Coelho talvez não se tenha empenhado muito nas mudanças propostas ao congresso de Lisboa. Tem tempo e deve considerar que haverá alturas mais propícias. Para já, não lhe convém desgastar-se em lutas de rentabilidade duvidosa.
Seguro, ao contrário, precisa destas alterações no imediato para conseguir, finalmente, começar a mandar num partido ainda demasiado agarrado ao legado de Sócrates e onde os pesos pesados olham ansiosos para todos os sinais que possam vir de António Costa.
Passos Coelho viu o exercício do cargo de primeiro- -ministro unir-lhe o PSD. Só Manuela Ferreira Leite resiste à conversão. De resto, estão todos lá, bem comportados, de Marcelo a Santana, de Marques Mendes ao núcleo fiel a Durão Barroso, com Arnault e Sarmento à cabeça, simulando fidelidade. Mas Passos Coelho não tem ilusões. Sabe que o poder se ocupa: e, por isso, vai colocando os seus homens, jovens saídos da JSD, como ele. No Governo tem Miguel Relvas (e Carlos Moedas). No partido tem Moreira da Silva (e Pedro Pinto). E um marca, e contrabalança, o outro, enquanto Marco António Costa tentar construir uma carreira autónoma a partir do Norte.
A Seguro falta poder para distribuir. Muitos deputados são de Sócrates. E os que não são ainda não têm a certeza do que quer António Costa, que nas eleições da sucessão se fez representar por Francisco Assis enquanto reflete se prefere candidatar-se a São Bento ou a Belém. Esta realidade, na qual também pesam as responsabilidades dos últimos seis anos, é um caldo difícil de gerir. Seguro precisa de afrontar as eleições autárquicas com todas as suas escolhas, sem limitações. Só uma vitória nessa primeira grande sondagem nacional à governação lhe permitirá acabar com as dúvidas à sua volta. E nessa corrida contra o tempo não pode hesitar nem ter contemplações nas escolhas.
No PSD, o período de oposição fez três vítimas: Marques Mendes, Manuela Ferreira Leite e Luís Filipe Menezes. E, antes, também houve quem apostasse que Durão Barroso nunca chegaria sequer a primeiro- -ministro.
No PS pós-Mário Soares queimaram-se as lideranças de Vítor Constâncio e Jorge Sampaio. Nunca é fácil estar na liderança da oposição. Os recados são sempre muitos (ver artigos desta semana de Manuel Maria Carrilho no DN e de Francisco Assis no Público) e as ambições também. Sobra estar no partido com a máxima que José Sócrates lembrava repetidamente enquanto inquilino de São Bento: "Só se passa por aqui uma vez." Ao menos nessa convicção estava inteiramente certo...
Podem os partidos um dia mudar, abrirem-se à sociedade civil, aos "simpatizantes" que Assis também propunha para o PS? Será que um dia as primárias, autárquicas e nacionais, serão até abertas aos não militantes? Pode ser que sim, mas vai demorar muito tempo. A crise, como se vê, ainda não é suficiente para produzir o milagre nas células que a Democracia, apesar de tudo, não pode dispensar...
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Não há quem os ensine a falar?!
.
Não há quem os ensine a falar?!
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Felizmente os doutores de Economia não costumam ir para doutores dos bancos de urgência. Nestes, quando uma mãe leva lá o filhinho constipado, o médico receita um comprimido de paracetamol e diz que a febre vai baixar. Se a mãe for galinha e destravada, pergunta: "Mas, doutor, o meu menino pode vir a ter um cancro no pâncreas?" Ao que o médico de hospital só pode responder: "Oh, minha senhora, dê o comprimido ao miúdo e tenha juízo ..." Isso, nas urgências, porque se sucede no intervalo do encontro dos ministros das Finanças da UE, como agora se realiza em Copenhaga, abordar um doutor de Economia pode começar bem mas logo tresmalha. Por exemplo, o professor Vítor Constâncio fez o discurso a que o bom senso obriga: os spreads (é como se diz febre em economês) estão a baixar para Portugal e os mercados (é como se diz vírus) estão a acalmar... Enfim, disse bem e não mentia. O problema é que Constâncio estava rodeado de jornalistas e, como se sabe, nada mais parecido com mães destravadas do que um tipo com microfone: "Mas, doutor, o meu Portugal vai ser obrigado a segundo resgate [é como se diz, para países, cancro no pâncreas]?", lançou um jornalista. O doutor devia tê-lo mandado passear. Mas o doutor não era de banco de urgência e deu a resposta parva de um vice-presidente do Banco Central Europeu: que tudo era possível, cancro e segundo resgate. Enfim, mostrou como é possível estarmos nas mãos de incompetentes da palavra.
In DN
Não há quem os ensine a falar?!
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Felizmente os doutores de Economia não costumam ir para doutores dos bancos de urgência. Nestes, quando uma mãe leva lá o filhinho constipado, o médico receita um comprimido de paracetamol e diz que a febre vai baixar. Se a mãe for galinha e destravada, pergunta: "Mas, doutor, o meu menino pode vir a ter um cancro no pâncreas?" Ao que o médico de hospital só pode responder: "Oh, minha senhora, dê o comprimido ao miúdo e tenha juízo ..." Isso, nas urgências, porque se sucede no intervalo do encontro dos ministros das Finanças da UE, como agora se realiza em Copenhaga, abordar um doutor de Economia pode começar bem mas logo tresmalha. Por exemplo, o professor Vítor Constâncio fez o discurso a que o bom senso obriga: os spreads (é como se diz febre em economês) estão a baixar para Portugal e os mercados (é como se diz vírus) estão a acalmar... Enfim, disse bem e não mentia. O problema é que Constâncio estava rodeado de jornalistas e, como se sabe, nada mais parecido com mães destravadas do que um tipo com microfone: "Mas, doutor, o meu Portugal vai ser obrigado a segundo resgate [é como se diz, para países, cancro no pâncreas]?", lançou um jornalista. O doutor devia tê-lo mandado passear. Mas o doutor não era de banco de urgência e deu a resposta parva de um vice-presidente do Banco Central Europeu: que tudo era possível, cancro e segundo resgate. Enfim, mostrou como é possível estarmos nas mãos de incompetentes da palavra.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
(1 de) Abril em Portugal
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(1 de) Abril em Portugal
por ALBERTO GONÇALVES
Hoje
Após impor a redução drástica na quantidade de freguesias e de municípios, o Governo recusou patrocinar o desleixo das autarquias que sobraram. Confrontado com as súplicas para que o Estado central patrocinasse dois mil milhões de euros das dívidas do poder local à banca, cerca de um sexto da dívida total, Pedro Passos Coelho parafraseou o que, com liberdade poética, um jornal disse que Gerald Ford disse à falida câmara de Nova Iorque em 1975: vão morrer longe.
Apesar da reacção furiosa da ANMP e de Miguel Relvas, que depois de demitido por razões familiares passou a assinar um comentário regular na TVI muito crítico para com os seus ex-colegas, a decisão não surpreendeu ninguém, vinda de um Executivo que privilegia a opção pelos cortes na despesa em lugar do saque aos contribuintes. Aqui e ali, sucedem-se as medidas de contenção, traduzidas na abolição de centenas de institutos públicos e similares, nas privatizações da RTP, da CP e da TAP, na partilha da Vespa de Pedro Mota Soares por parte de sete ministros e nos "cortes" no funcionalismo e nas nomeações.
Talvez o "corte" mais polémico, a extinção do Ministério da Economia vem permitindo a redução do défice sem perturbar a recuperação da actividade económica e da confiança dos consumidores. Desde que se viram entregues a si próprias, as pequenas, médias e grandes empresas sobreviventes depressa adquiriram uma inédita capacidade de se desenrascar no mercado interno e, frequentemente, no externo. Graças a estes progressos e a uma revisão a sério do código laboral, o desemprego continua a cair a pique. Álvaro Santos Pereira, que entretanto regressou ao Canadá, foi dos raros portugueses a emigrar no primeiro trimestre do ano.
Mesmo os "agentes" da "cultura", o habitual barómetro invertido do acerto governativo, ameaçam diariamente partir rumo a paragens onde lhes reconheçam o mérito mas permanecem por cá, a exibir desagrado pelo cancelamento da Capital Europeia da Cultura, o fim dos subsídios ao "audiovisual" e a venda do CCB a uma fábrica de candeeiros chinesa.
Na oposição, descontados os queixumes de "históricos" como Mário Soares e Manuel Alegre, de súbito reunidos à frente de uma Plataforma Indignada de Luta pela Invocação da Memória (PILIM), nenhuma voz se ouviu no PS actual contra a proposta de António José Seguro para que o partido assumisse o seu papel na crise agora terminada e, por pudor, mudasse de programa e de nome. Por enquanto, ambos são segredo. A propósito de embaraços socialistas, o eng. Sócrates, que recentemente se mudou para Luanda e, sem qualquer "cunha", se inscreveu num doutoramento na Universidade Agostinho Neto, continua a ser julgado à revelia em dois ou três processos judiciais.
Sob o tradicional mando do PCP e com a tradicional colagem do Bloco, a CGTP mostra-se preocupada com a melhoria das condições de vida e desatou a convocar greves gerais todas as terças e quintas. Na penúltima, 17 sujeitos e uma criança desceram a Av. da Liberdade. Da última não houve notícia.
Da Presidência da República também se sabe pouco, excepto que há meses que Cavaco Silva deixou de falar aos jornalistas, escrever prefácios, actualizar o Facebook e, em suma, estabelecer alguma forma de contacto com os cidadãos. Em troca, segundo as sondagens, os cidadãos dedicam-lhe uma subida vertiginosa nos índices de popularidade.
Portugal tinha de acertar um dia, nem que fosse o dos enganos.
Quinta-feira, 29 de março
A 17 de Março, Fabrice Muamba, futebolista do clube inglês Bolton, sofreu uma paragem cardíaca durante um jogo e quase morreu. Em simultâneo, Liam Stacey, um galês de 21 anos, aproveitou para se divertir à custa do caso no seu Twitter, no qual escreveu umas graçolas sobre o infortúnio de Muamba e insultos à respectiva etnia (Muamba é preto).
Até aqui, tudo normal: temos um sujeito que sofre de um problema físico e outro sujeito que sofre de um problema mental. A partir daqui, as coisas ficam estranhas: alguns utilizadores da referida "rede social" mostraram-se ofendidos com as palermices do sr. Stacey e, após um processo cujos pormenores me escapam, num ápice o sr. Satcey viu-se diante de um juiz de Swansea que o condenou a 56 dias de prisão para, cito, "reflectir a indignação suscitada".
A indignação ainda se compreende. A condenação nem por isso. Bem sei que os universos em causa, leia-se o futebol e a Internet, são particularmente dados à cordialidade e à sensatez, o que facilitou a repulsa às atoardas do sr. Stacey. Porém, nem todos os sectores da sociedade se regem por tão elevados valores: se o sistema judicial começa a punir a estupidez, conviria que percebesse que nunca terminará a tarefa. O sr. Stacey é um idiota? Provavelmente. Mas a idiotia, permanente ou ocasional, é uma característica distribuída com generosidade pela espécie. Sobretudo a espécie de maluquinhos que, a fim de tornar o mundo um lugar melhor, se empenha em transformá-lo primeiro num lugar inabitável.
Sexta-feira, 30 de março
Quando, em Julho do ano passado, o norueguês Anders Behring Breivik assassinou 69 pessoas numa ilha de Oslo, o Ocidente depressa percebeu que a culpa do massacre era partilhada pelo sr. Breivik e pela "cultura de morte" que ele representava. Sendo cristão, conservador, islamofóbico e, constou, sionista (?) e até maçon, não surpreendeu nada que o sr. Breivik imitasse a actividade favorita de inúmeros cristãos, conservadores, islamofóbicos, sionistas e maçons e desatasse aos tiros a quem lhe aparecesse pela frente.
Quando, ao longo das últimas semanas, Mohamed Merah matou dois soldados franceses de ascendência argelina, um soldado francês de ascendência caribenha, um rabino e três crianças de uma escola judaica, o caso revelou outra complexidade. E o Ocidente revelou outra cautela no diagnóstico. Afinal, o sr. Merah era um simpático muçulmano, cuja acção desesperada não comprometia ninguém: os muçulmanos simpáticos não se celebrizaram por matar à toa. Os devotos de Alá, de resto, mostraram-se imediatamente constrangidos pelos crimes, embora menos por pena das vítimas do que por receio de que os crimes implicassem consequências desagradáveis sobre a comunidade islâmica em França, no fundo a verdadeira vítima do sucedido. E será que o sr. Merah foi o verdadeiro culpado?
Aparentemente, nem por isso. Mesmo à distância de Oxford, o "intelectual" Tariq Ramadan viu tudo, compreendeu tudo e explicou quase tudo. Em suma, o sr. Merah via- -se discriminado graças à sua origem, à cor da sua pele, à sua religião e ao seu nome. O que ele perseguia, garante Ramadan, não divergia das ambições do mais banal e honrado dos mortais: igualdade, dignidade, estabilidade, um emprego decente e um lugar para viver. Por azar, a sociedade não prestou a devida atenção aos incontáveis méritos do rapaz e, "cidadão privado de autêntica dignidade", o rapaz acabou forçado a enveredar pelo recurso comum a tantos desprezados, leia--se a chacina. Não se trata apenas de não comprometer o islão: os actos do sr. Merah não o comprometem nem a ele próprio.
Aliás, uma versão alternativa do sucedido, tipicamente disseminada pela Internet, jura que o sr. Merah pertencia aos serviços secretos franceses, os quais, a mando de Israel, o obrigaram a cometer os homicídios a título de provocação. E ainda há o pai de Merah, que pretende processar o Estado francês pela morte injustificada do filho. Há a professora francesa que submeteu os alunos a um minuto de silêncio em homenagem ao sr. Merah. Há os trinta jovens muçulmanos que, em Toulouse, desfilaram em memória do sr. Merah. Há o rapaz judeu agredido em Paris, os disparos contra um centro cultural judaico em Sarcelles e os graffiti obscenos na parede de uma sinagoga em Sartrouville, acontecimentos posteriores às proezas do sr. Merah mas banais no quotidiano francês e europeu. E há, convém não esquecer, os principais culpados do drama: as crianças cuja morte serviu uma tentativa de conspurcar a honra do doce, oprimido e inocente homem que as matou. Felizmente, como se nota, a tentativa falhou.
Millôr Fernandes, que morreu na terça-feira, tinha imensas virtudes. Lembro uma: ser de esquerda e apreciado por quem nunca o foi. É verdade que a convicção não era ortodoxa ("A direita acredita cegamente em tudo que lhe ensinaram, a esquerda acredita cegamente em tudo que ensina"). É verdade que a convicção não era tonta ("O comunismo é uma espécie de alfaiate que quando a roupa não fica boa faz alterações no cliente"). É verdade que a convicção não se estendia às unanimidades do meio como Chico Buarque ("Desconfio de todo o idealista que lucra com seu ideal") ou Lula ("A ignorância lhe subiu à cabeça"). Mas as limitações da ideologia que ridicularizava não apoucam o mérito de Millôr. E a noção do ridículo eleva-lhe a lucidez
In DN
(1 de) Abril em Portugal
por ALBERTO GONÇALVES
Hoje
Após impor a redução drástica na quantidade de freguesias e de municípios, o Governo recusou patrocinar o desleixo das autarquias que sobraram. Confrontado com as súplicas para que o Estado central patrocinasse dois mil milhões de euros das dívidas do poder local à banca, cerca de um sexto da dívida total, Pedro Passos Coelho parafraseou o que, com liberdade poética, um jornal disse que Gerald Ford disse à falida câmara de Nova Iorque em 1975: vão morrer longe.
Apesar da reacção furiosa da ANMP e de Miguel Relvas, que depois de demitido por razões familiares passou a assinar um comentário regular na TVI muito crítico para com os seus ex-colegas, a decisão não surpreendeu ninguém, vinda de um Executivo que privilegia a opção pelos cortes na despesa em lugar do saque aos contribuintes. Aqui e ali, sucedem-se as medidas de contenção, traduzidas na abolição de centenas de institutos públicos e similares, nas privatizações da RTP, da CP e da TAP, na partilha da Vespa de Pedro Mota Soares por parte de sete ministros e nos "cortes" no funcionalismo e nas nomeações.
Talvez o "corte" mais polémico, a extinção do Ministério da Economia vem permitindo a redução do défice sem perturbar a recuperação da actividade económica e da confiança dos consumidores. Desde que se viram entregues a si próprias, as pequenas, médias e grandes empresas sobreviventes depressa adquiriram uma inédita capacidade de se desenrascar no mercado interno e, frequentemente, no externo. Graças a estes progressos e a uma revisão a sério do código laboral, o desemprego continua a cair a pique. Álvaro Santos Pereira, que entretanto regressou ao Canadá, foi dos raros portugueses a emigrar no primeiro trimestre do ano.
Mesmo os "agentes" da "cultura", o habitual barómetro invertido do acerto governativo, ameaçam diariamente partir rumo a paragens onde lhes reconheçam o mérito mas permanecem por cá, a exibir desagrado pelo cancelamento da Capital Europeia da Cultura, o fim dos subsídios ao "audiovisual" e a venda do CCB a uma fábrica de candeeiros chinesa.
Na oposição, descontados os queixumes de "históricos" como Mário Soares e Manuel Alegre, de súbito reunidos à frente de uma Plataforma Indignada de Luta pela Invocação da Memória (PILIM), nenhuma voz se ouviu no PS actual contra a proposta de António José Seguro para que o partido assumisse o seu papel na crise agora terminada e, por pudor, mudasse de programa e de nome. Por enquanto, ambos são segredo. A propósito de embaraços socialistas, o eng. Sócrates, que recentemente se mudou para Luanda e, sem qualquer "cunha", se inscreveu num doutoramento na Universidade Agostinho Neto, continua a ser julgado à revelia em dois ou três processos judiciais.
Sob o tradicional mando do PCP e com a tradicional colagem do Bloco, a CGTP mostra-se preocupada com a melhoria das condições de vida e desatou a convocar greves gerais todas as terças e quintas. Na penúltima, 17 sujeitos e uma criança desceram a Av. da Liberdade. Da última não houve notícia.
Da Presidência da República também se sabe pouco, excepto que há meses que Cavaco Silva deixou de falar aos jornalistas, escrever prefácios, actualizar o Facebook e, em suma, estabelecer alguma forma de contacto com os cidadãos. Em troca, segundo as sondagens, os cidadãos dedicam-lhe uma subida vertiginosa nos índices de popularidade.
Portugal tinha de acertar um dia, nem que fosse o dos enganos.
Quinta-feira, 29 de março
A 17 de Março, Fabrice Muamba, futebolista do clube inglês Bolton, sofreu uma paragem cardíaca durante um jogo e quase morreu. Em simultâneo, Liam Stacey, um galês de 21 anos, aproveitou para se divertir à custa do caso no seu Twitter, no qual escreveu umas graçolas sobre o infortúnio de Muamba e insultos à respectiva etnia (Muamba é preto).
Até aqui, tudo normal: temos um sujeito que sofre de um problema físico e outro sujeito que sofre de um problema mental. A partir daqui, as coisas ficam estranhas: alguns utilizadores da referida "rede social" mostraram-se ofendidos com as palermices do sr. Stacey e, após um processo cujos pormenores me escapam, num ápice o sr. Satcey viu-se diante de um juiz de Swansea que o condenou a 56 dias de prisão para, cito, "reflectir a indignação suscitada".
A indignação ainda se compreende. A condenação nem por isso. Bem sei que os universos em causa, leia-se o futebol e a Internet, são particularmente dados à cordialidade e à sensatez, o que facilitou a repulsa às atoardas do sr. Stacey. Porém, nem todos os sectores da sociedade se regem por tão elevados valores: se o sistema judicial começa a punir a estupidez, conviria que percebesse que nunca terminará a tarefa. O sr. Stacey é um idiota? Provavelmente. Mas a idiotia, permanente ou ocasional, é uma característica distribuída com generosidade pela espécie. Sobretudo a espécie de maluquinhos que, a fim de tornar o mundo um lugar melhor, se empenha em transformá-lo primeiro num lugar inabitável.
Sexta-feira, 30 de março
Quando, em Julho do ano passado, o norueguês Anders Behring Breivik assassinou 69 pessoas numa ilha de Oslo, o Ocidente depressa percebeu que a culpa do massacre era partilhada pelo sr. Breivik e pela "cultura de morte" que ele representava. Sendo cristão, conservador, islamofóbico e, constou, sionista (?) e até maçon, não surpreendeu nada que o sr. Breivik imitasse a actividade favorita de inúmeros cristãos, conservadores, islamofóbicos, sionistas e maçons e desatasse aos tiros a quem lhe aparecesse pela frente.
Quando, ao longo das últimas semanas, Mohamed Merah matou dois soldados franceses de ascendência argelina, um soldado francês de ascendência caribenha, um rabino e três crianças de uma escola judaica, o caso revelou outra complexidade. E o Ocidente revelou outra cautela no diagnóstico. Afinal, o sr. Merah era um simpático muçulmano, cuja acção desesperada não comprometia ninguém: os muçulmanos simpáticos não se celebrizaram por matar à toa. Os devotos de Alá, de resto, mostraram-se imediatamente constrangidos pelos crimes, embora menos por pena das vítimas do que por receio de que os crimes implicassem consequências desagradáveis sobre a comunidade islâmica em França, no fundo a verdadeira vítima do sucedido. E será que o sr. Merah foi o verdadeiro culpado?
Aparentemente, nem por isso. Mesmo à distância de Oxford, o "intelectual" Tariq Ramadan viu tudo, compreendeu tudo e explicou quase tudo. Em suma, o sr. Merah via- -se discriminado graças à sua origem, à cor da sua pele, à sua religião e ao seu nome. O que ele perseguia, garante Ramadan, não divergia das ambições do mais banal e honrado dos mortais: igualdade, dignidade, estabilidade, um emprego decente e um lugar para viver. Por azar, a sociedade não prestou a devida atenção aos incontáveis méritos do rapaz e, "cidadão privado de autêntica dignidade", o rapaz acabou forçado a enveredar pelo recurso comum a tantos desprezados, leia--se a chacina. Não se trata apenas de não comprometer o islão: os actos do sr. Merah não o comprometem nem a ele próprio.
Aliás, uma versão alternativa do sucedido, tipicamente disseminada pela Internet, jura que o sr. Merah pertencia aos serviços secretos franceses, os quais, a mando de Israel, o obrigaram a cometer os homicídios a título de provocação. E ainda há o pai de Merah, que pretende processar o Estado francês pela morte injustificada do filho. Há a professora francesa que submeteu os alunos a um minuto de silêncio em homenagem ao sr. Merah. Há os trinta jovens muçulmanos que, em Toulouse, desfilaram em memória do sr. Merah. Há o rapaz judeu agredido em Paris, os disparos contra um centro cultural judaico em Sarcelles e os graffiti obscenos na parede de uma sinagoga em Sartrouville, acontecimentos posteriores às proezas do sr. Merah mas banais no quotidiano francês e europeu. E há, convém não esquecer, os principais culpados do drama: as crianças cuja morte serviu uma tentativa de conspurcar a honra do doce, oprimido e inocente homem que as matou. Felizmente, como se nota, a tentativa falhou.
Millôr Fernandes, que morreu na terça-feira, tinha imensas virtudes. Lembro uma: ser de esquerda e apreciado por quem nunca o foi. É verdade que a convicção não era ortodoxa ("A direita acredita cegamente em tudo que lhe ensinaram, a esquerda acredita cegamente em tudo que ensina"). É verdade que a convicção não era tonta ("O comunismo é uma espécie de alfaiate que quando a roupa não fica boa faz alterações no cliente"). É verdade que a convicção não se estendia às unanimidades do meio como Chico Buarque ("Desconfio de todo o idealista que lucra com seu ideal") ou Lula ("A ignorância lhe subiu à cabeça"). Mas as limitações da ideologia que ridicularizava não apoucam o mérito de Millôr. E a noção do ridículo eleva-lhe a lucidez
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Um sinal
.
Um sinal
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
Do Congresso do PSD não se esperavam grandes novidades. Um evento deste tipo com o partido no poder arriscava-se a não passar dum momento de apologia ao líder, dum não acabar de críticas à oposição e ao anterior Governo, duns desabafos dos representantes das autarquias e das inevitáveis pequenas lutas internas por este ou aquele lugar. Não seria também expectável que fosse ali que o primeiro-ministro, duma vez por todas, mostrasse que tem um caminho para o País para além do acordo com a troika, uma ideia sobre a Europa ou que nos revelasse que tipo de milagre irá acontecer para que o tão ansiado crescimento económico aconteça.
O errático e pouco preparado discurso de Passos Coelho no início dos trabalhos confirmava a convicção de que, de facto, nada de saliente sairia da reunião magna dos sociais-democratas. No entanto, na noite de sábado, percebeu-se que algo poderia estar a mudar no PSD. Passos Coelho entregava o poder no partido a Jorge Moreira da Silva, chegando mesmo a dizer que o primeiro vice-presidente, a partir daquela altura, seria o seu representante máximo no partido.
O partido estava, e provavelmente ainda está, nas mãos de Miguel Relvas, que, com as suas qualidades e os seus defeitos, o controla com mão de ferro. O grande obreiro da vitória de Passos Coelho nas eleições internas tinha, ao tempo, grande influência na máquina do PSD, e com a vitória de Passos Coelho no partido, e depois nas eleições nacionais, ainda mais reforçou o seu poder. Foi, claro está, esse poder que o levou a ter um papel central no Governo, e sem essa força a sua posição inevitavelmente fica muito enfraquecida, não só no partido mas também no Executivo. Quem controla a máquina partidária controla o aparelho de Estado. Infelizmente, é essa a realidade. A Miguel Relvas foi retirado o suporte do seu poder, foi ele o grande derrotado do Congresso e ninguém estaria à espera disso.
Com a escolha de Moreira da Silva, Passos coloca alguém que é o exacto oposto do ministro dos Assuntos Parlamentares. O ex-secretário de Estado da Ciência e Ensino Superior é alguém com curriculum fora do partido, com uma visão profunda dos problemas europeus, com uma carreira digna de nota nas Nações Unidas e com um discurso político bem definido e verdadeiramente social-democrata, concorde-se ou não com essa linha (será interessante observar como é que o primeiro-ministro lidará com o seu primeiro vice-presidente que é convictamente social-democrata, quando a linha seguida pelo seu Governo decididamente vai por outro rumo). Curiosamente, a ninguém presente no Congresso terá escapado que o discurso de encerramento de Passos Coelho teve várias semelhanças com o proferido pelo novo vice-presidente na noite anterior. Por outro lado, e a nível interno do partido, Moreira da Silva não parece ser propriamente um seguidor da linha de Miguel Relvas, longe disso.
A tarefa de Jorge Moreira da Silva dificilmente podia ser mais complicada. Preparar o partido para umas eleições autárquicas em que os sociais-democratas se arriscam a uma derrota histórica, as eleições nos Açores, que em circunstâncias normais seriam um passeio até à vitória, e acalmar os militantes que, como todos os portugueses, vão, mais cedo ou mais tarde, contestar as opções do Governo. Como se tudo isto fosse pouco, Moreira da Silva tem a tarefa ciclópica de reestruturar o PSD. E esta é, sem dúvida, a mais importante e de longe a mais difícil tarefa que tem pela frente. Basta olhar para o grupo parlamentar, ver as intervenções de dirigentes do partido na comunicação social ou ter estado atento ao congresso da passada semana para perceber o quanto o partido está necessitado de sangue novo (não confundir com gente jovem de idade), de conseguir captar bons profissionais das várias áreas, de gerar debate interno e de não desperdiçar os históricos sociais-democratas que tanto podiam trazer ao partido.
O presidente do PSD mostrou claramente que quer mudar o partido. Falta reformular o Governo, retirando pessoas que manifestamente não estão à altura da exigência dos cargos. E, sobretudo, mudar o rumo da governação.
Foi dado um primeiro passo, e não parece que tenha sido pequeno. Haja esperança
In DN
Um sinal
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
Do Congresso do PSD não se esperavam grandes novidades. Um evento deste tipo com o partido no poder arriscava-se a não passar dum momento de apologia ao líder, dum não acabar de críticas à oposição e ao anterior Governo, duns desabafos dos representantes das autarquias e das inevitáveis pequenas lutas internas por este ou aquele lugar. Não seria também expectável que fosse ali que o primeiro-ministro, duma vez por todas, mostrasse que tem um caminho para o País para além do acordo com a troika, uma ideia sobre a Europa ou que nos revelasse que tipo de milagre irá acontecer para que o tão ansiado crescimento económico aconteça.
O errático e pouco preparado discurso de Passos Coelho no início dos trabalhos confirmava a convicção de que, de facto, nada de saliente sairia da reunião magna dos sociais-democratas. No entanto, na noite de sábado, percebeu-se que algo poderia estar a mudar no PSD. Passos Coelho entregava o poder no partido a Jorge Moreira da Silva, chegando mesmo a dizer que o primeiro vice-presidente, a partir daquela altura, seria o seu representante máximo no partido.
O partido estava, e provavelmente ainda está, nas mãos de Miguel Relvas, que, com as suas qualidades e os seus defeitos, o controla com mão de ferro. O grande obreiro da vitória de Passos Coelho nas eleições internas tinha, ao tempo, grande influência na máquina do PSD, e com a vitória de Passos Coelho no partido, e depois nas eleições nacionais, ainda mais reforçou o seu poder. Foi, claro está, esse poder que o levou a ter um papel central no Governo, e sem essa força a sua posição inevitavelmente fica muito enfraquecida, não só no partido mas também no Executivo. Quem controla a máquina partidária controla o aparelho de Estado. Infelizmente, é essa a realidade. A Miguel Relvas foi retirado o suporte do seu poder, foi ele o grande derrotado do Congresso e ninguém estaria à espera disso.
Com a escolha de Moreira da Silva, Passos coloca alguém que é o exacto oposto do ministro dos Assuntos Parlamentares. O ex-secretário de Estado da Ciência e Ensino Superior é alguém com curriculum fora do partido, com uma visão profunda dos problemas europeus, com uma carreira digna de nota nas Nações Unidas e com um discurso político bem definido e verdadeiramente social-democrata, concorde-se ou não com essa linha (será interessante observar como é que o primeiro-ministro lidará com o seu primeiro vice-presidente que é convictamente social-democrata, quando a linha seguida pelo seu Governo decididamente vai por outro rumo). Curiosamente, a ninguém presente no Congresso terá escapado que o discurso de encerramento de Passos Coelho teve várias semelhanças com o proferido pelo novo vice-presidente na noite anterior. Por outro lado, e a nível interno do partido, Moreira da Silva não parece ser propriamente um seguidor da linha de Miguel Relvas, longe disso.
A tarefa de Jorge Moreira da Silva dificilmente podia ser mais complicada. Preparar o partido para umas eleições autárquicas em que os sociais-democratas se arriscam a uma derrota histórica, as eleições nos Açores, que em circunstâncias normais seriam um passeio até à vitória, e acalmar os militantes que, como todos os portugueses, vão, mais cedo ou mais tarde, contestar as opções do Governo. Como se tudo isto fosse pouco, Moreira da Silva tem a tarefa ciclópica de reestruturar o PSD. E esta é, sem dúvida, a mais importante e de longe a mais difícil tarefa que tem pela frente. Basta olhar para o grupo parlamentar, ver as intervenções de dirigentes do partido na comunicação social ou ter estado atento ao congresso da passada semana para perceber o quanto o partido está necessitado de sangue novo (não confundir com gente jovem de idade), de conseguir captar bons profissionais das várias áreas, de gerar debate interno e de não desperdiçar os históricos sociais-democratas que tanto podiam trazer ao partido.
O presidente do PSD mostrou claramente que quer mudar o partido. Falta reformular o Governo, retirando pessoas que manifestamente não estão à altura da exigência dos cargos. E, sobretudo, mudar o rumo da governação.
Foi dado um primeiro passo, e não parece que tenha sido pequeno. Haja esperança
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O pecado original
.
O pecado original
por PAULO BALDAIA
Hoje
Seguro é vítima de si próprio. Foi eleito contra o que restava de Sócrates e nunca fez a necessária catarse interna. Herdou um terreno minado e demorou demasiado tempo a perceber que este tipo de conflitos não se resolve com falinhas mansas. Nunca é tarde para um líder se afirmar, mas o tempo corre contra ele.
Se a maioria dos analistas considera que menos de um ano não é tempo suficiente para avaliar a prestação de um governo, por maioria de razão essa necessidade de tempo é vital para uma análise correcta do valor de um líder da oposição. Os militantes do PS elegeram António José Seguro e poderão reelegê-lo ou escolher outro líder no congresso do próximo ano.
Adiante. Olhemos apenas para o terramoto socialista desta semana. Uns deputados tão socráticos como o próprio Sócrates, de onde com demasiada frequência se destaca José Lello, gritaram como virgens ofendidas contra a liderança de Seguro. Não gostaram da disciplina de voto no código laboral, nem da revisão dos estatutos do partido. Como não gostam do penteado de Seguro, nem das camisas que usa, nem de nada que tenha que ver com o Seguro.
Os que mais se ouvem contra a actual liderança não carregam uma folha de serviços prestados à Pátria, são na sua maioria deputados agradecidos pelo que o anterior líder fez por eles e não querem saber de argumentos. Se quisessem argumentar, a luta poderia ser mais difícil mas teria mais eficácia.
Quem fazia parte de um governo, ou de uma bancada, que assinou o memorando com a troika não pode agora fazer de conta que são os malandros da direita que andam a roubar os direitos aos trabalhadores. Quem apoiou a alternativa a Seguro não fazendo discurso no Congresso contra as alterações estatutárias propostas pelo líder não pode agora alegar que não houve debate.
Com uma bancada onde não faltam deputados treinados para a guerrilha interna, mas onde também há muitos bons dirigentes que deveriam ser aproveitados pela liderança, Seguro não pode fazer de conta que o passado só existe para o desculpar pelo apoio que dá ao memorando da troika.
O governo de Sócrates acabou mal, mas começou bem. Houve um espírito reformista que hoje volta a estar na agenda. Houve apostas nas novas tecnologias e nas energias renováveis que não podem ser esquecidas. Assumir, criticando, tudo o que foi má governação e retomar apostas com sentido faz mais pela credibilidade do PS do que assinar de cruz toda a legislação que o actual Governo produz à luz do memorando.
Pelo caminho bem pode Seguro dizer aos deputados guerrilheiros que no seu PS não há espaço para quem coloca os seus interesses pessoais à frente dos interesses do partido e, pior ainda, à frente dos interesses do País.
In DN
O pecado original
por PAULO BALDAIA
Hoje
Seguro é vítima de si próprio. Foi eleito contra o que restava de Sócrates e nunca fez a necessária catarse interna. Herdou um terreno minado e demorou demasiado tempo a perceber que este tipo de conflitos não se resolve com falinhas mansas. Nunca é tarde para um líder se afirmar, mas o tempo corre contra ele.
Se a maioria dos analistas considera que menos de um ano não é tempo suficiente para avaliar a prestação de um governo, por maioria de razão essa necessidade de tempo é vital para uma análise correcta do valor de um líder da oposição. Os militantes do PS elegeram António José Seguro e poderão reelegê-lo ou escolher outro líder no congresso do próximo ano.
Adiante. Olhemos apenas para o terramoto socialista desta semana. Uns deputados tão socráticos como o próprio Sócrates, de onde com demasiada frequência se destaca José Lello, gritaram como virgens ofendidas contra a liderança de Seguro. Não gostaram da disciplina de voto no código laboral, nem da revisão dos estatutos do partido. Como não gostam do penteado de Seguro, nem das camisas que usa, nem de nada que tenha que ver com o Seguro.
Os que mais se ouvem contra a actual liderança não carregam uma folha de serviços prestados à Pátria, são na sua maioria deputados agradecidos pelo que o anterior líder fez por eles e não querem saber de argumentos. Se quisessem argumentar, a luta poderia ser mais difícil mas teria mais eficácia.
Quem fazia parte de um governo, ou de uma bancada, que assinou o memorando com a troika não pode agora fazer de conta que são os malandros da direita que andam a roubar os direitos aos trabalhadores. Quem apoiou a alternativa a Seguro não fazendo discurso no Congresso contra as alterações estatutárias propostas pelo líder não pode agora alegar que não houve debate.
Com uma bancada onde não faltam deputados treinados para a guerrilha interna, mas onde também há muitos bons dirigentes que deveriam ser aproveitados pela liderança, Seguro não pode fazer de conta que o passado só existe para o desculpar pelo apoio que dá ao memorando da troika.
O governo de Sócrates acabou mal, mas começou bem. Houve um espírito reformista que hoje volta a estar na agenda. Houve apostas nas novas tecnologias e nas energias renováveis que não podem ser esquecidas. Assumir, criticando, tudo o que foi má governação e retomar apostas com sentido faz mais pela credibilidade do PS do que assinar de cruz toda a legislação que o actual Governo produz à luz do memorando.
Pelo caminho bem pode Seguro dizer aos deputados guerrilheiros que no seu PS não há espaço para quem coloca os seus interesses pessoais à frente dos interesses do partido e, pior ainda, à frente dos interesses do País.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Processo de tapar cabelos em curso
.
Processo de tapar cabelos em curso
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Escrevi há pouco mais de um ano, aqui, sobre o Egito de então: "De um lado, povo; do outro, ditador. Mas é um jogo com regras complicadas: façam zoom àquelas caras sem véu nem lenço. Estão do lado do povo mas amanhã podem ter de ter véu e lenço em nome de mais alto que o povo. Seria um resultado péssimo (definição de péssimo: pior que mau). Não tenho mestrado em Relações Internacionais mas já vi um filme parecido em 1979"... Era essa memória que me levou a ter feito aquela crónica e dar-lhe por título "Assumidamente sem me empolgar". É que naqueles dias do ano passado havia gente esperançada com as enchentes da Praça Tahrir. Eu não, porque frequento as sessões da minha TV Memória pessoal e tinha (e tenho) demasiado presente o drama iraniano. No Irão, as mulheres esperam há 33 anos. Há 33 anos... - é uma vida para os cabelos, muitos só vão reaparecer mortiços e brancos. Depois daquela crónica sobre o Egito, os Irmãos Muçulmanos (movimento político-religioso que pertence à definição de péssimo dada acima) ganharam as eleições legislativas. No sábado, eles anunciaram que vão concorrer às presidenciais de maio - ao contrário do que diziam antes, para tranquilizar os adversários. O apetite do poder, como sempre, vem com o comer. Isto é, estamos a semanas de os Irmãos Muçulmanos deterem todas as rédeas políticas. Em breve, para voltar a ver cabelos de egípcias vou ter de recorrer à minha TV Memória.
In DN
Processo de tapar cabelos em curso
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Escrevi há pouco mais de um ano, aqui, sobre o Egito de então: "De um lado, povo; do outro, ditador. Mas é um jogo com regras complicadas: façam zoom àquelas caras sem véu nem lenço. Estão do lado do povo mas amanhã podem ter de ter véu e lenço em nome de mais alto que o povo. Seria um resultado péssimo (definição de péssimo: pior que mau). Não tenho mestrado em Relações Internacionais mas já vi um filme parecido em 1979"... Era essa memória que me levou a ter feito aquela crónica e dar-lhe por título "Assumidamente sem me empolgar". É que naqueles dias do ano passado havia gente esperançada com as enchentes da Praça Tahrir. Eu não, porque frequento as sessões da minha TV Memória pessoal e tinha (e tenho) demasiado presente o drama iraniano. No Irão, as mulheres esperam há 33 anos. Há 33 anos... - é uma vida para os cabelos, muitos só vão reaparecer mortiços e brancos. Depois daquela crónica sobre o Egito, os Irmãos Muçulmanos (movimento político-religioso que pertence à definição de péssimo dada acima) ganharam as eleições legislativas. No sábado, eles anunciaram que vão concorrer às presidenciais de maio - ao contrário do que diziam antes, para tranquilizar os adversários. O apetite do poder, como sempre, vem com o comer. Isto é, estamos a semanas de os Irmãos Muçulmanos deterem todas as rédeas políticas. Em breve, para voltar a ver cabelos de egípcias vou ter de recorrer à minha TV Memória.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
O Governo não sabe o que faz
.
O Governo não sabe o que faz
por BAPTISTA-BASTOS
Hoje
Tudo é mau em Portugal. A começar pela vida e a continuar no Governo. E desconhece-se quando e onde o mau vai terminar. O desemprego cresce na directa proporção em que os assaltos aumentam. O poder possui uma visão fantasmagórica do que se passa, e inscreveu as suas decisões numa perspectiva de terror. As diferenças com uma espécie particular de totalitarismo são escassas.
Começa a ser cada vez mais nítido: o Governo não sabe o que faz, nem possui nenhuma estratégia de solução dos nossos problemas. E o ministro da Finanças dá sinais enervantes de cansaço, a que muitos qualificados economistas designam de desfasamento com a realidade, e outros, de incompetência. Passos Coelho anunciou uma linha ferroviária europeia, que não vai existir porque sem continuação em Espanha; o governador do Banco de Portugal assevera que vamos precisar de mais "austeridade" e o primeiro-ministro diz que não, antes pelo contrário; uma reunião, anteontem, na Concertação Social traduziu-se numa barafunda atroz, na qual o pobre João Proença, esquemático e atrapalhado, surgiu como uma criatura, manipulada pelas suas próprias ambivalências. Então ele não sabia que, depois de subscrever aquele infausto documento, sobre as leis do trabalho, que outras coacções se lhe seguiriam? Os cortes na Saúde, que deixam sem tratamento doentes oncológicos, e a diminuição de dias nas baixas por doença, são capítulos de um processo de reversão que põe em causa o próprio Estado Social. Quem for cúmplice deste projecto de demolição dificilmente poderá dizer-se respeitador da ética progressista e do humanismo.
Os próprios patrões começam a espavorir-se com as "indecisões" do Governo, que nada faz para realizar uma política de crescimento e de desenvolvimento económicos. Além de tentar ser fiel a uma ideologia que põe a Europa em perigo, este Executivo demonstra o desprezo sem limites pelo cidadão e pelas suas ansiedades. Apesar de aproveitar de dispositivos de coerção quase nunca vistos. Estamos a emigrar em massa, como na década de 60; e a despovoar o País sem dó nem piedade. Estamos, sobretudo, a subverter o próprio conceito de identidade, e obrigados a desfazer-nos da narrativa que nos diferenciou.
O PS, por seu turno, ainda não encontrou o enquadramento ideológico que forneça ao debate público um interesse sobrelevante de questões insignificantes. Seguro entrou na questiúncula provocada pelo Marcelo, que teceu, na TVI, uma teia reticular de intriga, tão ao seu gosto e estilo. E o secretário-geral socialista, em vez que resolver o berbicacho com um displicente: "Não comento o que dizem os comentadores", embrenhou-se em explicações desnecessárias. Logo o Marcelo ameaçou responder, no próximo domingo.
Que interesse tem isto para as pessoas?
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.
In DN
O Governo não sabe o que faz
por BAPTISTA-BASTOS
Hoje
Tudo é mau em Portugal. A começar pela vida e a continuar no Governo. E desconhece-se quando e onde o mau vai terminar. O desemprego cresce na directa proporção em que os assaltos aumentam. O poder possui uma visão fantasmagórica do que se passa, e inscreveu as suas decisões numa perspectiva de terror. As diferenças com uma espécie particular de totalitarismo são escassas.
Começa a ser cada vez mais nítido: o Governo não sabe o que faz, nem possui nenhuma estratégia de solução dos nossos problemas. E o ministro da Finanças dá sinais enervantes de cansaço, a que muitos qualificados economistas designam de desfasamento com a realidade, e outros, de incompetência. Passos Coelho anunciou uma linha ferroviária europeia, que não vai existir porque sem continuação em Espanha; o governador do Banco de Portugal assevera que vamos precisar de mais "austeridade" e o primeiro-ministro diz que não, antes pelo contrário; uma reunião, anteontem, na Concertação Social traduziu-se numa barafunda atroz, na qual o pobre João Proença, esquemático e atrapalhado, surgiu como uma criatura, manipulada pelas suas próprias ambivalências. Então ele não sabia que, depois de subscrever aquele infausto documento, sobre as leis do trabalho, que outras coacções se lhe seguiriam? Os cortes na Saúde, que deixam sem tratamento doentes oncológicos, e a diminuição de dias nas baixas por doença, são capítulos de um processo de reversão que põe em causa o próprio Estado Social. Quem for cúmplice deste projecto de demolição dificilmente poderá dizer-se respeitador da ética progressista e do humanismo.
Os próprios patrões começam a espavorir-se com as "indecisões" do Governo, que nada faz para realizar uma política de crescimento e de desenvolvimento económicos. Além de tentar ser fiel a uma ideologia que põe a Europa em perigo, este Executivo demonstra o desprezo sem limites pelo cidadão e pelas suas ansiedades. Apesar de aproveitar de dispositivos de coerção quase nunca vistos. Estamos a emigrar em massa, como na década de 60; e a despovoar o País sem dó nem piedade. Estamos, sobretudo, a subverter o próprio conceito de identidade, e obrigados a desfazer-nos da narrativa que nos diferenciou.
O PS, por seu turno, ainda não encontrou o enquadramento ideológico que forneça ao debate público um interesse sobrelevante de questões insignificantes. Seguro entrou na questiúncula provocada pelo Marcelo, que teceu, na TVI, uma teia reticular de intriga, tão ao seu gosto e estilo. E o secretário-geral socialista, em vez que resolver o berbicacho com um displicente: "Não comento o que dizem os comentadores", embrenhou-se em explicações desnecessárias. Logo o Marcelo ameaçou responder, no próximo domingo.
Que interesse tem isto para as pessoas?
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Madrid não é 'El País' de Mourinho
.
Madrid não é 'El País' de Mourinho
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Em Madrid vale tudo contra José Mourinho, se calhar tipo execrável, mete o dedo no olho de um adversário e foge, mas o melhor treinador do mundo. Este ano, quando ele pode tornar-se o único a ganhar campeonatos nacionais em quatro países e o único a ganhar a Champions com três equipas diferentes, movem-lhe uma campanha manhosa, em Espanha. Não seria nada de estranho no mundo de futebol, tão marcado pelo clubismo - basta ler as capas dos nossos diários desportivos também tendenciosas. Mas a campanha a que me refiro não vem dos meios afetos ao Barcelona, seu adversário, mas surpreendentemente do diário El País, jornal sério exceto, agora, no noticiário sobre Mourinho. Ler no El País, assinadas por gente que por lá chamam grandes jornalistas desportivos, sucessivas inventonas sobre problemas entre o treinador e os seus jogadores (em textos que muitas vezes roçam a xenofobia antiportuguesa), espicaça-nos o cinismo: sim, filhos, mas digam lá que ala do Real Madrid que Mourinho afastou é que vos alimenta o ódio... Este jornalismo de compadrio é ainda mais extraordinário porque feito contra uma realidade que todos veem (o clube "em crise" está a bater vários recordes, nomeadamente marcando golos como nunca) e que desmente os desonestos. Quando até num caso de sucesso tão notório um bom jornal se permite campanhas destas acabam-se as ilusões: se hay brujas, haverá também, podem crer, megafones para elas
In DN
Madrid não é 'El País' de Mourinho
por FERREIRA FERNANDES
Hoje
Em Madrid vale tudo contra José Mourinho, se calhar tipo execrável, mete o dedo no olho de um adversário e foge, mas o melhor treinador do mundo. Este ano, quando ele pode tornar-se o único a ganhar campeonatos nacionais em quatro países e o único a ganhar a Champions com três equipas diferentes, movem-lhe uma campanha manhosa, em Espanha. Não seria nada de estranho no mundo de futebol, tão marcado pelo clubismo - basta ler as capas dos nossos diários desportivos também tendenciosas. Mas a campanha a que me refiro não vem dos meios afetos ao Barcelona, seu adversário, mas surpreendentemente do diário El País, jornal sério exceto, agora, no noticiário sobre Mourinho. Ler no El País, assinadas por gente que por lá chamam grandes jornalistas desportivos, sucessivas inventonas sobre problemas entre o treinador e os seus jogadores (em textos que muitas vezes roçam a xenofobia antiportuguesa), espicaça-nos o cinismo: sim, filhos, mas digam lá que ala do Real Madrid que Mourinho afastou é que vos alimenta o ódio... Este jornalismo de compadrio é ainda mais extraordinário porque feito contra uma realidade que todos veem (o clube "em crise" está a bater vários recordes, nomeadamente marcando golos como nunca) e que desmente os desonestos. Quando até num caso de sucesso tão notório um bom jornal se permite campanhas destas acabam-se as ilusões: se hay brujas, haverá também, podem crer, megafones para elas
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
Os mistérios da Caixa Geral de Depósitos
.
Os mistérios da Caixa Geral de Depósitos
por PEDRO TADEU0
3 Abril 2012
No tempo em que Portugal achava que era rico, a banca privada mandava no Governo, nas empresas e no povo. Mesmo assim, apesar das benesses do Estado, dos financiamentos loucos e da usura para a vida sobre cada português que comprou casa, o maior banco do mercado continuou a ser o do Estado.
Em 2005, a Caixa Geral de Depósitos comprou as seguradoras Império Bonança e Seguro Directo, através da sua Fidelidade Mundial, para meter 343 milhões de euros no BCP, que estava a precisar de fundos. O favor deu à Caixa um terço do mercado segurador português, que este ano será privatizado, apesar de valer 38,9% de todo o lucro do banco. Em 2010 achava-se que a privatização valeria 1,5 mil milhões de euros. Agora, toda a gente duvida.
Também em 2005 a Caixa entrou com 80 por cento dos 426 milhões de euros com que a Sumolis comprou a Compal e a Nutricafés. Três anos depois, a Caixa cedeu parte da sua posição à Sumolis por 397 milhões, ficando com apenas 20 por cento da empresa. Este negócio motiva agora uma investigação do Ministério Público, que suspeita de fuga ao fisco caucionada pela CGD, numa alegada fraude de 5,7 milhões de euros.
Desde a nacionalização do BPN até à anunciada venda ao BIC, por apenas 40 milhões de euros, a Caixa meteu ali 4,2 mil milhões de euros. Há uma promessa de o Estado pagar, até 2020, 3,9 mil milhões pelo favor. O resto logo se vê.
O grupo José de Mello precisa que a banca lhe empreste uns 500 milhões para poder fazer uma OPA à Brisa. Quem vai ajudar na operação? A Caixa, claro, mais uns euros vindos do BCP e do BES.
Na Cimpor, a Caixa, que em 2009 comprou ações a um preço superior em 25% ao valor de mercado para ficar com cerca de 10% da empresa, recusou, há semanas, vender essas ações - na sequência de uma luta pelo poder dentro da empresa - a 6,18 euros cada. Agora diz-se disposta, depois de uma ordem do Governo, a vender a 5,5 euros, favorecendo assim uma das partes em luta.
Esta história de gestão do banco do Estado, que se mete em trapalhadas suspeitas, que esbanja dinheiro de forma incompreensível, que aplica políticas contrárias aos seus interesses, que é suspeita da justiça, levará qualquer um de nós à indignação. Os que defendem a privatização deste banco encontrarão razões para defender a sua tese. Os que valorizam o papel de um banco do Estado forte, mas livre da dependência de interesses obscuros, também.
A pergunta que deixo é óbvia: por este caminho, vão mesmo ser capazes de, um dia, arruinar de vez a Caixa. Quem ganhará com isso?
In DN
Os mistérios da Caixa Geral de Depósitos
por PEDRO TADEU0
3 Abril 2012
No tempo em que Portugal achava que era rico, a banca privada mandava no Governo, nas empresas e no povo. Mesmo assim, apesar das benesses do Estado, dos financiamentos loucos e da usura para a vida sobre cada português que comprou casa, o maior banco do mercado continuou a ser o do Estado.
Em 2005, a Caixa Geral de Depósitos comprou as seguradoras Império Bonança e Seguro Directo, através da sua Fidelidade Mundial, para meter 343 milhões de euros no BCP, que estava a precisar de fundos. O favor deu à Caixa um terço do mercado segurador português, que este ano será privatizado, apesar de valer 38,9% de todo o lucro do banco. Em 2010 achava-se que a privatização valeria 1,5 mil milhões de euros. Agora, toda a gente duvida.
Também em 2005 a Caixa entrou com 80 por cento dos 426 milhões de euros com que a Sumolis comprou a Compal e a Nutricafés. Três anos depois, a Caixa cedeu parte da sua posição à Sumolis por 397 milhões, ficando com apenas 20 por cento da empresa. Este negócio motiva agora uma investigação do Ministério Público, que suspeita de fuga ao fisco caucionada pela CGD, numa alegada fraude de 5,7 milhões de euros.
Desde a nacionalização do BPN até à anunciada venda ao BIC, por apenas 40 milhões de euros, a Caixa meteu ali 4,2 mil milhões de euros. Há uma promessa de o Estado pagar, até 2020, 3,9 mil milhões pelo favor. O resto logo se vê.
O grupo José de Mello precisa que a banca lhe empreste uns 500 milhões para poder fazer uma OPA à Brisa. Quem vai ajudar na operação? A Caixa, claro, mais uns euros vindos do BCP e do BES.
Na Cimpor, a Caixa, que em 2009 comprou ações a um preço superior em 25% ao valor de mercado para ficar com cerca de 10% da empresa, recusou, há semanas, vender essas ações - na sequência de uma luta pelo poder dentro da empresa - a 6,18 euros cada. Agora diz-se disposta, depois de uma ordem do Governo, a vender a 5,5 euros, favorecendo assim uma das partes em luta.
Esta história de gestão do banco do Estado, que se mete em trapalhadas suspeitas, que esbanja dinheiro de forma incompreensível, que aplica políticas contrárias aos seus interesses, que é suspeita da justiça, levará qualquer um de nós à indignação. Os que defendem a privatização deste banco encontrarão razões para defender a sua tese. Os que valorizam o papel de um banco do Estado forte, mas livre da dependência de interesses obscuros, também.
A pergunta que deixo é óbvia: por este caminho, vão mesmo ser capazes de, um dia, arruinar de vez a Caixa. Quem ganhará com isso?
In DN
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
O pacto suicida
.
O pacto suicida
por Pedro Marques Lopes
Hoje
1O primeiro-ministro disse, na última quinta-feira, que o chamado pacto orçamental não era de esquerda nem de direita. Dando por boa a afirmação, pelo menos nenhum dos quadrantes políticos fica envergonhado com a enormidade que a esmagadora maioria dos deputados aprovou.
O pacto diz muito sobre o caminho que a Europa vem percorrendo.
Para não variar, os cidadãos não são chamados a dar a sua opinião sobre mais um verdadeiro momento fundador. Dir-se-á que estamos apenas perante o aprofundamento de decisões que retiraram soberania aos Estados e que não se justificaria desta vez consultar directamente os cidadãos, o mal ou o bem já estaria feito. Pode ser, porém importa recordar que em matérias de soberania, provavelmente as únicas, não há representação que possa substituir o voto directo. A verdadeira crise europeia é, nunca é demais repetir, política. Mas vai muito para lá da questão do papel do BCE, planos de crescimento económico, maior integração de políticas fiscais, menor ou maior federalismo, mais ou menos défice, maior ou menor dívida pública. É sobretudo na dimensão do fundamental papel dos cidadãos de decidir o que de facto querem, de os envolver nos processos de decisão, do seu cabal esclarecimento sobre os caminhos a trilhar. A inexistência de discussão pública deste tratado leva a que a população não faça a mais pequena ideia do que de facto está em causa e das consequências que advirão para as suas vidas e para a comunidade. Aí está mais um péssimo exemplo do caminho que está a ser traçado.
Esta aberração em forma de tratado institui a visão merkeliana do que deve ser a Europa. Dividida entre os mui sérios e disciplinados países e os pequenotes que não se sabem comportar e que devem ser postos na linha pelos primeiros. Esqueçamos a Europa em que os cidadãos seriam tratados de forma idêntica mas respeitando a especificidade dos países, o seu estado de desenvolvimento, as suas idiossincrasias ou as suas debilidades. Não senhor, o que a Alemanha e o seu ajudante francês pensam para nós e os outros países mal comportados e preguiçosos é o que está certo.
Nem de direita nem de esquerda, dizia o primeiro-ministro. Melhor, o pacto institui a ausência de alternativa. A partir de agora, quando votarmos, apenas escolheremos pessoas, representantes não dos eleitores nacionais mas de outras gentes, já que as políticas serão exactamente as mesmas. O principal instrumento político, leia-se o Orçamento, perde quase toda a sua importância. Tudo isto em razão do sacrossanto equilíbrio orçamental, como se esse equilíbrio por artes mágicas criasse emprego, desenvolvimento económico e investimento. E não vale a pena vir com a conversa oca de que quando se fala disto se faz apelos a desequilíbrios, a despesismos, descontrolos orçamentais ou ao mais demagógico dos disparates que é o dos encargos para as gerações futuras, como se o investimento em escolas, estradas, tecnologia, hospitais fossem encargos.
Especificamente para Portugal, as consequências da ratificação deste tratado são simples. Das duas uma, ou Portugal cumpre os objectivos constantes no pacto orçamental que pura e simplesmente obsta a implementação de políticas de crescimento e impõe metas absolutamente irrealistas para o decréscimo do défice e da dívida pública (só para referir os exemplos mais gritantes), obrigando na realidade a cortes que destruiriam de facto por inteiro o Estado social e que fariam disparar ainda mais o desemprego e as falências, ou seja, o nosso país chegaria ao fim do processo na mais profunda miséria, ou não os cumpre, os tais objectivos, e sujeitar-se-á a penalizações gravíssimas que, no limite, o afastará do euro com as consequências conhecidas e o arrastará também para a miséria. Venha o diabo e escolha.
Sim, este pacto não é de esquerda nem de direita, é apenas suicida para Portugal e para a Europa.
2A taxa sobre o comércio de alimentos não é mais do que um imposto encapotado.
Ao contrário do que a ministra pensa, não serão as grandes e médias superfícies a pagar o que quer que seja, quem irá pagar este novo custo serão os consumidores. Os mais ricos e os mais pobres. São, aliás, os mais pobres os que recorrem mais aos hipermercados e grandes cadeias de comércio alimentar, por uma razão muito simples: são mais baratos, sobretudo neste tipo de produtos. Temos assim um novo imposto que penalizará ainda mais os que mais sofrem com a austeridade.
Quanto à promessa de que não íamos ter mais subidas de impostos, novas medidas de austeridade e que a distribuição de sacrifícios ia ser justa, estamos conversados
In DN
O pacto suicida
por Pedro Marques Lopes
Hoje
1O primeiro-ministro disse, na última quinta-feira, que o chamado pacto orçamental não era de esquerda nem de direita. Dando por boa a afirmação, pelo menos nenhum dos quadrantes políticos fica envergonhado com a enormidade que a esmagadora maioria dos deputados aprovou.
O pacto diz muito sobre o caminho que a Europa vem percorrendo.
Para não variar, os cidadãos não são chamados a dar a sua opinião sobre mais um verdadeiro momento fundador. Dir-se-á que estamos apenas perante o aprofundamento de decisões que retiraram soberania aos Estados e que não se justificaria desta vez consultar directamente os cidadãos, o mal ou o bem já estaria feito. Pode ser, porém importa recordar que em matérias de soberania, provavelmente as únicas, não há representação que possa substituir o voto directo. A verdadeira crise europeia é, nunca é demais repetir, política. Mas vai muito para lá da questão do papel do BCE, planos de crescimento económico, maior integração de políticas fiscais, menor ou maior federalismo, mais ou menos défice, maior ou menor dívida pública. É sobretudo na dimensão do fundamental papel dos cidadãos de decidir o que de facto querem, de os envolver nos processos de decisão, do seu cabal esclarecimento sobre os caminhos a trilhar. A inexistência de discussão pública deste tratado leva a que a população não faça a mais pequena ideia do que de facto está em causa e das consequências que advirão para as suas vidas e para a comunidade. Aí está mais um péssimo exemplo do caminho que está a ser traçado.
Esta aberração em forma de tratado institui a visão merkeliana do que deve ser a Europa. Dividida entre os mui sérios e disciplinados países e os pequenotes que não se sabem comportar e que devem ser postos na linha pelos primeiros. Esqueçamos a Europa em que os cidadãos seriam tratados de forma idêntica mas respeitando a especificidade dos países, o seu estado de desenvolvimento, as suas idiossincrasias ou as suas debilidades. Não senhor, o que a Alemanha e o seu ajudante francês pensam para nós e os outros países mal comportados e preguiçosos é o que está certo.
Nem de direita nem de esquerda, dizia o primeiro-ministro. Melhor, o pacto institui a ausência de alternativa. A partir de agora, quando votarmos, apenas escolheremos pessoas, representantes não dos eleitores nacionais mas de outras gentes, já que as políticas serão exactamente as mesmas. O principal instrumento político, leia-se o Orçamento, perde quase toda a sua importância. Tudo isto em razão do sacrossanto equilíbrio orçamental, como se esse equilíbrio por artes mágicas criasse emprego, desenvolvimento económico e investimento. E não vale a pena vir com a conversa oca de que quando se fala disto se faz apelos a desequilíbrios, a despesismos, descontrolos orçamentais ou ao mais demagógico dos disparates que é o dos encargos para as gerações futuras, como se o investimento em escolas, estradas, tecnologia, hospitais fossem encargos.
Especificamente para Portugal, as consequências da ratificação deste tratado são simples. Das duas uma, ou Portugal cumpre os objectivos constantes no pacto orçamental que pura e simplesmente obsta a implementação de políticas de crescimento e impõe metas absolutamente irrealistas para o decréscimo do défice e da dívida pública (só para referir os exemplos mais gritantes), obrigando na realidade a cortes que destruiriam de facto por inteiro o Estado social e que fariam disparar ainda mais o desemprego e as falências, ou seja, o nosso país chegaria ao fim do processo na mais profunda miséria, ou não os cumpre, os tais objectivos, e sujeitar-se-á a penalizações gravíssimas que, no limite, o afastará do euro com as consequências conhecidas e o arrastará também para a miséria. Venha o diabo e escolha.
Sim, este pacto não é de esquerda nem de direita, é apenas suicida para Portugal e para a Europa.
2A taxa sobre o comércio de alimentos não é mais do que um imposto encapotado.
Ao contrário do que a ministra pensa, não serão as grandes e médias superfícies a pagar o que quer que seja, quem irá pagar este novo custo serão os consumidores. Os mais ricos e os mais pobres. São, aliás, os mais pobres os que recorrem mais aos hipermercados e grandes cadeias de comércio alimentar, por uma razão muito simples: são mais baratos, sobretudo neste tipo de produtos. Temos assim um novo imposto que penalizará ainda mais os que mais sofrem com a austeridade.
Quanto à promessa de que não íamos ter mais subidas de impostos, novas medidas de austeridade e que a distribuição de sacrifícios ia ser justa, estamos conversados
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Joao Ruiz- Pontos : 32035
A igreja e o protesto
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A igreja e o protesto
por BAPTISTA-BASTOS
Hoje
A desagregação da democracia portuguesa está em marcha, e não me parece que haja grande sobressalto cívico. Cada vez ficamos mais pobres, e não só na razão da subsistência. Os intelectuais abandonaram a força propulsora que os distinguiu e caracterizou como referência moral, cedendo a uma série de intermediações que os bajula, e afasta do seu papel fundamental.
A Igreja Católica (talvez alertada por perder prosélitos) dá tímidos sinais de que esta política conduz a uma forma cruel de desapropriação e cria formas assustadoras de dependência. Uma carta da pastoral do Ensino ao ministro Nuno Crato (ex-militante da extrema-esquerda, fascinado pelas sereias do "mercado") adverte que, por este caminho, só os filhos dos ricos poderão aceder aos estudos universitários. Entretanto, por dificuldades de toda a ordem, seis mil alunos do Superior abandonaram as aulas.
O Governo de Passos Coelho, em dez meses, criou a desmesura obscena de uma desigualdade a qual não passa de derivação perversa de outra, das muitas expressões do fascismo. Não tenhamos medo das palavras. A democracia de superfície, ou a deformação do próprio conceito, tornou-se numa banalidade que não vejo analisada pelos historiadores e sociólogos portugueses.
A inocência corrompida da Igreja, sacudida pela necessidade de cuidar das coisas terrenas, resultou, por tardia, no abandono de milhões dos seus crentes. A especificidade contemporânea do mal alastrou-se com o advento do neoliberalismo e na transformação do trabalhador num mero objecto destinado a obter o rendimento máximo. Frequentemente, a Igreja cedeu a vez e calou a voz, sem qualquer outra consideração que não fosse a "defesa do sagrado", em detrimento do factor humano. Este documento agora dirigido ao ministro Crato surge depois de protestos de professores, de pais e de responsáveis de educação terem expresso um generalizado descontentamento.
Não se trata de paradoxos éticos do "mercado." O que nos está a atingir, a sufocar e a empobrecer é um programa ideológico muito bem pensado e organizado, que tem conseguido fascinar as suas próprias vítimas. Quando o prof. Medina Carreira chama a atenção pela qualidade da manipulação a que somos submetidos, consideram-no "catastrofista"; mas a verdade é que ele se tornou praticamente no único a desmontar a armadilha montada contra nós.
Não se pense que Pedro Passos Coelho e alguns dos seus não sabem o que estão a fazer. Sabem e fazem- -no, graças à violência simbólica que nos inculcaram de que não existe alternativa, e à passividade doentia com que tudo admitimos. Nesta conversa envenenada também vai António José Seguro, cujas cedências ao projecto denotam falta de convicções, carência de estudo e ausência de antagonismo. Parafraseando o dito de uma antiga telenovela: "Que mais nos vai acontecer?"
In DN
A igreja e o protesto
por BAPTISTA-BASTOS
Hoje
A desagregação da democracia portuguesa está em marcha, e não me parece que haja grande sobressalto cívico. Cada vez ficamos mais pobres, e não só na razão da subsistência. Os intelectuais abandonaram a força propulsora que os distinguiu e caracterizou como referência moral, cedendo a uma série de intermediações que os bajula, e afasta do seu papel fundamental.
A Igreja Católica (talvez alertada por perder prosélitos) dá tímidos sinais de que esta política conduz a uma forma cruel de desapropriação e cria formas assustadoras de dependência. Uma carta da pastoral do Ensino ao ministro Nuno Crato (ex-militante da extrema-esquerda, fascinado pelas sereias do "mercado") adverte que, por este caminho, só os filhos dos ricos poderão aceder aos estudos universitários. Entretanto, por dificuldades de toda a ordem, seis mil alunos do Superior abandonaram as aulas.
O Governo de Passos Coelho, em dez meses, criou a desmesura obscena de uma desigualdade a qual não passa de derivação perversa de outra, das muitas expressões do fascismo. Não tenhamos medo das palavras. A democracia de superfície, ou a deformação do próprio conceito, tornou-se numa banalidade que não vejo analisada pelos historiadores e sociólogos portugueses.
A inocência corrompida da Igreja, sacudida pela necessidade de cuidar das coisas terrenas, resultou, por tardia, no abandono de milhões dos seus crentes. A especificidade contemporânea do mal alastrou-se com o advento do neoliberalismo e na transformação do trabalhador num mero objecto destinado a obter o rendimento máximo. Frequentemente, a Igreja cedeu a vez e calou a voz, sem qualquer outra consideração que não fosse a "defesa do sagrado", em detrimento do factor humano. Este documento agora dirigido ao ministro Crato surge depois de protestos de professores, de pais e de responsáveis de educação terem expresso um generalizado descontentamento.
Não se trata de paradoxos éticos do "mercado." O que nos está a atingir, a sufocar e a empobrecer é um programa ideológico muito bem pensado e organizado, que tem conseguido fascinar as suas próprias vítimas. Quando o prof. Medina Carreira chama a atenção pela qualidade da manipulação a que somos submetidos, consideram-no "catastrofista"; mas a verdade é que ele se tornou praticamente no único a desmontar a armadilha montada contra nós.
Não se pense que Pedro Passos Coelho e alguns dos seus não sabem o que estão a fazer. Sabem e fazem- -no, graças à violência simbólica que nos inculcaram de que não existe alternativa, e à passividade doentia com que tudo admitimos. Nesta conversa envenenada também vai António José Seguro, cujas cedências ao projecto denotam falta de convicções, carência de estudo e ausência de antagonismo. Parafraseando o dito de uma antiga telenovela: "Que mais nos vai acontecer?"
In DN
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Amigos?Longe! Inimigos? O mais perto possível!
Joao Ruiz- Pontos : 32035
No país que odeia vencedores
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No país que odeia vencedores
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
Jorge Nuno Pinto da Costa completou na última terça-feira trinta anos como presidente da mais bem sucedida instituição portuguesa da nossa história recente: o Futebol Clube do Porto.
Em nenhum sector de actividade uma organização conseguiu sequer aproximar-se do desempenho nacional e internacional do clube nortenho. Até o mais distraído dos cidadãos não ignora as sistemáticas vitórias do Futebol Clube do Porto no plano interno em todos os desportos profissionais ou semiprofissionais e os êxitos retumbantes a nível internacional. Desde 1964, o único clube de futebol português a ganhar provas europeias e mundiais foi o FC Porto. Ganhou sete, batendo-se de igual para igual com clubes representativos de cidades e países com muitíssimas mais capacidades financeiras e com uma capacidade de recrutamento de jogadores e treinadores quase ilimitada - não vale a pena perder tempo referindo os campeonatos e taças dentro de fronteiras, o espaço nesta página é demasiado pequeno.
A pergunta impõe-se: que empresa portuguesa, que instituição, foi a melhor da Europa, no seu ramo de actividade, por duas vezes ou, pelo menos, chegou perto disso nos últimos trinta anos? Pois...
Os sócios e adeptos do FC Porto, o desporto português e a comunidade portuguesa devem todos esses feitos a uma pessoa: Pinto da Costa. Claro que nenhum homem sozinho seria capaz de tão espantosa obra, mas foi, de facto, ele o grande motor, o grande líder duma das mais extraordinárias histórias de sucesso duma organização portuguesa.
Pinto da Costa é, sem sombra de dúvida, o mais brilhante gestor português e, no seu sector, um dos melhores do mundo, senão o melhor (é o presidente dum clube, no mundo inteiro, com mais títulos ganhos). Em qualquer país que não estivesse minado pela inveja, que não vivesse obcecado pela intriga e não odiasse vencedores, o presidente do FC do Porto seria um autêntico herói nacional. O exemplo de alguém que com parcos recursos, liderando uma organização originária duma região pobre da Europa, conseguiu, à custa de trabalho, capacidade de organização e uma dedicação sem limites transformar um clube como muitos outros num dos maiores do mundo seria estudado, promovido, glorificado. Não é em vão que por esse mundo fora o FC Porto e o seu presidente são homenageados e vistos como autênticos fenómenos. Mas, em Portugal, quanto maior for o sucesso, maior será o ódio, maior será o desprezo, e, claro está, Pinto da Costa é o alvo de toda a desconsideração, de toda a infâmia, de toda a calúnia.
Desenganem-se os que acreditam que a razão para tanta falta de respeito pela obra realizada se deve exclusivamente à paixão que rodeia as coisas do futebol, ao facto de um clube com menos adeptos que os seus rivais lhes ganhar sistematicamente, às tomadas de posição muitas vezes duras do presidente ou ao discurso exageradamente regionalista. Terão essas razões algum peso, mas estão longe de ser as fundamentais. Pinto da Costa é invejado e odiado porque ganha. E ganha porque sabe mais do seu ofício, porque trabalha mais, porque sabe organizar melhor a sua empresa. Mas isso no nosso país pouco conta. Toda a gente sabe que se alguém é rico é porque roubou, se alguém tem um bom contrato é porque tem cunhas. Porque seria diferente com Pinto da Costa?
O sucesso em Portugal nunca serve de exemplo, nunca leva as pessoas a quererem fazer melhor, a trabalharem mais, a serem mais empenhadas.
Como dizia um meu bom amigo benfiquista, em Portugal só no futebol se fazem declarações de interesses. Sou sócio do FC Porto. Estarei eternamente agradecido a quem me proporcionou tantas alegrias e me fez quase arrebentar de orgulho por ser portista e português. Mas isso, para o tema, pouco importa. É quase patético ter de anunciar a minha condição de adepto dum clube apenas porque se reconhece a obra de alguém ímpar na nossa comunidade, de alguém que honrou o nome da cidade do Porto e de Portugal.
Muito obrigado, sr. Pinto da Costa.
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.
In DN
No país que odeia vencedores
por PEDRO MARQUES LOPES
Hoje
Jorge Nuno Pinto da Costa completou na última terça-feira trinta anos como presidente da mais bem sucedida instituição portuguesa da nossa história recente: o Futebol Clube do Porto.
Em nenhum sector de actividade uma organização conseguiu sequer aproximar-se do desempenho nacional e internacional do clube nortenho. Até o mais distraído dos cidadãos não ignora as sistemáticas vitórias do Futebol Clube do Porto no plano interno em todos os desportos profissionais ou semiprofissionais e os êxitos retumbantes a nível internacional. Desde 1964, o único clube de futebol português a ganhar provas europeias e mundiais foi o FC Porto. Ganhou sete, batendo-se de igual para igual com clubes representativos de cidades e países com muitíssimas mais capacidades financeiras e com uma capacidade de recrutamento de jogadores e treinadores quase ilimitada - não vale a pena perder tempo referindo os campeonatos e taças dentro de fronteiras, o espaço nesta página é demasiado pequeno.
A pergunta impõe-se: que empresa portuguesa, que instituição, foi a melhor da Europa, no seu ramo de actividade, por duas vezes ou, pelo menos, chegou perto disso nos últimos trinta anos? Pois...
Os sócios e adeptos do FC Porto, o desporto português e a comunidade portuguesa devem todos esses feitos a uma pessoa: Pinto da Costa. Claro que nenhum homem sozinho seria capaz de tão espantosa obra, mas foi, de facto, ele o grande motor, o grande líder duma das mais extraordinárias histórias de sucesso duma organização portuguesa.
Pinto da Costa é, sem sombra de dúvida, o mais brilhante gestor português e, no seu sector, um dos melhores do mundo, senão o melhor (é o presidente dum clube, no mundo inteiro, com mais títulos ganhos). Em qualquer país que não estivesse minado pela inveja, que não vivesse obcecado pela intriga e não odiasse vencedores, o presidente do FC do Porto seria um autêntico herói nacional. O exemplo de alguém que com parcos recursos, liderando uma organização originária duma região pobre da Europa, conseguiu, à custa de trabalho, capacidade de organização e uma dedicação sem limites transformar um clube como muitos outros num dos maiores do mundo seria estudado, promovido, glorificado. Não é em vão que por esse mundo fora o FC Porto e o seu presidente são homenageados e vistos como autênticos fenómenos. Mas, em Portugal, quanto maior for o sucesso, maior será o ódio, maior será o desprezo, e, claro está, Pinto da Costa é o alvo de toda a desconsideração, de toda a infâmia, de toda a calúnia.
Desenganem-se os que acreditam que a razão para tanta falta de respeito pela obra realizada se deve exclusivamente à paixão que rodeia as coisas do futebol, ao facto de um clube com menos adeptos que os seus rivais lhes ganhar sistematicamente, às tomadas de posição muitas vezes duras do presidente ou ao discurso exageradamente regionalista. Terão essas razões algum peso, mas estão longe de ser as fundamentais. Pinto da Costa é invejado e odiado porque ganha. E ganha porque sabe mais do seu ofício, porque trabalha mais, porque sabe organizar melhor a sua empresa. Mas isso no nosso país pouco conta. Toda a gente sabe que se alguém é rico é porque roubou, se alguém tem um bom contrato é porque tem cunhas. Porque seria diferente com Pinto da Costa?
O sucesso em Portugal nunca serve de exemplo, nunca leva as pessoas a quererem fazer melhor, a trabalharem mais, a serem mais empenhadas.
Como dizia um meu bom amigo benfiquista, em Portugal só no futebol se fazem declarações de interesses. Sou sócio do FC Porto. Estarei eternamente agradecido a quem me proporcionou tantas alegrias e me fez quase arrebentar de orgulho por ser portista e português. Mas isso, para o tema, pouco importa. É quase patético ter de anunciar a minha condição de adepto dum clube apenas porque se reconhece a obra de alguém ímpar na nossa comunidade, de alguém que honrou o nome da cidade do Porto e de Portugal.
Muito obrigado, sr. Pinto da Costa.
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.
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